EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000216-85.2015.4.04.7117/RS
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
EMBARGANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMBARGADO | : | ACÓRDÃO |
INTERESSADO | : | LUCIA CIOTTA MUNARI |
ADVOGADO | : | LUIZ GUSTAVO FERREIRA RAMOS |
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DO INSS. INEXISTÊNCIA DAS HIPÓTESES ENSEJADORAS DO RECURSO. PREQUESTIONAMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACLARATÓRIOS DA PARTE AUTORA. AGREGAR FUNDAMENTOS.
1. A acolhida dos embargos de declaração só tem cabimento nas hipóteses de omissão, contradição, obscuridade e erro material. 2. Como os presentes embargos têm por finalidade prequestionam a matéria para fins de recurso especial e/ou extraordinário, resta perfectibilizado o acesso à via excepcional, nos termos do art. 1.025, do CPC/15. 3. Embargos de declaração do INSS providos em parte para efeitos de prequestionamento. 4. Embargos aclaratórios da parte autora. Necessidade de agregar fundamentação verificada. Inalterado, contudo, o resultado do julgado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento aos embargos de declaração do INSS, exclusivamente para fins de prequestionamento, e dar provimento aos embargos da parte autora, para agregar fundamentação ao julgado, inalterado o resultado do julgamento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 17 de maio de 2017.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8931073v3 e, se solicitado, do código CRC E44339A9. | |
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| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 23/05/2017 11:28 |
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000216-85.2015.4.04.7117/RS
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
EMBARGANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMBARGADO | : | ACÓRDÃO |
INTERESSADO | : | LUCIA CIOTTA MUNARI |
ADVOGADO | : | LUIZ GUSTAVO FERREIRA RAMOS |
RELATÓRIO
Trata-se de embargos declaratórios opostos pela parte autora e pelo INSS contra acórdão desta Sexta Turma.
Os embargantes sustentam, em síntese, que o voto condutor do acórdão encerra um dos vícios tipicamente previstos (art. 1.022, CPC/15) e que deve ser corrigido pela via dos embargos declaratórios.
Alega a parte autora que o acórdão embargado incorreu em obscuridade, porque fixou os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação, porém deve ser aclarado que o "valor da condenação" compreende tanto as parcelas que deixaram de ser pagas como também o valor declarado inexigível.
Alega o INSS que o acórdão embargado incorreu em omissão e contradição, pois, apesar de reconhecer a exigência legal de início de prova material para a comprovação do tempo de serviço rural, prevista no art. 55, §3º, Lei 8.213/91, considerou que a exigência fora satisfeita com a juntada de documentos sem pertinência temática com a comprovação de atividade rural. Sustenta ainda que o acórdão embargado nada referiu sobre a questão relativa ao requerimento administrativo, para os fins previstos no art. 143 da Lei 8.213/1991. Opõe os embargos inclusive para fins de prequestionamento.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, cumpre esclarecer que cabem embargos de declaração quando, na decisão prolatada, houver obscuridade, contradição, omissão ou erro material, nos termos do art. 1.022, CPC/15. Assim, o recurso em tela não objetiva o rejulgamento da causa, mas tão somente o aperfeiçoamento de decisão anteriormente proferida. Trata-se, aliás, de remédio que somente combate vícios intrínsecos ao decisum, e não a ele exteriores (MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. vol. V. Rio de Janeiro: Forense, 2005).
Pela fundamentação invocada no voto condutor do acórdão embargado, não se observa a ocorrência das hipóteses ensejadoras do recurso em apreço. O acórdão embargado teve a seguinte fundamentação:
"Da demonstração da atividade rural
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, considerando-se como tal os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que indiquem a continuidade da atividade rural, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida, exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, Súmula nº 149 do STJ e REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia). Cabe salientar que embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo.
Não se exige, por outro lado, prova documental plena da atividade rural de todo período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.), que juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Ademais, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016) que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório."
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural, de acordo com a Súmula n° 73, desta Corte, haja vista que o trabalho com base em uma única unidade produtiva tem como regra a documentação emitida em nome de uma única pessoa. Tal orientação, agora sumulada, decorre da própria interpretação possibilitada pelo art. 11 da Lei de Benefícios, que define o regime de economia familiar como aquele em que os membros da família exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo certo, repita-se, que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta exercida, normalmente, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
Assim, as certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
Quando se trata de mulheres, a prova se torna ainda mais difícil, pois se sabe que quando existiam documentos, estes eram lançados em nome do chefe da família onde, há certo tempo, era o único membro familiar a possuir direito à aposentadoria, de modo que deixar de atribuir-lhe a qualidade de trabalhadora rural em face da inexistência de documento em nome próprio, qualificando-a como tal, redunda em grande injustiça com as mulheres ativas neste tipo de trabalho árduo em que trabalham tanto quanto ou muitas vezes ainda mais que os homens.
Importante, ainda, ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não serve para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/1991, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. Somente será descaracterizado o regime de economia familiar se restar comprovado que a remuneração proveniente do labor urbano do cônjuge importe em montante tal que dispense a renda do labor rural para a subsistência do grupo familiar.
Acerca do exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, cumpre referir o entendimento do STJ, no julgamento do recurso especial repetitivo nº 1.354.908/SP, vinculado ao Tema nº 642, representativo de controvérsia, assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil (REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016. (Grifou-se.)
Do caso concreto
No presente caso, observo que a parte autora preencheu o requisito etário (55 anos) em 08/05/2003, porquanto nascida em 08/05/1948, e requereu o benefício na via administrativa em 09/05/2003. Dessa forma, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural no período de 132 meses anteriores ao implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
Para comprovar o trabalho agrícola no período de carência, a parte autora juntou aos autos os seguintes documentos:
a) nota fiscal de produtor, em nome da autora e seu marido, referente aos anos de 1991, 1993, 1994, 1995, 1996, 1997, 1998, 1999, 2002, 2003 (Evento 1.3, p.4-29);
b) declaração expedida pela Cooperativa Agropecuária Alto Uruguai Ltda., que atesta que o marido da autora foi associado da cooperativa no período compreendido entre 03/08/1978 a 28/02/2003 (Evento 1.4, p.35);
c) contrato particular de parceria agrícola, em nome do marido da autora, referente a exploração de área de 5 hectares, com vigência de 03 anos a contar de 23/01/2001 (Evento 1.6, p.1-2)
Tais documentos demonstram que a parte autora pode ser qualificada como sendo agricultora de profissão, o que também vem sendo aceito pela jurisprudência como início de prova material.
A prova oral produzida em juízo em 22/04/2015 (Evento 25) foi precisa e convincente acerca do trabalho rural da parte autora em regime de economia familiar, em todo o período de carência do benefício, conforme se verifica dos depoimentos colhidos em audiência:
Depoimento pessoal da autora Lucia Ciotta Munari
A propriedade que possuíam foi vendida para Paulo Balato; ele mora até hoje lá; o marido da autora vendeu a propriedade e foi para a cidade, a depoente ficou por lá até mais ou menos 2000, pois tinha plantação para cuidar; nessa propriedade ficou até 2002, algo assim; o marido foi trabalhar em uma indústria de pedra; depois de 2000 a depoente foi para a cidade e arrendou terra de Lody Munari; a terra era distante 15km de Erechim; as vezes a depoente ia lá a semana inteira, as vezes ia um dia ou dois na semana e seu marido descida junto no fim de semana; as vezes ia de ônibus, as vezes o marido a levava; quando ia a semana inteira ficava na casa de seu cunhado; depois que saiu da propriedade rural e veio morar em Erechim, arrendou a propriedade de seu cunhado só para completar o tempo e não perder a aposentadoria; seu cunhado tinha uma colônia e meia; tem erva-mate na propriedade de seu cunhado, assim como tinha na propriedade que venderam; a nota fiscal de erva mate do ano de 2002 é do tempo em que arrendava as terras do cunhado; tudo que plantavam em 1999 e 2002 era da depoente; não lembra se somente ajudava o cunhado a colher a erva-mate ou se recebia parte da produção; a área que arrendou era uma parte limpa e outra tinha erva; não lembra onde o contrato de arrendamento foi preenchido e assinado; não sabe porque não foi feito reconhecimento de firma; seu marido veio para a cidade antes da depoente, acredita que um ano antes; não recorda a extensão da área arrendada; na área arrendada cultivava feijão, milho, pipoca, paçoquinha, essas coisas; deixou de se trabalhar quando se aposentou; veio para a cidade mas ficou trabalhando com seu cunhado por 3 anos; plantava milho, mandioca, amendoim, feijão; dava meio saco, as vezes cinco ou dez; a produção era pouca, eram mais miudezas; seu marido recebia pouco, apenas meio salário;
Vicente Lise
Conhece a autora e o marido do km 14; eles saíram de lá em 1999 ou 2000; eles venderam a terra, não sabendo pra quem; no lugar agora tem uma padaria; o marido da autora mora na cidade; ele veio antes morar em Erechim, a família continuou na lavoura; estima que o marido da autora veio para a cidade um ano antes do resto da família; depois de venderam a propriedade, a família da autora continuou a morar lá por mais um ano e meio; o comprador da propriedade não era colono da região; o cunhado da autora mora a 10 km do depoente; ele tem erva-mate no local; estima que a autora ficou trabalhando com o cunhado por dois anos; a autora ia toda semana lá, as vezes ficava 3 a 4 dias, as vezes a semana inteira; a requerente tem 4 filhas, todas mulheres; não sabe se quando a requerente vendeu a terra alguma filha ainda morava com ela.
Nilva Simoni Kerstike
Conhece a autora e o marido dela do km 14; eles tem 4 filhas, todas mulheres; primeiro o marido da autora saiu da roça e foi morar em Erechim e a depoente veio depois; ela só saiu da terra depois de aposentada; depois de comprar a propriedade da depoente, o comprador não foi morar de imediato no local, pois teve que esperar a colheita da safra; o marido da autora saiu para a cidade procurar emprego e a autora ficou no campo com as filhas; só uma filha ficou morando com a mãe, a Lidiane; refere que Lody Munardi é cunhado da autora; Lody tem plantação de erva-mate e frutas; a autora plantava nas terras do Lody, o marido da autora não; quando a requerente veio para Erechim continuava a trabalhar na terra; a requerente e o marido alugaram a terra para que a autora pudesse se aposentar; venderam a propriedade em 1999, mas a autora ficou até 2001 e só depois veio para Erechim; mesmo em Erechim a requerente continuava a trabalhar na terra; a autora arrendou a terra para se aposentar; não sabe se depois de se aposentar a requerente continuou a ir trabalhar na terra;
Idani Antonio Kerstike
Conhece a autora há muito tempo; sabe que a autora e seu marido venderam a propriedade em 1999; quem comprou foi o Balato; o comprador não era da região; depois que venderam a propriedade ficaram um tempo ainda por lá, por volta de 2000-2001; primeiro o marido veio foi para Erechim, depois a autora, pois precisava colher a safra; a autora e o marido tiveram 4 filhos; os filhos já estavam casados quando a requerente e o marido venderam a propriedade; ficou com a autora uma filha; a propriedade do depoente dista mil metros da propriedade da autora; a propriedade do Lody era um pouco mais distante, mais ou menos 2,5km; Lody tem laranjas, frutas e deve ter eucalipto também; não sabe se tem erva-mate; sabe que a autora arrendou terras do Lody porque morava na região e sabia que ela ia trabalhar lá; a autora ia pra terra arrendada toda semana, apesar de não todos os dias; ela trabalhou lá até se aposentar.
A prova oral colhida é clara e convincente quanto ao labor rural desempenhado pela parte autora, em regime de economia familiar, durante todo o período de carência.
Não se pode desconsiderar, todavia, que os trabalhadores que desenvolvem suas atividades em terras de terceiros são, à exceção dos trabalhadores rurais boias-frias, talvez os mais prejudicados quando se trata de comprovar labor rural. Como não detêm título de propriedade e, na maior parte das vezes, comercializam a produção em nome do proprietário do imóvel, acabam por ficar sem qualquer documento que os vincule ao exercício da agricultura.
Ressalta-se que o fato de o cônjuge da autora exercer atividade outra que não a rural não serve para descaracterizar automaticamente a condição de segurada especial de quem postula o benefício, pois, ainda que considerada como trabalhadora rural individual, sua situação encontra guarida no art. 11, inciso VII, da Lei n.° 8.213/91, sendo certo também que incumbia à Autarquia Previdenciária a prova de que a subsistência da família é garantida pelo salário do companheiro, sendo dispensável a atividade rural desenvolvida pela requerente, o que não se verificou no presente caso.
Cabe mencionar o seguinte precedente da 3ª Seção:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. APOSENTADORIA. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. COMPROVAÇÃO.
1. O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea. 2. Com o advento da Lei 11.718/08, que alterou diversos dispositivos da Lei 8.213/91, restou claro que a existência de fonte de renda diversa da agricultura não descaracteriza, por si só, a condição de segurado especial, haja vista o que estabelecem os arts. 11, §§ 9º e 10º, I, "a", da Lei n.º 8.213/91. Além disso, a Instrução Normativa INSS/PRES n.º 45, de 06/08/10, em seu art. 7º, § 5º, dispõe que não é segurado especial o membro de grupo familiar (somente ele) que possuir outra fonte de rendimento. (EINF n.º 0000833-59.2011.404.9999, Rel. Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. em 19-08-2011). (Sublinhei.)
No que concerne à comprovação da atividade laborativa do rurícola, é tranquilo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade de extensão da prova material em nome de um membro do núcleo familiar a outro. Contudo, no julgamento do Resp. 1.304.479-SP, apreciado sob a sistemática dos recursos repetitivos, aquela colenda Corte adotou posicionamento no sentido da impossibilidade de se estender a prova de um membro do núcleo familiar a outro, quando o titular dos documentos passa a exercer trabalho urbano.
O Recurso Especial n. 1.304.479-SP, tido como representativo de controvérsia, foi assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas prova em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta e período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está e conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Grifo nosso).
A partir da leitura do item "5" da ementa, vê-se que o julgamento do recurso especial repetitivo versou sobre hipótese semelhante ao caso em análise, em que, apesar de terem sido juntados documentos em nome do cônjuge da parte autora, o qual passou a exercer atividade urbana, verifica-se que também foram carreados aos autos documentos em nome da requerente, o que atende a necessidade de apresentação de documentos em nome próprio.
Quanto à pesquisa externa realizada pelo INSS, o eg. Tribunal Regional Federal da 4ª Região tem entendido que a entrevista concedida ao agente do INSS, de forma isolada, possui restrito valor probante. Sozinha, não se presta a desautorizar o conjunto de provas produzidas nos autos em sentido contrário.
Nesse sentido, os seguintes precedentes:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. PESQUISA ADMINISTRATIVA X PROVA JUDICIALIZADA. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR.INÍCIO DE PROVA MATERIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONSECTÁRIOS LEGAIS. VERBA HONORÁRIA. 1. Não merecem relevância, no caso, as conclusões da pesquisa administrativa realizada pelo INSS, quando contrastadas à prova judicializada, porquanto produzidas unilateralmente e sem a observância do contraditório. 2. Para a concessão da aposentadoria por idade rural deve estar comprovado nos autos, mediante início de prova material corroborado pela prova testemunhal, o exercício da atividade laborativa rural, no período de carência, e preenchida a idade mínima. 3. A correção monetária de débitos previdenciários, por tratar-se de obrigação alimentar e, inclusive, dívida de valor, incide a partir do vencimento de cada parcela, segundo o disposto no § 1º do art. 1º da Lei 6.899/81 e, no caso, observará o IGP-DI, de acordo com o artigo 10 da Lei 9.711/98. 4. Os juros moratórios, nas ações previdenciárias, devem ser fixados à taxa legal de 12% ao ano e são devidos a partir da citação. 5. A verba honorária, quando vencido o INSS, deve ser fixada em 10% sobre o valor da condenação, compreendendo-se, tão-somente, as prestações devidas até a prolação da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência. 6. O INSS está isento do pagamento de custas quando litiga na Justiça Federal" (TRF-4 - AC: 694 PR 2000.70.04.000694-5, Relator: Relator, Data de Julgamento: 30/05/2006, QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJ 04/10/2006 PÁGINA: 916)
"PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. RESTABELECIMENTO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ENTREVISTA ADMINISTRATIVA. HOMOLOGAÇÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO. 1. A 'entrevista' realizada administrativamente pelo INSS não compromete, por si, o conjunto probatório em sentido contrário trazido aos autos. 2. (...) 3. (...)"(TRF4, EIAC 1998.04.01.069251-7/SC, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Antônio Albino Ramos de Oliveira, DJU 30-10-2002).
Com efeito, tenho que a prova material acostada, aliada à prova testemunhal colhida, mostra-se razoável à demonstração de que a parte autora trabalhou durante toda na lavoura, não havendo motivo para que seja afastado seu direito ao benefício.
No caso, é possível a formação de uma convicção plena, após a análise do conjunto probatório, no sentido de que, efetivamente, houve o exercício da atividade laborativa rurícola em regime de economia familiar em todo o período correspondente à carência.
Assim, preenchidos os requisitos da idade exigida (completou 55 anos em 08/05/2003) e comprovado o exercício da atividade rural em período correspondente ao da carência, no caso, 132 meses, deve ser mantida a sentença que restabeleceu o benefício de Aposentadoria Rural por Idade em favor da parte autora a partir do cancelamento administrativo, em 20/11/2014, a teor do disposto no art. 49, inciso II, da Lei n.º 8.213/91.
(...)
Da Verba Honorária
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
No ponto assiste razão à parte autora". (Grifei)
Quanto aos argumentos trazidos pelo INSS, observo que a decisão está devidamente fundamentada, com a apreciação dos pontos relevantes e controvertidos da demanda, não se verifica omissão. Também não apresenta contradições, já que a conclusão se coadunou com a fundamentação. Tampouco há "inexatidões materiais" uma vez que a decisão contemplou a questão de fato posta e a exteriorizou adequadamente. Por fim, igualmente não se verifica obscuridade já que a decisão foi clara em relação aos pontos controvertidos.
Verifica-se, portanto, que o pleito da autarquia previdenciária é no sentido de rediscutir o mérito da decisão. Porém, salvo situações excepcionalíssimas, a eventual discordância quanto à valoração dos fatos apresentados, não pode ser objeto de discussão em embargos de declaração. Nesse mesmo sentido:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART. 535, CPC.
1. Não há como prosperar a pretensão dos Embargantes, pois, no caso, não se vislumbra a ocorrência das hipóteses previstas no artigo 535 do CPC.
2. Não há cerceamento de defesa ou omissão de pontos suscitados pelas partes, pois, ao Juiz cabe apreciar a lide de acordo com o seu livre convencimento, não estando obrigado a analisar todos os pontos suscitados pelas partes.
3. Impossibilidade de serem acolhidos embargos de declaração cujo único objetivo é a rediscussão da tese defendida pelos Embargantes.
4. O simples inconformismo dos Embargantes com o resultado do julgamento não tem o condão de conceder efeito modificativo, por meio de embargos de declaração.
5. Embargos rejeitados.
(STJ, EDcl no REsp 581682/SC, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/12/2003, DJ 01/03/2004, p. 176).
Como os embargos oposto pelo INSS têm por finalidade prequestionar a matéria para fins de recurso especial e/ou extraordinário, resta perfectibilizado o acesso à via excepcional, nos termos do art. 1.025, do CPC/15. De todo modo, dou por prequestionada a matéria versada nos dispositivos legais e constitucionais apontados pelo embargante, nos termos das razões de decidir já externadas no voto, deixando de aplicar aqueles não expressamente mencionados no acórdão e/ou tidos como aptos a fundamentar o pronunciamento judicial em sentido diverso do declinado.
Quanto aos embargos de declaração da parte autora, observo a necessidade de agregar fundamentação.
O acórdão embargado deu provimento ao apelo da parte autora para fixar a verba honorária em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observada a Súmula 76 desta Corte. Esclareço que o fato de a verba honorária ter sido fixada sobre as parcelas vencidas até a data da sentença, não exclui sua incidência sobre o valor que foi reputado inexigível.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento aos embargos de declaração do INSS, exclusivamente para fins de prequestionamento, e dar provimento aos embargos da parte autora, para agregar fundamentação ao julgado, inalterado o resultado do julgamento.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/05/2017
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000216-85.2015.4.04.7117/RS
ORIGEM: RS 50002168520154047117
INCIDENTE | : | EMBARGOS DE DECLARAÇÃO |
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da Republica Paulo Gilberto Cogo Leivas |
EMBARGANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMBARGADO | : | ACÓRDÃO |
INTERESSADO | : | LUCIA CIOTTA MUNARI |
ADVOGADO | : | LUIZ GUSTAVO FERREIRA RAMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/05/2017, na seqüência 820, disponibilizada no DE de 02/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DO INSS, EXCLUSIVAMENTE PARA FINS DE PREQUESTIONAMENTO, E DAR PROVIMENTO AOS EMBARGOS DA PARTE AUTORA, PARA AGREGAR FUNDAMENTAÇÃO AO JULGADO, INALTERADO O RESULTADO DO JULGAMENTO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA | |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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