Apelação/Remessa Necessária Nº 5059447-84.2021.4.04.7100/RS
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5059447-84.2021.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (INTERESSADO)
APELADO: CAMILA ANVERSA (IMPETRANTE)
ADVOGADO: RAFAEL MARIATH BASSUINO (OAB RS076305)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
INTERESSADO: GERENTE REGIONAL DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO - UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO - PORTO ALEGRE (IMPETRADO)
RELATÓRIO
Trata-se de mandado de segurança impetrado objetivando o reconhecimento do direito ao recebimento do benefício de seguro-desemprego.
Narrou a parte impetrante ter sido despedida sem justa causa e, na sequência, formulado requerimento administrativo para a liberação do seguro-desemprego, o qual foi indeferido sob o argumento de ser sócia de uma empresa como microempreendora individual, tendo efetuado recolhimentos como contribuinte individual.
A liminar foi deferida (evento 9).
Processado o feito, foi proferida sentença cujo dispositivo tem o seguinte teor:
"Ante o exposto, RATIFICO a decisão liminar e CONCEDO A SEGURANÇA, extinguindo o processo com julgamento de mérito, nos termos art. 487, inciso I, do CPC, para DETERMINAR a imediata liberação das parcelas do seguro-desemprego relativas ao Requerimento nº 7780474471 devidas à impetrante, destacando que as ainda não vencidas deverão ser pagas na medida em que se vencerem, desde que inexista outro óbice à sua concessão que não aquele abordado na presente decisão.
Sem custas, devido à concessão do benefício da gratuidade da justiça à impetrante (Evento 3).
Sem honorários advocatícios, consoante o art. 25 da Lei nº 12.016/2009.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Interposto recurso, a Secretaria deverá abrir prazo para contrarrazões e, após, remeter os autos ao Egrégio TRF da 4º Região.
Não havendo recurso voluntário, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4º Região para reexame necessário, nos moldes do art. 14, inciso I, da Lei nº 12.016/2009."
Irresignada, a União apelou, alegando que, acusada a existência de contribuição previdenciária no CNIS como contribuinte individual, a Administração presume a existência de renda, o que é incompatível com a percepção do seguro-desemprego ensejando a sua suspensão nos termos do artigo 7º, II, da Lei nº 7.998/90. Afirma que nestas hipóteses a presunção que se estabelece é que a parte mantinha atividade autônoma, e consequentemente renda, no período em que verteu contribuições previdenciárias, presunção essa que não foi elidida no presente feito.
O Ministério Público Federal opinou pelo prosseguimento do feito.
É o relatório.
VOTO
Remessa Necessária
Em relação à remessa necessária determina o art. 14, § 1º, da Lei nº 12.016/2009 que a sentença que conceder a segurança estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição.
Mérito
O seguro-desemprego é um benefício garantido constitucionalmente no artigo 7º, inciso II, e tem por finalidade "prover assistência financeira temporária ao trabalhador desempregado em virtude de dispensa sem justa causa, inclusive a indireta, e ao trabalhador comprovadamente resgatado de regime de trabalho forçado ou da condição análoga à de escravo" (art. 2º, I, da Lei n. 7.998/90).
Nos termos do artigo 3º do referido diploma legal, com redação dada pela Lei nº 13.134/2015, terá direito à percepção do seguro-desemprego o trabalhador dispensado sem justa causa que comprove:
I - ter recebido salários de pessoa jurídica ou de pessoa física a ela equiparada, relativos a:
a) pelo menos 12 (doze) meses nos últimos 18 (dezoito) meses imediatamente anteriores à data de dispensa, quando da primeira solicitação;
b) pelo menos 9 (nove) meses nos últimos 12 (doze) meses imediatamente anteriores à data de dispensa, quando da segunda solicitação; e
c) cada um dos 6 (seis) meses imediatamente anteriores à data de dispensa, quando das demais solicitações;
II - Revogado.
III - não estar em gozo de qualquer benefício previdenciário de prestação continuada, previsto no Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, excetuado o auxílio-acidente e o auxílio suplementar previstos na Lei nº 6.367, de 19 de outubro de 1976, bem como o abono de permanência em serviço previsto na Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973;
IV - não estar em gozo do auxílio-desemprego; e
V - não possuir renda própria de qualquer natureza suficiente à sua manutenção e de sua família.
VI - matrícula e frequência, quando aplicável, nos termos do regulamento, em curso de formação inicial e continuada ou de qualificação profissional habilitado pelo Ministério da Educação, nos termos do art. 18 da Lei no 12.513, de 26 de outubro de 2011, ofertado por meio da Bolsa-Formação Trabalhador concedida no âmbito do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), instituído pela Lei no 12.513, de 26 de outubro de 2011, ou de vagas gratuitas na rede de educação profissional e tecnológica. (grifei)
Outrossim, as hipóteses de suspensão e cancelamento do benefício são aquelas previstas nos artigos 7º e 8º da referida lei:
Art. 7º - O pagamento do benefício do seguro-desemprego será suspenso nas seguintes situações:
I - admissão do trabalhador em novo emprego;
II - início de percepção de benefício de prestação continuada da Previdência Social, exceto o auxílio-acidente, o auxílio suplementar e o abono de permanência em serviço;
III - início de percepção de auxílio-desemprego.
IV - recusa injustificada por parte do trabalhador desempregado em participar de ações de recolocação de emprego, conforme regulamentação do Codefat.
Art. 8º - O benefício do seguro-desemprego será cancelado:
I - pela recusa por parte do trabalhador desempregado de outro emprego condizente com sua qualificação registrada ou declarada e com sua remuneração anterior;
II - por comprovação de falsidade na prestação das informações necessárias à habilitação;
III - por comprovação de fraude visando à percepção indevida do benefício do seguro-desemprego; ou
IV - por morte do segurado.
No caso dos autos, a parte impetrante demonstrou a rescisão, sem justa causa, do contrato de trabalho que manteve com a empresa O PÃO DOS POBRES DE SANTO ANTÔNIO, entre 28/05/2013 a 27/01/2021 (
).O pedido de concessão do seguro-desemprego foi indeferido sob o fundamento de a parte impetrante perceber renda própria por efetuar recolhimentos como contribuinte individual, em razão de ser microempreendedora individual - MEI (
).Todavia, a existência de recolhimentos como contribuinte individual não impede, por si só, o recebimento de seguro-desemprego. É que, além de inexistir previsão legal em tal sentido, a existência de contribuição previdenciária como contribuinte individual não significa, necessariamente, percepção de renda própria suficiente à manutenção do trabalhador.
Dessa forma, não há demonstração por parte da União de que a microempresa gerasse renda em favor da parte impetrante ou de qualquer outro elemento capaz de desautorizar o recebimento do seguro-desemprego.
Saliente-se que o requisito previsto no inciso V do art. 3º da Lei n.º 7.998/90 é interpretado pro misero.
Com efeito, o mero recolhimento de contribuição previdenciária ou a manutenção do registro de empresa não estão elencadas nas hipóteses de cancelamento ou suspensão do seguro-desemprego, ou de negativa de sua concessão, de forma que não é possível, a partir desta constatação, se inferir que a parte impetrante percebia renda própria suficiente a sua manutenção e de sua família na data do pedido de seguro-desemprego.
Nesse sentido, os seguintes precedentes desta Corte:
PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO ADMINISTRATIVO. SEGURO-DESEMPREGO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. PARTICIPAÇÃO SOCIETÁRIA. AUSÊNCIA DE RENDA. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E DESPESAS PROCESSUAIS. ARTIGO 82, §2º, E 84 DO CPC/2015. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE DE INDENIZAÇÃO.
1. O Programa de Seguro-Desemprego tem por finalidade prover assistência financeira temporária ao trabalhador desempregado em virtude de dispensa sem justa causa, inclusive a indireta, e ao trabalhador comprovadamente resgatado de regime de trabalho forçado ou da condição análoga à de escravo (art. 2º, I, da Lei n. 7.998/90).
2. A circunstância de existir recolhimento de contribuição previdenciária como contribuinte individual ou como segurado facultativo não justifica o indeferimento/cancelamento ou suspensão do seguro-desemprego, pois não demonstrada a percepção de renda própria suficiente à manutenção do trabalhador. Precedentes.
3. A mera manutenção do registro de empresa não justifica o indeferimento do pedido de benefício de seguro-desemprego, pois tal fato não faz presumir a percepção de renda própria suficiente à manutenção do trabalhador.
4. Quanto à condenação em verba indenizatória, o entendimento de que se trata de despesa indenizatória com previsão de fixação nos artigos 82, §2º, e 84 do CPC/2015 e não propriamente uma condenação em honorários advocatícios não merece prosperar. De fato, enquanto as "despesas processuais" são tratadas pelos artigos 82 a 84 do CPC/2015, os honorários advocatícios são regulados por artigo específico do CPC, qual seja, o artigo 85. Logo, novamente em razão da especificidade do tratamento normativo, os honorários advocatícios não podem ser tratados como "despesa processual", para fins de ressarcimento dos gastos antecipados pela parte vencedora.
(TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5015484-31.2018.4.04.7003, 3ª Turma, Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 23/08/2019)
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SEGURO DESEMPREGO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. PERCEPÇÃO DE RENDA PRÓPRIA. NÃO DEMONSTRAÇÃO.
A circunstância de existir recolhimento de contribuição previdenciária como contribuinte individual, ou a mera manutenção do registro de empresa não justifica indeferimerimento/cancelamento ou suspensão do seguro-desemprego, pois não demonstrada percepção de renda própria suficiente à manutenção do trabalhador. Precedentes.
(TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004028-45.2018.4.04.7016, 4ª Turma, Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE JUNTADO AOS AUTOS EM 28/03/2019)
Portanto, não há motivos para obstar o pagamento do benefício de seguro-desemprego à parte impetrante.
Assim sendo, é de ser mantida a sentença.
Sucumbência
Sem recolhimento de custas pela parte impetrante (AJG) e sem condenação em honorários advocatícios (artigo 25 da Lei nº 12.016/2009).
Conclusão
Resta mantida a sentença.
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e à remessa necessária, nos termos da fundamentação supra.
Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003220402v2 e do código CRC a4d14c40.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5059447-84.2021.4.04.7100/RS
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5059447-84.2021.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (INTERESSADO)
APELADO: CAMILA ANVERSA (IMPETRANTE)
ADVOGADO: RAFAEL MARIATH BASSUINO (OAB RS076305)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
INTERESSADO: GERENTE REGIONAL DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO - UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO - PORTO ALEGRE (IMPETRADO)
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO ADMINISTRATIVO. SEGURO-DESEMPREGO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
1. O Programa de Seguro-Desemprego tem por finalidade prover assistência financeira temporária ao trabalhador desempregado em virtude de dispensa sem justa causa, inclusive a indireta, e ao trabalhador comprovadamente resgatado de regime de trabalho forçado ou da condição análoga à de escravo (art. 2º, I, da Lei n. 7.998/90).
2. A circunstância de existir recolhimento de contribuição previdenciária como contribuinte individual ou como segurado facultativo não justifica o indeferimento/cancelamento ou suspensão do seguro-desemprego, pois não demonstrada a percepção de renda própria suficiente à manutenção do trabalhador. Precedentes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa necessária, nos termos da fundamentação supra, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de junho de 2022.
Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003220403v3 e do código CRC 3c5966ca.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 30/05/2022 A 07/06/2022
Apelação/Remessa Necessária Nº 5059447-84.2021.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
PROCURADOR(A): ADRIANA ZAWADA MELO
APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (INTERESSADO)
APELADO: CAMILA ANVERSA (IMPETRANTE)
ADVOGADO: RAFAEL MARIATH BASSUINO (OAB RS076305)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 30/05/2022, às 00:00, a 07/06/2022, às 14:00, na sequência 434, disponibilizada no DE de 19/05/2022.
Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA NECESSÁRIA, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO SUPRA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO
Secretário
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