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QUESTÃO DE ORDEM. ERRO MATERIAL. ANULAÇÃO DE JULGAMENTO. REAFIRMAÇÃO DA DER. DATA POSTERIOR AO AJUIZAMENTO. TEMA 995/STJ. SOBRESTAMENTO. TRF4. 5012820-26.2...

Data da publicação: 07/07/2020, 04:33:15

EMENTA: QUESTÃO DE ORDEM. ERRO MATERIAL. ANULAÇÃO DE JULGAMENTO. REAFIRMAÇÃO DA DER. DATA POSTERIOR AO AJUIZAMENTO. TEMA 995/STJ. SOBRESTAMENTO. 1. Tendo em vista a omissão da análise da apelação da parte autora, e a constatação de erro material em relação ao desacolhimento, na sentença, do pedido de concessão do benefício previdenciário, impõe-se a anulação do julgamento realizado pelo Colegiado. 2. Postulando a parte autora, em seu recurso, a reafirmação da DER para período posterior ao ajuizamento da demanda, deve o presente feito ser sobrestado, até ulterior definição do STJ em relação ao Tema 995. (TRF4 5012820-26.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 01/08/2019)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5012820-26.2019.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: WALDEMIR JOAO FERREIRA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: OS MESMOS

QUESTÃO DE ORDEM

Trata-se de demanda em que parte autora pugnou pelo reconhecimento de tempo especial em relação aos períodos de 27/06/1983 a 07/02/1986, 17/03/1986 a 27/05/1987, 15/01/1992 a 09/07/1993 e de 23/09/1993 a 12/01/1995, bem como pela sua conversão em tempo comum e consequente concessão de aposentadoria por tempo de contribuição a contar da DER (16/11/2010).

Regularmente instruído o feito, sobre veio sentença que julgou parcialmente procedente o pedido da parte autora, a fim de reconhecer o tempo especial em relação aos períodos de 27/06/1983 a 07/02/1986, de 15/01/1992 a 09/07/1993 e de 23/09/1993 a 12/01/1995, afastando igual pretensão quanto ao período de 17/03/1986 a 27/05/1987 e, por fim conceder o benefício previdenciário postulado, nestes termos:

"(...) Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, com fundamento no art. 269, I, do Código de Processo Civil, para: a) reconhecer a especialidade das atividades exercidas pelo autor nos períodos de 27/06/1983 a 07/02/1986, de 15/01/1992 a 09/07/1993 e de 23/09/1993 a 12/01/1995, com a conversão para comum pelo fator 1,4, nos termos da fundamentação; b) reconhecer a existência de coisa julgada referente ao pedido de reconhecimento da especialidade da atividade exercida pelo autor no interregno de 17/03/1986 a 27/05/1987; c) condenar o réu a conceder em favor do autor o benefício de aposentaria por tempo de contribuição (conforme opção mais vantajosa), a contar do requerimento administrativo (16/11/2010), nos termos da fundamentação, bem como a pagar todas as prestações vencidas, observada a prescrição quinquenal (parcelas anteriores a 05/05/2006); ' d) até 30/06/2009, as parcelas vencidas são acrescidas de atualização monetária, adotando-se os i ex dores: ORTN (Lei 4.257/1964, até 02/1986); OTN (Decreto-Lei 2.284/1 6, 3/ 986 a 01/1989); BTN (Lei 7.777/1989, de 02/1989 a 02/1991); I (Lei 8.2 /1991, de 03/1991 a 12/1992); IRSM (Lei 8.542/1992, de 01/1993/2122/1994); RV (Lei 8.880/1994, de 03 06/1994); IPC-r (Lei 8.880/1994, de 07/1994 a 06/1995); INPC (MP 1.053/1995, de 07/1995 a 04/1996); IGP-DI (Lei 9.711/1998, art. 10, de 05/1996 a 03/2006) e INPC (a partir de 04/2006). Até 30/06/2009 os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3° do Decreto-Lei 2.322/1987, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar. A partir de 30/06/2009, por força da Lei 11.960/2009, que alterou o art. 1°-F da Lei 9.494/1997, para fins de apuração dos juros de mora haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial de aplicado a caderneta de poupança (TRF4, APELREEX 5028139-54.2012.404.7000/PR, rel. Juiz João Batista Pinto Silveira, j. 05/02/2014); E e) condenar o réu, diante da sucumbência parcial mínima do autor, ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo, considerando o trabalho despendido e a natureza da causa, em 10% (dez por cento) do valor da condenação (art. 20, § 4”, do CPC), excluídas as parcelas vincendas (Súmula 111 do STJ), além das despesas processuais pela metade (art. 33, § 1°, da Lei Complementar Estadual 156/97); f) determinar, com fundamento no art. 461 e seu § 4° do Código de Processo Civil, que o réu implemente, no prazo de 30 (trinta) dias do pagamento do benefício em questão, sob pena de multa diária no valor de R$ 300,00 (trezentos reais), a ser revertida ao autor, haja vista o caráter alimentar do benefício e o considerável transcurso de tempo desde o ajuizamento até a presente; Expeça-se mandado para intimação pessoal do responsável pela Gerência Executiva do INSS (...)." (e. 4.21 dos autos eletrônicos, fls. 211/219).

Devidamente intimado, o INSS opôs embargos declaratórios, informando que o tempo especial reconhecido em juízo não assegurava ao autor a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, porquanto contava com 30 anos, 05 meses e 17 dias de tempo de contribuição, sendo necessários 30 anos, 10 meses e 27 dias (e. 4.22 dos autos eletrônicos, fls. 223/224 dos autos físicos).

Face a tanto, sobreveio sentença na qual o MM. Juízo a quo, acolhendo o recurso aclaratório e atribuindo-lhe efeitos infringentes, rejeitou o pedido da parte autora de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, nessas letras:

"(...) Ante o exposto, conheço dos embargos e lhes dou provimento, ao efeito de rejeitar o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição. Diante da sucumbência recíproca. o autor deverá arcar com o pagamento das despesas processuais pela metade. Todavia. tal exigibilidade encontra-se suspensa. A outra metade deverá ser arcada pela parte ré. Quanto aos honorários advocatícios, considero-os compensados, devendo cada parte arcar com as despesas de seu patrono. Custas reduzidas à metade, em face do disposto no art. 33, § 1°, da Lei Complementar Estadual 156/1997. No mais, permanecem os demais termos da sentença. Retorne o processo ao seu curso normal, devolvendo-se as partes o prazo recursal (...). (e. 4.24 dos autos eletrônicos, fls. 250/251).

Face à sucumbência recíproca, ambas as partes interpuseram recurso de apelação. A parte autora, em suas razões recursais, postulou a reafirmação da DER para 05/06/2011, data em que preenche o tempo de serviço/contribuição exigido para a concessão do benefício postulado. O INSS, por seu turno, alegou falta de interesse de agir, tendo em vista o autor não ter requerido, em sede administrativa, o reconhecimento de tempo especial controverso.

Encaminhados os autos a esta Corte, restou prolatado Acórdão na sessão de 14/09/2017. Tal decisão, todavia, considerou apenas a sentença original do MM. Juízo a quo, sem atentar para os efeitos infringentes da decisão que acolheu os embargos do INSS, e, por consequência, sem análise da apelação da parte autora. Negou-se, assim, provimento ao recurso do INSS e à remessa oficial, confirmando-se a sentença anterior ao acolhimento dos efeitos modificativos decorrentes do recurso aclaratório da parte ré, inclusive quanto ao preenchimento dos requisitos para a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição a contar da DER e à antecipação da tutela que, com os efeitos infringentes aos embargos, fora revogado (e. 4.29 dos autos eletrônicos, fls. 272/280).

Com o trânsito em julgado do Acórdão em 23/11/2017 (fl. 279), foram os autos devolvidos os autos ao juízo de origem, e intimada a parte ré a proceder ao cumprimento da obrigação de fazer. Manifestou-se, contudo, o INSS no sentido de que a sentença não condenou-o à implantação da aposentadoria por tempo de contribuição, inclusive por carecer a parte autora de tempo de contribuição para a concessão do benefício (e. 4.31, fls. 284).

Face a tanto, requereu o demandante o retorno dos autos a esta Corte, a fim de que se procedesse ao exame de sua apelação, cuja análise deixou de ser oportunamente realizada (e. 4.32, fls. 287/288).

Tendo em vista o indeferimento do pleito pelo magistrado singular (e. 4.33, fl. 289), o autor interpôs agravo de instrumento, ao qual foi dado provimento pelo Colegiado, "determinando-se a remessa dos autos a este Tribunal, para o fim de reanalise dos recursos e das questões apontadas pelos recorrentes" (e. 4.36, fls. 296/299).

É o relatório.

Percuciente análise do feito evidencia que, efetivamente, uma vez encaminhados os autos a este Colegiado para julgamento, restou apenas examinado o recurso do INSS e a remessa oficial, com a confirmação da sentença não apenas em relação ao reconhecimento do tempo especial nos períodos de 27/06/1983 a 07/02/1986, 15/01/1992 a 09/07/1993 e de 23/09/1993 a 12/01/1995, como também em relação à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, o que caracteriza, de fato, erro material, tendo em vista que, concedidos efeitos infringentes aos embargos opostos pelo INSS em primeira instância, o MM. Juízo a quo prolatou sentença em que rejeitou o pedido de concessão do benefício.

Assim, equivocadamente, o teor da decisão proferida em 23/11/2017 (e. 4.29 - fls. 172/180 dos autos físicos), revela hipótese fática absolutamente divorciada do caso dos autos, a saber, apelo unicamente do INSS contra sentença que teria, além de reconhecido o tempo especial nos períodos controversos, também determinado a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, por restarem preenchidos os requisitos legais do benefício - quando, na verdade, também a parte autora havia interposto recurso, e contra sentença que deixou de deferir o benefício postulado. Tal descompasso, evidenciado na absoluta ausência de conformidade dos fundamentos adotados na decisão com os fatos trazidos a julgamento, recomenda a anulação do julgado, nos termos do art. 494, I, do NCPC.

A jurisprudência é firme no sentido da necessidade de conhecimento de ofício de inexatidões materiais dos julgados, bem como da necessidade do provimento judicial refletir o estado de fato existente no momento da entrega jurisdicional de modo a compor realmente a lide, devendo-se aplicar tal preceito não apenas nas instâncias ordinárias, mas, também, nos tribunais de segundo grau e nos tribunais superiores.

Assim, resta evidenciada, de forma objetiva, a inexatidão material (erro material) do acórdão proferido por esta Corte que não teve o condão de revelar o pensamento e vontade dos respectivos julgadores sobre a causa efetivamente tratada nos autos.

Aliás, sobre o assunto - erro material consistente em vício do consentimento -, cita-se a elucidativa lição do Exmo. Ministro Luiz Fux, ao relatar o AgRg no REsp 773273/MG (STJ, Primeira Turma, julgado em 27/11/2007, DJ 27/02/2008, p. 162), in verbis:

"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. EXECUÇÃO. DESAPROPRIAÇÃO. PRECATÓRIO COMPLEMENTAR. JUROS COMPENSATÓRIOS. PRECLUSÃO. RATIO ESSENDI DO ART. 473, DO CPC. PRECLUSÃO.

1. O pagamento da dívida por meio de precatório, revela inviável, nos próprios autos reabrir-se a discussão acerca dos cálculos, reservando-se à Fazenda, em ação de repetição, reaver o que pagou indevidamente, pretensão impossível de ser exercida na fase administrativa do implemento do débito.

2. Pedido de retificação do saldo devedor, em sede de execução de ação de desapropriação, após o pagamento integral dos precatórios, para que deles fossem excluídos os juros compensatórios e moratórios, relativos ao período posterior à Constituição Federal, nos termos do art. 33 do ADCT.

3. É assente que a coisa julgada é qualidade consubstanciada na imutabilidade do acertamento ou da declaração contida na sentença, no que pertine à definição do direito controvertido.

4. Nesse sentido leciona Ovídio Baptista da Silva, literris:

"(...) É indispensável, porém, ter presente que o pensamento dominante na doutrina européia considera que a coisa julgada é o efeito - ou, como quer LIEBMAN, 'a qualidade' - que se agrega à "declaração contida na sentença", libertando os demais efeitos da "imutabilidade" que ele pretendera atribuir-lhes, permite, por exemplo, aceitar que a decisão que homologue a atualização do cálculo, na fase de execução da sentença para reservar o valor da condenação - não ofenderá a coisa julgada.

12. A distinção entre coisa julgada e 'efeitos' da sentença está feita de modo didático no Código Civil italiano, ao conceituar a coisa julgada como 'L 'accertamento contenuto nella sentenza' (art. 2.909), depois de referir-se, no artigo precedente, a seus 'efeitos'. Esse 'accertamento', diz o Código italiano, 'ufa stato', entre as partes, para todos os efeitos.

De resto, poderíamos ir mais longe, para advertir que as hipóteses que mais diretamente causaram revolta àqueles ilustres juristas - não por acaso magistrados ou ex-magistrados foram as avaliações judiciais produtoras de valores 'absurdos', Cuidava-se, porém, de sentenças homologatórias rigorosamente incongruentes, caracterizadas por manifesta oposição respectiva sentença que condenara ao pagamento do 'justo valor'.

O cálculo produzido na respectiva execução da sentença subvertia inteiramente o julgado, fazendo com que o 'justo valor' - que o processo de liquidação da sentença deveria determinar - se transformasse em fonte de enriquecimento ilícito.

Por outro lado - este é um argumento adicional decisivo -, a sentença que homologa o cálculo decide sobre 'fato', não sobre direito, no sentido de que a decisão possa adquirir a força de coisa julgada. Como disse, com toda razão, o Ministro DELGADO (p. 18), as sentenças nunca poderão 'transformar fatos não verdadeiros em reais'. Se o arbitrador, por qualquer motivo, desobedeceu ao julgado, produzindo um cálculo 'absurdo', terá, com certeza, cometido erro de cálculo. A declaração contida no ato de homologar, no ato através do qual o juiz torna seu o arbitramento (homo + logos), não produz coisa julgada capaz de impedir que se corrija o cálculo, (...)."

5. Com efeito, o erro material pode ser sanado a qualquer tempo, sem que se ofenda a coisa julgada, até porque a correção do mesmo constitui mister inerente à função jurisdicional. Essa é, inclusive, a inteligência da norma prevista no art. 463, I, do Código de Processo Civil.

6. Ademais, in casu, não se vislumbra ocorrência de erro material, caracterizado pelo equívoco de escrita ou de cálculo, sobre a conta homologada, hábil a representar a manifestação incorreta da vontade, e não se confunde com o erro sobre os critérios de cálculo a serem utilizados, tais como incidência de expurgos, de juros, ou de índice de correção monetária, dentre outros.

2.Hipótese de preclusão em que a recorrente quedou-se inerte quanto à inclusão de juros compensatórios na conta homologada por sentença (fls. 44), restando-lhe vedado requerer, intempestivamente, o afastamento dessa verba sob a alegação de erro material. 3. O acórdão recorrido afirma que a recorrente concordou com os valores computados, fato inibidor do pleito de exclusão de juros em sede de precatório, sob pretexto de erro de cálculo. Precedentes: (REsp AgRg nos EDCl no Resp 762575/PR Relator Ministro LUIZ FUX DJ 21.09.2006;AgRg no Ag 705084/SP, DJ 14.11.2005; REsp 710394/MG, DJ 15.09.2006 )

7. Deveras, na hipótese sub examine a pretensão do Município cinge-se à revisão de cálculos já homologados, o que revela a preclusão da matéria.

8. Sobre o tema discorre Carlos Valder do Nascimento, in "Execução Contra a Fazenda Pública", 1.ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2000, pp. 29/30 e 34/35, verbis:

"Dentro de uma perspectiva geral assentada pela legislação, pela doutrina e pela jurisprudência, pode-se afirmar que o erro é um desvio de percepção da realidade fática, constituindo-se em vício do consentimento, por equívoco a propósito de determinado evento material.

Cezar Peluso, apud Arruda Alvim, perfilhando a idéia de Salvalore Satta, assim o define: 'Erro material não são apenas os defeitos exteriores ocorrentes na documentação do juízo ou na formação de documento, mas também toda divergência ocasional entre a idéia e sua representação, objetivamente reconhecível que demonstre não traduzir o pensamento ou a vontade do prolator.' Em estudo publicado em revista especializada que reproduz trabalhos forenses, vale trazer à colação excerto do voto da lavra de Arruda Alvim, em que fixa sua noção: 'O erro material é aquele que pode ser verificado a partir de critérios objetivos, deve ser identificável por todo homem médio e que não corresponde, de forma evidente e inequívoca à intenção do Magistrado.' Ora, se o juiz homologa cálculos com erro, pressupõe-se que, embora não seja a manifestação inequívoca da sua vontade, o fez por desconhecimento, por irreal percepção do fato. de modo que seu ato contempla o âmago da questão, isto é, sua causa material. E assim, configurando discrepância entre sua vontade e a veiculada no próprio conteúdo de sua decisão, torna-a defeituosa.

Decorrente disso, o erro de cálculo ou mesmo de sua atualização deve ser corrigido de ofício pelo Judiciário. Ele não reproduz a vontade do magistrado nem o estado pode cobri-lo com o manto do trânsito em julgado. Mesmo homologado nessas circunstâncias, porque ato nulo, não irradia efeitos jurídicos definitivos.

Pela sua não inserção na relação processual válida, pode ser recomposto, com vistas ao restabelecimento da sua exatidão, a qualquer tempo. O que importa é que se persiga, sem limitação temporal, a eliminação da incerteza presente no vínculo jurídico, sendo insubsistente o processo se tal desiderato não for atingido em toda a sua plenitude.

Não é sem razão que Calamandrei assevera que o fim do processo é a garantia da observância prática do direito objetivo. O expurgo da dúvida é fator preponderante para que a coisa julgada alcance foro de imutabilidade. Ora, se é certo que essa imutabilidade insere-se no contexto da segurança jurídica, não menos verdade é que seu relativismo decorre da razão natural das coisas.

Contaminada de inexatidão material ou essencial, a obrigação exeqüenda ou o processo executório, este extinto e aquela adimplida, não transita em julgado. (...)"

Ora, como o Acórdão de fls. 172/180 (evento 4.29 dos autos eletrônicos) não condiz com a realidade da situação posta nos autos, o litígio efetivamente estabelecido entre as partes permaneceu sem solução já que não examinados os argumentos recursais da autora, afigurando-se de qualquer sorte inexeqüível o provimento constante do título executivo de modo que o dever estatal de entrega da prestação jurisdicional satisfatória (adequada e efetiva) não foi cumprido, tampouco posto fim ao processo.

A hipótese, portanto, é de decisão inexistente, que vai além da extra petita (em decorrência de erro material) e de nulidade originária, reputando-se ausente a vontade do julgador que concede prestação jurisdicional diferente da que lhe foi postulada, em clara afronta ao princípio da congruência entre o pedido articulado na exordial e a sentença. Logo, no caso em tela, inexistente a decisão constante do acórdão de fls. 172/180.

Por tal razão, descabe aduzir a coisa julgada, porquanto essa não ampara, em nosso ordenamento, os erros materiais. Nesse sentido, decidiu o STF no julgamento da AR 1881/RS, em decisão de lavra do Ministro Gilmar Mendes, publicada no DJe-078, de 26-04-2013, de cujas razões extraio:

"(...) Esse entendimento – que tem sido acolhido por esta Corte – apóia-se na relevante circunstância de que erros materiais não se acham amparados pela coisa julgada (RTJ 128/950 , Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE), podendo , por isso mesmo, uma vez constatados , sofrer correção, a qualquer tempo ( AI 235.944-QO/SP , Rel. Min. MOREIRA ALVES – Ext 775-petição avulsa–AgR-QO/Argentina , Rel. Min. NELSON JOBIM – RE 82.215-ED/SP , Rel. Min. CUNHA PEIXOTO – RE 108.096/SP , Rel. Min. CÉLIO BORJA – RE147.928-ED/PE , Rel. Min. ILMAR GALVÃO – RE 161.174-QO/SP , Rel. Min. ILMAR GALVÃO – RE 193.422-ED/SP , Rel. Min. ILMAR GALVÃO – RE 199.466-QO/PR , Rel. Min. MARCO AURÉLIO - RE 216.548/RS , Rel. p/ acórdão Min. ILMAR GALVÃO, v . g .).

Não foi por outra razão que o eminente Ministro EROS GRAU, como Relator da AR 1.548/BA, tendo em consideração a mesma situação versada na presente causa (julgado rescindendo que decide matéria diversa daquela veiculada no processo), apreciou, monocraticamente, a pretensão deduzida pelo autor, assinalando, então, que a hipótese por ele examinada configurava, tal como sucede na espécie, verdadeiro erro material que, segundo reiterada jurisprudência desta Corte, pode ser corrigido a qualquer tempo, não sendo amparado pela coisa julgada (...) ( AR 1.548/BA )."

Do mesmo modo já decidiu a 3ª Seção desta Corte Regional:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. TEMPESTIVIDADE. ERRO MATERIAL. POSSIBILIDADE DE CORREÇÃO DE OFÍCIO. 1. Se no julgamento do agravo de instrumento interposto na fase de execução da sentença para subtrair tempo de contribuição em duplicidade houve manifestação quanto à questão vertida na ação rescisória, o início do prazo decadencial deve ser computado a partir do trânsito em julgado do acórdão agravo (27.6.2013) e não do acórdão prolatado na apelação cível. É tempestiva, portanto, a ação rescisória ajuizada em 07.01.2015. 2. Identificado erro material na sentença que, no dispositivo, em vez de afirmar o direito à averbação do período referido na inicial como desconsiderado pelo INSS (01.03.1977 a 03.01.1983) mencionou intervalo (de 17.7.2003 a 15.7.2008), também registrado no CNIS, mas sobre o qual nenhum destaque fora feito na petição inicial da ação originária. 3. Embora a ação rescisória não se destine à correção de erro material, é admitido o aproveitamento do instrumento processual para promover-se, de ofício, à adequação do julgado por imperativo de economia processual. Precedentes da 3ª Seção. 4. Sanado o equívoco no acórdão da apelação cível e do agravo de instrumento que o reproduziu, a segurada contabiliza 33 anos, 2 meses e 23 dias de tempo de contribuição até a DER, fazendo jus à concessão da aposentadoria postulada. (TRF4, AR 0000071-28.2015.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator LUIZ ANTONIO BONAT, D.E. 12/04/2016)

A doutrina nacional também confere essa interpretação ao princípio da congruência, a exemplo da lição de Fredie Didier Jr.:

"Daí se vê que a decisão guarda intrínseca relação com a demanda que lhe deu causa. Há entre elas um nexo de referibilidade, no sentido de que a decisão deve sempre ter como parâmetro a demanda e seus elementos. É por isso que já se disse que a petição inicial é um projeto da sentença que se pretende obter.

Justamente por existir essa referibilidade, o legislador nos arts. 128 e 460 do CPC, determina que a sentença deve conter a análise e a decisão de todos os pedidos deduzidos no processo e somente eles, não podendo ir além nem fora do que foi pleiteado. A noção vale para todo tipo de pronunciamento decisório. Eis a redação dos referidos dispositivos legais:

(...)

Esses dois artigos dão substância ao chamado princípio da congruência da decisão judicial.

(...)

O princípio da congruência é, também uma consequência da garantia do contraditório: a parte tem o direito de manifestar-se sobre tudo o que possa interferir no conteúdo da decisão; assim, o magistrado deve ater-se ao que foi demandado exatamente porque, em relação a isso, as partes puderam manifestar-se.

A despeito de haver nos arts. 128 e 460 do CPC uma referência direta apenas aos elementos objetivos da demanda (causa de pedir e pedido), é intuitivo que a decisão deve guardar congruência também em relação aos sujeitos envolvidos no processo (elemento subjetivo da demanda) e com os fundamentos da defesa suscitados pelo demandado. Pode-se dizer, pois, que esses dispositivos legais estabelecem verdadeira limitação ao exercício da jurisdição, na medida que impõem à decisão do magistrado limites subjetivos e objetivos, abrangendo estes últimos os fundamentos de fato da demanda e da defesa e o(s) pedido(s) formulado(s)." (Fredie Didier Jr., Paulo Sarno Braga & Rafael Oliveira. Curso de Direito Processual Civil. 4ª ed. Salvador: jusPODVIM, 2009, vol. 02, p 309/10).

Cumpre registrar, por oportuno, ter sido essa a solução recentemente dada pelo Colegiado a caso semelhante, em que também houve divergência entre a situação fático-jurídica retratada no caso concreto e a apreciada pelo Colegiado (Questão de Ordem na Apelação Cível n. 5003249-31.2019.4.04.9999/SC, Rel. Des. Fed. Celso Kipper, julg. na sessão de 29/05/2019).

Assim, na hipótese em apreço, deve ser anulada, de ofício, a decisão colegiada proferida em 172/180, a qual não guarda correspondência com o caso dos autos, razão pela qual deve ser reexaminado o recurso da parte autora e proferido novo acórdão.

Isso posto, constata-se que a parte autora, em seu recurso de apelação, requereu a reafirmação da DER para 05/06/2011, a fim de que lhe seja assegurada a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição (e. 2.25 - fls. 253 e 256 dos autos físicos). Tem-se, todavia, que tal data é posterior ao ajuizamento da presente demanda, ocorrido em 06/05/2011 (e. 4.1, p. 02).

Assim, diante da determinação do Egrégio STJ de suspender todos os processos que versam sobre esse ponto em razão da afetação do Tema 995 [Possibilidade de se considerar o tempo de contribuição posterior ao ajuizamento da ação, reafirmando-se a data de entrada do requerimento-DER- para o momento de implementação dos requisitos necessários à concessão de benefício previdenciário: (i) aplicação do artigo 493 do CPC/2015 (artigo 462 do CPC/1973); (ii) delimitação do momento processual oportuno para se requerer a reafirmação da DER, bem assim para apresentar provas ou requerer a sua produção.], nos autos do ProAfR no REsp 1727063/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/08/2018, DJe 22/08/2018), impõe-se o sobrestamento do presente feito, nos termos do art. 1.037, II, do NCPC, até ulterior deliberação do STJ, quando então o Colegiado deverá renovar o julgamento dos recursos das partes.

Pelo exposto, voto por apresentar questão de ordem, a fim de anular o Acórdão de fls. 172/180 (e. 4.29 dos autos eletrônicos) e sobrestar o presente feito até ulterior deliberação do STJ em relação ao Tema 995.



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5012820-26.2019.4.04.9999
40001157252 .V17


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5012820-26.2019.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELANTE: WALDEMIR JOAO FERREIRA

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

QUESTÃO DE ORDEM. ERRO MATERIAL. ANULAÇÃO De JULGAMENTO. REAFIRMAÇÃO DA DER. DATA POSTERIOR AO AJUIZAMENTO. TEMA 995/STJ. SOBRESTAMENTO.

1. Tendo em vista a omissão da análise da apelação da parte autora, e a constatação de erro material em relação ao desacolhimento, na sentença, do pedido de concessão do benefício previdenciário, impõe-se a anulação do julgamento realizado pelo Colegiado.

2. Postulando a parte autora, em seu recurso, a reafirmação da DER para período posterior ao ajuizamento da demanda, deve o presente feito ser sobrestado, até ulterior definição do STJ em relação ao Tema 995.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, apresentar questão de ordem, a fim de anular o Acórdão de fls. 172/180 (e. 4.29 dos autos eletrônicos) e sobrestar o presente feito até ulterior deliberação do STJ em relação ao Tema 995, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 31 de julho de 2019.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001158119v5 e do código CRC 2f41ddaf.Informações adicionais da assinatura:
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5012820-26.2019.4.04.9999
40001158119 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 01:33:14.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 31/07/2019

Apelação/Remessa Necessária Nº 5012820-26.2019.4.04.9999/SC

INCIDENTE: QUESTÃO DE ORDEM

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE

PROCURADOR(A): WALDIR ALVES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELANTE: WALDEMIR JOAO FERREIRA

ADVOGADO: JOAO PAULO ALVES DE LIMA (OAB SC022530)

ADVOGADO: FRANCISCO VITAL PEREIRA (OAB SC002977)

APELADO: OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 31/07/2019, na sequência 358, disponibilizada no DE de 12/07/2019.

Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE, APRESENTAR QUESTÃO DE ORDEM, A FIM DE ANULAR O ACÓRDÃO DE FLS. 172/180 (E. 4.29 DOS AUTOS ELETRÔNICOS) E SOBRESTAR O PRESENTE FEITO ATÉ ULTERIOR DELIBERAÇÃO DO STJ EM RELAÇÃO AO TEMA 995.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN

Votante: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE

ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 01:33:14.

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