Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PROVA DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. DESCONSIDERAÇÃO DO LAUDO JUDICIAL. UTILIZAÇÃO DE PROVA EMPRESTADA. APOSENTADORI...

Data da publicação: 07/07/2020, 19:04:11

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PROVA DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. DESCONSIDERAÇÃO DO LAUDO JUDICIAL. UTILIZAÇÃO DE PROVA EMPRESTADA. APOSENTADORIA ESPECIAL. MOTORISTA DE ÔNIBUS. EXPOSIÇÃO A RUÍDO E A VIBRAÇÕES. 1. O princípio do livre convencimento motivado permite que o juiz forme a sua convicção com amparo em outros elementos ou fatos provados nos autos, caso entenda que a perícia judicial mostre-se infundada, incoerente ou insuficiente ou não reflete as condições de trabalho da época em que a atividade foi exercida. 2. Admite-se a utilização, como prova emprestada, de laudos técnicos produzidos em outras ações judiciais, que analisaram o mesmo local de trabalho ou outro estabelecimento com estrutura e condições de trabalho semelhantes àquele em que a atividade foi exercida, em momento mais próximo à data da prestação dos serviços. 3. O uso de prova emprestada não apenas observa o princípio da economia processual, mas também possibilita que os princípios do contraditório e da ampla defesa possam também ser exercidos no processo para o qual a prova foi trasladada. 4. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 5. Os laudos elaborados em outras ações judiciais constataram nível médio de ruído superior a 90 decibéis, no período de 06-03-1997 a 18-11-2003, no cargo de motorista de ônibus, o qual foi exercido na mesma empresa em que a parte autora trabalhou. 6. O art. 283 da Instrução Normativa INSS/PRES nº 77/2015 estabelece que a exposição ocupacional a vibrações localizadas ou de corpo inteiro enseja a concessão de aposentadoria especial, quando forem ultrapassados os limites de tolerância definidos nas normas indicadas no ato regulamentar. 7. A perícia judicial concluiu que os níveis de vibração que atingem os membros superiores (vibração localizada) e que são transmitidas ao corpo como um todo, enquanto o profissional ocupa a posição sentada (vibrações de corpo inteiro), no cargo de motorista de ônibus, ficaram acima do limite permitido. 8. Os requisitos para a concessão do benefício de aposentadoria especial foram preenchidos. (TRF4, AC 5001796-73.2012.4.04.7112, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 16/04/2019)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001796-73.2012.4.04.7112/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: CERLAR DE CARVALHO (AUTOR)

ADVOGADO: ALEXANDRA LONGONI PFEIL

ADVOGADO: JULIA CAROLINA LONGHI KOSCIUK

ADVOGADO: ANILDO IVO DA SILVA

ADVOGADO: Mariana de Medeiros Flores Nunes

ADVOGADO: ELISANGELA LEITE AGUIAR

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

A sentença proferida na ação ajuizada por Cerlar de Carvalho contra o INSS, publicada em 16 de agosto de 2017, julgou parcialmente procedentes os pedidos, para condenar o réu a reconhecer e averbar o exercício de atividade em condições especiais nos períodos de 22-07-1985 a 13-03-1987, de 16-03-1987 a 21-07-1989, de 29-04-1995 a 05-03-1997 e de 19-11-2003 a 09-02-2011, com a possibilidade de converter o tempo especial em comum.

A parte autora interpôs apelação, a fim de obter o reconhecimento da especialidade nos períodos de 06-03-1997 a 10-07-1998, de 06-08-1998 a 31-01-2000 e de 07-02-2000 a 18-11-2003, em que trabalhou como cobrador e motorista de ônibus na empresa SOGAL - Sociedade de Ônibus Gaúcha Ltda. Alegou que os documentos fornecidos pela empresa omitiram a condição penosa e periculosa da atividade e a exposição ao agente nocivo vibração, além de informarem ruído inferior à efetiva intensidade. Requereu a utilização de prova por similitude, apresentando laudos técnicos judiciais que avaliaram o ruído em nível superior a 90 decibéis, na função de motorista e de cobrador de ônibus. Salientou que a perícia técnica realizada nesta ação judicial considerou a atividade como penosa, assim como outros laudos judiciais juntados aos autos. Sustentou a possibilidade de reconhecer o exercício de atividade especial, embora a penosidade não conste no regulamento, com base na Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos e na jurisprudência deste Tribunal Regional Federal. Discordou da condenação em honorários advocatícios, uma vez que decaiu em parte mínima dos pedidos. Por fim, postulou a juntada de documentos novos, com amparo em decisões do Superior Tribunal de Justiça.

O INSS não apresentou contrarrazões.

Após a remessa dos autos a este Tribunal, o autor apresentou petição requerendo a postergação da data de entrada do requerimento (DER), para que seja implementado o tempo suficiente para a aposentadoria especial, em razão de ter continuado trabalhando na empresa SOGAL. Juntou a carteira de trabalho e o PPP atualizado (evento 18).

O INSS não se manifestou sobre o pedido do autor.

VOTO

Juntada de documentos na fase recursal

O art. 435 do CPC, que reproduz a redação do art. 397 do antigo CPC, admite a juntada de documentos novos, quando destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados ou para contrapô-los aos que foram produzidos nos autos. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que a interpretação do referido dispositivo não deve ser feita restritivamente, a fim de possibilitar a juntada de documentos na fase recursal, contanto que seja observado o contraditório, conforme o acórdão a seguir reproduzido:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. JUNTADA DE DOCUMENTO NA FASE RECURSAL. POSSIBILIDADE. PRECLUSÃO. INOCORRÊNCIA. INTIMAÇÃO DA APELADA. INOVAÇÃO DE JULGAMENTO. AGRAVO IMPROVIDO. 1. "A juntada de documentos com a apelação é possível, desde que respeitado o contraditório e inocorrente a má-fé, com fulcro no art. 397 do CPC." (REsp nº 980.191/MS, Relatora Ministra Nancy Andrighi, in DJe 10/3/2008). 2. Reconhecido no acórdão estadual que os documentos juntados na fase recursal apenas corroboravam as alegações das partes e todo o conjunto probatório já encartado aos autos, constituindo-se o próprio fundamento da ação, não há falar em preclusão, a consequencializar eventual violação dos artigos 473 e 517 do Código de Processo Civil. 3. Em sede de agravo regimental não se conhece de alegações estranhas às razões do agravo de instrumento, por vedada a inovação de fundamento. 4. Agravo regimental improvido (STF - AgRg no REsp 1120022 /SP, Primeira Turma, Ministro Relator HAMILTON CARVALHIDO, D. E 02.06.2010)

Portanto, é possível valorar os documentos juntados à apelação (evento 179) e à petição do autor (evento 18), inclusive porque o réu, devidamente intimado, não apresentou qualquer impugnação.

Tempo de atividade especial

O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente na época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, havendo a prestação laboral sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem do tempo de serviço especial na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial. Nesse sentido, a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24-09-2008) e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (EINF 2005.71.00.031824-5/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. 18-11-2009).

A evolução legislativa da matéria apresenta os seguintes marcos temporais:

a) até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei nº 3.807/1960 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/1991 (Lei de Benefícios da Previdência Social), em sua redação original (artigos 57 e 58), a especialidade do tempo de serviço decorria do exercício de atividade profissional prevista como especial nos Decretos nº 53.831/1964 e nº 83.080/1979 e/ou na legislação especial. As normas regulamentares classificavam as atividades de duas formas: segundo os grupos profissionais, presumindo-se a sujeição do trabalhador a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física; e segundo os agentes nocivos, caso em que deve ser demonstrada a exposição ao agente por qualquer meio de prova. Para os agentes nocivos ruído e calor, é necessário mensurar os seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar o grau de nocividade dos agentes envolvidos;

b) entre 29 de abril de 1995 a 05 de março de 1997, período em que estavam vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032/1995 no artigo 57 da LBPS, torna-se necessária a demonstração efetiva da exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima. Foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei nº 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13 de outubro de 1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória nº 1.523/1996, que a revogou expressamente;

c) a partir de 06 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da LBPS pela Medida Provisória nº 1.523/1996 (convertida na Lei nº 9.528/1997), passou a ser exigida, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico de condições ambientais do trabalho, ou por meio de perícia técnica.

A redação original do parágrafo 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213/1991, que previa o cômputo do tempo comum para a concessão de aposentadoria especial, foi revogada pela Lei nº 9.032, de 28 de abril de 1995. A partir da vigência da alteração legal, passou a ser exigido o exercício de todo o tempo de serviço em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. Assim, havendo a implementação dos requisitos para a aposentadoria especial após a Lei nº 9.032/1995, não se admite a conversão do tempo comum para especial.

Segundo o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso especial repetitivo, a conversão do tempo de serviço comum em especial deve observar a disciplina legal em vigor quando se aperfeiçoaram os requisitos para a concessão do benefício. O que se incorpora ao patrimônio jurídico do trabalhador é a prestação de trabalho em condições especiais, a qual é regida pela legislação vigente na época do exercício da atividade. Dessa forma, é possível a contagem do tempo especial independente da data da prestação do trabalho ou do requerimento de benefício, porém o tempo comum pode ser computado para a concessão de aposentadoria especial apenas se a lei admitir a conversão na época em que o segurado reuniu as condições necessárias para o deferimento do benefício. Eis a tese firmada:

Tema nº 546: A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço (REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/10/2012, DJe 19/12/2012).

Para que se caracterize a habitualidade e a permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, § 3º, da Lei n° 8.213/91), a exposição ao agente nocivo deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24-10-2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07-11-2011). Em suma, somente se a exposição ao agente nocivo for eventual ou ocasional, está afastada a especialidade do tempo de serviço.

Além disso, conforme o tipo de atividade, a exposição ao agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade. Não é razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18-05-2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. 08-01-2010).

Em relação ao agente nocivo ruído, consideram-se os níveis de pressão sonora estabelecidos na legislação em vigor na data da prestação do trabalho, conforme o quadro a seguir:

Período TrabalhadoEnquadramentoLimites de Tolerância
Até 05/03/19971. Decreto n.º 53.831/1964; 2. Decreto n.º 83.080/1979.1. Superior a 80 dB; 2. Superior a 90 dB.
De 06/03/1997 a 06/05/1999Decreto n.º 2.172/1997.Superior a 90 dB.
De 07/05/1999 a 18/11/2003Decreto n.º 3.048/1999, na redação original.Superior a 90 dB.
A partir de 19/11/2003Decreto n.º 3.048/1999 com a alteração introduzida pelo Decreto n.º 4.882/2003.Superior a 85 dB.

Cabe esclarecer que os Decretos nº 53.831/1964 e 83.080/1979 tiveram vigência concomitante até a edição do Decreto nº 2.172/1997, que revogou de forma expressa o fundamento de validade da legislação então vigente.

O Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o limite de tolerância ao agente físico ruído para 85 decibéis, não pode ser aplicado retroativamente. Dessa forma, entre 06 de março de 1997 e 18 de novembro de 2003, o limite de tolerância ao ruído corresponde a 90 decibéis, consoante o código 2.0.1 do Anexo IV dos Decretos n° 2.172/1997 e 3.048/1999. O Superior Tribunal de Justiça examinou a matéria em recurso especial repetitivo e fixou a seguinte tese:

Tema nº 694: O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). (REsp 1.398.260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014)

A respeito da utilização de equipamento de proteção individual (EPI), a partir da Lei nº 9.732/1998, que modificou a redação dos parágrafos 1º e 2º do art. 58 da Lei nº 8.213/1991, a legislação previdenciária estabelece que a existência de tecnologia de proteção individual eficaz, que comprovadamente neutralize os agentes nocivos ou diminua a sua intensidade a limites de tolerância, afasta o efetivo prejuízo à saúde ou integridade física do trabalhador, razão pela qual a atividade não pode ser qualificada como especial.

O Supremo Tribunal Federal, em julgado com repercussão geral, firmou entendimento no sentido de que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não há direito à aposentadoria especial. Contudo, havendo demonstração de que o uso do EPI, no caso concreto, não é suficiente para afastar a nocividade, deve ser reconhecida a especialidade do trabalho. Em relação ao ruído, o STF considerou que a exposição a níveis superiores aos limites de tolerância causa prejuízos ao organismo humano que vão além dos relacionados à perda das funções auditivas. Assim, a utilização do EPI não garante a eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído, pois existem fatores de difícil ou impossível controle que influenciam a sua efetividade. Esta é a redação da tese firmada:

Tema nº 555: I - O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial; II - Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria. (ARE 664335, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-029 DIVULG 11-02-2015 PUBLIC 12-02-2015)

Caso concreto

A matéria a ser apreciada refere-se somente ao reconhecimento da especialidade nos períodos impugnados na apelação, visto que a sentença não está sujeita ao reexame necessário.

O autor trabalhou na empresa Sociedade de Ônibus Gaúcha Ltda. - SOGAL, no cargo de cobrador, entre 05-08-1989 a 10-07-1998, e no cargo de motorista, entre 06-08-1998 a 31-01-2000 e 07-02-2000 a 09-02-2011.

O INSS enquadrou o intervalo de 05-08-1989 a 28-04-1995 como especial, com base no código 2.4.4 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.831/1964 (transporte rodoviário - motoristas e cobradores de ônibus).

Já a sentença entendeu que se caracterizou a especialidade apenas nos períodos de 29-04-1995 a 05-03-1997 e de 19-11-2003 a 09-02-2011, valendo-se da perícia técnica realizada nos autos que avaliou o trabalho do autor na empresa SOGAL e constatou o nível de ruído de 85.3 dB(9A) na função de motorista de ônibus (evento 101). Uma vez que o limite de tolerância entre 06-03-1997 a 18-11-2003 era de 90 decibéis, não foi reconhecido o exercício de atividade especial nos períodos de 06-03-1997 a 10-07-1998, de 06-08-1998 a 31-01-2000 e de 07-02-2000 a 18-11-2003.

Conquanto o magistrado sentenciante tenha admitido a força probante da perícia judicial, há um aspecto concernente à valoração da prova a ser ponderado. O perito, ao responder o quesito 6 do INSS, assinalou que os modelos de ônibus atuais são menos ruidosos do que os utilizados na época em que o autor trabalhou na empresa. Os laudos periciais que acompanharam a inicial já haviam evidenciado essa circunstância, conforme o seguinte trecho do laudo elaborado em 21 de setembro de 2010, nos autos da ação previdenciária nº 2009.71.62.004776-4/RS, que verificou a exposição a agentes nocivos na função de motorista de ônibus, também na empresa SOGAL (evento 1, procadm9, p. 12):

O Autor exerceu a serviço da empresa periciada, sua ex-empregadora, as atividades de motorista de ônibus, a bordo de veículos da mesma, em horários variáveis, em função da escala de serviço, em linhas regulares, intermunicipais, entre as cidades de Canoas, Esteio, Sapucaia do Sul, Cachoeirinha e Porto Alegre,

O trajeto mais realizado era o de ida e volta, de Canoas a Porto Alegre, sendo cada trecho percorrido em aproximadamente duas horas.

Aquela época, entre os anos de 1999 a 2003, antes da implantação no País do Programa de Modernização e Reaparelhamento do Transporte Coletivo de Passageiros, financiado pelo BNDES, a outrora empregadora do Autor, tinha uma frota de ônibus velhos, com motor dianteiro e com câmbio mecânico, onde ruídos no posto de comando, por estar localizado ao lado do grupo motriz, eram exagerados.

O art. 436 do antigo CPC, em vigor na data da realização da prova, acolhe o princípio do livre convencimento motivado, permitindo que o juiz forme a sua convicção com amparo em outros elementos ou fatos provados nos autos, caso entenda que a perícia judicial mostra-se infundada, incoerente ou insuficiente ou, como no caso dos autos, não reflete as condições de trabalho na época da prestação do serviços.

Não há óbice ao aproveitamento de laudos técnicos embasados em inspeção atual, pois a evolução tecnológica, ao reduzir a intensidade dos agentes nocivos, torna inconcebível a suposição de que as circunstâncias laborais e ambientais de outrora fossem melhores do que as existentes na atualidade. Contudo, o juiz pode levar em conta laudos técnicos mais próximos das reais condições de trabalho da época, se as partes trouxeram aos autos esses subsídios probatórios.

Nesse caso, admite-se a utilização, como prova emprestada, dos laudos técnicos produzidos em outras ações judiciais, que analisaram o mesmo local de trabalho ou outro estabelecimento com estrutura e condições de trabalho semelhantes àquele em que a atividade foi exercida. Além disso, a quantificação do nível de ruído nos laudos similares ocorreu em momento mais próximo à data da prestação dos serviços do que o laudo elaborado nestes autos. Note-se que o uso de prova emprestada não apenas observa o princípio da economia processual, mas também possibilita que os princípios do contraditório e da ampla defesa possam também ser exercidos no processo para o qual a prova foi trasladada. Neste sentido, já decidiu este Tribunal:

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. LABORATORISTA, TÉCNICO QUÍMICO, QUIMICO E ANALISTA DE LABORATÓRIO. CATEGORIA PROFISSIONAL. AGENTES QUÍMICOS. EPIs. APOSENTADORIA ESPECIAL. AFASTAMENTO DA ATIVIDADE PROFISSIONAL. REAFIRMAÇÃO DA DER. TERMO INICIAL. AFASTAMENTO COMPULSÓRIO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Demonstrada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida 2. É admissível, assegurado o contraditório, prova emprestada de processo do qual não participaram as partes do processo para o qual a prova será trasladada. A grande valia da prova emprestada reside na economia processual que proporciona, tendo em vista que se evita a repetição desnecessária da produção de prova de idêntico conteúdo. Igualmente, a economia processual decorrente da utilização da prova emprestada importa em incremento de eficiência, na medida em que garante a obtenção do mesmo resultado útil, em menor período de tempo, em consonância com a garantia constitucional da duração razoável do processo, inserida na CF pela EC 45/2004. (...) (TRF4 5002141-84.2013.4.04.7215, SEXTA TURMA, Relator EZIO TEIXEIRA, juntado aos autos em 11/07/2017)

Os laudos judiciais acostados à inicial, elaborados em setembro de 2009 e dezembro de 2010, inspecionaram as condições laborais do cargo de motorista de ônibus na empresa SOGAL, apurando média do nível de ruído de 90,2 db(A) e 91,25 dB(A), em veículo com motor dianteiro (evento 1, procadm9, p. 11-28). Há outros laudos judiciais que também apontam a exposição a nível de ruído superior a 90dB(A) no período de 06-03-1997 a 18-11-2003, no cargo de motorista de ônibus nas empresas SOGAL, TRANSCAL e VICASA (evento 28, laudo2, laudo5, laudo7 e laudo10).

Por outro lado, além do agente físico ruído, o motorista de ônibus também fica exposto ao risco proveniente das vibrações mecânicas. O art. 283 da Instrução Normativa INSS/PRES nº 77/2015 regula a matéria, estabelecendo que, entre 06-03-1997 a 12-08-2014, a exposição ocupacional a vibrações localizadas ou de corpo inteiro dará ensejo à aposentadoria especial, quando forem ultrapassados os limites de tolerância definidos pela Organização Internacional para Normalização - ISO, em suas Normas ISO nº 2.631 e ISO/DIS nº 5.349, respeitando-se as metodologias e os procedimentos de avaliação que elas autorizam.

A perícia juntada à inicial avaliou o risco da exposição ocupacional às vibrações localizadas, que atingem os membros superiores do motorista de ônibus, em várias situações (asfalto, calçamento e chão batido), concluindo que os níveis de vibração para mãos e braços ficaram acima do limite permitido, em conformidade com a Norma ISO 5.349-1 (evento 1, procadm10, p. 1-30). Já o laudo técnico realizado em outra ação judicial averiguou as vibrações de corpo inteiro, que são transmitidas ao corpo do motorista como um todo, enquanto ocupa a sua posição de trabalho (sentado), também concluindo que a vibração ultrapassou o limite de exposição, de acordo com a norma ISO 2.631-1:1997 (evento 18 do TRF4, laudo7).

A jurisprudência deste Tribunal reconhece o exercício de atividade especial com base na exposição a vibrações, conforme o acórdão citado a seguir:

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. CONVERSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. REVISÃO. 1. Até 28/04/1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, aceitando-se qualquer meio de prova (exceto para ruído); a partir de 29/04/1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, devendo existir comprovação da sujeição a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05/03/1997 e, a partir de então, por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 2. Havendo a comprovação de que o trabalho foi exercido em condições agressivas à saúde, deverá ser considerado especial, ainda que a atividade não esteja arrolada nos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, cujos rol de agentes nocivos é meramente exemplificativo. Hipótese na qual tem incidência a Súmula nº 198 do TFR. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 3. O laudo pericial por similaridade indica que o segurado desempenhou a função de motorista de ônibus e estava exposto, de modo habitual e permanente, aos riscos físicos próprios da profissão, tais como: vibrações, risco de acidentes de trânsito, tudo permitindo concluir que exercia atividade penosa, autorizando o reconhecimento de tempo de serviço especial. 4. Comprovado o exercício de atividade especial por mais de 25 anos, a parte autora faz jus à conversão da aposentadoria por tempo de contribuição que titula em aposentadoria especial, desde a data do requerimento administrativo, descontados os valores percebidos a título de ATC e observada a prescrição quinquenal. (TRF4, AC 5018163-48.2016.4.04.7205, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 05/02/2019)

Em relação aos riscos a que o autor estava exposto na função de cobrador de ônibus, deve ser aproveitado, pelas mesmas razões já expendidas, o laudo judicial que examinou as condições de trabalho na empresa VICASA e constatou o nível de pressão sonora média de 91,25 dB(A) em ônibus fabricado em 1999, equipado com motor dianteiro Mercedes Benz OF-1721 (evento 1, procadm9, p. 29-34). Igualmente devem ser considerados os laudos realizados em outras empresas de transporte coletivo, que avaliaram o ruído e verificaram nível superior ao permitido pela legislação entre 06-03-1997 e 18-11-2003 (evento 28, laudo7 e laudo8).

Assim, deve ser reconhecido o exercício de atividade especial nos períodos de 06-03-1997 a 10-07-1998, de 06-08-1998 a 31-01-2000 e de 07-02-2000 a 18-11-2003, em razão do enquadramento nos códigos 2.0.1 e 2.0.2 do Anexo IV dos Decretos n° 2.172/1997 e 3.048/1999.

Requisitos para a aposentadoria especial

O INSS, na data do requerimento administrativo (09-02-2011), contou a carência de 308 meses.

Os períodos de atividade especial reconhecidos na sentença (22-07-1985 a 13-03-1987, 16-03-1987 a 21-07-1989, 29-04-1995 a 05-03-1997 e 19-11-2003 a 09-02-2011), somado ao tempo especial já considerado pelo INSS (05-08-1989 a 28-04-1995), resultam em 18 anos, 9 meses e 20 dias.

Já o tempo de atividade especial reconhecido neste voto corresponde a 1 ano, 4 meses e 5 dias (06-03-1997 a 10-07-1998), 1 ano, 5 meses e 26 dias (06-08-1998 a 31-01-2000) e 3 anos, 9 meses e 12 dias (07-02-2000 a 18-11-2003).

Considerando que a soma do tempo de serviço especial resulta em 25 anos, 4 meses e 18 dias, o autor preencheu os requisitos para a concessão de aposentadoria especial desde a data do requerimento administrativo (09-02-2011).

Correção monetária

A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.

Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.

O art. 491 do Código de Processo Civil, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.

E, no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE 870.947, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 20/09/2017), fixando as seguintes teses sobre a questão da correção monetária e dos juros moratórios nas condenações impostas à Fazenda Pública:

1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º,caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e

2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina.

Recentemente, todavia, o Ministro Luiz Fux proferiu decisão no RE 870.947, deferindo excepcionalmente efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos pelos entes federativos estaduais, a fim de obstar a imediata aplicação do acórdão.

O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, discutiu a aplicabilidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, em relação às condenações impostas à Fazenda Pública, em julgamento submetido à sistemática de recursos repetitivos (REsp 1.495.146/MG, REsp 1.492.221/PR, REsp 1.495.144/RS - Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, j. em 22/02/2018). Quanto aos índices de correção monetária e juros de mora aplicáveis às ações previdenciárias, a tese firmada no Tema nº 905 foi redigida nos seguintes termos:

3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária.

As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).

Porém, no juízo de admissibilidade do recurso extraordinário interposto contra o acórdão proferido no REsp n.º 1.492.221/PR (Tema 905 do STJ), a Ministra Maria Thereza de Assis Moura igualmente atribuiu efeito suspensivo à decisão que é objeto do recurso.

Portanto, não há ainda definição do índice de atualização monetária aplicável aos débitos de natureza previdenciária.

Em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os artigos 4º, 6º e 8º, todos do CPC, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelos tribunais superiores, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.

A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelas Cortes Superiores a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.

Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a definição do índice de atualização monetária aplicável, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009.

Juros de mora

Os juros de mora, no percentual de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29 de junho de 2009. A partir de 30 de junho de 2009, os juros moratórios serão computados de forma equivalente aos aplicáveis à caderneta de poupança, conforme dispõe o art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.

Implantação imediata do benefício

Assim dispõe o art. 497 do CPC: "Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente".

A respeito da matéria, a Terceira Seção deste Tribunal pacificou o entendimento neste sentido:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. ART. 461 do CPC. TUTELA ESPECÍFICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. EFICÁCIA PREPONDERANTEMENTE MANDAMENTAL DO PROVIMENTO. CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO. POSSIBILIDADE. REQUERIMENTO DO SEGURADO. DESNECESSIDADE. 1. Atento à necessidade de aparelhar o processo de mecanismos preordenados à obtenção do resultado prático equivalente à situação jurídica que se verificaria caso o direito material tivesse sido observado espontaneamente pelo "devedor" através da realização da conduta imposta pelo direito material, o legislador, que já havia, na época da edição do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) instituído a tutela específica do direito do "credor" de exigir o cumprimento dos deveres de fazer ou não fazer decorrentes de relação de consumo, inseriu no ordenamento processual positivo, por meio da alteração no art. 461 do Código de Processo Civil operada pela Lei 8.952/94, a tutela específica para o cumprimento dos deveres de fazer ou não fazer decorrentes das relações do direito material que não as de consumo. 2. A adoção da tutela específica pela reforma processual de 1994 do CPC veio para suprir, em parte, a morosidade judicial, na proporção em que busca dar ao cidadão aquilo e somente aquilo que lhe é devido, tirando o direito do plano genérico-abstrato da norma, conferindo-lhe efeitos concretos, com o fito de lhe garantir a mesma conseqüência do que aquela que seria obtida pelo adimplemento voluntário. 3. A sentença que concede um benefício previdenciário (ou assistencial), em regra, compõe-se de uma condenação a implantar o referido benefício e de outra ao pagamento das parcelas atrasadas. No tocante à determinação de implantação do benefício (para o futuro, portanto), a sentença é condenatória mandamental e será efetiva mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). 4. A respeito do momento a partir do qual se poderá tornar efetiva a sentença, na parte referente à implantação futura do benefício, a natureza preponderantemente mandamental da decisão não implica automaticamente o seu cumprimento imediato, pois há de se ter por referência o sistema processual do Código, não a Lei do Mandado de Segurança, eis que a apelação de sentença concessiva do benefício previdenciário será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo, nos termos do art. 520, caput, primeira parte, do CPC, motivo pelo qual a ausência de previsão de efeito suspensivo ex lege da apelação, em casos tais, traz por conseqüência a impossibilidade, de regra, do cumprimento imediato da sentença. 5. Situação diversa ocorre, entretanto, em segundo grau, visto que o acórdão que concede o benefício previdenciário, que esteja sujeito apenas a recurso especial e/ou recurso extraordinário, enseja o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, ante a ausência, via de regra, de efeito suspensivo daqueles recursos, de acordo com o art. 542, § 2º, do CPC. Tal cumprimento não fica sujeito, pois, ao trânsito em julgado do acórdão, requisito imprescindível apenas para a execução da obrigação de pagar (os valores retroativamente devidos) e, consequentemente, para a expedição de precatório e de requisição de pequeno valor, nos termos dos parágrafos 1º, 1º-A e 3º do art. 100 da Constituição Federal. 6. O cumprimento imediato da tutela específica, diversamente do que ocorre no tocante à antecipação de tutela prevista no art. 273 do CPC, independe de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário, pois aquele é inerente ao pedido de que o réu seja condenado a conceder o benefício previdenciário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC. Em suma, a determinação da implantação imediata do benefício contida no acórdão consubstancia, tal como no mandado de segurança, uma ordem (à autarquia previdenciária) e decorre do pedido de tutela específica (ou seja, o de concessão do benefício) contido na petição inicial da ação. 7. Questão de ordem solvida para que, no tocante à obrigação de implantar (para o futuro) o benefício previdenciário, seja determinado o cumprimento imediato do acórdão sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, independentemente de trânsito em julgado e de pedido específico da parte autora. (TRF4, AC 2002.71.00.050349-7, 3ª Seção, relator para acórdão Des. Federal Celso Kipper, D.E. 01/10/2007)

Dessa forma, considerando as disposições do art. 497 do CPC e a ausência de recurso com efeito suspensivo por força da lei, determina-se a implantação imediata do benefício no prazo de até trinta dias úteis. Incumbe ao representante judicial do INSS que for intimado desta decisão dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.

Honorários advocatícios

A vitória integral da parte autora impõe a condenação do INSS ao pagamento dos ônus sucumbenciais.

Incumbe ao réu, por conseguinte, o pagamento de honorários advocatícios ao procurador da parte autora. Tendo em vista as disposições dos parágrafos 2º e 3º do art. 85 do CPC (aplicável à hipótese, já que a sentença recorrida foi publicada sob a sua vigência), arbitra-se a verba honorária em 15% sobre as parcelas vencidas até a data do julgamento da apelação (Súmula nº 111 do STJ; Súmula nº 76 desta Corte). Registre-se que esse percentual já engloba os honorários relativos à esfera recursal, consoante dispõe o art. 85, §11, do CPC.

Conclusão

Dou provimento à apelação do autor, para condenar o INSS a: a) reconhecer o tempo de serviço especial nos períodos de 06-03-1997 a 10-07-1998, de 06-08-1998 a 31-01-2000 e de 07-02-2000 a 18-11-2003; b) conceder o benefício de aposentadoria especial, a partir da data do requerimento administrativo (09-02-2011); c) pagar as parcelas vencidas com correção monetária e juros de mora e os honorários advocatícios, na forma da fundamentação.

De ofício, determino a implantação imediata da aposentadoria.

Em face do que foi dito, voto no sentido de dar provimento à apelação do autor e determinar, de ofício, a implantação da aposentadoria.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000971104v85 e do código CRC 92a6a3b4.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 16/4/2019, às 16:30:13


5001796-73.2012.4.04.7112
40000971104.V85


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 16:04:11.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001796-73.2012.4.04.7112/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: CERLAR DE CARVALHO (AUTOR)

ADVOGADO: ALEXANDRA LONGONI PFEIL

ADVOGADO: JULIA CAROLINA LONGHI KOSCIUK

ADVOGADO: ANILDO IVO DA SILVA

ADVOGADO: Mariana de Medeiros Flores Nunes

ADVOGADO: ELISANGELA LEITE AGUIAR

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PROVA DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. DESCONSIDERAÇÃO DO LAUDO JUDICIAL. UTILIZAÇÃO DE PROVA EMPRESTADA. APOSENTADORIA ESPECIAL. MOTORISTA DE ÔNIBUS. EXPOSIÇÃO A RUÍDO E A VIBRAÇÕES.

1. O princípio do livre convencimento motivado permite que o juiz forme a sua convicção com amparo em outros elementos ou fatos provados nos autos, caso entenda que a perícia judicial mostre-se infundada, incoerente ou insuficiente ou não reflete as condições de trabalho da época em que a atividade foi exercida.

2. Admite-se a utilização, como prova emprestada, de laudos técnicos produzidos em outras ações judiciais, que analisaram o mesmo local de trabalho ou outro estabelecimento com estrutura e condições de trabalho semelhantes àquele em que a atividade foi exercida, em momento mais próximo à data da prestação dos serviços.

3. O uso de prova emprestada não apenas observa o princípio da economia processual, mas também possibilita que os princípios do contraditório e da ampla defesa possam também ser exercidos no processo para o qual a prova foi trasladada.

4. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.

5. Os laudos elaborados em outras ações judiciais constataram nível médio de ruído superior a 90 decibéis, no período de 06-03-1997 a 18-11-2003, no cargo de motorista de ônibus, o qual foi exercido na mesma empresa em que a parte autora trabalhou.

6. O art. 283 da Instrução Normativa INSS/PRES nº 77/2015 estabelece que a exposição ocupacional a vibrações localizadas ou de corpo inteiro enseja a concessão de aposentadoria especial, quando forem ultrapassados os limites de tolerância definidos nas normas indicadas no ato regulamentar.

7. A perícia judicial concluiu que os níveis de vibração que atingem os membros superiores (vibração localizada) e que são transmitidas ao corpo como um todo, enquanto o profissional ocupa a posição sentada (vibrações de corpo inteiro), no cargo de motorista de ônibus, ficaram acima do limite permitido.

8. Os requisitos para a concessão do benefício de aposentadoria especial foram preenchidos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, com ressalva da juíza federal Gisele Lemke, dar provimento à apelação do autor e determinar, de ofício, a implantação da aposentadoria, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 09 de abril de 2019.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000971105v12 e do código CRC f78f36df.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 16/4/2019, às 16:30:13


5001796-73.2012.4.04.7112
40000971105 .V12


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 16:04:11.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIãO

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 09/04/2019

Apelação Cível Nº 5001796-73.2012.4.04.7112/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PROCURADOR(A): CÍCERO AUGUSTO PUJOL CORRÊA

SUSTENTAÇÃO ORAL: ELISANGELA LEITE AGUIAR por CERLAR DE CARVALHO

APELANTE: CERLAR DE CARVALHO (AUTOR)

ADVOGADO: ALEXANDRA LONGONI PFEIL

ADVOGADO: JULIA CAROLINA LONGHI KOSCIUK

ADVOGADO: ANILDO IVO DA SILVA

ADVOGADO: MARIANA DE MEDEIROS FLORES NUNES

ADVOGADO: ELISANGELA LEITE AGUIAR

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 09/04/2019, na sequência 267, disponibilizada no DE de 25/03/2019.

Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, COM RESSALVA DA JUÍZA FEDERAL GISELE LEMKE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR E DETERMINAR, DE OFÍCIO, A IMPLANTAÇÃO DA APOSENTADORIA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Juiz Federal JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA

Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

Ressalva em 09/04/2019 13:16:59 - GAB. 51 (Juíza Federal GISELE LEMKE) - Juíza Federal GISELE LEMKE.

Ressalvo posição diversa no que se refere ao reconhecimento de tempo especial com fundamento em vibração, já que não há previsão legal nesse sentido para o motorista, mas sim para quem trabalha com perfuratriz e martelete pneumático, o que são atividades bastante diversas da de motorista de ônibus. Portanto, o reconhecimento da especialidade com base na trepidação, a rigor se dá com fundamento em penosidade, o que é hipótese que a jurisprudência desta Turma não reconhece. No entanto, apenas faço essa ressalva quanto à fundamentação, por verificar que nos períodos em que reconhecida a especialidade pela trepidação, também está sendo reconhecida a especialidade pelo ruído, com o que estou de acordo, sendo que basta o reconhecimento da especialidade fundada num agente nocivo em cada período para a contagem do tempo como especial.



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 16:04:11.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora