RECLAMAÇÃO (CORTE ESPECIAL) Nº 5007531-10.2017.4.04.0000/SC
RELATOR | : | CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ |
RECLAMANTE | : | SONIA REGINA FORMAGI |
ADVOGADO | : | Silvio Schmidt |
BENEFICIÁRIO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
RECLAMAÇÃO. DECISÕES EM DEMANDA PREVIDENCIÁRIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. ALEGAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE ACÓRDÃO PROFERIDO EM ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA CORTE ESPECIAL DESTE TRF4R. INADEQUAÇÃO DA VIA ESCOLHIDA. NÃO CONHECIMENTO.
O Código de Processo Civil/15 passou a regular a reclamação, nos arts. 988 a 993, consolidando-a como instituto de direito processual civil, ampliando as hipóteses de cabimento em relação ao texto constitucional. Doutrina abalizada defende sua constitucionalidade. De qualquer modo, o texto processual é aplicável, pois em pleno vigor.
Alegação pela reclamante de desrespeito e afronta pelas decisões proferidas no âmbito do Juizado Especial Federal e, mais especificamente da 2ª Turma Recursal de Santa Catariana (procedimento comum do JEF nº 5015041-61.2015.404.7205), ao que decidido pela Corte Especial deste Tribunal, na Arguição de Inconstitucionalidade nº 5012935-13.2015.404.0000/TRF, que excluiu a incidência do fator previdenciário do cálculo de aposentadoria por tempo de contribuição diferenciada dos professores.
Sem adentrar no mérito, verifica-se não se ajustar a via escolhida em qualquer das hipóteses previstas na CF e no art. 988 do CPC/15. Isso porque a reclamação visa a preservar a competência do Tribunal e a garantir a autoridade de suas decisões, garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade, bem como garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de IRDR ou de incidente de assunção de competência.
Observe-se que o Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade, previsto nos arts. 948 a 950 do CPC/15, julgado na Corte Especial e em controle difuso, não se encontra elencado nas hipóteses previstas no art. 988 do CPC/15. De outra banda, a necessidade de observância da orientação do Órgão Especial se dá em relação aos juízes que estiverem vinculados ao respectivo Tribunal, nos termos do art. 927, inc. V, do CPC/15. Não há obrigatoriedade de observância pelos juízes dos JEFs ao que decidido pelos Tribunais Regionais Federais, em face de aqueles possuírem regras próprias de competência e estes não se constituírem em suas instâncias revisionais.
Em síntese, a reclamação pressupõe o descumprimento de uma decisão específica, oriunda do tribunal perante o qual interposta, e que envolva as figuras do reclamante e do reclamado. No caso não há decisão vinculante da Corte Especial do TRF4 descumprida. Isso porque a arguição de inconstitucionalidade foi suscitada incidentalmente em outro processo judicial, com partes diversas, e não no processo originário dessa reclamação. O acórdão da Corte Especial deste Tribunal tido por desrespeitado revela-se apenas como precedente jurisprudencial de observância não obrigatória no âmbito dos Juizados, o que inviabiliza a pretensão deduzida.
Conclui-se pelo descabimento da reclamação uma vez que não há decisão desta Corte a ser resguardada, nem cuja autoridade esteja sendo desrespeitada.
Deferida a assistência judiciária gratuita à reclamante. Não conhecimento da reclamação, em face da inadequação da via escolhida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, deferir a assistência judiciária gratuita à reclamante e não conhecer da reclamação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 27 de abril de 2017.
Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8913080v3 e, se solicitado, do código CRC 6C6AE5F6. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz |
| Data e Hora: | 27/04/2017 18:20 |
RECLAMAÇÃO (CORTE ESPECIAL) Nº 5007531-10.2017.4.04.0000/SC
RELATOR | : | CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ |
RECLAMANTE | : | SONIA REGINA FORMAGI |
ADVOGADO | : | Silvio Schmidt |
BENEFICIÁRIO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de reclamação apresentada por SONIA REGINA FORMAGI, com fulcro nos arts. 988 e seguintes do CPC/15, contra sentença de improcedência, prolatada em demanda previdenciária no JEF (procedimento comum do JEF nº 5015041-61.2015.404.7205), que objetivava a exclusão do fator previdenciário no cálculo da RMI de sua aposentadoria de Professor (evento 3 - SENT1 - processo originário), a qual restou confirmada pela 2ª Turma Recursal de Santa Catarina (evento 23- processo originário) e cujo Incidente de Uniformização de Jurisprudência por ela proposto para a TNU dos JEFs teve seu seguimento negado, com base na Questão de Ordem nº 13, da TNU (Não cabe Pedido de Uniformização, quando a jurisprudência da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais se firmou no mesmo sentido do acórdão recorrido) (Evento 45 - DESPADEC1 - processo originário).
A reclamante sustenta, em síntese, que as decisões suprarreferidas, ao assentarem, em todas as instâncias do Juizado Especial Federal, o entendimento de incidência do fator previdenciário no cálculo da aposentadoria por tempo de contribuição diferenciada dos professores, violaram frontalmente a autoridade de julgado deste Tribunal adotado como solução no Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade nº 5012935-13.2015.404.0000. Refere que neste Incidente, transitado em julgado em 21/10/2016, decidiu-se, por maioria, pela inconstitucionalidade do inciso I, do artigo 29, da Lei nº 8.213/91, sem redução de texto, e dos incisos II e III do §9º do mesmo dispositivo legal, com redução de texto, em relação aos professores que atuam na educação infantil e no ensino fundamental e médio, excluindo-se, por conseguinte, a incidência do fator previdenciário do cálculo de aposentadoria por tempo de contribuição diferenciada dos professores.
Ressalta que a inconstitucionalidade declarada pela Corte Especial deste Tribunal, nos termos do que dispõe o art. 97 da CF, vincula os demais órgãos julgadores do Tribunal e, por conseguinte, devem ser cassadas as decisões prolatadas na demanda originária nº 5015041-61.2015.404.7205, com observância do teor do julgamento do Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade nº 5012935-13.2015.404.0000, ou seja, não deve incidir a aplicação do fator previdenciário no cálculo de aposentadoria por tempo de contribuição da autora, ora reclamante.
Ao final, alegando flagrante descumprimento da determinação judicial no Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade nº 5012935-13.2015.404.0000 e, visando garantir a autoridade do acórdão deste Tribunal, requer: a) a concessão de Assistência Judiciária Gratuita, em face de não ter condições de arcar com os custos do processo e dado o caráter alimentar da natureza da causa, bem como pelo fato de já ter sido deferida na demanda originária; b) seja observado o estabelecido nos arts. 989 e 991, ambos do CPC/15; c) a procedência da presente reclamação.
VOTO
Preliminarmente, sobre a postulada concessão do benefício da assistência judiciária gratuita, pelo exame dos autos e dadas às peculiaridades do caso em tela, tenho por evidenciada a impossibilidade da reclamante de suportar os custos do processo.
Assim, no tópico, defiro a assistência judiciária à requerente, com fulcro no arts. 98 e 99, §3º, do CPC/15.
A reclamação, cuja natureza jurídica não é de recurso, de ação e nem de incidente processual, situa-se no direito constitucional do direito de petição previsto no art. 5º, inciso XXXIV da CF (STF, ADI 2.212/CE) e objetiva a preservação da competência do Tribunal, bem como a garantia da autoridade de suas decisões e de sua jurisprudência consolidada.
Sua origem remonta à jurisprudência do STF, mas a previsão tem assento na Constituição Federal tanto em relação ao Supremo Tribunal Federal quanto ao Superior Tribunal de Justiça, conformenormas constitucionais abaixo descritas:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I - processar e julgar, originariamente:
(...)
l) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões;
Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Vide Lei nº 11.417, de 2006).
(...)
§ 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
I - processar e julgar, originariamente:
(...)
f) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões;
Consoante orientação jurisprudencial consolidada pelo Supremo Tribunal Federal, o cabimento da reclamação, instituto jurídico de natureza constitucional, deve ser aferido nos estritos limites das normas de regência, que só a concebem para preservação da competência do Tribunal e para garantia da autoridade de suas decisões (art. 102, I, l, CF/88), bem como contra atos que contrariem ou indevidamente apliquem súmula vinculante (art. 103-A, § 3º, CF/88) (STF, Pleno, AGREG na Reclamação n.º 8.273, Rel. Min. Teori Zavascki).
Nessa linha, dispõe o artigo 156 e seguintes de seu Regimento Interno, in verbis:
Art. 156. Caberá reclamação do Procurador-Geral da República, ou do interessado na causa, para preservar a competência do Tribunal ou garantir a autoridade das suas decisões.
No regime anterior ao CPC, a reclamação também era viável no TSE e para o STM e, a despeito de frequentemente Constituições Estaduais preverem a reclamação como instituto, a possibilidade de sua apresentação em outros Tribunais causou polêmica por algum tempo, sendo levado o tema ao STF que culminou por assentar a constitucionalidade de tais reclamações no caso de haver previsão na respectiva Constituição Estadual (STF, ADI 2.212/CE, Sessão Plenária, Rel. Min. Ellen Gracie, j. 02.10.2013, DJ 14.11.2003).
Por sua vez, o Código de Processo Civil/15, passou a regular a reclamação, consolidando-a como instituto de direito processual civil, ampliando as hipóteses de cabimento em relação ao texto constitucional e da Lei de Recursos onde tinha igualmente previsão (Lei nº 8.038, de 28/05/1990 - arts. 13 a 18, revogados pela Lei nº 13.105/15), nos seguintes termos:
CAPÍTULO IX
DA RECLAMAÇÃO
Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para:
I - preservar a competência do tribunal;
II - garantir a autoridade das decisões do tribunal;
III - garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)
IV - garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência; (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)
§ 1o A reclamação pode ser proposta perante qualquer tribunal, e seu julgamento compete ao órgão jurisdicional cuja competência se busca preservar ou cuja autoridade se pretenda garantir.
§ 2o A reclamação deverá ser instruída com prova documental e dirigida ao presidente do tribunal.
§ 3o Assim que recebida, a reclamação será autuada e distribuída ao relator do processo principal, sempre que possível.
§ 4o As hipóteses dos incisos III e IV compreendem a aplicação indevida da tese jurídica e sua não aplicação aos casos que a ela correspondam.
§ 5º É inadmissível a reclamação: (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)
I - proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada; (Incluído pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)
II - proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias. (Incluído pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)
§ 6o A inadmissibilidade ou o julgamento do recurso interposto contra a decisão proferida pelo órgão reclamado não prejudica a reclamação.
Art. 989. Ao despachar a reclamação, o relator:
I - requisitará informações da autoridade a quem for imputada a prática do ato impugnado, que as prestará no prazo de 10 (dez) dias;
II - se necessário, ordenará a suspensão do processo ou do ato impugnado para evitar dano irreparável;
III - determinará a citação do beneficiário da decisão impugnada, que terá prazo de 15 (quinze) dias para apresentar a sua contestação.
Art. 990. Qualquer interessado poderá impugnar o pedido do reclamante.
Art. 991. Na reclamação que não houver formulado, o Ministério Público terá vista do processo por 5 (cinco) dias, após o decurso do prazo para informações e para o oferecimento da contestação pelo beneficiário do ato impugnado.
Art. 992. Julgando procedente a reclamação, o tribunal cassará a decisão exorbitante de seu julgado ou determinará medida adequada à solução da controvérsia.
Art. 993. O presidente do tribunal determinará o imediato cumprimento da decisão, lavrando-se o acórdão posteriormente.
Quanto ao fato de o novo CPC ter aumentado os casos de reclamação em relação à Constituição Federal, doutrina abalizada defende sua constitucionalidade ao argumento de as hipóteses consistirem-se, ao menos em relação ao STF, em um desdobramento da garantia de autoridade das decisões daquele Tribunal e de nada impedir que o instituto seja aplicável a outras situações e Tribunais já que há mera indicação no texto constitucional da via de impugnação adequada.
Some-se a isso o fato de o texto processual estar em pleno vigor e não ter sido vetado ou alterado quando do início de vigência do novo CPC, de modo que plenamente aplicável aos casos em que possam ser enquadrados.
No caso em apreço, a reclamante alega desrespeito e afronta pelas decisões proferidas no âmbito do Juizado Especial Federal e, mais especificamente da 2ª Turma Recursal de Santa Catariana (procedimento comum do JEF nº 5015041-61.2015.404.7205), ao que decidido pela Corte Especial deste Tribunal na Arguição de Inconstitucionalidade nº 5012935-13.2015.404.0000/TRF.
Entretanto, sem adentrar no mérito, verifica-se não se ajustar a via escolhida em qualquer das hipóteses previstas na Constituição Federal e no art. 988 do CPC/15. Isso porque a reclamação visa a preservar a competência do Tribunal e a garantir a autoridade de suas decisões, garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade, bem como garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de IRDR ou de incidente de assunção de competência.
Observe-se que o Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade, previsto nos arts. 948 a 950 do CPC/15, julgado na Corte Especial e em controle difuso, não se encontra elencado nas hipóteses previstas no art. 988 do CPC/15. Somente há em seu inciso IV previsão para garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidentes de resolução de demandas repetitivas (IRDR) ou de assunção de competência, mas não em relação ao incidente de arguição de inconstitucionalidade.
Ademais, a necessidade de observância da orientação do Órgão Especial se dá em relação aos juízes que estiverem vinculados ao respectivo Tribunal, nos termos do art. 927, inc. V, do CPC/15, verbis:
Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
|I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
II - os enunciados de súmula vinculante;
III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;
V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
Não há obrigatoriedade de observância pelos juízes dos JEFs ao que decidido pelos Tribunais Regionais Federais, em face de aqueles possuírem regras próprias de competência e estes não se constituírem em suas instâncias revisionais. Com efeito, a Lei 10.259/01, com fundamento no art. 98 da CF, não contempla qualquer hipótese de submissão, sob o aspecto jurisdicional, das decisões dos Juizados Especiais Federais aos Tribunais Regionais Federais.
E, especificamente aos termos do inciso II do art. 988 do CPC/15 "garantir a autoridade das decisões do tribunal", tem-se como pressuposto a necessária presença de uma decisão prolatada por este Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em relação ao caso verificado nos autos principais e que tenha sido descumprida pelo órgão jurisdicional a ele vinculado.
Em síntese, a reclamação pressupõe o descumprimento de uma decisão específica, oriunda do tribunal perante o qual interposta, e que envolva as figuras do reclamante e do reclamado.
Nesse sentido, confira-se os seguintes precedentes:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NA RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS. RECLAMAÇÃO INDEFERIDA. FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. IMPUGNAÇÃO. AUSÊNCIA. SÚMULA N. 182/STJ. AGRAVO NÃO CONHECIDO. 1. A reclamação constitucional, prevista nos arts. 105, I, "f", da CF e 187 do RISTJ, tem a finalidade de fazer cumprir decisão prolatada em caso concreto, bem como de preservar a competência desta Corte Superior, não sendo cabível como sucedâneo recursal. Precedente. 2. É inviável o agravo interno que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada (Súmula n. 182/STJ). 3. Agravo interno não conhecido. (AgInt na Rcl 31.647/DF, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/06/2016, DJe 30/06/2016);
AGRAVO REGIMENTAL NA RECLAMAÇÃO. 1. ART. 105, I, f, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO DO STJ NÃO CONSTATADO. 2. RESOLUÇÃO STJ N. 12/2009. DECISÃO IRRECORRÍVEL. ART. 6º DA RESOLUÇÃO. 3. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E IMPROVIDO. 1. A reclamação constitucional é um remédio destinado a preservar a competência do Superior tribunal de Justiça ou para garantir a autoridade de suas decisões, sempre que haja indevida usurpação por parte de outros órgãos de sua competência constitucional, nos termos do art. 105, I, f, da Constituição Federal. No caso, não há menção à existência de decisão prolatada por este tribunal Superior em relação ao específico caso dos autos e que tenha sido descumprida na origem. Em outras palavras, não se está diante de descumprimento de decisão emanada por esta Casa envolvendo as partes da demanda a que se refere o presente expediente. 2. De acordo com o disposto no art. 6º da Resolução n. 12/2009, deste tribunal, são irrecorríveis as decisões proferidas pelo Relator nas reclamações destinadas a solucionar divergência supostamente existente entre acórdão do Juizado Especial Estadual e a jurisprudência desta Casa Superior. 3. Agravo regimental parcialmente conhecido e, nessa extensão, improvido. (AgRg na Rcl 28.839/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/04/2016, DJe 19/04/2016).
Constata-se, dessa forma, que o aludido requisito não restou preenchido no caso em tela, porquanto a decisão que deu azo à presente reclamação é de lavra da 1ª Turma Recursal do Estado do Santa Catarina, afrontando, alegadamente, acórdão deste Tribunal. Por conseguinte, não compreende o descumprimento de um julgado deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região envolvendo as mesmas partes que figuram na reclamação.
No caso não há decisão vinculante da Corte Especial do TRF4 descumprida. Isso porque a arguição de inconstitucionalidade foi suscitada incidentalmente em outro processo judicial, com partes diversas, e não no processo originário dessa reclamação.
Por conseguinte, descabe a reclamação se não há decisão desta Corte a ser resguardada, nem cuja autoridade esteja sendo desrespeitada. O acórdão da Corte Especial deste Tribunal tido por desrespeitado revela-se apenas como precedente jurisprudencial de observância não obrigatória no âmbito dos Juizados, o que inviabiliza a pretensão deduzida.
Por fim, adoto como reforço de argumentação o parecer do Ministério Público Federal, exarado nos seguintes termos:
"(...)
Verifica-se a inadequação da via eleita no manejo da Reclamação com fulcro no art. 988 do CPC/2015. O instituto processual, previsto nos artigos 102, I, l, 103-A, §3º e 105, I, da CF/88 e regulamentado pelos artigos 988 e ss. do CPC/2015, presta-se a salvaguardar a competência ou garantir a autoridade das decisões dos Tribunais pátrios, bem como a garantir o respeito às decisões do STF em sede de controle concentrado e às sumulas vinculantes e precedentes exarados em casos repetitivos (IRDR) ou incidentes de assunção de competência.
Com efeito, a ação intentada não se ajusta a quaisquer das hipóteses constitucionais ou legais acima referidas.
O acordão tido por desrespeitado foi proferido no âmbito do rito ordinário, em processo de cognição da Justiça Federal, não sendo de observância obrigatória para os Juizados Especiais Federais da 4ª Região, que seguem regras de competência próprias, não encontrando nos Tribunais Regionais Federais a sua instância revisional. Observo, outrossim, que, adotado entendimento diverso, o TRF4 estará, por via transversa, exercendo controle de constitucionalidade sobre decisão de Turma Regional que aplicou paradigma da TNU, sem que disponha de competência constitucional ou legal para tanto.
Cabe ponderar que o art. 14 da Lei nº 10259/2001 prevê tão somente os pedidos de uniformização de jurisprudência para as Turmas Regionais de Uniformização e para a Turma Nacional de Uniformização, podendo a parte interessada provocar manifestação do STJ se a orientação da Turma de Uniformização contrariar suas súmulas ou jurisprudências dominantes em questões de direito material, ou interpor Recurso Extraordinário nas hipóteses de suposta inconstitucionalidade, não prevista a competência recursal dos Tribunais Regionais Federais.
A propósito, conforme reiteradas decisões em sede de mandado de segurança originário, essa Corte Especial firmou entendimento de que não cabe o controle jurisdicional, em relação aos feitos de competência dos Juizados Especiais Federais, pela Justiça Federal comum, conforme exemplifica o seguinte precedente, verbis:
Trata-se de mandado de segurança impetrado em face de ato da Presidência da Turma Regional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais da 4ª Região, que negou provimento a agravo interposto em face de decisão que não admitiu o Incidente de Uniformização. Vieram os autos conclusos para análise. É o sucinto relatório. Decido. Com efeito, o regime dos Juizados Especiais Federais segue rito próprio, não sendo esta Corte o órgão competente para apreciar ato jurisdicional do Presidente da Turma Regional. Nesse sentido, já se manifestou reiteradamente esta Corte. A propósito, confiram-se os seguintes julgados: PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DA TURMA RECURSAL. COMPETÊNCIA DA PRÓPRIA TURMA RECURSAL. 1. A Lei 10.259/01 não contempla qualquer hipótese de submissão, sob o aspecto jurisdicional, das decisões dos Juizados Especiais Federais ao Tribunal Regional Federal. 2. De acordo com a sistemática estabelecida pelas Leis 10.259/01 e 9.099/95, a qual tem fundamento no disposto no artigo 98 da Constituição Federal, os recursos interpostos contra as decisões dos Juízes de Juizados Especiais Federais serão julgados por Turmas formadas por Juízes de primeiro grau. 3. Para que a integridade do sistema dos Juizados Federais seja assegurada, o conhecimento do mandado de segurança que se preste como substitutivo recursal, ou mesmo para tutelar recurso regularmente interposto, só pode competir a órgão que integre o próprio sistema dos Juizados Especiais Federais. 4. Consoante orientação do Supremo Tribunal Federal, compete à Turma Recursal dos Juizados Especiais conhecer de mandados de segurança impetrados contra seus próprios atos (MS-QO 24691. Tribunal Pleno. Julgamento: 04/12/2003) 5. Agravo regimental improvido. (TRF4; AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA N.º 2008.04.00.038161-4,Turma Suplementar, Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, d.e.28/05/2009) AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA. DECISÃO PROFERIDA PELO JUIZADO ESPECIAL. COMPETÊNCIA. ÓRGÃO RECURSAL. Versando a matéria de fundo sobre a concessão de benefício previdenciário de auxílio-doença à Terceira Seção (5ª e 6ª Turma) compete o processamento e julgamento do feito, nos termos do art. 2º, § 2º, III, do RITRF/4, pouco importando a discussão pontual a respeito da prerrogativa institucional trazida no mandamus. Compete à Turma Recursal rever as decisões do Juizado Especial Federal. Agravo regimental improvido. (AGMS nº 2003.04.01.049144-3/RS, 5ª Turma, Rel.Juiz Federal Fernando Quadros da Silva, pub. DJU 10/03/2004) AGRAVO REGIMENTAL. COMPETÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA IMPETRADO CONTRA ATO JURISDICIONAL DO JUIZADO ESPECIAL. 1. Afastada a preliminar de nulidade absoluta, pois, versando a ação principal sobre direito previdenciário, resta estabelecida, em tese, competência da 3ª Seção para a apreciação da matéria. 2. É inadmissível mandado de segurança junto ao Tribunal Regional Federal para combater decisões de cunho jurisdicional dos Juizados Especiais e das Turmas Recursais Federais. Interpretação da regra da alínea "c" do inciso I do art. 108 em consonância com o disposto no inciso I do art. 98, ambos da Constituição Federal. (AGMS nº 2003.04.01.049143-1/RS, 5ª Turma, Rel. Juiz Fed. Ricardo Teixeira do Valle Pereira, pub. DJU 11/02/2004). QUESTÃO DE ORDEM. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA DECISÃO DE JUIZ FEDERAL DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. SUBSTITUTIVO RECURSAL. COMPETÊNCIA DA TURMA RECURSAL. 1. Compete à Turma Recursal do Juizado Especial Federal examinar o cabimento do mandado de segurança impetrado contra decisão de Juiz Federal no exercício da jurisdição do Juizado Especial Federal, quando substitutivo recursal. 2. Admitir a competência do Tribunal Regional Federal para processar e julgar os mandados de segurança nesses casos implicaria transformar a Corte em instância ordinária para a reapreciação de decisões interlocutórias proferidas pelos Juizados Especiais, o que afrontaria os princípios insculpidos nas Leis nºs 9.099/1995 e 10.259/2001. 3. Questão de ordem acolhida no sentido de declinar da competência para a Turma Recursal do Juizado Especial Federal do Rio Grande do Sul. (QOMS nº 2004.04.01.003399-8/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Fed. Nylson Paim de Abreu, pub. DJU 03/03/2004). QUESTÃO DE ORDEM. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA DECISÃO DE JUIZ FEDERAL DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. SUBSTITUTIVO RECURSAL. COMPETÊNCIA DA TURMA RECURSAL. 1. Compete à Turma Recursal do Juizado Especial Federal examinar o cabimento do mandado de segurança impetrado contra decisão de Juiz Federal no exercício da jurisdição do Juizado Especial Federal, quando substitutivo recursal. 2. Admitir a competência do Tribunal Regional Federal para processar e julgar os mandados de segurança interpostos contra decisões de cunho jurisdicional implicaria transformar a Corte em instância ordinária para a reapreciação de decisões proferidas pelos Juizados Especiais, o que afrontaria os princípios insculpidos nas Leis nºs 9.099/1995 e 10.259/2001. 3. Questão de ordem acolhida no sentido de declinar da competência para a Turma Recursal do Juizado Especial Federal do Paraná. (Mandado de Segurança n.º 5024872-83.2016.4.04.0000/PR; Relator: Des.Fed. João Batista Pinto Silveira; julg. em 17/08/2016) Ante o exposto, com fulcro no art. 223 do Regimento Interno da Corte, não conheço do mandado de segurança. Intimem-se. (TRF4 5055079-65.2016.404.0000, CORTE ESPECIAL, Relator CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, juntado aos autos em 09/02/2017) (grifou-se)
A reclamação é instituto processual vocacionado a garantir que o Tribunal possa cassar decisões que afrontem sua competência ou a autoridade de suas decisões. Ou seja, é um mecanismo de defesa do Tribunal para que suas decisões não sejam desrespeitadas ou que sua competência não seja usurpada, o que não ocorreu no caso presente, já que não há decisão vinculante da Corte Especial do TRF4 descumprida. Como já referido, a arguição de inconstitucionalidade suscitada teve caráter incidental em outro processo judicial, com outras partes, e não no feito originário dessa Reclamação. Assim, o julgado evocado constitui-se tão somente em precedente de observância não obrigatória no âmbito dos Juizados, o que inviabiliza a pretensão deduzida.
Por fim, a literalidade do art. 988, III, do CPC/2015 assenta que a Reclamação tutela a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do STF em controle concentrado de constitucionalidade, não havendo a previsão de extensão do instituto aos incidentes de arguição de inconstitucionalidade julgados pelos demais Tribunais.
Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL opina seja por Vossas Excelências extinto o processo sem resolução do mérito, ante a inadequação da via eleita."
Ante o exposto, voto por deferir a assistência judiciária gratuita à reclamante e por não conhecer da presente reclamação, em face da inadequação da via escolhida, nos termos da fundamentação retro.
Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8913071v2 e, se solicitado, do código CRC B11165C5. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz |
| Data e Hora: | 27/04/2017 18:20 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/04/2017
RECLAMAÇÃO (CORTE ESPECIAL) Nº 5007531-10.2017.4.04.0000/SC
ORIGEM: SC 50150416120154047205
RELATOR | : | Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ |
PRESIDENTE | : | LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
PROCURADOR | : | Dr. FABIO BENTO ALVES |
RECLAMANTE | : | SONIA REGINA FORMAGI |
ADVOGADO | : | Silvio Schmidt |
BENEFICIÁRIO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/04/2017, na seqüência 6, disponibilizada no DE de 10/04/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) CORTE ESPECIAL, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A CORTE ESPECIAL, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DEFERIR A ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA À RECLAMANTE E POR NÃO CONHECER DA PRESENTE RECLAMAÇÃO, EM FACE DA INADEQUAÇÃO DA VIA ESCOLHIDA, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO RETRO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ |
: | Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS | |
: | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal RÔMULO PIZZOLATTI | |
: | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA | |
: | Des. Federal MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE | |
: | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA | |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO | |
: | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER | |
: | Des. Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE | |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
AUSENTE(S) | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
: | Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR |
Jaqueline Paiva Nunes Goron
Secretária
| Documento eletrônico assinado por Jaqueline Paiva Nunes Goron, Secretária, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8965633v1 e, se solicitado, do código CRC 862E5638. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Jaqueline Paiva Nunes Goron |
| Data e Hora: | 02/05/2017 16:44 |
