REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL Nº 5005921-19.2014.4.04.7208/SC
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PARTE AUTORA | : | JOAO MELLIES |
ADVOGADO | : | ELIDIA TRIDAPALLI |
PARTE RÉ | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO ADMINISTRATIVA. PRAZO DECADENCIAL. MÁ-FÉ. INOCORRÊNCIA. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES PERCEBIDOS.
1. De acordo com entendimento pacificado pelo E. Superior Tribunal de Justiça, os benefícios previdenciários concedidos antes do advento da Lei n.º 9.784/99, têm, como termo inicial do prazo decadencial, a data de vigência da norma que o estabeleceu, ou seja, 01.02.1999. Já para os benefícios concedidos sob a égide da referida legislação, o termo inicial do prazo decadencial a ser considerado é a data do respectivo ato. Em qualquer hipótese, o prazo decadencial é de dez anos. Precedente do Superior Tribunal de Justiça (Recurso Especial Repetitivo n.º 1.114.938/AL).
2. O ônus probatório em demonstrar a existência de má-fé do beneficiário é do INSS e este não obteve êxito em comprová-la.
3. Não se pode exigir que o segurado revise o ato de concessão do benefício previdenciário a fim de verificar se o INSS não laborou em erro.
4. Afastada a má-fé do segurado, reconhece-se a decadência do direito de revisão administrativa e, por consequência, a inexigibilidade da cobrança perpetrada pelo INSS.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 06 de julho de 2016.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL Nº 5005921-19.2014.4.04.7208/SC
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PARTE AUTORA | : | JOAO MELLIES |
ADVOGADO | : | ELIDIA TRIDAPALLI |
PARTE RÉ | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por João Mellies em face do Instituto Nacional do Seguro Social, objetivando seja reconhecida a inexigibilidade dos valores cobrados pelo réu, supostamente percebidos de forma indevida, bem como o restabelecimento integral do benefício atual. Alegou a ocorrência de decadência administrativa da revisão, uma vez que transcorridos mais de dez anos desde o ato concessório, ocorrido em 19/01/1989, bem como a prescrição quinquenal. Sustentou sua boa-fé na percepção do benefício, uma vez que, tivesse o servidor da Autarquia somado o período de labor urbano com o rural realizado, o demandante igualmente faria jus à aposentadoria por tempo de serviço. Afirmou ser inexigível a cobrança perpetrada pelo INSS, ressaltando que os pagamentos se deram por ato equivocado da própria Autarquia. Aduziu que, por se tratar de verba alimentar percebida de boa-fé, os valores são irrepetíveis. Requereu a concessão de tutela antecipada para determinar ao INSS que se abstenha de promover qualquer desconto ou bloqueio do benefício em manutenção. Alternativamente, requereu que os descontos sejam limitados ao máximo de 10% do benefício mensal.
O pedido antecipatório foi deferido (evento 3).
Sobreveio sentença que, confirmando a antecipação da tutela, julgou procedente o pedido, declarando a inexistência de débito, bem como a irrepetibilidade dos valores decorrentes do processo NB 084.320.973-9. Condenou o INSS ao pagamento de custas e honorários, arbitrado em R$ 3.000,00 (três mil reais).
Sem recurso de apelação, os autos subiram por força da remessa oficial.
É o relatório.
VOTO
Do Direito Intertemporal
Considerando que o presente voto está sendo apreciado por essa Turma após o início da vigência da Lei n.º 13.105/15, novo Código de Processo Civil, referente ao apelo em face de sentença exarada na vigência da Lei n.º 5.869/73, código processual anterior, necessária se faz a fixação, à luz do direito intertemporal, dos critérios de aplicação dos dispositivos processuais concernentes ao caso em apreço, a fim de evitar eventual conflito aparente de normas.
Para tanto, cabe inicialmente ressaltar que o CPC/2015 procurou estabelecer, em seu CAPÍTULO I, art. 1º que "o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código"; em seu CAPÍTULO II, art. 14, que "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada"; e em suas DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS, art. 1.046, caput, que "ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973." (sublinhei)
Nesse contexto, percebe-se claramente ter o legislador pátrio adotado o princípio da irretroatividade da norma processual, em consonância com o art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, o qual estabelece que "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada".
Desta forma, a fim de dar plena efetividade às referidas disposições normativas, e tendo em vista que o processo é constituído por um conjunto de atos dirigidos à consecução de uma finalidade, qual seja, a composição do litígio, adoto, como critério de solução de eventual conflito aparente de normas, a Teoria dos Atos Processuais Isolados, segundo a qual cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar a lei que o rege, que, por sua vez, será aquela que estava em vigor no momento em que o ato foi praticado, de acordo com o princípio tempus regit actum.
Por consequência, para deslinde da antinomia aparente supracitada, deve ser aplicada no julgamento a lei vigente:
(a) na data do ajuizamento da ação, para a verificação dos pressupostos processuais e das condições da ação;
(b) na data da citação (em razão do surgimento do ônus de defesa), para a determinação do procedimento adequado à resposta do réu, inclusive quanto a seus efeitos;
(c) na data do despacho que admitir ou determinar a produção probatória, para o procedimento a ser adotado, inclusive no que diz respeito à existência de cerceamento de defesa;
(d) na data da publicação da sentença (entendida esta como o momento em que é entregue em cartório ou em que é tornado público o resultado do julgamento), para fins de verificação dos requisitos de admissibilidade dos recursos, de seus efeitos, da sujeição da decisão à remessa necessária, da aplicabilidade das disposições relativas aos honorários advocatícios, bem como de sua majoração em grau recursal.
Feitos esses esclarecimentos, passo ao exame do recurso.
Remessa Oficial
Como já referido, tratando-se de sentença publicada na vigência do CPC/73 (08/06/2015), inaplicável o art. 496 do CPC/2015 quanto à remessa necessária.
Consoante decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso, conheço da remessa oficial.
Da decadência contra a Administração Pública
De acordo com entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento do Recurso Especial Repetitivo n.º 1.114.938/AL (Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 3ª Seção, Unânime, julgado em 14.04.2010), os benefícios previdenciários concedidos antes do advento da Lei n.º 9.784/99, têm, como termo inicial do prazo decadencial, a data de vigência da norma que o estabeleceu, ou seja, 01.02.1999. Já para os benefícios concedidos sob a égide da referida legislação, o termo inicial do prazo decadencial a ser considerado é a data do respectivo ato.
Considerando-se, ademais, que o elastecimento do prazo de cinco anos (art. 54 da Lei n.º 9.784/99) para dez anos (MP n.º 138, de 19 de novembro de 2003) se deu antes do decurso de cinco anos da vigência da Lei n.º 9.784/99, em qualquer hipótese, tanto para benefícios concedidos antes quanto para os concedidos após o advento da Lei n.º 9.784/99, o prazo decadencial aplicável é de dez anos.
No caso concreto, em se tratando de benefício concedido anteriormente ao advento da Lei n.º 9.784/99 (DIB 19/01/1989), o termo inicial do prazo decadencial deve ser fixado em 01/02/1999. Assim, considerando que os procedimentos para a revisão da aposentadoria foram iniciados em 20/01/2012 (evento1-out10), e o cancelamento do benefício ocorreu em 01/02/2012 (evento1-procadm15), tenho que transcorreu o prazo decadencial para a revisão do ato concessório do mesmo.
Cumpre observar ainda que, no caso em análise, o fundamento para o cancelamento do benefício decorreu do fato de seu nome ter sido "relacionado juto aos documentos encontrados pela Polícia Federal de Itajaí/SC no ano de 1992, quando da apreensão na residência da ex-servidora Vanda Weber Abreu", o que culminou com a reabertura do processo administrativo e a constatação de má-fé do autor, "seja na apresentação da RSC com valores que não condizem com aqueles que foram contribuídos, seja com a apresentação de um documento oficial contendo informações inverídicas".
Todavia, conforme ressaltado na sentença, a irregularidade apontada decorreu de falha da própria Administração, sem má-fé por parte do beneficiário, porquanto não se pode exigir que o segurado revise o ato de concessão do benefício previdenciário a fim de verificar se o INSS não laborou em erro. Aliás, o próprio autor refere que achava que o INSS tinha somado ao seu tempo urbano o período rural laborado em regime de economia familiar, esclarecendo que nunca realizou a atividade de pescador artesanal constante do ato de concessão administrativa.
A sentença analisou adequadamente a alegação de fraude, de forma que passo a transcrevê-la na parte em que pertinente:
O entendimento permanece hígido e atual, na medida em que o ônus probatório é do INSS e este não obteve êxito em demonstrar que o segurado agiu com o ânimo de fraudar o ente autárquico, uma vez que a juntada do documento constante no arquivo procadm15, p. 9, não aponta, por si só, o conhecimento do Sr. João quanto ao seu teor e quanto à veracidade das informações ali constantes.
Como se percebe da decisão administrativa do arquivo procadm15, p. 47, o INSS optou por não apurar em que condições referida certidão aportou àquele processo. O nome do autor aparece ligado a uma ex-servidora da autarquia que praticava irregularidades no âmbito da autarquia, é verdade, mas em momento algum se esclarece quem juntou aos autos a certidão, em que circunstâncias esse fato se deu e, mais importante, se o autor efetivamente tinha ciência e consciência de que havia de fato uma falsidade e que esta operava em seu favor.
Calha apontar, inclusive, que a certidão mencionada contém informações complexas e com índice de verossimilhança tal que ludibriaram o INSS por quase 22 anos. Os elementos ali constantes, tais como brasão, carimbos, nomes de embarcação, datas de embarque e desembarque, e mesmo o conhecimento do nome Capitão-Tenente da Marinha, são fortes indícios de especialização (organização criminosa) no que tange à mencionada falsificação, mormente em se tratando do ano de 1988, época em que não se obtinham tais informações com facilidade, dada a falta de informatização, sendo improvável e temerário apontar que teriam sido produzidas pelo autor sem qualquer elemento que indique esse norte.
Resta, assim, afastada a má-fé do segurado, o que implica na decadência do direito de revisão administrativa e, por consequência, no reconhecimento da inexistência do débito e inexigibilidade da cobrança perpetrada pelo INSS.
Logo, mantida a sentença de procedência.
Honorários Advocatícios
Considerando que a sentença recorrida foi publicada antes de 18/03/2016, data da entrada em vigor do NCPC, e tendo em conta as explanações tecidas quando da análise do direito intertemporal, esclareço que as novas disposições acerca da verba honorária são inaplicáveis ao caso em tela, de forma que não se determinará a graduação conforme o valor da condenação (art. 85, §3º, I ao V, do CPC/2015), tampouco se estabelecerá a majoração em razão da interposição de recurso (art. 85, §11º, do CPC/2015).
Assim, mantidos os honorários advocatícios arbitrados em R$ 3.000,00 (três mil reais), por ausência de recurso da parte autora.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p.único, da Lei Complementar Estadual nº156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela Antecipada
No tocante à antecipação dos efeitos da tutela, entendo que deve ser mantida a sentença no ponto, uma vez que presentes os pressupostos legais para o seu deferimento.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à remessa oficial.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 06/07/2016
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL Nº 5005921-19.2014.4.04.7208/SC
ORIGEM: SC 50059211920144047208
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Fábio Nesi Venzon |
PARTE AUTORA | : | JOAO MELLIES |
ADVOGADO | : | ELIDIA TRIDAPALLI |
PARTE RÉ | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 06/07/2016, na seqüência 399, disponibilizada no DE de 17/06/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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