APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000942-35.2014.4.04.7201/SC
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | ACACILDO MENDES |
ADVOGADO | : | LEONARDO POLETTO |
: | GEORGE ALEXANDRE ROHRBACHER | |
APELANTE | : | DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL: recurso autônomo e recurso adesivo: PRECLUSÃO CONSUMATIVA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ATO OMISSIVO: FAUTE DE SERVICE PUBLIque. TEORIA SUBJETIVA: NECESSIDADE DE PROVA DA CULPA. FALTA DE SINALIZAÇÃO ADEQUADA: BURACO NA PISTA. omissão estatal, DANO E NEXO DE CAUSALIDADE: DEVER DE INDENIZAR. DANO MORAL. LUCROS CESSANTES. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA: DIFERIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Consoante firme orientação do STJ, em virtude da preclusão consumativa, não é cabível a interposição de recurso adesivo quando a parte já tenha manifestado recurso autônomo.
2. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos respondem objetivamente por danos que seus agentes causarem a terceiros, sendo suficiente para o reconhecimento do dever de indenizar a ocorrência de um dano, a autoria e o nexo causal (art. 37, § 6º, CF). Todavia, em se tratando de ato omissivo, exige-se a prova da culpa (negligência, imprudência ou imperícia), ou seja, aplica-se a teoria da responsabilidade subjetiva.
3. A faute de service publique (culpa do serviço) ocorre quando este não funcionou nas hipóteses que deveria, funcionou mal ou funcionou com atraso. A doutrina e a jurisprudência têm destacado que esta modalidade de responsabilidade civil é de caráter subjetivo, de modo que se torna necessária a existência de culpa por parte da administração.
4. A responsabilização do Estado, seja por atos comissivos, seja por atos omissivos, não dispensa a verificação do nexo de causalidade, que deve ser comprovado (ônus da parte autora), existindo, ademais, situações que excluem esse nexo: caso fortuito ou força maior, ou culpa exclusiva da vítima ou de terceiro (ônus das pessoas jurídicas de direito público e das de direito privado prestadoras de serviços públicos).
5. Mantida a sentença pelos seus próprios fundamentos, considerada a ocorrência de ato omissivo - a falta de sinalização adequada em relação a buraco na pista - gerador dos danos narrados na inicial.
6. O dano moral, à luz da Constituição de 1988, se configura a partir de uma agressão à dignidade humana, não bastando qualquer contrariedade à sua configuração.
7. Para a configuração do dano moral - em seus aspectos preventivo e pedagógico -, faz-se necessária, previamente, a demonstração dos respectivos pressupostos.
8. Configurados os pressupostos, a fixação do dano moral deve observar os princípios de moderação e de razoabilidade, assegurando à parte lesada a justa reparação, sem incorrer em enriquecimento ilícito e não deixando de observar o caráter pedagógico ao agente que cometeu o ato lesivo. Mantido o quantum fixado na sentença.
9. Não é incompatível o recebimento de benefício previdenciário, no caso auxílio-doença pelo acidente, com a fixação de pensão de natureza civil. Precedentes do TRF4.
10. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei nº 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
11. Adequada a verba honorária. Considerado o disposto nos arts. 85, § 3°, c/c 86, caput, do CPC/2015, a respectiva verba honorária deve ser fixada na forma do inciso I do art. 85, na medida em que a condenação, no caso, não atinge valor superior a 200 (duzentos) salários-mínimos. Elevada a verba a 10% sobre o valor da condenação a cada uma das partes, vedada a compensação (§ 14 do art. 85 do CPC/2015). Em face da sucumbência recursal - § 11 do art. 85 do novo CPC - , atribuído o acréscimo de mais 3% sobre o valor da condenação aos honorários do patrono do autor.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer do recurso adesivo e dar parcial provimento aos recursos de apelação interpostos pelas partes, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de agosto de 2017.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9093150v9 e, se solicitado, do código CRC 38E9C928. | |
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| Signatário (a): | Rogerio Favreto |
| Data e Hora: | 01/09/2017 19:35 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000942-35.2014.4.04.7201/SC
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | ACACILDO MENDES |
ADVOGADO | : | LEONARDO POLETTO |
: | GEORGE ALEXANDRE ROHRBACHER | |
APELANTE | : | DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
ACACILDO MENDES ajuizou ação de indenização contra o DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT, objetivando a condenação do réu a pagar-lhe; a) indenização mensal vitalícia de R$ 1.522,30, inclusive com 13.º salário; (b) indenização por danos morais no valor de R$ 100.000,00; (c) indenização por danos estéticos no valor de R$ 20.000,00; (d) custear eventual procedimento cirúrgico a ser realizado no autor; e (e) sucessivamente, se não constatada invalidez permanente do autor, a pagar indenização "condizente com o grau de redução da capacidade laborativa". Narrou que, em 23/07/2013, conduzia sua motocicleta Honda CG de placa MCP 9494 na BR-280, entre São Francisco do Sul e Joinville, quando, no trevo de acesso ao Município de Araquari, sofreu um acidente ao cair em um grande buraco existente na pista, no ponto onde ela cruzava com a ferrovia; aduz que, no momento do acidente, estava conduzindo o veículo seguindo todas as normas de trânsito aplicáveis, sendo o único causador do acidente o "imenso buraco (...) existente próximo ao trilho do trem"; em razão do acidente, refere que sofreu "graves lesões corporais", passando por cirurgia e intenso tratamento, alegando que, mesmo com os cuidados médicos, teria ficado com debilidade permanente no membro inferior esquerdo que o impossibilitou de exercer sua profissão habitual, sofrendo diariamente com fortes dores; diz que exercia exclusivamente a profissão de soldador na empresa Metalúrgica e Calderaria Pinheiro Ltda. e recebia R$ 1.522,30 à época do acidente; estaria gozando de auxílio-doença.
Sentenciando, o juízo a quo julgou a ação parcialmente procedente, in verbis (Evento 236):
a) julgo parcialmente procedente o pedido para condenar o DNIT a pagar ao autor a quantia de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) a título de indenização pelos danos morais que lhe foram causados. O valor da condenação deverá ser corrigido monetariamente e acrescido de juros entre o mês desta sentença e o do pagamento. A correção monetária deverá ser o IPCA-e e os juros o índice equivalente à diferença, quando positiva, entre a taxa aplicada para correção de tributos federais (atualmente, a Selic) e o índice de correção retro (CC, art. 406);
b) julgo parcialmente procedente o pedido para condenar o DNIT a pagar ao autor, mensalmente, a quantia de R$ 536,58 (quinhentos e trinta e seis reais e cinquenta e oito centavos), mais uma parcela anual referente à 13.º (décimo terceiro) salário, a título de indenização mensal vitalícia limitada à pessoa do autor e que cessará quando de sua morte, em razão da redução de sua capacidade laboral. Esse valor deverá ser atualizado anualmente pelo INPC. Os valores serão devidos desde a data do evento danoso e deverão ser atualizado pelo INPC desde a data a que se referem até a data do pagamento. Sobre o valor da condenação incidirão, ainda, juros de mora a partir da citação até a data de início da execução equivalentes à diferença, se positiva, entre a taxa do SELIC (CC, art. 406) e o índice de correção monetária acima referido; e
c) julgo improcedentes os demais pedidos de pagamento de indenização a título de danos estéticos e de que réu custeie os procedimentos médicos futuros necessários ao restabelecimento da saúde do autor.
Interpostos embargos de declaração, o juízo a quo acolheu o recurso para, in verbis (Evento 243):
a) em razão da sucumbência recíproca, condenar as partes a pagarem uma ao patrono da outra, metade (cinquenta por cento) do valor dos honorários advocatícios que fixo no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos dos artigos 85, § 3.º, inciso I, e 86, caput, do CPC. Neste caso, o valor da condenação comportará o valor do dano moral acrescido do valor da indenização mensal vitalícia, esta última composta pelo valor de todas as prestações vencidas até o proferimento da sentença (quarenta e três) somado ao valor de doze prestações vincendas (CPC, art. 85, § 9.º), totalizando 55 (cinquenta e cinco) parcelas;
b) determinar a suspensão da exigibilidade do pagamento dos honorários sucumbenciais devidos pela parte autora, na forma do CPC, art. 98, § 3.º.
Inconformadas, as partes apelaram.
Defende o autor, em síntese, que deve ser reformada a sentença no tocante aos honorários advocatícios, devendo ser observado o percentual mínimo de dez e máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico, na forma do art. 85, § 3°, I, do CPC/2015.
Refere, no tocante à reciprocidade da sucumbência, que os principais pleitos da parte foram julgados procedentes (dano moral e indenização pela incapacidade laboral), tendo decaído apenas quanto ao dano estético, bem como quanto ao pagamento das despesas médicas e hospitalares. Nesse contexto, pede a fixação de honorários em valor superior ao fixado na sentença ao procurador federal. Postula a fixação de honorários em 15% sobre o valor da condenação, pugnando ao final, ainda, pela sua majoração em face da sucumbência recursal.
Defende o DNIT, em síntese, que, diante do "exame detalhado da prova documental e oral produzida neste processo torna indubitável que a parte autora não foi capaz de se desincumbir do ônus de demonstrar o local exato do acidente, e, com isso, de comprovar o nexo de causalidade entre a alegada falha no pavimento e o infortúnio experimentado."
Ou seja, sustenta a não-comprovação do nexo causal entre o alegado defeito de manutenção da rodovia e o evento.
Mantida a sentença, insurge-se quanto à condenação à pensão vitalícia (lucros cessantes), na medida em que, em razão do acidente, não houve comprovação da redução de patrimônio; refere, ademais, que o autor obteve do INSS concessão de benefício de auxílio-doença no período, em valor superior (R$ 1.584,00) à renda declarada na inicial.
Ainda subsidiariamente, pede que seja reduzida a indenização por danos morais a R$ 10.000,00.
Quanto aos consectários, pede a incidência da Lei n° 11.960/09 em relação à correção monetária e juros de mora.
Com contrarrazões, a parte autora, ainda, interpôs recurso adesivo, o qual igualmente recebera contrarrazões, tendo os autos vindo ao Tribunal em 04/07/2017.
É o relatório.
VOTO
DA ORDEM CRONOLÓGICA DOS PROCESSOS
O presente feito está sendo levado a julgamento em consonância com a norma do art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que assim dispõe: os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão.
Nessa ordem de julgamento, também são contempladas as situações em que estejam litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei nº 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei nº 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei nº 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
DO RECURSO ADESIVO E DA PRECLUSÃO CONSUMATIVA
No caso, não obstante a interposição do recurso de apelação (Evento 248), a parte autora, no prazo ao oferecimento de contrarrazões ao recurso do DNIT, protocolou recurso adesivo (Evento 258).
Consoante situações análogas já decididas, venho manifestando-me no sentido de que, entendendo a parte pela existência de eventuais incorreções ou incongruências do julgado, deve alegá-las, todas, na apelação, porquanto uma vez exercido o direito de impugnação, a parte fica impedida de fazê-lo novamente contra a mesma decisão em razão da preclusão consumativa.
O Colendo STJ tem precedentes no sentido de que, em virtude da preclusão consumativa, não é cabível a interposição de recurso adesivo quando a parte já tenha manifestado recurso autônomo, in verbis (grifei):
I. RECURSO ESPECIAL ADESIVO DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. APRESENTAÇÃO DE RECURSO ESPECIAL (AUTÔNOMO) E RECURSO ESPECIAL ADESIVO. PRECLUSÃO CONSUMATIVA.
1. O Município do Rio de Janeiro apresentou recurso especial em face do acórdão recorrido, cujo processamento foi indeferido pela decisão de fl. 754, "em razão de intempestividade". Posteriormente, em face do mesmo acórdão, o Município do Rio de Janeiro apresentou recurso especial adesivo.
2. A orientação desta Corte é firme no sentido de que, em virtude da preclusão consumativa, não é cabível a interposição de recurso adesivo quando a parte já tenha manifestado recurso autônomo, ainda que este não seja conhecido.
3. Recurso especial adesivo não conhecido, acompanhando o Ministro Relator, mas por fundamentos diversos.
(...)
(REsp 1197761/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, Rel. p/ acórdão Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, 2ª Turma, julgado em 20/03/2012, DJe 27/06/2012)
PROCESSUAL CIVIL - RECURSO ADESIVO - ADITAMENTO DA APELAÇÃO INTERPOSTA - INADMISSIBILIDADE.
Tendo em vista o propósito do recurso adesivo e o princípio da consumação, a parte que, no prazo legal, apresentou recurso autônomo não pode recorrer adesivamente.
Recurso não conhecido.
(REsp 179.586/RS, Rel. Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, 2ª Turma, julgado em 16/11/2000, DJ 18/12/2000, p. 175)
É oportuno considerar, ademais, que, em face do disposto no art. 223 do CPC/2015 - "Decorrido o prazo, extingue-se o direito de praticar ou de emendar o ato processual, independentemente de declaração judicial, ficando assegurado, porém, à parte provar que não o realizou por justa causa." - possa haver interpretação no sentido de que a preclusão consumativa fora abolida - ou atenuada - no novo CPC.
Contudo, Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero doutrinam no sentido de que:
"Uma vez praticado o ato, consome-se a possibilidade de emendá-lo dentro do prazo legal eventualmente ainda disponível. A alusão à possibilidade de emendar o ato processual dentro do prazo legal constante do art. 223, CPC, deve ser entendida como possibilidade de praticar-se novo ato processual por força de viabilização de nova oportunidade para tanto por força do dever de prevenção do juiz na condução do processo - daí falar-se em emenda do ato, cujo exemplo clássico é o da emenda à petição inicial. Vale dizer: o art. 223 não aboliu a preclusão consumativa para as partes."
(Novo Código de Processo Civil Comentado. 2ª ed. São Paulo, RT. 2016. p. 326)
A preclusão é o impedimento da prática de ato processual depois do momento adequado. A lei processual disciplina que cada ato deve ser praticado no momento adequado.
E o objetivo em destaque decorrente da garantia de que cada ato seja praticado em determinado momento não se direciona, apenas, à duração razoável do processo, mas também em virtude da efetividade do processo e da boa-fé.
Nesse sentido, a doutrina de Fredie Didier Jr:
"A preclusão não serve somente à ordem, à segurança e à duração razoável do processo. Não se resume à condição de mera mola impulsionadora do processo. A preclusão tem, igualmente, fundamentos éticos-políticos, na medida em que busca preservar a boa-fé e a lealdade no itinerário processual. A preclusão é técnica, pois, a serviço do direito fundamental à segurança jurídica, do direito à efetividade (como impulsionadora do processo) e da proteção à boa-fé. É importante essa observação: como técnica, a preclusão deve ser pensada e aplicada em função dos valores a que busca proteger."
(Curso de Direito Civil. Vol. 01. 17ª ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2015. p. 417).
Concluindo, infiro que o recurso adesivo interposto pela parte autora (Evento 258), tendo a parte já manejado recurso de apelação contra o mesmo decisum, não merece conhecimento.
MÉRITO
Destaco que a controvérsia no plano recursal restringe-se:
- à análise quanto à responsabilidade civil do DNIT em face do acidente de trânsito narrado na inicial (dano moral e lucros cessantes);
- subsidiariamente, pela a minoração do quantum a título de danos morais;
- aos consectários legais, notadamente em relação à correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios.
DA RESPONSABILIDADE SUBJETIVA POR ATO OMISSIVO DO ENTE PÚBLICO - faute de service publique
Inicialmente, oportuno esclarecer que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos respondem objetivamente por danos que seus agentes causarem a terceiros, sendo suficiente para o reconhecimento do dever de indenizar a ocorrência de um dano, a autoria e o nexo causal (art. 37, § 6º, CF).
Todavia, em se tratando de ato omissivo, como no caso, exige-se a prova da culpa (negligência, imprudência ou imperícia), ou seja, aplica-se a teoria da responsabilidade subjetiva.
A faute de service publique (culpa do serviço) ocorre quando este não funcionou nas hipóteses que deveria, funcionou mal ou funcionou com atraso. A doutrina e a jurisprudência têm destacado que esta modalidade de responsabilidade civil é de caráter subjetivo, de modo que se torna necessária a existência de culpa por parte da administração.
Nesse sentido, acórdão do Colendo Supremo Tribunal Federal, in verbis:
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ATO OMISSIVO DO PODER PÚBLICO: DETENTO FERIDO POR OUTRO DETENTO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: CULPA PUBLICIZADA: FALTA DO SERVIÇO. C.F., art. 37, § 6º.
I. - Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por esse ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, em sentido estrito, esta numa de suas três vertentes -- a negligência, a imperícia ou a imprudência -- não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço.
II. - A falta do serviço -- faute du service dos franceses -- não dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro.
III. - Detento ferido por outro detento: responsabilidade civil do Estado: ocorrência da falta do serviço, com a culpa genérica do serviço público, por isso que o Estado deve zelar pela integridade física do preso.
IV. - RE conhecido e provido.
(STF, RE 382.054/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 01/10/2004, p. 37).
A responsabilização das pessoas jurídicas de direito público e das de direito privado prestadoras de serviços públicos, seja por atos comissivos, seja por atos omissivos, não dispensa a verificação do nexo de causalidade, que deve ser comprovado (ônus da parte autora), existindo, ademais, situações que excluem esse nexo: caso fortuito ou força maior, ou culpa exclusiva da vítima ou de terceiro (ônus da parte ré). A concorrência de culpa (responsabilidade subjetiva) ou a concorrência de causas (responsabilidade objetiva), ônus das pessoas jurídicas de direito público e das de direito privado prestadoras de serviços públicos, tem o condão de abrandar a responsabilidade.
DA ANÁLISE DA RESPONSABILIDADE CIVIL NO CASO CONCRETO (ocorrência de ato omissivo culposo, dano e nexo causal; da condenação por danos morais)
Consoante se discute - e aqui a controvérsia principal pela qual se decidirá, ou não, pelo dever de indenizar, consideradas evidentemente os argumentos e provas de ambas as partes - o acidente em questão teria ocorrido pelo fato de que não havia sinalização acerca de buraco existente na pista (tese sustentada pela parte autora na inicial e acolhida pelo juízo a quo).
Por sua vez, o réu sustenta que a parte autora não foi capaz de se desincumbir do ônus de demonstrar o local exato do acidente e, com isso, de comprovar o nexo de causalidade entre a alegada falha no pavimento e o infortúnio experimentado. Ou seja, sustenta a não-comprovação do nexo causal entre o alegado defeito de manutenção da rodovia e o evento.
Evidentemente, que a análise do caso concreto depende, necessariamente, da apreciação da prova produzida pelas partes, atento, aqui, ao disposto no art. 373 do CPC/2015 (ônus da prova incumbe: ao autor quanto ao fato constitutivo de seu direito; aos réus quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor).
- da alegada omissão (rodovia apresentava buraco), do dano e do respectivo nexo causal:
Tendo em vista as considerações iniciais e analisada a prova produzida nos autos, infiro que deve ser mantida a sentença pelos seus próprios fundamentos em relação à ocorrência de ato omissivo gerador do dano narrado na inicial, in verbis:
Do ponto de vista fático, foi demonstrado que, em 23/07/2013, entre 05h30min e 6h00min, a motocicleta Honda CG de placa MCP 9494, conduzida pelo autor, chocou-se com um buraco existente na pista de rolamento da BR-280, Km 23, no trevo de acesso ao município de Araquari, no ponto onde ela cruzava com a ferrovia e, em razão disso, o autor caiu do veículo e sofreu fratura de colo do fêmur à esquerda, CID 10 - S72.0 (1:5, pág. 5, 1:6 e 1:8, pág. 8) e fratura de vértebra lombar, CID 10 - S32.0 (1:11, pág. 1). A prova da ocorrência deste fato são as fotos que instruíram a inicial (1:12-17) e que não foram objeto de impugnação pelo réu em sua contestação, além da prova documental acima referida e da prova testemunhal produzida. Com efeito, Cláudio Renato de Lima Penha, ex-comandante Operacional do Corpo de Bombeiros Voluntários de Araquari, e Adriano Luís da Conceição, motorista socorrista do SAMU, confirmaram que o acidente ocorreu com o autor naquele local, bem como que a motocicleta e o autor estavam poucos distantes da ferrovia, o que demonstra que o autor não conduzia o veículo em alta velocidade.
Adentrando ao campo jurídico, cabe referir que compete ao DNIT a atribuição de manutenção e de conservação das rodovias federais, nos termos da Lei n.º 10.233/2003:
Art. 82. São atribuições do DNIT, em sua esfera de atuação: (...)
IV - administrar, diretamente ou por meio de convênios de delegação ou cooperação, os programas de operação, manutenção, conservação, restauração e reposição de rodovias, ferrovias, vias navegáveis, eclusas ou outros dispositivos de transposição hidroviária de níveis, em hidrovias situadas em corpos de água de domínio da União, e instalações portuárias públicas de pequeno porte; (...)
Como não houve demonstração da existência de excesso de velocidade do veículo, de embriaguez do autor durante sua condução ou de qualquer outra conduta temerária (imprudência, negligência ou imperícia) capaz de induzir um juízo de culpa concorrente ou exclusiva da vítima, a causa do acidente somente pode ser considerada como sendo decorrência do buraco existente na pista. Ademais, uma vez constatada a existência do buraco na pista, deveriam ter sido adotadas providências para sinalizar adequadamente a rodovia, de modo a prevenir a ocorrência de acidentes. Dessa forma, encontram-se presentes a omissão estatal, consubstanciada na negligência da autarquia ao não promover o bom estado de conservação e funcionamento da rodovia, o dano, o nexo de causalidade e a ausência de causas excludentes da responsabilidade estatal.
Outrossim, não merece guarida o argumento do réu de que não haveria prova cabal do acidente por conta da ausência de boletim de ocorrência lavrado pela autoridade competente (Polícia Rodoviária Federal). Isso porque não há a necessidade de efetivação de tal conduta com o fím precípuo de fazer prova do sinistro. A ocorrência do acidente pode ser comprovada por outros meios, como a produção de fotografias, tal como se sucedeu. Ademais, André Luiz Ortega, Policial Rodoviário Federal, afirmou ser comum, em acidentes envolvendo motocicletas ou bicicletas, que o próprio condutor ou algum parente retire o veículo do local do acidente sem comunicar à Polícia Rodoviária Federal. Afirmou que também já aconteceu de o SAMU ou o Corpo de Bombeiros não avisar a Polícia Rodoviária Federal e que mais ou menos 1% dos acidentes com vítima não são notificados, como parece ter ocorrido no caso dos autos.
Efetivamente, restou suficientemente comprovado que o evento danoso ocorrera em virtude de buraco existente na pista, evidenciando, pois, o dever de indenizar do DNIT.
Consoante os fundamentos da sentença, os quais adoto e aqui reforço, não assiste razão ao réu quando afirma que não comprovado o local do evento diante da ausência de boletim de ocorrência lavrado pela PRF.
O fato em si pode ser comprovado por outros meios, como aliás é exemplo o caso dos autos. Nesse sentido, os depoimentos de Cláudio Renato de Lima Penha, ex-comandante Operacional do Corpo de Bombeiros Voluntários de Araquari, e Adriano Luís da Conceição, motorista socorrista do SAMU, confirmaram que o acidente ocorreu com o autor na BR-280.
Note-se, ademais, que André Luiz Ortega, Policial Rodoviário Federal, afirmou ser comum, em acidentes envolvendo motocicletas ou bicicletas, que o próprio condutor ou algum parente retire o veículo do local do acidente sem comunicar à Polícia Rodoviária Federal.
Portanto, comprovada a omissão estatal, o dano e do respectivo nexo causal, é devido o dever de indenizar!
- da indenização por danos morais:
Em relação ao dano moral, infiro que, à luz da Constituição de 1988, tal se configura a partir de uma agressão à dignidade humana, não bastando qualquer contrariedade à sua configuração.
Deve ser reputado como dano moral a dor, o vexame, o sofrimento, a humilhação, situações que, fugindo da normalidade do cotidiano, interfiram intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar, consoante doutrina de Sérgio Cavalieri Filho (Programa de Responsabilidade Civil. 3ª edição, revista, aumentada e atualizada, Malheiros Editores, 2002, p. 88/89).
Mero dissabor, consoante o referido doutrinador, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, na medida em que, além de fazerem parte da normalidade do dia-a-dia, no trabalho, no trânsito etc., tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo.
Para a configuração do dano moral - em seus aspectos preventivo epedagógico -, faz-se necessária, previamente, a demonstração dos respectivos pressupostos.
Por outro lado, nos casos configurados como in re ipsa, a configuração do abalo psicológico sofrido pela vítima - o dano -, não se faz necessário, uma vez que a ocorrência do próprio fato já configura o dano moral presumido.
Configurados os pressupostos, a fixação do dano moral deve observar os princípios de moderação e de razoabilidade, assegurando à parte lesada a justa reparação, sem incorrer em enriquecimento ilícito e não deixando de observar o caráter pedagógico ao agente que cometeu o ato lesivo.
Com essas considerações e analisada a prova produzida nos autos, infiro que deve ser mantida a sentença pelos seus próprios fundamentos, in verbis:
Em relação ao dano moral, reconheço que ele advém do próprio acidente e de suas consequências, pois são notórios a angústia e o sofrimento físico e psíquico que o acidente veio a causar no autor. Em depoimento, o autor afirmou que já passou por duas intervenções cirúrgicas no âmbito do SUS, uma ocorrida cinco dias após o acidente e outra realizada no dia 10/06/2016, esta última em decorrência de soltura de material de síntese, tendo a fratura inicial evoluído para um quadro de osteomielite crônica, CID 10 - M86.6, e pseudoartrose (falta de consolidação de fratura), conforme constou do laudo pericial (65:1, resposta ao quesito 5 do autor e resposta ao quesito complementar 'a' do DNIT; 49:1, resposta ao quesito 'b' do DNIT e resposta ao quesito 'c' do juízo). Não bastasse isso, o autor ainda terá que se submeter a pelo menos mais dois procedimentos, um debridamento cirúrgico para tratamento da infecção instalada e uma artroplastia total do quadril esquerdo para inserção de prótese. Impende asseverar, ainda, que após a efetivação desse tratamento que durará em média de seis a oito meses, levará, ainda, em média um ano para que o autor possa retornar a suas atividades laborais, mesmo assim com restrições permanentes para qualquer atividade que exija ortostase - posição anatômica padrão -, prolongada ou grandes deslocamentos (49:1, resposta ao quesito 'd' do juízo). Em suma, o autor provavelmente terá dificuldades de exercer qualquer atividade laboral na qual tenha que permanecer em pé, em posição ereta. Embora a incapacidade seja temporária, já que o quadro é passível de melhora mediante sujeição ao tratamento cirúrgico anteriormente descrito, é provável que autor conviva para sempre com certa limitação em seu membro inferior esquerdo (49:2, resposta ao quesito 'h' do DNIT). Isso tudo evidencia um abalo emocional e dor física e psíquica incomum a um homem médio a justificar a indenização pelo dano.
Assim, o conjunto fático revela que o acidente causou sofrimento à vítima (autor) a ponto de ensejar a reparação por danos morais.
No que se refere à quantificação dos danos morais, destaque-se que a lei não fixa parâmetros exatos para a valoração do quantum indenizatório, razão pela qual o juízo deve se valer do seu "prudente arbítrio", guiado pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, em análise caso a caso. O artigo 944 do Código Civil alude à extensão do dano e à proporcionalidade entre a gravidade da culpa e o dano para definir como seria uma condenação adequada, senão vejamos:
Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.
Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização.
É sabido que nessa hipótese a indenização deve representar uma compensação ao lesado, diante da impossibilidade de recomposição exata da situação na qual se encontrava anteriormente, alcançando-lhe ao menos uma forma de ver diminuídas suas aflições. Outrossim, deve-se buscar o equilíbrio entre a prevenção de novas práticas lesivas à moral e as condições econômicas dos envolvidos.
Em razão das peculiaridades do caso e, ainda, atendendo a critérios de moderação e prudência para que a repercussão econômica da indenização repare o dano sem representar enriquecimento sem causa ao lesado, assinalo que a indenização respectiva fixada pelo juízo a quo em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), é razoável, adequada e atende aos propósitos do instituto do dano moral.
Concluindo o tópico, pois, nego provimento ao recurso do DNIT.
DOS DANOS MATERIAIS - LUCROS CESSANTES (pensionamento):
Em relação aos lucros cessantes (pensionamento), o DNIT defende que, em razão do acidente, não houve comprovação da redução de patrimônio; refere, ademais, que o autor obteve do INSS concessão de benefício de auxílio-doença no período, em valor superior (R$ 1.584,00) à renda declarada na inicial.
Não assiste razão ao DNIT.
9. Nesse sentido: TRF4, Apelação/Remessa Necessária n° 5001277-66.2014.4.04.7100/RS, 4a Turma, Relator LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE, unânime, julgado em julgado 01/06/2016; TRF4, Apelação/Remessa Necessária nº 5009778-03.2014.404.7102, 3ª TURMA, Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, unânime, julgado em 06/06/2017).
No mais, mantenho a sentença pelos próprios fundamentos, in verbis:
Tal como já referido anteriormente, a incapacidade do autor para o trabalho é temporária, já que existe grande probabilidade de se restabelecer e voltar a exercer sua profissão habitual desde que seja adotado o tratamento recomendado (49:2, resposta ao quesito 'h' do DNIT; 65:2, respostas aos quesitos 15 e 19 do autor). O perito deixou claro que é possível e provável que o autor retorne ao exercício de suas atividades laborais habituais. O autor não poderá desenvolver atividades que impliquem grande esforço físico, praticar atividades esportivas, como corrida, ou movimentos de repetição de quadril. No momento, o autor se encontra inapto para o exercício de sua profissão habitual, mas no futuro é provável que a possa desenvolver, talvez com uma certa limitação ou queda de rendimento. De qualquer sorte, o autor poderá trabalhar, seja como soldador ou na prática de qualquer outro ofício, motivo pelo qual o valor da indenização mensal deve ser fixado como base num percentual estimado do tamanho da redução da capacidade laboral. Em um contexto tal, considero como mais adequada a fixação da indenização mensal no percentual de 30% (trinta por cento) do salário recebido pelo autor à época do acidente, ou seja, R$ 536,58 (1:3, pág. 11, item 17).
Concluindo, nego provimento à apelação no ponto.
CONSECTÁRIOS E PROVIMENTOS FINAIS
Juros Moratórios e Correção Monetária
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei nº 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016).
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei nº 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei nº 11.960/2009, devendo ser parcialmente provido o recurso da União no ponto.
Honorários advocatícios
O atual CPC inovou de forma significativa com relação aos honorários advocatícios, buscando valorizar a atuação profissional dos advogados, especialmente pela caracterização como verba de natureza alimentar (§ 14, art. 85, CPC) e do caráter remuneratório aos profissionais da advocacia.
Cabe ainda destacar, que o atual diploma processual estabeleceu critérios objetivos para fixar a verba honorária nas causas em que a Fazenda Pública for parte, conforme se extrai da leitura do § 3º, incisos I a V, do art. 85. Referidos critérios buscam valorizar a advocacia, evitando o arbitramento de honorários em percentual ou valor aviltante que, ao final, poderia acarretar verdadeiro desrespeito à profissão. Ao mesmo tempo, objetiva desestimular os recursos protelatórios pela incidência de majoração da verba em cada instância recursal.
No caso dos autos, em razão da sucumbência recíproca, o juízo a quo condenou as partes a pagarem uma ao patrono da outra, metade (cinquenta por cento) do valor dos honorários advocatícios, fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
Atento, inicialmente, às regras dos arts. 85, § 3°, c/c 86, caput, do CPC/2015, a respectiva verba honorária deve ser fixada na forma do inciso I do art. 85, na medida em que a condenação, no caso, não atinge valor superior a 200 (duzentos) salários-mínimos, razão pela qual elevo os honorários a 10% sobre o valor da condenação a cada uma das partes, vedada a compensação (§ 14 do art. 85 do CPC/2015). Suspensa a exigibilidade, em relação à parte autora, por gozar do benefício da gratuidade da justiça, na forma do art. 98, § 3°, do CPC/2015.
Ademais, em face da sucumbência recursal - § 11 do art. 85 do novo CPC - , atribuo o acréscimo de mais 3% sobre o valor da condenação aos honorários do patrono do autor.
Caso o valor da condenação a ser apurada em liquidação do julgado venha a superar a faixa correspondente ao percentual definido pelo art. 85, § 3º, do novo CPC, o excedente deverá observar a faixa subsequente, na forma do § 5° do referido dispositivo. O percentual definitivo a incidir sobre o eventual excedente deverá observar aquele correspondente à majoração ora determinada.
Dou parcial provimento à apelação da parte autora, pois.
CONCLUSÃO
Parcialmente provido o recurso do DNIT para diferir para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei nº 11.960/2009, forma da fundamentação supra.
Provido parcialmente o recurso da parte autora para adequar a verba honorária a 10% sobre o valor da condenação a cada uma das partes. Majorados, em face da sucumbência recursal, em 3% sobre o valor da condenação aos honorários do patrono do autor.
DISPOSITIVO
ANTE O EXPOSTO, voto por não conhecer do recurso adesivo e dar parcial provimento aos recursos de apelação interpostos pelas partes.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/08/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000942-35.2014.4.04.7201/SC
ORIGEM: SC 50009423520144047201
RELATOR | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr. Juarez Mercante |
APELANTE | : | ACACILDO MENDES |
ADVOGADO | : | LEONARDO POLETTO |
: | GEORGE ALEXANDRE ROHRBACHER | |
APELANTE | : | DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/08/2017, na seqüência 165, disponibilizada no DE de 01/08/2017, da qual foi intimado(a) o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DO RECURSO ADESIVO E DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS RECURSOS DE APELAÇÃO INTERPOSTOS PELAS PARTES.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA | |
: | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
Luiz Felipe Oliveira dos Santos
Secretário de Turma
| Documento eletrônico assinado por Luiz Felipe Oliveira dos Santos, Secretário de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9153586v1 e, se solicitado, do código CRC 88D74C5F. | |
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