| D.E. Publicado em 13/09/2018 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003433-43.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | NELIRIA DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | Cristiane Bohn |
: | Anna Maria Vicente Dorneles | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. QUALIDADE DE SEGURADA E INCAPACIDADE LABORATIVA COMPROVADAS. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Comprovado nos autos que a parte autora está incapacitada total e definitivamente para o trabalho, considerados o quadro clínico e as condiçõs pessoais, e que tinha qualidade de segurada na data de início da incapacidade laborativa, é de ser reformada a sentença para conceder o auxílio-doença desde a DER e convertê-lo em aposentadoria por invalidez desde a data do segundo laudo judicial. 2. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso e determinar a implantação do benefício de aposentadoria por invalidez, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 04 de setembro de 2018.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9441772v3 e, se solicitado, do código CRC 89A550A7. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003433-43.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | NELIRIA DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | Cristiane Bohn |
: | Anna Maria Vicente Dorneles | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
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RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido de auxílio-doença e/ou de aposentadoria por invalidez, em razão de não ser comprovada a incapacidade laborativa, condenando a parte autora ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios fixados em R$ 800,00, suspensa a exigibilidade em razão de Justiça Gratuita.
Recorre a parte autora, requerendo a reforma da sentença, sustentando, em suma, que restou comprovada a incapacidade laborativa.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
Na sessão de 04-10-17, a 6ª Turma decidiu solver questão de ordem para converter o julgamento em diligência de ofício (fls. 78/80).
Os autos baixaram à vara de origem e, após a reabertura da instrução com a produção de prova testemunhal, retornaram a esta Corte em 11-07-18.
É o relatório.
VOTO
Controverte-se, na espécie, sobre o acerto ou não da sentença que julgou improcedente o pedido de auxílio-doença e/ou de aposentadoria por invalidez, em razão de não ser comprovada a incapacidade laborativa.
Quanto à aposentadoria por invalidez, reza o art. 42 da Lei nº 8.213/91:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Já no que tange ao auxílio-doença, dispõe o art. 59 do mesmo diploma:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Segundo entendimento dominante na jurisprudência pátria, nas ações em que se objetiva a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, ou mesmo nos casos de restauração desses benefícios, o julgador firma seu convencimento com base na prova pericial, não deixando de se ater, entretanto, aos demais elementos de prova, sendo certo que embora possível, teoricamente, o exercício de outra atividade pelo segurado, ainda assim a inativação por invalidez deve ser outorgada se, na prática, for difícil a respectiva reabilitação, seja pela natureza da doença ou das atividades normalmente desenvolvidas, seja pela idade avançada.
Durante a instrução processual, foram realizadas duas perícias médico-judiciais, a primeira em 11-11-15, da qual se extraem as seguintes informações acerca do quadro clínico da parte autora (fls. 28/31):
a) enfermidade: diz o perito que Sinais de artrose acrômio-clavicular... CID M75.8. Outras lesões do ombro... Doença crônica, degenerativa... Em 1989 HAS; Em 05.2015 Labirintite;Esteatose hepática (Vide Eco 04.2015), sinais de artrose acrômio-clavicular (Vide Eco 23.04.15)... A maioria assintomática;
b) incapacidade: responde o perito que As enfermidades relatadas não são impeditivas de trabalhar. Apta com restrições (elevar os braços acima dos ombros)... Demais não são incapacitantes... Não há incapacidade... Deve evitar elevar os membros superiores acima dos ombros... Incapacidade parcial nos períodos de crise por dor ao realizar movimentos com elevação dos braços acima dos ombros... Temporária. Limitada a não fazer certos exercícios. Apta com restrições;
c) tratamento: refere o perito que Medicada=SUS... Estabilizada. Melhorada. Medicada.
Da segunda perícia judicial, realizada por ortopedista em 24-02-16, constam as seguintes informações (fls. 38/42):
QUESITOS
- O autor se encontra acometido por alguma doença?
R: Sim.
- Em caso afirmativo, qual a doença e o CID correspondente?
R: 1. Artrose incipiente acrômio clavicular:
Tendinite do supraespinhoso sem atividade inflamatória atual M575.0, M 65.9
- A que data remonta a moléstia?
R: Há 1 ano, conforme anamnese.
- A enfermidade que acomete o autor é a mesma ou se vincula aquela inalterado, desde a data do requerimento administrativo junto ao INSS ?
R: Sim;
- O quadro clinico do(a) examinando(a) melhorou, ou permanece inalterado, desde a data do requerimento administrativo junto ao INSS?
R: Permanece o mesmo;
- Esta doença o incapacita para o trabalho?
R: Não, não incapacita para a sua atividade, do ponto de vista ortopédico, respeitando sua idade e biofísico.
- A que data remonta a incapacidade? Em havendo possibilidade de fixar a data exata, o perito devera, a vista dos exames juntados, estimar o momento mais aproximado do inicio da incapacidade.
R: Não há incapacidade, ao presente exame, do ponto de vista ortopédico.
(...)
R: Sem limitações.
(...)
R: Não há incapacidade ao presente exame, do pinto de vista ortopédico.
(...)
R: Não. Não está incapacitado para atos da vida cotidiana.
(...)
R: Não. Não necessita de auxilio de terceiros.
(...).
- Terá dor eventual no ombro esquerdo assim como qualquer trabalhador braçal.
- Não há incapacidade ao presente exame para sua atividade, respeitando sua idade e biofísico.
(...)
- No momento, sem processo inflamatório em atividade;
- No momento não.
(...).
Do exame dos autos, colhem-se ainda as seguintes informações sobre a parte autora:
a) idade: 53 anos (nascimento em 01-09-64 - fl. 09);
b) histórico de benefícios: a parte autora requereu auxílio-doença em 02-04-15, indeferido em razão de perícia contrária (fls. 11, 16 e CNIS/SPlenus em anexo); ajuizou a ação em 03-09-15;
c) atestado médico de 05-05-15 (fl. 10) referindo, em suma, tratamento médico por doença hipertensiva, CID I11.9, obesidade, estenose hepática, lipídios elevados, bursite ombro E, labirintite, que lhe dificultam o trabalho; encaminhamento à perícia de 06-02-17 (fl. 74) referindo, em suma, CID M19.9 - artrose ombro E, M75.5 - bursite, M77.9 - tendinite, K76.0 - esteatose- h, R51- cefaléia, R42- tontura,
d) US do ombro E de 23-04-15 (fl. 12); documento de referência de 18-08-15 (fl. 13); controle de HAS (fls. 14/14v); ecografia abdominal total de 07-04-15 (fl. 15); TC do encéfalo de 08-05-15 (fl. 75);
e) laudo do INSS de 11-05-15, com diagnóstico de CID M25.5 (dor articular).
Diante de todo o conjunto probatório, entendo que restou comprovada a incapacidade laborativa da parte autora na DER (02-04-15).
Todavia, também há controvérsia quanto à qualidade de segurada da autora, pois o INSS contesta tal condição, alegando que sua última contribuição foi como facultativo/do lar em 06/12 e a DER (02-04-15) foi indeferida em maio/15, ocorrendo a perda da qualidade de segurada.
A parte autora qualificou-se nos autos como pescadora.
O pescador artesanal, para efeitos previdenciários, é considerado segurado especial, nos termos do art. 11, inciso VII, da Lei n.º 8.213/91, recebendo disciplina semelhante a do trabalhador rural para cômputo do tempo de serviço.
Cumpre ao julgador valorar os fatos e circunstâncias evidenciados com ênfase no artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil e levar em conta a realidade social em que inserido o trabalhador rural, na qual predomina a informalidade na demonstração dos fatos. Vale lembrar que não se mostra razoável exigir que os documentos carreados ao processo sigam sempre a forma prescrita em lei, por isso devem ser considerados válidos quando de outra forma atingir a finalidade precípua de comprovar o exercício da atividade rural, consoante disposto no art. 244 do CPC.
O tempo de serviço rural e como pescador artesanal pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do disposto no art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, e na Súmula n.º 149 do STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de alternância das provas ali referidas. Não se exige prova plena das atividades rural e pesqueira de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Quanto à demonstração do exercício das atividades rural e pesqueira, encontra-se averbado no parágrafo 3º do art. 55 da Lei de Benefícios da Previdência que: "a comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
Complementando a matéria, cuidou o legislador de elencar no art. 106 do mesmo Diploma os meios destinados à demonstração do exercício das atividades rural e pesqueira e, ainda que se entenda o referido rol meramente enunciativo, à evidência, alguma prova material há de ser produzida.
Deve-se observar que a Lei de Benefícios da Previdência Social exige, em seu art. 55, § 3º, início de prova material para fins de comprovação do tempo de serviço rural, não admitindo a prova exclusivamente testemunhal. Entretanto, tal limitação não pode ser extensiva ao segurado que apresente documentos que, embora não correspondam exatamente ao intervalo necessário a ser comprovado, constituam um indício razoável de que a atividade agrícola vinha sendo desenvolvida, tendo a prova testemunhal a finalidade de, nesse caso, vincular o início de prova material ao período cuja demonstração das atividades rural e pesqueira é necessária. Nesse sentido vem decidindo o STJ: RESp n.º 608.045/CE, Quinta Turma, Relator Min. Laurita Vaz, DJU de 07-06-2004; e RESp n.º 628.575/CE, Sexta Turma, Relator Min. Hamilton Carvalhido, DJU de 24-05-2004.
De outro modo, não há impedimento a que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que indiquem a continuidade das atividades rural ou pesqueira.
No caso concreto, para a comprovação do trabalho como pescadora, a parte autora juntou aos autos a carteira de pescadora profissional do MPA emitida em 29-04-13 (fl. 09).
Consoante se vê, há nos autos início de prova material acerca do desempenho da alegada atividade de pescadora.
Em audiência realizada em 15-05-18, foram inquiridas duas testemunhas, cujos depoimentos foram os seguintes (fls. 88/90 e 95/98):
DEPOIMENTO DE LUIS VENERO MACHADO
SERVIDOR:Nome completo?
LUIS:Luis Venero Machado.
SERVIDOR:Endereço?
LUIS:Balneário Monte Alegre.
SERVIDOR:Profissão?
LUIS:Pescador.
SERVIDOR:Obrigado.
JUIZ:Bom dia. O senhor tem algum parentesco com a Sra. Neliria?
LUIS:Não.
JUIZ:Amigo íntimo ou inimigo?
LUIS:Não, não, a gente se conhece lá na beira do rio, pescando.
JUIZ:Tá bom. O senhor presta o compromisso de dizer a verdade.
LUIS:Certo.
PROCURADORA:O senhor conhece a dona Neliria da onde?
LUIS:Ali do balneário mesmo.
PROCURADORA:Há quanto tempo, mais ou menos?
LUIS:Olha, eu, faz dezoito ano que eu moro lá embaixo. Acho que mais de dez anos que a gente se cruza.
PROCURADORA:E no que a dona Neliria trabalha?
LUIS:Ela ajuda o seu Paulo, né, o Neia, que a gente chama de tio Neia, tia Lia, pesca junto com ele. Ela sempre pesca ali junto.
PROCURADORA:Tá. Então a profissão dela é?
LUIS:Pescadora.
PROCURADORA:Pescadora. E o senhor sabe mais ou menos há quanto tempo ela pesca?
LUIS:Não. Isso, exato, eu não posso lhe dizer, mas há mais de dez anos que eu vejo eles sempre junto, os dois.
PROCURADORA:E agora ela tem pescado?
LUIS:Ultimamente não, né, que ela não está se sentindo muito bem. Inclusive uma vez a gente ajudou o Neia lá, que ela até desmaiou dentro do barco. Ele pediu pra gente, a gente tava passando e ele pediu uma mão pra (inaudível) em casa, levar ela pra dentro de casa.
PROCURADORA:Tá bem. Não tenho mais perguntas.
JUIZ:Também não tenho.
DEPOIMENTO DE EVILAZIO VANDERLEI PEREIRA
SERVIDOR: Nome completo?
EVILAZIO: Evilazio Vanderelei Pereira.
SERVIDOR:Endereço?
EVILAZIO:É... Monte Alegre. Balneário Monte Alegre.
SERVIDOR:E a sua profissão?
EVILAZIO:Pescador.
SERVIDOR:Muito obrigado.
JUIZ:O senhor tem algum parentesco com a dona Neliria?
EVILAZIO:Não, não.
JUIZ:Amigo íntimo ou inimigo?
EVILAZIO:Não, não.
JUIZ:Tá. O senhor presta o compromisso de dizer a verdade, tá?
EVILAZIO:Sim, sim.
JUIZ:Pode perguntar.
PROCURADORA:O senhor conhece a dona Neliria há quanto tempo?
EVILAZIO:Ah, ela, o marido dela eu conheço há uns quarenta ano, que a gente se criou junto pescando, né, lá. Ela conheço desde 2000... 2000.
PROCURADORA:E o que ela faz?
EVILAZIO:Pesca com ele, né? Porque acho que o único casal que pesca lá é eu e a minha esposa e ele e ela, né, na beira lá do rio. Só que eles moram mais pra cima e a gente mora bem mais pra baixo, né.
PROCURADORA:E o sustento deles é a pesca?
EVILAZIO:É a pesca; não tem outro sustento.
PROCURADORA:Está. E ela continua pescando ou ela teve que parar?
EVILAZIO:Não, ela não tá pescando. Até a gente deu uma ajuda pra ele, esses tempos ela passou mal. Ela passou mal no barco lá e o barquinho deles é meio pequeno, e meu barco é maior, daí a gente deu uma mão pra ela lá. Ficou tonta dentro do barco lá, desmaiou lá... Meio..., desmaiou dentro do barco, ou desmaiou dentro do barco lá. Ele pediu uma mão pra nós, pra mim trazer ela pra casa, aí eu trouxe ela pra casa (falha no áudio)... Eu tô todo dia dentro d'água, né, porque meu sustento é a água, né?
PROCURADORA:Está bom, então. Muito obrigada.
Dessa forma, entendo que restou comprovada a qualidade de segurada da parte autora em período superior ao da carência bem como a sua incapacidade laborativa.
Com efeito, tendo em vista todo o conjunto probatório, entendo que a parte autora está incapacitada de forma total e permanente para o trabalho, sem condições de integrar qualquer processo de reabilitação profissional. Isso porque, é imprescindível considerar além do estado de saúde (padece de várias enfermidasdes), as condições pessoais da segurada, como sua idade, sua escolaridade, a limitada experiência laborativa e, por fim, a realidade do mercado de trabalho atual, já exíguo até para pessoas jovens e que estão em perfeitas condições de saúde. Nesse compasso, ordenar que a postulante, com tais limitações, recomponha sua vida profissional, negando-lhe o benefício no momento em que dele necessita, é contrariar o basilar princípio da dignidade da pessoa. Observe-se que a autora é pescadora, sendo que entendo que suas enfermidades são incompatíveis com tal atividade.
Assim, tenho por demonstrado nos autos pelo conjunto probatório que a parte autora é portadora de moléstias que a incapacitam para o exercício de suas atividades laborativas, sem recursos pessoais capazes de garantir-lhe êxito em reabilitar-se e reinserir-se adequadamente no mercado de trabalho, devendo ser reformada a sentença para conceder o auxílio-doença desde a DER (02-04-15) e convertê-lo em aposentadoria por invalidez a partir da data do segundo laudo judicial (24-02-16).
Dessa forma, condeno o INSS a conceder o benefício nos termos da fundamentação precedente, com o pagamento dos valores atrasados.
Dos consectários
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3.ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5.º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 1495146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja, o INPC.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29.06.2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3.º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1.º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5.ª Turma, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Da Verba Honorária
Os honorários advocatícios, ônus exclusivos do INSS no caso, devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Das Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4.º, I, da Lei 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, de acordo com disposto no art. 5.º, I, da Lei Estadual 14.634/14, que institui a Taxa Única de Serviços Judiciais desse Estado, ressalvando-se que tal isenção não o exime da obrigação de reembolsar eventuais despesas judiciais feitas pela parte vencedora (parágrafo único, do art. 5.º). Salienta-se, ainda, que nessa taxa única não estão incluídas as despesas processuais mencionadas no parágrafo único, do art. 2.º, da referida Lei, tais como remuneração de peritos e assistentes técnicos, despesas de condução de oficiais de justiça, entre outras.
Tal isenção não se aplica quando o INSS é demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula n.º 20 deste regional), devendo ser salientado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Da tutela específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09.08.2007 - 3.ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício ora reconhecido, em favor da parte autora, no prazo de 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso e determinar a implantação do benefício de aposentadoria por invalidez.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 04/09/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003433-43.2017.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00014196820158210099
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Marcelo Veiga Beckhausen |
APELANTE | : | NELIRIA DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | Cristiane Bohn |
: | Anna Maria Vicente Dorneles | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 04/09/2018, na seqüência 5, disponibilizada no DE de 17/08/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO AO RECURSO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ | |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
Paulo Roberto do Amaral Nunes
Secretário em substituição
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