Apelação Cível Nº 5003297-63.2020.4.04.7215/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
APELANTE: LIDINALDO CARDOSO DA SILVA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face de sentença que indeferiu a pedição inicial nos seguintes termos (
):A regularização de tal fato foi objeto da Carta de Exigência, emitida pela Autarquia Previdenciária em 11/11/2019.
(...)
Contudo, o autor apresentou o PPP da empresa Santa Catarina Vidros e Segurança, que não era objeto da intimação realizada pelo INSS.
Entendo que para caracterização do interesse de agir não basta apenas o protocolo do pedido junto ao ente previdenciário, mas também o cumprimento das exigências solicitadas, ou a justificativa de não o fazê-la, sob pena de o prévio requerimento administrativo transformar-se apenas em um simples requisito formal para ajuizamento da ação judicial.
(...)
Assim, o pleito não pode ser analisado judicialmente sem que antes a parte autora oportunize ao INSS a sua apreciação com os documentos necessários.
2.2. Assistência Judiciária Gratuita
A parte autora requereu a concessão da gratuidade de justiça.
Ocorre que, analisando detidamente o feito, em especial o CNIS anexado ao evento 03, verifico que a autora tem como remuneração mensal a quantia de R$ 3.263,14 (três mil duzentos e sessenta e três reais e quatorze centavos).
(...)
Atualmente, o limite máximo dos benefícios do RGPS é de R$ 6.101,06 (seis mil cento e um real e seis centavos).
A remuneração da parte autora é superior ao montante correspondente a R$ 2.440,42 (dois mil quatrocentos e quarenta reais e quarenta e dois centavos) - 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social - , conforme comprovam os documentos juntados ao feito.
Diante disso, tenho por não caracterizada a presunção absoluta de hipossuficiência.
Portanto, não prospera o pedido de AJG.
3. DISPOSITIVO
Ante o exposto, INDEFIRO a petição inicial, com fundamento no artigo 485, I e VI c/c art. 330, III do novo Código de Processo Civil. ambos do Código de Processo Civil, e, em conseqüência, JULGO EXTINTO o processo, sem resolução de mérito, na forma do inciso 485, I e III, do Código de Processo Civil.
Indefiro o pedido de AJG. Anote-se.
Intime-se a parte autora para proceder ao recolhimento das custas processuais.
Sem condenação em honorários, porquanto o INSS não foi citado.
A parte autora recorre (
) pleiteando seja reconhecida a especialidade do período de 01/10/2004 a 26/09/2014, bem como a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, condenando a Autarquia no pagamento das parcelas do benefício desde a data do requerimento inicial, de 13/09/2018, corrigidas, bem como honorários de sucumbência. Requer ainda a concessão do benefício de assistência judiciária gratuita.Oportunizada a apresentação de contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Gratuidade da Justiça
A Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no IRDR 5036075-37.2019.4.04.0000/PR (IRDR 25, data de julgamento: 07/01/2022), firmou entendimento acerca da matéria, proferindo decisão nos seguintes termos:
INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. ACESSO À JUSTIÇA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. DISTINÇÃO. CRITÉRIOS. 1. Conforme a Constituição brasileira, "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos". 2. Assistência jurídica integral configura gênero que abarca diferentes serviços gratuitos, a cargo do poder público, voltados a assegurar a orientação, a defesa e o exercício dos direitos. 3. A consultoria jurídica gratuita é prestada pelas Defensorias Públicas quando do acolhimento dos necessitados, implicando orientação até mesmo para fins extrajudiciais e que nem sempre redunda na sua representação em juízo. 4. A assistência judiciária gratuita é representação em juízo, por advogado não remunerado, realizada pelas defensorias públicas e também advogados conveniados com o Poder Público ou designados pelo juiz pro bono. 5. A gratuidade de justiça assegura a prestação jurisdicional independentemente da realização dos pagamentos normalmente exigidos para a instauração e o processamento de uma ação judicial, envolvendo, essencialmente, custas, despesas com perícias e diligências e honorários sucumbenciais. 6. Nos termos das Leis 9.099/95, 10.259/01 e 12.153/19, o acesso à primeira instância dos Juizados de pequenas causas é gratuito, o que aproveita a todos, indistintamente. 7. O acesso à segunda instância dos juizados, às Varas Federais e aos tribunais é oneroso, de modo que depende de pagamento ou da concessão do benefício da gratuidade de justiça. 8. A Corte Especial, por ampla maioria, definiu que faz jus à gratuidade de justiça o litigante cujo rendimento mensal não ultrapasse o valor do maior benefício do Regime Geral de Previdência Social, sendo suficiente, nessa hipótese, a presunção de veracidade da declaração de insuficiência de recursos, que pode ser afastada pela parte contrária mediante elementos que demonstrem a capacidade econômica do requerente. 9. Rendimentos mensais acima do teto do Regime Geral de Previdência Social não comportam a concessão automática da gratuidade de justiça. A concessão, em tais casos, exige prova a cargo do requerente e só se justifica em face de impedimentos financeiros permanentes. A par disso, o magistrado deve dar preferência ao parcelamento ou à concessão parcial apenas para determinado ato ou mediante redução percentual. (TRF4, INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (CORTE ESPECIAL) Nº 5036075-37.2019.4.04.0000, Corte Especial, Desembargador Federal LEANDRO PAULSEN, POR MAIORIA, JUNTADO AOS AUTOS EM 07/01/2022).
Assim, deve ser reformada a sentença que negou a gratuidade à parte que auferia rendimento inferior ao teto do RGPS (R$ 3.263,14).
Juízo de Admissibilidade
O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.
Do Interesse Processual
O interesse de agir afigura-se como uma das condições da ação e a sua ausência enseja o indeferimento da inicial com a consequente extinção do feito sem resolução do mérito, a teor do que dispõem os arts. 17, 330, III, e 485, VI, todos do Código de Processo Civil.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, em sede de repercussão geral, firmou a seguinte tese quanto ao Tema 350 (prévio requerimento administrativo como condição para o acesso ao Judiciário):
I - A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas;
II – A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado;
III – Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão;
IV – Nas ações ajuizadas antes da conclusão do julgamento do RE 631.240/MG (03/09/2014) que não tenham sido instruídas por prova do prévio requerimento administrativo, nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (a) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (b) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; e (c) as demais ações que não se enquadrem nos itens (a) e (b) serão sobrestadas e baixadas ao juiz de primeiro grau, que deverá intimar o autor a dar entrada no pedido administrativo em até 30 dias, sob pena de extinção do processo por falta de interesse em agir. Comprovada a postulação administrativa, o juiz intimará o INSS para se manifestar acerca do pedido em até 90 dias. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir;
V – Em todos os casos acima – itens (a), (b) e (c) –, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
(RE 631240, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-220 DIVULG 07-11-2014 PUBLIC 10-11-2014) - grifado
Assim, está assentado o entendimento da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, o que não se confunde com o exaurimento daquela esfera.
Exceção à regra os casos de reiterado entendimento contrário da Administração. Entretanto, não conheço nenhuma atividade que, demandada a análise na via administrativa, com a prova hábil para reconhecimento da especialidade apresentada, seja de plano indeferida, sem a competente verificação da prova.
No caso em tela, quando do requerimento administrativo, em 09/10/2018 o processo foi instruído com PPPs, tendo, inclusive sido proferido despacho sobre a atividade especial (
) em que a autarquia solicitou RETIFICAR PPP DA EMPRESA INDUSTRIA E COMERCIO DE VIDROS TEMPERADOS AGUA VERDE LTDA POIS ESTÁ SEM DATA DE EMISSÃO.Nas palavras do recorrente:
por total descuido, apresentou o PPP errado no cumprimento da exigência, resultando a não apreciação do período por parte do perito da Autarquia ao PPP da empresa Indústria e Comércio de Vidros Temperados Água Verde Ltda., pois erroneamente foi juntado novamente o PPP da empresa Santa Catarina Vidros de Segurança Ltda., o qual estava com a data de emissão correta (fls. 49 a 52 do processo administrativo).
Ocorre que o servidor do INSS, deveria ser feito nova exigência para que o Apelante pudesse juntar o PPP correto.
O PPP da empresa empresa Indústria e Comércio de Vidros Temperados Água Verde Ltda, esta nas fls. 10 e 11 do processo administrativo, totalmente preenchido. Falta somente a data da emissão.
Com razão o segurado.
O claro equívoco no atendimento da exigência, por não se tratar de prazo preclusivo, nem haver prejuízo de terceiros, não é causa para o encerramento sumário do procedimento administrativo, providência que vai de encontro à razoabilidade e ao dever de orientação própria da autarquia previdenciária.
Ademais, trata-se de lacuna relativa apenas à data da emissão, estando o documento íntegro em relação aos demais campos.
Assim, reputo presente o interesse de agir, pois o segurado instruiu o pedido administrativo com a documentação de que dispunha. Nesse sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. PEDIDO ADMINISTRATIVO. INTERESSE DE AGIR. 1. Na esteira do precedente do STF no julgamento do RE 631240, não é exigível o exaurimento da via administrativa para que se abra o acesso à via judicial. Necessário, porém, que tenha havido ao menos a formalização da pretensão do segurado ao reconhecimento do tempo especial ou a juntada de documento, ainda que insuficiente, a indicar a eventual nocividade. 2. Caso em que, comprovado o agendamento de cumprimento de exigência feito pelo cidadão, corroborando as alegações de que não foi presencialmente atendido e, não havendo razão para que o segurado não apresentasse documento de que dispunha, pois juntado com a inicial da ação, tem-se por configurado o interesse processual. (TRF4, AG 5046172-28.2021.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 28/01/2022)
Não estando o feito em condições de imediato julgamento, determino o retorno ao primeiro grau para regular instrução.
Conclusão
Reconhecer o interesse de agir e deferir a gratuidade.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para regular processamento do pedido.
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Apelação Cível Nº 5003297-63.2020.4.04.7215/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
APELANTE: LIDINALDO CARDOSO DA SILVA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
previdenciário. PROCESSUAL CIVIL. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. tempo especial. prévio requerimento administrativo. interesse processual. PPP.
1. Sobre a gratuidade judiciária, a orientação jurisprudencial consolidada recentemente, no âmbito deste Tribunal, é no sentido de que faz jus ao benefício o litigante cujo rendimento mensal não ultrapasse o valor do maior benefício do Regime Geral de Previdência Social.
2. O interesse de agir afigura-se como uma das condições da ação e a sua ausência enseja o indeferimento da inicial com a consequente extinção do feito sem resolução do mérito. É indispensável o prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, o que não se confunde com o exaurimento daquela esfera.
3. Hipótese em que houve formalização da pretensão do segurado ao reconhecimento do tempo especial mediante a juntada de documento, ainda que insuficiente, a indicar a eventual nocividade.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para regular processamento do pedido, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 18 de abril de 2023.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 11/04/2023 A 18/04/2023
Apelação Cível Nº 5003297-63.2020.4.04.7215/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PROCURADOR(A): CARMEM ELISA HESSEL
APELANTE: LIDINALDO CARDOSO DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO(A): MARCOS PAULO DE LEMOS (OAB SC017653)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 11/04/2023, às 00:00, a 18/04/2023, às 16:00, na sequência 783, disponibilizada no DE de 28/03/2023.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, PARA ANULAR A SENTENÇA E DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROCESSAMENTO DO PEDIDO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
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