Apelação Cível Nº 5052231-81.2016.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: TEREZA CLASEM DE ANDRADE
ADVOGADO: GEONIR EDVARD FONSECA VINCENSI
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por TEREZA CLASEM DE ANDRADE em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade.
Após regular processamento, o MM. Juízo a quo julgou procedente o pedido, para o fim de declarar o direito da autora ao benefício e condenar a autarquia à implantação do benefício de aposentadoria por idade no valor de um salário mínimo a ser pago mensalmente, desde a data do requerimento administrativo (2-4-2015), condenando-a ainda ao pagamento das prestações vencidas desde então, com fulcro no artigo 487, I, do Código de Processo Civil. Determinou o cumprimento imediato da sentença no tocante à implantação do benefício da parte a autora, a ser efetivada em 45 dias da intimação da sentença, e estabeleceu os critérios de juros e correção monetária. Condenou o réu ao pagamento das custas processuais e de honorários ao procurador da autora, os quais foram fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas. Não submeteu a sentença ao reexame necessário, nos termos do art. 496, §3º, do Código de Processo Civil.
O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS apela, sustentando, preliminarmente, a existência de coisa julgada, uma vez que a questão referente ao benefício da parte autora foi objeto da decisão proferida no processo nº 0000447-25.2011.8.16.0149, reformada pelo Tribunal para julgar improcedente o pedido de aposentadoria rural, em razão de inexistência de provas do trabalho rural. No mérito, alega que não há qualquer início de prova material que demonstre o trabalho rural da apelada durante todo o período de carência. Refere que as provas acostadas ao processo são de cunho meramente declaratório. Assevera que o marido da apelada, falecido em 27-3-1982, sempre trabalhou em meio urbano e instituiu pensão por morte como comerciário para a autora. Argumenta que a autora declarou, em entrevista rural, que estava afastada do meio rural há aproximadamente 07 (sete) anos. Defende que, conforme o art. 3º, II, da Lei 11.718/08, a parte apelada deveria realizar quatro contribuições por ano, a partir de 2011, o que não restou comprovado. Informa que adotou as providências necessárias para o cumprimento da tutela específica concedida na sentença. Postula o provimento do recurso.
Com contrarrazões, subiram os autos a essa Corte.
É o relatório.
Documento eletrônico assinado por FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000502058v3 e do código CRC 7a34b27d.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5052231-81.2016.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: TEREZA CLASEM DE ANDRADE
ADVOGADO: GEONIR EDVARD FONSECA VINCENSI
VOTO
DIREITO INTERTEMPORAL
Inicialmente, cumpre o registro de que a sentença recorrida foi publicada em data posterior a 18-3-2016, quando passou a vigorar o novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16-3-2015), consoante decidiu o Plenário do STJ.
REMESSA EX OFFICIO
Nos termos do artigo 496 do CPC/2015, está sujeita à remessa ex officio a sentença prolatada contra as pessoas jurídicas de direito público nele nominadas – à exceção dos casos em que, por simples cálculos aritméticos, seja possível concluir que o montante da condenação ou o proveito econômico obtido na causa é inferior a 1.000 salários mínimos.
Assim estabelecidos os parâmetros da remessa ex officio, registro que o artigo 29, § 2º, da Lei nº 8.213/91 dispõe que o valor do salário de benefício não será superior ao limite máximo do salário de contribuição na data de início do benefício, e que a Portaria Interministerial nº 01, de 8-1-2016, dos Ministérios da Previdência Social e da Fazenda, estabelece que a partir de 1-1-2016 o valor máximo do teto dos salários de benefícios pagos pelo INSS é de R$ 5.189,82 (cinco mil, cento e oitenta e nove reais e oitenta e dois centavos). Decorrentemente, por meio de simples cálculos aritméticos é possível concluir que, mesmo na hipótese de concessão de aposentadoria com RMI estabelecida no teto máximo, com o pagamento das parcelas em atraso nos últimos 05 anos acrescidas de correção monetária e juros de mora (artigo 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91), o valor da condenação jamais excederá o montante de 1.000 (mil) salários mínimos.
Logo, não se trata de hipótese de sujeição da sentença à remessa ex officio.
PRELIMINAR
COISA JULGADA
Primeiramente, deve ser afastada a aventada existência de coisa julgada, isso porque, claramente, o julgamento proferido nos autos do processo nº 0000447-25.2011.8.16.0149 fundamenta-se na ausência de início de prova material e impossibilidade de utilização da prova em nome do cônjuge, o que atrai a hipótese de flexibilização, a teor do que estabelece o precedente do STJ REsp 1352721, representativo da controvérsia.
No mais, a presente lide pretende a comprovação de outro período aquisitivo, não estando comprovada a ocorrência de coisa julgada.
CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A APOSENTADORIA RURAL POR IDADE
A apreciação de pretensão de concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (inciso VII do artigo 11 da Lei nº 8.213/91), deve ser feita à luz do disposto nos artigos 48, §§ 1º e 2º, 25, II, 26, III e 39, I, da Lei nº 8.213/91. Assim, necessária a comprovação do implemento da idade mínima (60 anos para o homem e de 55 anos para a mulher), e do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, sendo dispensável o recolhimento de contribuições.
Não se pode olvidar, outrossim, que artigo 143 da Lei nº 8.213/91, tratando genericamente do trabalhador rural que passou a ser enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social ( na forma da alínea a do inciso I, ou do inciso IV ou VII do artigo 11), assegurou-lhe o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de sua vigência, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência exigida. Complementando o artigo 143 na disciplina da transição de regimes, o artigo 142 da Lei nº 8.213/91 estabeleceu que para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial deve obedecer a uma tabela que prevê prazos menores no período de 1991 a 2010.
Quanto ao ano a ser utilizado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei nº 8.213/91, como regra deverá ser aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, neste caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, artigo 5º, XXXVI, e Lei de Benefícios, artigo 102, §1º).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei nº 8.213/91. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessária ao deferimento do benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, devendo ser verificado o implemento do requisito tempo equivalente à carência progressivamente, nos anos subsequentes ao implemento do requisito etário, de acordo com a tabela do mencionado artigo 142 da Lei de Benefícios.
Deve ser observado que nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-8-1994, data da publicação da Medida Provisória nº 598, que alterou o artigo 143 da Lei de Benefícios, (posteriormente convertida na Lei nº 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do artigo 142 da Lei nº 8.213/91.
A disposição contida no artigo 143 da Lei nº 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no artigo 102, § 1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria rural por idade será devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, mas caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STJ, REsp nº 544.327/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, DJ de 17-11-2003; STJ, REsp nº 338.435/SP, Rel. Min. Vicente Leal, 6ª Turma, DJ de 28-10-2002; STJ, REsp nº 225.719/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJ de 29-5-2000).
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporâneo do período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida, em princípio, exclusivamente, a teor do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, e Súmula 149 do STJ. Cabe salientar que embora o artigo 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo.
Não se exige, por outro lado, prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural. Com efeito, como o §1º do artigo 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", no mais das vezes os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta exercida, normalmente, no caso dos trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Nos casos dos trabalhadores rurais conhecidos como bóias-frias, diaristas ou volantes especificamente, considerando a informalidade com que é exercida a profissão no meio rural, que dificulta a comprovação documental da atividade, o entendimento pacífico desta Corte é no sentido de que a exigência de início de prova material deve ser abrandada, permitindo-se, em algumas situações extremas, até mesmo a prova exclusivamente testemunhal. A propósito, nesse sentido manifestou-se o Min. Luiz Vicente Cernicchiaro por ocasião do julgamento do RESP nº 72.216/SP, (DJU de 27-11-1995), afirmando que o Poder Judiciário só se justifica se visar à verdade real. Corolário do princípio moderno de acesso ao Judiciário, qualquer meio de prova é útil, salvo se receber o repúdio do Direito. A prova testemunhal é admitida. Não pode, por isso, ainda que a lei o faça, ser excluída, notadamente quando for a única hábil a evidenciar o fato. Os negócios de vulto, de regra, são reduzidos a escrito. Outra, porém, a regra geral quando os contratantes são pessoas simples, não afeitas às formalidades do Direito. Tal acontece com os chamados 'bóias-frias', muitas vezes impossibilitados, dada à situação econômica, de impor o registro em carteira. Impor outro meio de prova, quando a única for a testemunhal, restringir-se-á a busca da verdade real, o que não é inerente do Direito Justo.
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do artigo 11, VII, da Lei nº 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural . Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, b, do Decreto-Lei nº 1.166, de 15-04-71.
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não serve para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, porquanto, de acordo com o que dispõe o inciso VII do artigo 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 16 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. Ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também desimportar a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
Cumpre salientar também que muitas vezes a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Quanto a isso deve ser dito que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e em juízo, deve-se ficar com estas últimas, produzidas que são com todas as cautelas legais, garantido o contraditório. Não se trata aqui de imputar inverídicas as informações tomadas pela Seguradora, mas de prestigiar a imparcialidade que caracteriza a prova produzida no curso do processo jurisdicional. Dispondo de elementos que possam obstaculizar a pretensão da parte autora, cabe ao INSS judicializar a prova administrativa, de forma a emprestar-lhe maior valor probante.
Registro, por fim, que em se tratando de aposentadoria por idade rural, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei nº 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições. Quanto à Carteira de Identificação e Contribuição, prevista no artigo 106 da Lei nº 8.213/91 como necessária à comprovação do exercício de atividade rural a partir de 16-04-94, trata-se de documento voltado principalmente à esfera administrativa, sendo instrumento que visa a facilitar futura concessão de benefício ou reconhecimento de tempo de serviço e cuja expedição, via de regra, dá-se após a comprovação junto à Seguradora das alegadas atividades agrícolas. Uma vez expedida, é instrumento hábil, por si só, àquela comprovação. Todavia, a inexistência do referido documento não obsta ao segurado demonstrar sua condição de segurado especial por outros meios, mormente no âmbito judicial. Se a parte autora tivesse CIC expedida em seu nome não necessitaria postular o benefício em juízo, pois com base nesse documento é de supor-se que a própria Seguradora já o concederia administrativamente, porque assim prevê a Lei de Benefícios.
DO CASO CONCRETO
A parte autora implementou o requisito etário em 12 de setembro de 2005 e requereu o benefício na via administrativa em 2 de abril de 2015 (evento 1, OUT3 e OUT15). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 144 (cento e quarenta e quatro) meses anteriores ao implemento do requisito etário, isto é de setembro de 1993 a setembro de 2005 (IDADE), ou 180 (cento e oitenta) meses anteriores ao implemento de abril de 2003 a abril de 2015 (DER).
Como início de prova material do labor rurícola, constam dos autos os seguintes documentos:
a) Certidão de casamento da autora, ocorrido no ano de 1969, onde consta a profissão de seu esposo como agricultor (evento 1 - OUT7);
b) Certidão de óbito de seu esposo de 1982, constando a profissão do mesmo como agricultor (evento 1 - OUT8);
c) Certidão do cadastro eleitoral da parte autora emitida em 1-2015, onde que consta a profissão de agricultora (evento 1 - OUT9);
d) Ficha de atendimento do SUS da autora emitida em 1-2015, constando a profissão de agricultora (evento 1 - OUT10);
e) Cadastros da autora no comércio local, contendo sua profissão como agricultora (evento 1 - OUT11/OUT14).
A testemunha Herminia Borges Ribeiro, em sede de justificação administrativa, declarou que a autora residia e trabalhava em uma chácara própria e também como bóia-fria, mas que faz cinco a seis anos que não trabalha mais por motivos de saúde. A testemunha Roberto Francisco Maria também declarou que a requerente trabalha em área de terras própria e que não tinha outra fonte de renda além do trabalho agrícola. Já a testemunha Manoel Joaquim de Oliveira relatou que viu a requerente trabalhando em sua propriedade pela última vez a pouco mais de um ano (evento 33).
De outro lado, quando do primeiro requerimento administrativo em 11-11-2010, a autora apresentou nos autos do processo administrativo declarações firmadas por Manoel Joaquim de Oliveira (posteriormente ouvido na justificação administrativa), Clemente Dessanti, Nelson Geremia as quais afirmaram que a autora era sem terra e sempre trabalhou como bóia-fria para vários proprietários (evento 67 - OUT1 e OUT2).
Na entrevista rural em 2015 a própria autora reconheceu que não trabalhava faz uns 7 a 9 anos, exercendo apenas atividades domésticas (evento 67 - OUT9).
Conforme se vê há contradição entre os depoimentos, o que compromete a validade da prova testemunhal.
Veja-se que o INSS comprova que o marido da autora era aposentado pelo exercício de atividade urbana (comerciário), não sendo possível avaliar a real contribuição do trabalho rural para o sustento da família.
Quanto ao início de prova material, foi demonstrado nos depoimentos que a autora deixou de trabalhar há pelo menos sete anos, de modo que o período de carência a ser examinado deve ser entre setembro de 1993 a setembro de 2005. Todavia, não há provas documentais para esse intervalo de tempo.
Ainda que assim não fosse, as provas apresentadas não preenchem os requisitos, como cadastro eleitoral de 2015 e a ficha do SUS também atualizada em 2015, após o trânsito em julgado do processo judicial anterior, extinto por falta de provas.
Quanto aos cadastros em loja, observa-se que não constam a assinatura ou a data do cadastramento, sendo facilmente manipuláveis.
Outrossim, desde 3-1982 a autora recebe pensão por morte.
Embora esteja comprovado que a autora dedicou-se ao labor campesino em determinado período de sua vida laboral, bem como as testemunhas inquiridas nos autos atestam, a problemática instaura-se quanto à caracterização desta atividade em regime de economia familiar, o que por sua vez proporcionaria à autora a qualidade de segurada especial.
Importa consignar que a autora relata ter trabalhado a maior parte do período de carência em sítio de sua propriedade, contudo, não há qualquer elemento a demonstrar a quantia auferida com os serviços prestados, enquanto as declarações anexadas nos autos administrativos atestavam que a autora era sem terra.
Segundo versa a Lei nº 8.213/91, em seu art. 11, § 1°, entende-se por regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados.
Quando a renda obtida na atividade rural é apenas complementar, não há que se falar em atividade indispensável para a própria subsistência, tal como a normativa expõe.
Tal fato, inclusive, atrai a disciplina do art. 11, §9º, I, da Lei nº 8.213/1991, não podendo ser reconhecida a natureza de segurado especial.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL COMPROVADA. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. NÃO CARACTERIZADA. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL. TRABALHO URBANO DE MEMBRO DO GRUPO FAMILIAR. RENDA SUFICIENTE À MANUTENÇÃO DO GRUPO. 1. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea. 2. "O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ)" - RESP n.º 1.304.479. 3. Hipótese em que, além de ausente início de prova material, há prova de que a remuneração recebida pela esposa do autor, servidora pública municipal, assim como o valor da pensão por morte originada de tal labor, impede o reconhecimento da qualidade de segurado especial do requerente.
(TRF4, AC 0006294-70.2015.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, D.E. 5-4-2017)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. DESCARACTERIZAÇÃO. SUBSISTÊNCIA FAMILIAR PROVENIENTE DE PENSÃO POR MORTE. BENEFÍCIO INDEVIDO. 1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; c) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença). 2. A comprovação da qualidade de segurado especial é feita mediante demonstração do efetivo exercício da atividade rural individualmente ou em regime de economia familiar no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, mesmo que de forma descontínua, pelo prazo estabelecido em lei. Em todo caso, exige-se que o labor rural seja indispensável à subsistência do segurado e/ou de sua família. 3. No caso concreto, a autora percebe benefícios de pensão por morte, o que comprova que o exercício de atividade rural pela autora não se mostra imprescindível para a estabilidade financeira da família, descaracterizando-a como segurada especial, nos termos do art. 11, § 9º, I, da Lei 8.213/91.
(TRF4, APELREEX 0003485-10.2015.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, D.E. 29-8-2016)
Pontua-se que no período em exame, entre 1993 a 2005, a autora não comprova a existência de dependentes, a fim de justificar o trabalho rural como condição indispensável para subsistência da família.
Vale destacar que o exercício de atividade urbana concomitante ao trabalho rural pelo cônjuge da autora não tem o condão de descaracterizar o regime de economia familiar, desde que o trabalho agrícola seja indispensável à sobrevivência dos membros do grupo familiar com um mínimo de dignidade, o que, entretanto, não se observa no presente caso.
Nesse sentido, há a seguinte tese firmada:
Temas 532, 533 - Repercussão de atividade urbana do cônjuge na pretensão de configuração jurídica de trabalhador rural previsto no art. 143 da Lei 8.213/1991
3.O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana. (REsp 1304479/SP) (grifei)
Não estando comprovada a indispensabilidade do trabalho rural, não é possível o acolhimento do pleito de aposentadoria rural por idade como segurada especial, merecendo reforma a sentença que julgou procedente o pedido.
CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Condenada a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa atualizado, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º e o § 11, ambos do artigo 85 do CPC, restando determinada a sua inexigibilidade temporária, no entanto, em face do benefício da assistência judiciária gratuita.
CUSTAS PROCESSUAIS
Condenada a parte autora ao pagamento das custas processuais, determinando-se também a inexigibilidade temporária, enquanto atendidos os requisitos da assistência judiciária gratuita.
PREQUESTIONAMENTO
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.
CONCLUSÃO
a) apelação do INSS: provida, para reconhecer a violação ao disposto no art. 11, §9º, I, da Lei nº 8.213/1991 e julgar improcedente o pedido de aposentadoria rural por idade.
Em conclusão, sendo a prova dos autos insuficiente para abranger todo o período de carência, considerando que não se trata de trabalhadora bóia-fria, bem como demonstrado que a parte recebia pensão por morte, está descaracterizada como segurada especial, não fazendo jus ao benefício de aposentadoria por idade rural.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto no sentido de julgar procedente a apelação.
Documento eletrônico assinado por FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000502059v18 e do código CRC 552630b1.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FERNANDO QUADROS DA SILVA
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Apelação Cível Nº 5052231-81.2016.4.04.9999/PR
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APELADO: TEREZA CLASEM DE ANDRADE
ADVOGADO: GEONIR EDVARD FONSECA VINCENSI
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REMESSA EX OFFICIO. INEXISTÊNCIA. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS LEGAIS. NÃO PREENCHIMENTO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. INSUFICIENTE. OUTRA FONTE DE RENDA. PENSÃO POR MORTE. TRABALHO RURAL DISPENSÁVEL. NÃO OBSERVADA NECESSIDADE PARA FINS DE SUBSISTÊNCIA.
1. Hipótese em que a sentença não está sujeita à remessa ex officio, a teor do disposto no artigo 496, § 3º, I, do Código de Processo Civil.
2. Ocorre a coisa julgada quando a nova demanda têm as mesmas partes, o mesmo pedido e a mesma causa de pedir da ação julgada anteriormente, o que não se observa no caso.
3. O trabalhador que implementar a idade mínima exigida (60 anos para o homem e 55 anos para a mulher) e comprovar o exercício de atividade rural em regime de economia familiar no período de carência tem direito ao benefício de aposentadoria rural por idade na condição de segurado especial (artigos 11, VII, 48, § 1º, e 142, da Lei nº 8.213/91).
4. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser feita por meio de início de prova material complementada por prova testemunhal idônea, sendo dispensável o correspondente recolhimento de contribuições para fins de concessão do benefício de aposentadoria por idade.
5. O regime de economia familiar é descaracterizado quando a atividade rural não for indispensável à subsistência familiar, constituindo mera complementação de renda.
6. Ausente início de prova material apto a comprovar o labor, bem como demonstrado o recebimento de pensão por morte, originada de trabalho urbano do cônjuge, está descaracterizado o trabalho rural em regime de economia familiar.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu julgar procedente a apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 05 de julho de 2018.
Documento eletrônico assinado por FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000502060v6 e do código CRC ff91f5d2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FERNANDO QUADROS DA SILVA
Data e Hora: 6/7/2018, às 8:21:2
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 05/07/2018
Apelação Cível Nº 5052231-81.2016.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: TEREZA CLASEM DE ANDRADE
ADVOGADO: GEONIR EDVARD FONSECA VINCENSI
Certifico que este processo foi incluído no 1º Aditamento do dia 05/07/2018, na seqüência 389, disponibilizada no DE de 20/06/2018.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma Regional Suplementar do Paraná, por unanimidade, decidiu julgar procedente a apelação.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 12:54:46.