Apelação Cível Nº 5005781-44.2016.4.04.7101/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
APELANTE: FERNANDO BISPO DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO: JOSE LUIZ DE SEIXAS (OAB RS084459)
APELANTE: MARIA BEATRIZ DO AMARAL VIEIRA (AUTOR)
ADVOGADO: JOSE LUIZ DE SEIXAS (OAB RS084459)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação de usucapião extraordinária ajuizada por FERNANDO BISPO DA SILVA e MARIA BEATRIZ DO AMARAL VIEIRA , visando ao reconhecimento do domínio sobre o seguinte imóvel:
"(...) um apartamento sob número 901 (novecentos e um), situado no 9º pavimento, do Edifício Presidente Vargas, situado à rua Fernando Duprat da Silva, número 113 (cento e treze), na zona urbana desta cidade, dito apartamento fazendo frente para à Rua General Bacelar, constituído de vestíbulo, sala, dois dormitórios, cozinha, banheiro, circulação e área de serviço com tanque, com a área privativa de 80,25m2 (oitenta metros e vinte e cinco decímetros quadrados), área de uso comum de 17,13m2 (dezessete metros e treze decímetros quadrados), e área construída de 97,38m2 (noventa e sete metros e trinta e oito decímetros quadrados), a esta unidade corresponde uma fração ideal de 0,0259295 nas coisas de uso comum e fim proveitoso do edifício e da área do terreno, que está localizado na rua Dr. Fernando Duprat da Silva, esquina com rua General Bacelar, medindo pela face da rua General Bacelar, 13,00m (treze metros), e pela face da rua Fernando Duprat da Silva, 30,00m (trinta metros), ou seja, a área superficial de 390,00m2 (trezentos e noventa metros quadrados), e que se divide ou confronta ao norte com a rua Gal. Bacelar, ao sul com imóvel de sucessores de Marcos José Corcione, a leste com imóvel de David e Elik Wolf, e a oeste com a mencionada rua Fernando Duprat da Silva, conforme Transcrição 22.351, à fls. 233, do Livro 3-V." (Evento 51).
Esclarecem que "moram no local há mais de quinze anos, mantendo o bem em bom estado de conservação, e pagando em dia tributos e taxas de fornecimento de energia, cuja primeira solicitação foi feita em 1998. Afirmaram que em 27/08/1980, o então INSTITUTO DE ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA DA PREVIDÊNCIA E ASSISTÊNCIA SOCIAL (IAPAS), através do Contrato Particular de Promessa de Compra e Venda (Promitente Vendedor) e de outro ELY DA COSTA GONÇALVES, inscrito no CPF sob o nº 007.124.260-00 e sua esposa ELY ANDRADES GONÇALVES, inscrita no CPF sob o nº 248.055.480-53 (Promitentes Compradores), concluíram a transação desse apartamento, pelo Banco Nacional da Habitação. Em 01/10/1997, os Requerentes, por Contrato Particular de Compra e Venda, adquiriram o aludido imóvel do Sr. VILMAR BENTO BARROS, inscrito no CPF sob o nº 202.818.970-34 e sua esposa TRIANA RODRIGUES DIAS, inscrita no CPF sob o nº 178.875.500-68, quando estes detinham a posse de forma contínua e pacifica. Alegaram que residem no apartamento 901 desde o ano em que este imóvel foi adquirido onerosamente, permanecendo na mesma situação até os dias de hoje. Ressaltaram que o financiamento imobiliário desse apartamento de nº 901 foi quitado em 30/06/1993, de acordo com a folha 123, da 19.300.12 – Seção de Administração do Patrimônio Imobiliário, datado de 22/04/1999" (Evento 51).
Devidamente instruído o feito, seguiu-se sentença de improcedência, nos termos do seguinte dispositivo:
"DISPOSITIVO
Ante o exposto, rejeito as preliminares e julgo improcedente o pedido formulado na inicial, resolvendo o mérito do processo, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Por sucumbente, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da ré, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Contudo, a exigibilidade da verba fica suspensa porque os autores litigam ao abrigo da assistência judiciária gratuita.
As partes são isentas de custas, nos termos do artigo 4º, incisos I e II, da Lei nº 9.289/96.
Após o trânsito em julgado, arquivem-se estes autos eletrônicos, com baixa.
Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Rio Grande, data do evento eletrônico" (Evento 51).
Apelou a autora, sustentando, em síntese, que o imóvel objeto da lide foi desafetado, pela perda do interesse público. Assim, não havendo mais destinação pública, e por ter sido colocado à venda por meio do processo de Concorrência nº 01/1980, realizado em 18/06 do mesmo ano, além de ter todo seu valor pago, conforme se comprova pela quitação - a instituição deixou de ter interesse no bem. Assim, deve-se considerar que não há motivos suficientes para que não se reconheça a prescrição aquisitiva do apartamento residencial dos apelantes, em razão da falta de interesse público sobre o bem.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
A Procuradoria Regional da República não juntou manifestação de mérito.
É o relatório.
VOTO
Trata-se de ação de usucapião ajuizada por FERNANDO BISPO DA SILVA e MARIA BEATRIZ DO AMARAL VIEIRA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, visando à aquisição de propriedade do apartamento número 901 (novecentos e um), situado no 9º pavimento do Edifício Presidente Vargas, situado à rua Fernando Duprat da Silva, número 113 (cento e treze), nesta cidade de Rio Grande.
Os autores afirmam deter a posse de forma mansa e pacífica, contínua, sem oposição e com “animus domini” do bem desde 1997, quando o adquiriram do Sr. Vilmar Bento Barros e sua esposa, Triana Rodrigues Dias.
A sentença julgou improcedente o pedido, não reconhecendo a alegada aquisição.
Assim ressaltou o Julgador:
"FUNDAMENTAÇÃO
Preliminares
Inadequação do procedimento
O réu afirma que o procedimento escolhido pelos autores é inadequado, na medida em que é vedada a usucapião de bens públicos.
Acontece que tal matéria, suscitada como prefacial, diz respeito ao mérito da demanda, e como tal será analisada.
Rejeito, portanto, a preliminar.
Falta de interesse de agir
Alegou o INSS que "não houve qualquer requerimento administrativo no sentido de transferência do imóvel em questão", devendo o feito ser extinto sem resolução de mérito.
Não assiste razão ao demandado, já que este contestou o mérito da demanda.
Entendo que, tendo apresentado defesa de mérito, restou demonstrada a resistência do réu à pretensão dos requerentes, estando caracterizado o interesse da parte. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CONTESTAÇÃO DO MÉRITO. INTERESSE DE AGIR. JULGAMENTO CITRA PETITA. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.1. Resta configurado o interesse de agir quando, embora a parte autora não tenha formulado prévio requerimento administrativo, o INSS contesta o mérito da ação.2. Caracteriza-se cerceamento de defesa a não produção de perícia quando esta se traduz no único meio hábil a comprovar a pretensão deduzida pela parte autora, qual seja o reconhecimento de atividade urbana desenvolvida em condições especiais.3. A Sentença proferida citra petita, padece de error in procedendo. Se não suprida a falha mediante embargos de declaração, o caso é de anulação pelo tribunal, com devolução ao órgão a quo, para novo pronunciamento.4. Anulada a sentença com o retorno dos autos à vara de origem para restabelecimento da dilação probatória e novo julgamento do mérito da lide. (TRF4 5000098-21.2015.404.7211, QUINTA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 22/08/2016)
TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. IMPOSTO DE RENDA. PROVENTOS DE APOSENTADORIA. ALIENAÇÃO MENTAL. ISENÇÃO. LEI Nº 7.713/1988.1. Afastada a preliminar de ausência de interesse de agir, porquanto a União contestou o mérito da demanda, circunstância que demonstra sua resistência/oposição à pretensão da parte-autora, sendo o bastante para caracterizar o interesse da parte.2. A Lei n 7.713/88 instituiu a isenção, ao portador de doença grave, do imposto de renda retido na fonte sobre as parcelas recebidas a título de aposentadoria/proventos de reforma.3. A finalidade da norma que requer laudo pericial emitido por serviço médico oficial é prestigiar a presunção de veracidade conferida aos atos administrativos emanados de agente público. Entretanto, não se trata de prova tarifada, pois, a despeito de a previsão legal considerar suficiente o laudo emitido por serviço médico oficial, não se pode reputá-la indispensável.4. Hipótese em que, na via judicial, restou demonstrada a doença por outros meios (perícia médica e certidão de interdição). (TRF4, AC 5018504-06.2013.404.7100, PRIMEIRA TURMA, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 25/11/2015)
Rejeito, assim, as preliminares ventiladas.
Mérito
O documento acostado no evento 30 (MATRIMÓVEL2) demonstra que o imóvel objeto do presente feito é de propriedade do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
A pretensão dos autores, portanto, encontra óbice expresso na Constituição Federal, bem como na legislação infraconstitucional:
"Art. 183, §3º, CF - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião"
"Art. 191, parágrafo único, CF - "Os bens públicos não serão adquiridos por usucapião"
"Art. 102 , CCB - Os bens públicos não estão sujeitos a usucapião"
Nesse sentido, a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. USUCAPIÃO. BEM PÚBLICO. INVIABILIDADE. ORDEM DE DESOCUPAÇÃO. DESFAZIMENTO DE EDIFICAÇÕES. JULGAMENTO EXTRA PETITA. QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA. 1. De acordo com os documentos juntados aos autos, evidencia-se que o bem visado pela parte autora é de propriedade do Poder Público, mais precisamente do Instituto Nacional do Seguro Social, autarquia federal (pessoa jurídica de direito público integrante da Administração Pública indireta federal). 2. Assim, tratando-se de bem público, de propriedade do INSS, inviável a sua aquisição por usucapião, por força, sobretudo, do disposto nos artigos 183, §3º, e 191, parágrafo único, ambos da Carta Política. 3. Contudo, a ordem de desocupação do imóvel e de desfazimento de edificações (sob pena de incidência de multa diária) extrapola os limites da lide, posto que, nestes autos, em momento algum houve requerimento da autarquia federal no sentido da referida determinação. 4. É de ser reformada a sentença nesse específico ponto, afastando a determinação de desocupação do imóvel e de desfazimento de edificações (e, consequentemente, da multa diária fixada), pois compete ao proprietário (no caso, o INSS) intentar ação própria para tanto, com observância do devido processo legal. 5. A ausência de pedido expresso da recorrente não inviabiliza a destacada reforma da sentença, haja vista que, inexistindo contraditório e ampla defesa sobre a temática, na origem, prejudicados se encontram os ditames efetivos do Processo Civil cooperativo, fazendo com que o desrespeito à correlação revista a natureza de questão de ordem pública. 6. Apelação parcialmente provida.
(AC 0009817-52.2004.404.7000, Terceira Turma, Rel. Des. Federal Fernando Quadros da Silva, D.E. 28/06/2011)
AGRAVO. DECISÃO MONOCRÁTICA. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. INAPLICABILIDADE. IMÓVEL DE PROPRIEDADE DO INSS. "VILA DOMITILA-GLEBA JUVEVÊ". 1. O usucapião extraordinário está previsto nos arts. 183 e 191 da CRFB/88. Entretanto, é inaplicável aos imóveis públicos, cuja propriedade é imprescritível, nos moldes do art. 102 do NCC/02 e do entendimento sumulado sob o nº 340 pelo Supremo Tribunal Federal. 2. Reconhecido que o INSS é o legítimo proprietário do imóvel denominado 'Vila Domitila-Gleba Juvevê', não há como reconhecer o pedido de usucapião de um bem público, sob pena de ofensa à Constituição Federal. 3. A decisão agravada está devidamente fundamentada e encontra-se na esteira do entendimento desta Corte. Ante a ausência de elementos que possam modificá-la, mantenho a decisão pelos seus próprios fundamentos. (TRF4, APELREEX 5011187-68.2010.4.04.7000, TERCEIRA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 04/06/2013)
CONSTITUCIONAL. CIVIL. USUCAPIÃO. IMÓVEL DA AUTARQUIA PREVIDENCIÁRIA. REGISTRO PÚBLICO. 1. A transmissão da propriedade imóvel é feita pela transcrição no Registro de Imóveis competente. 2. O imóvel a ser usucapido está transcrito no Registro de Imóveis em nome da autarquia previdenciária. 3. Os bens das autarquias são públicos e, por isso, não podem ser adquiridos por meio da prescrição aquisitiva. (TRF4, AC 94.04.54250-4, TERCEIRA TURMA, Relatora LUIZA DIAS CASSALES, DJ 10/06/1998)
Certo que, na hipótese, a posse é irregular, sendo que o decurso do tempo, ainda que tenha havido omissão por parte do INSS ou mesmo do promitentes compradores do imóvel (eis que a alienação do imóvel não chegou a se perfectibilizar, como demonstram os documentos acostados no evento 43), não confere direito de aquisição originária da propriedade pela usucapião, em virtude da natureza pública do bem imóvel em litígio, o qual não é passível de prescrição aquisitiva por usucapião.
Assim, é de ser julgado improcedente o pedido formulado na inicial." (Evento 51).
Deve ser mantida integralmente a decisão combatida.
No presente caso, restou devidamente demonstrado - pelo documento inserto no Evento 30 (MATRIMÓVEL2), que o imóvel é de propriedade do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS:
Em relação à alegação de desafetação do imóvel, que não teria mais destinação pública por ter sido colocado à venda através do processo de Concorrência nº 01/1980, realizado em 18/06 do mesmo ano, com quitação do valor pago - tenho que a mesma não restou comprovada, não ensejando o reconhecimento da desafetação do bem.
Com efeito, a Advocacia-Geral da União chama atenção para o fato de que, conforme informações prestadas pela Chefe da Seção de Logística, Licitações, Contratos e Engenharia, da Gerência Executiva do INSS em Pelotas/RS, existe processo administrativo em nome de Ely Gonçalves, que firmou contrato de promessa de compra e venda com o IAPAS (Evento 15 - INF2, Evento 15 - CONTR3, Evento 15 - CONTR4). Porém, segundo informações, no r. processo administrativo constam alguns documentos que noticiam a quitação do imóvel - embora nem todos sejam documentos firmados.
Outrossim, ainda há notícia de recibo de sinal e sub-rogação e transferência, cedendo os direitos sobre o contrato de promessa de compra e venda para terceiros. Contudo, tal cessão foi analisada e não autorizada pela Administração, pois estaria em desacordo com o previsto no contrato de promessa de compra e venda (Evento 82).
Por derradeiro, a Logística-GEXPEL informou que não houve qualquer requerimento administrativo no sentido da transferência do imóvel em questão (Evento 82 e documentos anexos à contestação).
Assim, não restou comprovado, extreme de dúvidas, que o saldo devedor do financiamento do imóvel foi quitado ou que houve regular cessão e transferência do imóvel.
Nessa toada, o problema da regularização formal do título de propriedade do bem imóvel não se resolve pelo simples ajuizamento de uma ação de usucapião.
Sobressai, portanto, o entendimento de que, em se tratando de bem público, inviável sua aquisição por usucapião, haja vista a existência de vedação constitucional nesse sentido (arts. 183, §3º, e 191, parágrafo único, ambos da Constituição Federal, e art. 102 do CC). No mesmo sentido, a Súmula nº 340 do e. STF.
Por outro lado, consoante firme posição jurisprudencial, a posse de bens públicos, inclusive dominicais, independe da demonstração pelo ente público do poder de fato sobre a coisa.
Nesse sentido, os argumentos do voto condutor proferido no Recurso Especial 780.401/DF:
"Quando se trata de bens públicos, não se pode exigir do Poder Público que demonstre o poder físico sobre o imóvel, para que se caracterize a posse sobre o bem. Esse procedimento é incompatível com a amplitude das terras públicas, notadamente quando se refere a bens de uso comum e dominicais. A posse do Estado sobre seus bens deve ser considerada permanente, independendo de atos materiais de ocupação, sob pena de tornar inviável, sempre, conferir aos bens do Estado a proteção possessória que, paralelamente a medidas administrativas, é-lhe facultada pelo art. 20 do DL 9.760⁄46.
Disso decorre que a ocupação do bens públicos por particulares não implica, tão somente, um ato contrário à propriedade do Estado, mas um verdadeiro ato de esbulho à posse da Administração sobre esses bens. A intervenção de terceiro na modalidade de Oposição em julgamento, portanto, não tem como fundamento o domínio, este alegado incidentalmente, mas a posse do Estado sobre a área, sendo incabível afastá-la com fundamento na regra do art. 923 do CPC. Não há, aqui, uma ação petitória opondo-se a uma pretensão possessória. Há o conflito entre posses, e a necessidade de decidi-lo tomando-se como parâmetro a posse mais antiga." (REsp 780.401/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/09/2009, DJe 21/09/2009)
Desse modo, a ocupação ou uso de imóvel sem assentimento do ente público (art.71, Dec-lei 9.760/46), não passa de mera detenção:
"A ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por acessões e benfeitorias" (Súmula 619).
No mesmo sentido, os seguintes precedentes:
Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Manutenção de posse. Terra pública. Imóvel pertencente à Terracap. 1. O posicionamento do Tribunal está em perfeita harmonia com a jurisprudência da Corte, consolidada no sentido de que "a ocupação de bem público, ainda que dominical, não passa de mera detenção, caso em que se afigura inadmissível o pleito de proteção possessória contra o órgão público. Não induzem posse os atos de mera tolerância (art. 497 do CC/1916)" (REsp nº 146.367/DF, Quarta Turma, Relator o Ministro Barros Monteiro, DJ de 14/3/05). 2. Agravo regimental desprovido. (AgRg no Ag 648.180/DF, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/02/2007, DJ 14/05/2007, p. 280)
PROCESSO CIVIL - ADMINISTRATIVO - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - IMÓVEL FUNCIONAL - OCUPAÇÃO IRREGULAR - INEXISTÊNCIA DE POSSE - DIREITO DE RETENÇÃO E À INDENIZAÇÃO NÃO CONFIGURADO - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - EFEITO INFRINGENTE - VEDAÇÃO. 1. Embargos de declaração com nítida pretensão infringente. Acórdão que decidiu motivadamente a decisão tomada. 2. Posse é o direito reconhecido a quem se comporta como proprietário. Posse e propriedade, portanto, são institutos que caminham juntos, não havendo de se reconhecer a posse a quem, por proibição legal, não possa ser proprietário ou não possa gozar de qualquer dos poderes inerentes à propriedade. 3. A ocupação de área pública, quando irregular, não pode ser reconhecida como posse, mas como mera detenção. 4. Se o direito de retenção ou de indenização pelas acessões realizadas depende da configuração da posse, não se pode, ante a consideração da inexistência desta, admitir o surgimento daqueles direitos, do que resulta na inexistência do dever de se indenizar as benfeitorias úteis e necessárias. 5. Recurso não provido. (REsp 863.939/RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/11/2008, DJe 24/11/2008)
EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. PARQUE NACIONAL DA ILHA GRANDE. UNIDADE DE CONSERVAÇÃO. INDENIZAÇÃO. DESCABIMENTO. IMPOSSIBILIDADE JURIDICA DO PEDIDO. TERRAS DE DOMÍNIO DA UNIÃO. 1. Somente o apossamento de imóvel sob domínio do particular justifica a indenização por desapropriação indireta. 2. Não há dúvida sobre o domínio, porquanto ele é pertencente à União, que evidentemente não precisa indenizar a si mesma. 3. Seria impossível ao IBAMA ou à própria UNIÃO, desapropriar, mesmo que indiretamente, uma área já pertencente ao seu domínio. 4. Destarte, em qualquer demanda situada nesses termos, fica evidente a impossibilidade jurídica do pedido, a ensejar a extinção do feito sem apreciação do mérito. 5. Tratando-se de terra pública irregularmente ocupada, irrelevante falar-se em posse de boa ou má-fé, porquanto o poder de fato que sobre ela se exerce caracteriza mera detenção ou posse viciada que, ainda quando tolerada pela Administração Pública, não gera proteção jurídica. Dessa feita, não há falar em direito de retenção ou mesmo no direito advindo da necessidade de se indenizar eventuais benfeitorias. (TRF4, AC 0001181-51.2005.404.7004, Quarta Turma, Relatora Marga Inge Barth Tessler, D.E. 10/05/2010)
Dos honorários advocatícios
O atual CPC inovou de forma significativa com relação aos honorários advocatícios, buscando valorizar a atuação profissional dos advogados, especialmente pela caracterização como verba de natureza alimentar (§ 14, art. 85, CPC) e do caráter remuneratório aos profissionais da advocacia.
Cabe ainda destacar que o atual diploma processual estabeleceu critérios objetivos para fixar a verba honorária que buscam valorizar a advocacia, evitando o arbitramento de honorários em percentual ou valor aviltante que, ao final, poderia acarretar verdadeiro desrespeito à profissão. Ao mesmo tempo, objetiva desestimular os recursos protelatórios pela incidência de majoração da verba em cada instância recursal.
A partir dessas considerações, tenho que os honorários advocatícios devidos à taxa de 10% sobre o valor da causa foram adequadamente fixados, pois conforme previsto no art. 85 do novo CPC.
De qualquer maneira, levando em conta o não provimento do recurso, associado ao trabalho adicional realizado nesta Instância, no sentido de manter a sentença, a verba honorária deve ser majorada em favor do patrono da parte vencedora.
Assim sendo, em atenção ao disposto no art. 85, § 2º c/c § 11, do novo CPC, majoro a verba honorária de 10% para 12% (doze por cento) incidentes sobre o valor da causa, todavia mantenho a suspensão de sua exigibilidade em face da concessão do benefício da AJG.
Da conclusão
Mantida integralmente a sentença. Majorados os honorários advocatícios.
Do dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001933735v18 e do código CRC 9f8b4bcc.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5005781-44.2016.4.04.7101/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
APELANTE: FERNANDO BISPO DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO: JOSE LUIZ DE SEIXAS (OAB RS084459)
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ADVOGADO: JOSE LUIZ DE SEIXAS (OAB RS084459)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
REINTEGRAÇÃO DE POSSE. IMÓVEL PÚBLICO. USUCAPIÃO. INVIABILIDADE. ATOS MATERIAIS DE OCUPAÇÃO. IRRELEVÂNCIA. MERA DETENÇÃO.
I. Em se tratando de bem público, inviável sua aquisição por usucapião, haja vista a existência de vedação constitucional (art. 183, §3º, da Constituição Federal).
II. A proteção possessória a que faz jus a União no caso concreto decorre do domínio sobre o imóvel; os entes públicos, dada a sua natureza, merecem proteção possessória muito embora não exerçam, em todas as situações, atos materiais de ocupação.
III. A ocupação ou uso de imóvel sem assentimento do ente público (art.71, Dec-lei 9.760/46), não passa de mera detenção:
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 05 de outubro de 2021.
Documento eletrônico assinado por CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001933736v11 e do código CRC e49b7529.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 27/09/2021 A 05/10/2021
Apelação Cível Nº 5005781-44.2016.4.04.7101/RS
RELATORA: Juíza Federal CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES
PRESIDENTE: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PROCURADOR(A): THAMEA DANELON VALIENGO
APELANTE: FERNANDO BISPO DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO: JOSE LUIZ DE SEIXAS (OAB RS084459)
APELANTE: MARIA BEATRIZ DO AMARAL VIEIRA (AUTOR)
ADVOGADO: JOSE LUIZ DE SEIXAS (OAB RS084459)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 27/09/2021, às 00:00, a 05/10/2021, às 14:00, na sequência 312, disponibilizada no DE de 15/09/2021.
Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES
Votante: Juíza Federal CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES
Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO
Secretário
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