Apelação Cível Nº 5008627-60.2018.4.04.7102/RS
RELATOR: Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
APELANTE: EDILSO VESTENA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação ajuizada por Edilso Vestena contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, na qual o autor postula a concessão de benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição, inclusive por meio de reconhecimento de tempo especial e tempo rural em regime de economia familiar.
Processado o feito, sobreveio sentença extinguindo o feito, sem resolução de mérito (
):Ante o exposto, indefiro a inicial por falta de interesse de agir e extingo o processo, sem resolução de mérito, com fulcro no art. 485, I, c/c o art. 330, III, ambos do CPC/2015,
Sem custas e honorários.
Apela o autor (
), alegando, em síntese, acerca da necessidade de prévio requerimento administrativo como condição de acesso ao Poder Judiciário, que há casos em que o INSS, de forma reiterada, nega os pleitos dos segurados, sendo que, nessas situações excepcionais, o estabelecimento dessa exigência prévia, acabaria por retardar o acesso ao direito fundamental à Previdência Social. Assim, defende, com base no decidido pelo STF no julgamento do RE 631.240/MG, que a exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrária à postulação do segurado. Sustenta que parte dos períodos de tempo especial cujo reconhecimento é pleiteado correspondem a trabalho prestado em empresas inativas, de modo que é impossível a obtenção de Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP). Quanto ao tempo rural em regime de economia familiar, aponta o INSS exige a prova ano a ano do tempo trabalhado, mediante a apresentação de blocos de produtor, sendo que o recorrente não possui tais documentos. Pugna, enfim, pela reforma da sentença, a fim de que sejam analisados os períodos que o recorrente objetiva ver reconhecidos como tempo especial, para fins de obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição.Com contrarrazões do INSS (evento 36), vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Interesse de Agir
Em 03.09.2014 o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do RE 631240/MG, em sede de repercussão geral, assentando entendimento no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário. O acórdão foi assim ementado:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR. 1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo. 2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas. 3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado. 4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão. 5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos. 6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir. 7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir. 8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais. 9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir. (RE 631240, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014)
O Relator do RE 631240/MG, Exmo. Min. Luís Roberto Barroso, dividiu as ações previdenciárias em dois grupos, quais sejam:
(i) demandas que pretendem obter uma prestação ou vantagem inteiramente nova ao patrimônio jurídico do autor (concessão de benefício, averbação de tempo de serviço e respectiva certidão, etc.); e
(ii) ações que visam ao melhoramento ou à proteção de vantagem já concedida ao demandante (pedidos de revisão, conversão de benefício em modalidades mais vantajosa, restabelecimento, manutenção, etc.).
E concluiu o Ministro Relator afirmando que: 'no primeiro grupo, como regra, exige-se a demonstração de que o interessado já levou sua pretensão ao conhecimento da Autarquia e não obteve a resposta desejada', sendo que a falta de prévio requerimento administrativo de concessão deve implicar na extinção do processo judicial sem resolução de mérito, por ausência de interesse de agir; 'no segundo grupo, precisamente porque já houve a inauguração da relação entre o beneficiário e a Previdência, não se faz necessário, de forma geral, que o autor provoque novamente o INSS para ingressar em juízo'.
Considerando a existência de inúmeros processos judiciais em que o INSS é demandado, o STF fixou uma fórmula de transição a ser aplicável a todas as ações ajuizadas até a data do julgamento da repercussão geral, que consiste em:
a) nas ações ajuizadas no âmbito de Juizado Itinerante, a falta do prévio requerimento administrativo não implicará na extinção do feito sem julgamento de mérito;
b) nas ações em que o INSS tiver apresentado contestação de mérito, estará caracterizado o interesse de agir pela resistência à pretensão, implicando na possibilidade de julgamento do mérito, independentemente do prévio requerimento administrativo;
c) nas demais ações em que ausente o requerimento administrativo, o feito será baixado em diligência ao Juízo de primeiro grau, onde permanecerá sobrestado, a fim de intimar o autor a dar entrada no pedido administrativo em até 30 (trinta) dias, sob pena de extinção do processo por falta de interesse de agir. Comprovada a postulação administrativa, o Juiz intimará o INSS para se manifestar acerca do pedido em até 90 (noventa) dias.
(destaquei)
Nos casos do item "c", se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente (ex: não comparecimento à perícia ou à entrevista), extingue-se a ação. Por outro lado, se negado o pedido, estará caracterizado o interesse de agir e o feito deverá prosseguir. Em qualquer caso, a análise quanto à subsistência da necessidade do provimento jurisdicional deverá ser feita pelo Juiz.
Neste mesmo precedente, restou definido, por fim, que 'tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data da entrada do requerimento, para todos os efeitos legais'.
Caso Concreto
A sentença extinguiu o feito sem julgamento de mérito entendendo que a parte autora não demonstrou interesse processual em razão da falta de apresentação de documentos necessários a análise do seu pedido.
No presente caso, a parte requereu o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, pela via administrativa, em 22/12/2016 (evento 09, PROCADM1).
A controvérsia diz respeito à especialidade - ou não - dos períodos de 02/12/1991 até 01/12/1992, de 01/03/1994 até 01/08/1995, de 02/01/1996 até 01/07/1996, trabalhados na Empresa Librelotto e Cia LTDA - ME; de 02/07/1996 até 31/01/2000, de 01/07/2000 até 15/01/2002, de 01/08/2002 até 08/09/2004, trabalhados na Empresa Industria Alimentícia Fadiole LTDA-ME; e de 01/02/2005 até 26/09/2016, trabalhado na Empresa Cooperativa Agrícola Mista Nova Palma, bem como o tempo trabalhado em regime de economia familiar o período de 03/12/1986 (data que o autor completou doze anos de idade) até 02/12/1991.
A sentença examinou as questões nos seguintes termos (evento 27):
(...)
O interesse processual, como uma das condições da ação, é identificado pela necessidade concreta do processo e a adequação do procedimento, para a solução do litígio. O não preenchimento de todas as condições da ação significa a não existência da necessidade concreta de se recorrer ao Judiciário. A ausência dos requisitos de existência do direito processual de ação provoca, evidentemente, a extinção do processo.
Pela análise do processo administrativo anexado ao feito (Evento 09, PROCADM1), verifica-se que o autor não apresentou a CTPS e nem outros documentos necessários a análise do seu pedido.
Assim, entendo caracterizada a ausência de interesse de agir da parte autora a ensejar a extinção do feito sem resolução do mérito, visto que não cumprida a carta de exigências emitida pela Autarquia.
Esta Corte vem entendendo que, tendo havido pedido de aposentadoria na via administrativa, com comprovação de tempo laborado, ainda que não instruído de toda a documentação que poderia ser agregada, o indeferimento do pedido pelo INSS tende a ser suficiente para se ter por caracterizada a pretensão resistida quando houver o descumprimento dos deveres decorrentes da boa-fé objetiva por parte do Instituto Previdenciário (dever de informação e orientação do segurado).
Entendo que merece ser mantida a sentença, considerando que, ao compulsar os autos do processo administrativo protocolado em 206, observa-se que o INSS solicitou o comparecimento do requerente, à fl. 3 do evento 09, PROCADM1, para atender às seguintes exigências: "segurado deverá apresentar CTPS e demais documento necessários para dar andamento no requerimento".
Não atendidas as referidas exigências, o INSS concluiu pelo indeferimento do pedido na via administrativa (fl. 12 do mesmo evento).
Como não foi juntada qualquer documentação, tem-se, assim, hipótese em que não deve ser reconhecido o interesse de agir, pois o segurado não apresentou elementos probatórios acerca de circunstâncias passíveis de reconhecimento, pelo INSS, da especialidade ou de tempo rural em regime de economia familiar.
Considerando, enfim, que o autor não atendeu ao pedido de complementação formulado pelo INSS, está configurando o denominado "indeferimento forçado", que impede a apreciação da matéria em juízo, pois a questão ora debatida depende da análise de matéria de fato ainda não levada a conhecimento da autarquia.
Logo, deve ser mantida a sentença que extinguiu o feito sem exame de mérito.
Honorários
Com a apresentação de contrarrazões pela apelada que não havia sido citada anteriormente, há angularização da relação processual, o que torna necessária a fixação de honorários sucumbenciais.
Assim, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, restando suspensa a exigibilidade em face da AJG.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5008627-60.2018.4.04.7102/RS
RELATOR: Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
APELANTE: EDILSO VESTENA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. ESPECIALIDADE. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DEVER DO INSS DE ORIENTAÇÃO. INTERESSE DE AGIR NÃO CONFIGURADO. EXTINÇÃO SEM EXAME DE MÉRITO.
1. Em 03.09.2014 o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do RE 631240/MG, em sede de repercussão geral, assentando entendimento no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário.
2. Como não foi juntada qualquer documentação, tem-se, assim, hipótese em que não deve ser reconhecido o interesse de agir, pois o segurado não apresentou elementos probatórios acerca de circunstâncias passíveis de reconhecimento, pelo INSS, da especialidade ou de tempo rural em regime de economia familiar.
3. Considerando, enfim, que o autor não atendeu ao pedido de complementação formulado pelo INSS, está configurando o denominado "indeferimento forçado", que impede a apreciação da matéria em juízo, pois a questão ora debatida depende da análise de matéria de fato ainda não levada a conhecimento da autarquia. Logo, deve ser mantida a sentença que extinguiu o feito sem exame de mérito.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 28 de março de 2023.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA DE 28/03/2023
Apelação Cível Nº 5008627-60.2018.4.04.7102/RS
RELATOR: Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS
SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: carlos djalma silva da rosa por EDILSO VESTENA
APELANTE: EDILSO VESTENA (AUTOR)
ADVOGADO(A): carlos djalma silva da rosa
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 28/03/2023, na sequência 13, disponibilizada no DE de 16/03/2023.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
Votante: Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
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