Apelação Cível Nº 5006076-21.2020.4.04.7205/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
APELANTE: EULI MARLENE NECCA STEFFEN (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face de sentença que julgou extinto o feito sem resolução do mérito, em razão da falta de interesse de agir, nos termos do art. 485, VI, do Código de Processo Civil ( ).
A parte autora recorre sustentando, em síntese, que tem interesse de agir, uma vez que comprovou corretamente a não utilização de período constante em CTC emitida no ano de 2011 perante o Apelado, conforme recurso administrativo protocolado em decorrência do indeferimento inicial do benefício. Quanto aos períodos urbanos posteriores à emissão da CTC, alega a desnecessidade de protocolo de novo requerimento administrativo porquanto continua vinculada ao RGPS, não tendo utilizado nenhum período da CTC emitida em regime de previdência diverso, o que demonstra o desejo de se aposentar perante o Apelado/INSS. Aduz, por fim, que a justificativa do juízo a quo no tocante a falta de especificação de quais períodos pretendia indenizar não seria suficiente para extinguir os autos, pois poderia ter intimado a Apelante para tal esclarecimento. Requer o provimento do recurso para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER, ou, subsidiariamente, desde a sua reafirmação (
).Oportunizada a apresentação de contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de Admissibilidade
O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.
Do Interesse Processual
O interesse de agir afigura-se como uma das condições da ação e a sua ausência enseja o indeferimento da inicial com a consequente extinção do feito sem resolução do mérito, a teor do que dispõem os arts. 17, 330, III, e 485, VI, todos do Código de Processo Civil.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, em sede de repercussão geral, firmou a seguinte tese quanto ao Tema 350 (prévio requerimento administrativo como condição para o acesso ao Judiciário):
I - A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas;
II – A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado;
III – Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão;
IV – Nas ações ajuizadas antes da conclusão do julgamento do RE 631.240/MG (03/09/2014) que não tenham sido instruídas por prova do prévio requerimento administrativo, nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (a) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (b) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; e (c) as demais ações que não se enquadrem nos itens (a) e (b) serão sobrestadas e baixadas ao juiz de primeiro grau, que deverá intimar o autor a dar entrada no pedido administrativo em até 30 dias, sob pena de extinção do processo por falta de interesse em agir. Comprovada a postulação administrativa, o juiz intimará o INSS para se manifestar acerca do pedido em até 90 dias. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir;
V – Em todos os casos acima – itens (a), (b) e (c) –, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
(RE 631240, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-220 DIVULG 07-11-2014 PUBLIC 10-11-2014).
Assim, está assentado o entendimento da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, o que não se confunde com o exaurimento daquela esfera.
Exceção à regra os casos de reiterado entendimento contrário da Administração. Entretanto, não conheço nenhuma atividade que, demandada a análise na via administrativa, com a prova hábil para reconhecimento da especialidade apresentada, seja de plano indeferida, sem a competente verificação da prova.
No caso concreto, a parte autora postula a concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o cômputo de períodos de atividade urbana, objeto de certidão de tempo de contribuição que havia sido emitida pelo INSS, para utillização em regime jurídico próprio de previdência.
Contudo, o magistrado sentenciante extiguiu o processo sem exame do mérito, por ausência de interesse de agir, sob os seguintes fundamentos:
Em nenhum momento a parte autora comprovou ter solicitado o cômputo dos períodos de 16.6.2009 a 21.3/2013, 25.2.2013 a 6.8.2015, 1.6.2013 a 30.6.2013, 1.8.2013 a 31.8.2013, 1.9.2015 a 29.2.2016, 1.4.2016 a 28.2.2018, 1.7.2018 a 31.7.2018, 4.2.2019 a 31.7.2019 e 1.8.2019 a 26.10.2019 na via administrativa, tampouco requereu o cancelamento da CTC emitida para aproveitamento em RPPS, sendo certo que a movimentação do Poder Judiciário é de ser reservada aos casos em haja efetiva necessidade de sua intervenção, sob pena de se transmudar - no caso - em mera extensão da autarquia previdenciária.
O art. 452 da IN 77/2015, assim dispõe:
Art. 452. A CTC que não tiver sido utilizada para fins de averbação no RPPS ou, uma vez averbada, o tempo certificado, comprovadamente não tiver sido utilizado para obtenção de aposentadoria ou vantagem no RPPS, será revista, a qualquer tempo, a pedido do interessado, inclusive para incluir novos períodos ou para fracionamento, mediante a apresentação dos seguintes documentos:
I - solicitação do cancelamento da certidão emitida;
II - certidão original; e
III - declaração emitida pelo órgão de lotação do interessado, contendo informações sobre a utilização ou não dos períodos certificados pelo INSS, e para quais fins foram utilizados.
§ 1º Serão consideradas como vantagens no RPPS as verbas de anuênio, quinquênio, abono de permanência em serviço ou outras espécies de remuneração, pagas pelo ente público.
§ 2º Em caso de impossibilidade de devolução pelo órgão de RPPS, caberá ao emissor encaminhar a nova CTC com ofício esclarecedor, cancelando os efeitos da anteriormente emitida.
§ 3º Os períodos de trabalho constantes na CTC, serão analisados de acordo com as regras vigentes na data do pedido, para alteração, manutenção ou exclusão, e consequente cobrança das contribuições devidas, se for o caso.
§ 4º Mesmo que o tempo certificado em CTC emitida pelo RGPS já tenha sido utilizado para fins de vantagens no RPPS, a Certidão poderá ser revista para inclusão de períodos de trabalho posteriores ou anteriores à sua emissão, desde que não alterada a destinação do tempo originariamente certificado.
Conforme se infere, há uma regra para o cancelamento da CTC emitida e não utilizada e ela não foi observado pela parte autora que sequer efetuou o pedido de cancelamento.
Constata-se do processo administrativo que a autora, representada por advogada habilitada, formulou pedido de concessão de aposentadoria e que seja verificado se exitem períodos para recolhimento em atraso suficiente para alcançar os 85 pontos pretendidos com a aposentadoria integral ou necessários para benefício mais vantajoso.
Não houve a juntada da CTC, CTPS ou GPS pagas. Tampouco houve especificação de quais períodos teria trabalhado e não recolhido a contribuição para fins de indenização.
Ou seja, não houve pedido administrativo seja de reconhecimento dos períodos urbanos posteriores à emissão da CTC, seja de cancelamento da CTC, ou ainda a especificação de quais períodos pretende indenizar (ano de 2018 e 1/2019), sendo que em relação ao último pedido ele somente foi formulado por ocasião da réplica, e nada foi referido na petição inicial ou na petição de emenda à inicial.
De fato, a própria autora admite que, em 05/10/2011, requereu ao INSS a emissão de Certidão de Tempo de Contribuição para averbação junto ao Estado do Rio Grande do Sul onde estava laborando, para percepção de benefício futuro. Entretanto, por constatar em momento posterior que cumpriria os requisitos necessários para pleitear o benefício no INSS muito antes do que junto ao Regime Próprio daquele Estado, resolveu por requerer o benefício previdenciário em 01/12/2017, o qual foi indeferido sob a alegação de que não houve comprovação do cancelamento da referida CTC.
No ponto, registro que a exigência de solicitação prévia de cancelamento de CTC anteriormente expedida deve ser cumprida pela parte requerente, com a devolução da certidão original e o adimplemento dos demais requisitos previstos na instrução normativa. Isso porque, uma vez certificados pelo INSS períodos contributivos vinculados ao RGPS, para fins de averbação em regime próprio (RPPS), eles deixam de integrar o RGPS, ainda que não tenham sido efetivamente utilizados no regime próprio, somente voltando a reintegrá-lo mediante a realização do procedimento administrativo de cancelamento da CTC.
Desta forma, inviável o cômputo desde logo dos períodos constantes na CTC referida para fins de benefício previdenciário junto ao RGPS, pois, uma vez que os intervalos nela constantes foram certificados pelo INSS para aproveitamento junto à regime próprio de previdência, não integram mais o RGPS, sendo indispensável o prévio cancelamento da certidão, na forma prevista na IN 77/2015.
Diante do reconhecimento da ausência de interesse de agir pela indispensabilidade do prévio cancelamento administrativo da CTC e, consequentemente, da necessidade de novo requerimento administrativo de aposentadoria, resta prejudicada a análise das questões envolvendo o aproveitamento dos períodos urbanos posteriores e de falta de especificação de quais períodos a parte pretende indenizar.
Por conseguinte, deve ser mantida a sentença.
Honorários Recursais
Desprovido integralmente o recurso da parte autora, tendo em conta o disposto no § 11 do art. 85 do CPC, majoro em 20% a verba honorária a ela atribuída na sentença, mantida a suspensão por conta da justiça gratuita deferida.
Custas processuais
Arcará a parte autora com o pagamento das custas processuais, mantida a suspensão da sua exigibilidade por força do deferimento da gratuidade da justiça.
Prequestionamento
No que concerne ao prequestionamento, tendo sido a matéria analisada, não há qualquer óbice, ao menos por esse ângulo, à interposição de recursos aos tribunais superiores.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da autora.
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Apelação Cível Nº 5006076-21.2020.4.04.7205/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
APELANTE: EULI MARLENE NECCA STEFFEN (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. INTERESSE DE AGIR. ausência. períodos averbados em ctc. aproveitamento junto ao inss. prévio requerimento para cancelamento da ctc. INDISPENSABILIDADE.
1. O interesse de agir afigura-se como uma das condições da ação e a sua ausência enseja o indeferimento da inicial com a consequente extinção do feito sem resolução do mérito, a teor do que dispõem os arts. 17, 330, III, e 485, VI, todos do Código de Processo Civil.
2. Na hipótese, inviável o cômputo desde logo dos períodos constantes na CTC expedida para fins de benefício previdenciário junto ao RGPS, pois, uma vez que os intervalos nela constantes foram certificados pelo INSS para aproveitamento junto à regime próprio de previdência, não integram mais o RGPS, sendo indispensável o prévio cancelamento da certidão, na forma prevista na IN 77/2015.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 28 de junho de 2024.
Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004459661v5 e do código CRC d89c3030.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 21/06/2024 A 28/06/2024
Apelação Cível Nº 5006076-21.2020.4.04.7205/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
APELANTE: EULI MARLENE NECCA STEFFEN (AUTOR)
ADVOGADO(A): CRISTIANO KÖRBES STEFFEN (OAB SC026347)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 21/06/2024, às 00:00, a 28/06/2024, às 16:00, na sequência 757, disponibilizada no DE de 12/06/2024.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA AUTORA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 06/07/2024 04:01:27.