Apelação Cível Nº 5012214-95.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JAIRO ARUZ
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por Jairo Aruz em face do INSS, em que requer a concessão de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez em razão de problemas ósseos. Narra na inicial que a incapacidade perdura, não tendo condições de retomar o labor habitual na agricultura.
O magistrado de origem, da Comarca de Arvorezinha/RS, proferiu sentença em 30/05/2018, julgando procedente o pedido, para determinar a implantação do benefício de aposentadoria por invalidez desde a DER (17/02/2012), condenando a autarquia ao pagamento das prestações vencidas corrigidas monetariamente pelo IPCA-E e com juros de mora pelos índices de poupança. O INSS foi onerado ainda ao pagamento de despesas processuais e de honorários advocatícios de 10% das prestações vencidas até a data da sentença. O R. Juízo referiu que não era caso de reexame necessário (evento 3, Sent29).
Em sentença em que acolhidos parcialmente os embargos de declaração, o R. Juízo determinou a aplicação dos índices de deflação (evento 3, Sent31).
Em consulta ao CNIS, observa-se que o benefício não foi implantado.
Irresignada, a autarquia apelou, sustentando, preliminarmente, a obrigatoriedade do reexame necessário e a existência de coisa julgada em relação os autos n. 082/1.10.0000465-2, demanda ajuizada em 03/2010 e com trânsito em julgado em 10/2011, julgada improcedente, pois não reconhecida a incapacidade do demandante. Assevera que o laudo pericial produzido nestes autos, o qual verificou a incapacidade total e permamente, é tão somente um parecer técnico diverso de uma situação já analisada e julgada, de modo que deve ser extinto o feito sem resolução de mérito. Caso mantido o decisum, requer a fixação da DIB na data do laudo pericial, a aplicação do disposto na Lei 11.960/2009 no que concerne à correção monetária, a isenção das custas, despesas e emolumentos e o prequestionamento da matéria debatida na petição recursal (evento 3, Apelação 32).
Com contrarrazões (evento 3, Contraz33), os autos vieram a esta Corte para julgamento.
VOTO
CPC/2015
Conforme o art. 14 do CPC/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Logo, serão examinados segundo as normas do CPC/2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Tendo em vista que a sentença foi publicada posteriormente a esta data, o recurso será analisado em conformidade com o CPC/2015.
Preliminares
Reexame necessário
A presente demanda possui valor líquido e certo sendo inaplicável a disciplina da Súmula nº 490 do Superior Tribunal de Justiça.
Por outro lado, o art. 496, §3º, I, do Código de Processo Civil/2015, dispensa a submissão da sentença ao duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários mínimos para a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público.
Diante da nova disposição legal sobre o tema, solicitou-se à Divisão de Cálculos Judiciais - DICAJ informações. A DICAJ por sua vez explicitou que, para que uma condenação previdenciária atingisse o valor de 1.000 salários mínimos, necessário seria que a RMI fosse fixada no valor teto dos benefícios previdenciários, bem como abrangesse um período de 10 (dez) anos entre a DIB e a prolação da sentença.
No caso concreto, é possível concluir com segurança absoluta que o limite de 1.000 salários mínimos não seria alcançado pelo montante da condenação, uma vez que a DIB do benefício é 02/2012 e a sentença é datada de 05/2018.
Assim sendo, não conheço da remessa necessária.
Observo que a necessidade de se analisar o conceito de sentença ilíquida em conformidade com as disposições do Novo CPC é objeto da Nota Técnica n.º 03, emitida pelo Centro de Inteligência da Justiça Federal.
Outrossim, havendo impugnação específica sobre o ponto, oportuniza-se à parte a apresentação de memória de cálculo do montante que entender devido, como forma de instruir eventual recurso interposto, o qual será considerado apenas para a análise do cabimento ou não da remessa necessária.
Coisa julgada
O INSS assevera a existência de coisa julgada, porquanto o autor ajuizou em 30/03/2010 a ação n. 082/1.10.0000465-2, em que requereu o restabelecimento do auxílio-doença previdenciário que titularizara de 09/2009 a 12/2009, sob o fundamento de continuidade da incapacidade. Naquele feito, o perito observou a existência de uma fratura no tornozelo esquerdo, geradora de incapacidade pretérita, sendo que naquela data não mais havia inaptidão para o labor, conforme constou da sentença de improcedência (evento 3, Pet22, p. 7-8) e da decisão proferida por esta Corte, mantendo o decisum do R. Juízo a quo (evento 3, Pet22, p. 11-15). A ação transitou em julgado em 10/2011.
O autor protocolou novo pedido administrativo em 17/02/2012 (evento 3, AnexosPet4, p. 2), indeferido em virtude de parecer contrário da perícia médica, o qual fundamenta a presente ação, ajuizada em 22/02/2013, sob o fundamento de agravamento/continuidade da incapacidade, situação que foi atestada pelo perito que examinou o demandante nestes autos (evento 18, LaudoPeric1).
O expert considerou que o autor estava incapacitado desde 09/2009, consignando que houve variação do grau de limitação laboral ao longo do tempo, visto que, "à medida que tempo passa, as lesões evoluem por compressão contínua sobre os discos lombares e raízes nervosas correspondentes" (resposta ao quesito 7 formulado pelo INSS - evento 18, LaudoPeric1, p. 4).
Portanto, diante da alteração da situação fática (agravamento, com evolução para patologias associadas, como será detalhado mais adiante), não há que falar em coisa julgada.
Superadas as preliminares, passo à análise dos pontos questionados em sede recursal.
Controvérsia dos autos
A controvérsia recursal cinge-se ao termo inicial da aposentadoria por invalidez, à correção monetária, às custas e despesas processuais e aos emolumentos.
Termo inicial do benefício
Na sentença, o magistrado de origem concedeu ao autor aposentadoria por invalidez desde a DER (17/02/2012). O INSS insurge-se contra o termo inicial do benefício, requerendo a fixação na data do exame pericial.
Importa referir que o laudo médico (evento 18, LaudoPeric1), produzido em 12/2013, apontou que o autor encontrava-se incapacitado de forma total e permanente desde a ocorrência do acidente, em 09/2009, quando teve uma lesão no tornozelo por acidente com o arado de bois Referiu que, em virtude das dificuldades de deambulação e do desnivelamento gerado, houve evolução para lesões na coluna lombar: CID M54.1 - radiculopatia, M54.4 - lumbago com ciática e M79 - outros transtornos dos tecidos moles. Consignou que as dores na coluna eram incapacitantes e o grau de limitações evoluía com o passar do tempo.
Importa referir que o autor já estivera em auxílio-doença em dois períodos, cerca de seis meses após o relatado acidente (evento 3, Pet22, p. 16):
- de 09/2009 a 12/2009; e
- de 02/2010 a 03/2010.
Em 2010/2011, durante a tramitação da ação anterior intentada, foi realizada perícia médica, a qual não identificou incapacidade para o labor.
Já na perícia judicial produzida nestes autos, conforme supra referido, o médico observou evolução para outras patologias incapacitantes na coluna, decorrentes da deambulação desnivelada oriunda da lesão no tornozelo.
O perito referiu expressamente que "à medida que o tempo passa, as lesões evoluem por compressão sobre os discos lombares e raízes nervosas correspondentes", em resposta ao quesito 7 formulado pela autarquia, o qual versava sobre a ocorrência de agravamento (evento 18, LaudoPeric1, p. 4).
No quesito seguinte, n. 8, o INSS pergunta se há divergências entre os laudos médicos da autarquia e as alegações e o histórico médico da autora, cuja resposta do perito é: "Sim. O INSS não reconhece a cronicidade da patologia em curso, com piora progressiva do quadro" (evento 18, LaudoPeric18, p. 5).
Embora o expert tenha fixado a DII na data do acidente (09/2009), a incapacidade total e permanente foi verificada tão somente no dia do exame pericial (11/2013), de forma que merece parcial provimento o recurso do INSS, para conceder ao autor o auxílio-doença desde a DER (17/02/2012), benefício convertido em aposentadoria por invalidez a partir da data da perícia médica (em 20/11/2013).
Correção monetária
Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE n. 870.947), a que se seguiu, o dos embargos de declaração da mesma decisão, rejeitados e com afirmação de inexistência de modulação de efeitos, deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece para as condenações judiciais de natureza previdenciária:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91)
Desprovido o recurso do INSS e, de ofício, fixado do INPC como índice de correção monetária.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (inc. I do art. 4º da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigos 2º, parágrafo único, e 5º, I da Lei Estadual 14.634/2014).
Tendo em vista que o R. Juízo a quo já isentara o INSS das custas processuais, em consonância com o entendimento desta Corte, condenando-o ao pagamento de despesas processuais e emolumentos, resta desprovido o recurso no tópico.
Desprovida a apelação do INSS no ponto.
Honorários de sucumbência
Considerando o disposto no art. 85, § 11, NCPC, e que está sendo dado provimento ao recurso do INSS, ainda que parcial, não é o caso de serem majorados os honorários fixados na sentença, eis que, conforme entendimento desta Turma, "a majoração dos honorários advocatícios fixados na decisão recorrida só tem lugar quando o recurso interposto pela parte vencida é integralmente desprovido; havendo o provimento, ainda que parcial, do recurso, já não se justifica a majoração da verba honorária" (TRF4, APELREEX n.º 5028489-56.2018.4.04.9999/RS, Relator Osni Cardoso Filho, julgado em 12/02/2019).
Prequestionamento
No que concerne ao pedido de prequestionamento, observe-se que, tendo sido a matéria analisada, não há qualquer óbice, ao menos por esse ângulo, à interposição de recursos aos tribunais superiores.
Tutela Específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício postulado, observando-se o prazo de 45 dias.
Faculta-se ao beneficiário manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Conclusão
Provido parcialmente o apelo do INSS, para deferir ao autor o auxílio-doença desde a DER (17/12/2012), benefício convertido em aposentadoria por invalidez a partir da data da perícia médica (20/11/2013). De ofício, aplicado o INPC como índice de correção monetária sobre as prestações vencidas. Determinada a imediata implantação do benefício.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do INSS e, de ofício, aplicar o INPC como índice de correção monetária.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001788840v6 e do código CRC eba9942f.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 13/7/2020, às 18:18:32
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Apelação Cível Nº 5012214-95.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JAIRO ARUZ
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. processual civil. REMESSA OFICIAL. CPC/2015. NÃO CONHECIMENTO. coisa julgada. inocorrência. agravamento da patologia. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. termo inicial. correção monetária. custas processuais. tutela específica.
1. Inobstante os termos da Súmula 490 do Superior Tribunal ressalvar as sentenças ilíquidas da dispensa de reexame necessário, a remessa oficial, na espécie, não deve ser conhecida, a teor do que dispõe o artigo 496, § 3º, inciso I, do CPC de 2015.
2. Mesmo que a RMI do benefício seja fixada no teto e que sejam pagas as parcelas referentes aos últimos cinco anos com juros e correção monetária, o valor da condenação não excederá a quantia de mil salários mínimos, montante exigível para a admissibilidade do reexame necessário.
3. Hipótese em que houve agravamento da doença, com evolução para patologias associadas, havendo novo pedido administrativo de benefício por incapacidade. Afastada a coisa julgada.
4. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; c) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença).
5. Comprovada na perícia médica a existência de incapacidade total e permanente, é de ser deferido o auxílio-doença desde a DER, convertido em aposentadoria por invalidez a partir da data do exame pericial.
6. Correção monetária a contar do vencimento de cada prestação, calculada pelo INPC, para os benefícios previdenciários, a partir de 04/2006, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91.
7. O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (inc. I do art. 4º da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigos 2º, parágrafo único, e 5º, I da Lei Estadual 14.634/2014).
8. Ordem para implantação do benefício. Precedentes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e, de ofício, aplicar o INPC como índice de correção monetária, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 04 de agosto de 2020.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001788841v3 e do código CRC b976aee6.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 28/07/2020 A 04/08/2020
Apelação Cível Nº 5012214-95.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JAIRO ARUZ
ADVOGADO: MARLOS TOMÉ ZELICHMANN (OAB RS052441)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 28/07/2020, às 00:00, a 04/08/2020, às 14:00, na sequência 97, disponibilizada no DE de 17/07/2020.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E, DE OFÍCIO, APLICAR O INPC COMO ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 12/08/2020 07:18:20.