APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002760-58.2015.4.04.7113/RS
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | WANDERLEY BESKOW |
ADVOGADO | : | VAGNER AUGUSTO CAINELLI |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REMESSA NECESSÁRIA. CONDENAÇÃO DE VALOR FACILMENTE DETERMINÁVEL. NÃO CONHECIMENTO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. RECEBIMENTO INDEVIDO. ERRO ADMINISTRATIVO. BOA-FÉ. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES.
1. Não está sujeita a reexame necessário a sentença que condena a Fazenda Pública em quantia inferior a mil salários mínimos (art. 496, §3º, do NCPC).
2. Condenação manifestamente inferior ao limite legal, não é caso de remessa necessária.
3. Os valores recebidos pelo segurado, por conta de erro administrativo, não são sujeitos à restituição, diante do seu caráter alimentar e da inexistência de má-fé.
4. Não importa declaração de inconstitucionalidade do art. 115, da Lei 8.213/91, o reconhecimento da impossibilidade de devolução ou desconto dos valores indevidamente percebidos. A hipótese é de não incidência do dispositivo legal, porque não concretizado o seu suporte fático. Precedentes do STF (ARE 734199, Rel Min. Rosa Weber).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 30 de agosto de 2017.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002760-58.2015.4.04.7113/RS
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | WANDERLEY BESKOW |
ADVOGADO | : | VAGNER AUGUSTO CAINELLI |
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária, com pedido de tutela antecipada, ajuizada por WANDERLEI BESKOW contra o INSS, objetivando o reconhecimento da inexigibilidade do débito cobrado pela Autarquia em decorrência de recebimento indevido do benefício de auxílio-doença, por erro administrativo, bem como a reafirmação do direito ao benefício recebido, com indenização por danos morais decorrentes da cobrança indevida. Alternativamente, pede a limitação da referida cobrança aos períodos em que laborou concomitantemente à percepção do benefício.
A tutela antecipada foi deferida para determinar a imediata suspensão da exigibilidade da restituição do valor cobrado da parte autora a título de irregularidade constatada no recebimento do benefício de auxílio-doença no período de 15-01-2011 a 31-12-2012 (evento 3, DESPADEC1).
Sentenciando, o magistrado singular julgou parcialmente procedente o pedido, confirmando a tutela provisória deferida para cancelar a cobrança relativa ao recebimento do benefício de auxílio-doença NB 537.373.395-0, no período de 15/01/2011 a 31/12/2012 (evento 1 - NOT7), bem como para cancelar eventual inscrição dos valores correspondentes em dívida ativa. Julgou improcendente o pedido com relação à indenização por danos morais e à permanência do benefício durante o período controvertido. Diante da sucumbência recíproca, condenou cada parte ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, na proporção de 50% a ser devido a cada procurador, nos termos do art. 85, §3º, do CPC, fixados em 10% do valor da causa atualizado, com base no art. 85, §4º, inciso III, do CPC. Todavia, a exigibilidade da verba restou suspensa em relação à parte autora, em face da assistência judiciária gratuita deferida nos autos, nos termos do art. 98, §3º, do CPC. Sem custas.
O INSS recorre, sustentando ser devida a devolução dos valores indevidamente recebidos, independentemente da boa-fé do segurado.
Com contrarrazões e por força do reexame necessário, subiram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A apelação preenche os requisitos de admissibilidade.
REMESSA NECESSÁRIA
Nos termos do artigo 14 do novo CPC, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".
A nova lei processual prevê que serão salvaguardados os atos já praticados, perfeitos e acabados na vigência do diploma anterior, e que suas disposições aplicam-se aos processos em andamento, com efeitos prospectivos.
As sentenças sob a égide do CPC de 1973, sujeitavam-se a reexame obrigatório se condenassem a Fazenda Pública ou em face dela assegurassem direito controvertido de valor excedente a 60 salários mínimos.
O CPC de 2015 definiu novos parâmetros de valor, no art. 496, § 3º, para reexame obrigatório das sentenças. O texto afastou o interesse da Fazenda Pública em ver reexaminadas decisões que a condenem ou garantam o proveito econômico à outra parte em valores correspondentes a até mil salários mínimos.
No caso concreto, o valor do proveito econômico refere-se à condenação imposta ao INSS no sentido de cancelar a cobrança relativa ao recebimento do benefício de auxílio-doença NB 537.373.395-0, no período de 15/01/2011 a 31/12/2012 (evento 1 - NOT7), bem como de cancelar eventual inscrição dos valores correspondentes em dívida ativa, cujo montante perfaz R$ 37.467,49 (trinta e sete mil, quatrocentos e sessenta e sete reais e quarenta e nove centavos), o que caracteriza como líquida a decisão, para efeitos de aferição da necessidade de reexame obrigatório.
Assim, é possível estimar que o total resultará em valor manifestamente inferior ao limite legal para o reexame obrigatório.
Impõe-se, para tal efeito, aferir o montante da condenação na data em que proferida a sentença. Se é a sentença que está ou não sujeita a reexame, é no momento de sua prolação que o valor da condenação, para tal finalidade, deve ser estimado.
Assim, sendo a condenação do INSS fixada em valor manifestamente inferior a mil salários mínimos, a sentença não está sujeita ao reexame obrigatório, de forma que a remessa não deve ser conhecida nesta Corte.
Devolução dos valores
Discute-se sobre a possibilidade de cobrança de valores pagos pelo INSS a título de benefício previdenciário.
Trata-se de pagamento alegadamente indevido de benefício, no período de 15-01-2011 a 31-12-2012, o qual se deu por erro administrativo. E isto porque, depois de realizadas duas perícias administrativas de prorrogação, e sendo o autor considerado apto ao labor, a autarquia previdenciária deixou de cessar o pagamento. Em suas razões de decidir, o juizo a quo assim consignou:
"De acordo com o que consta no procedimento administrativo do autor (evento 1 - PROCADM8, p. 39-40), na data da realização da perícia de revisão ficou constatado que se tratava de benefício restabelecido judicialmente até a data da perícia (13/05/2010). Após a realização de duas perícias de prorrogação, o benefício foi cessado em 14/01/2011. Porém, essa DCB (data de cancelamento do benefício) não migrou para o SUB (Sistema Único de Benefícios), por se tratar de benefício judicial, e, por consequência, o benefício não foi cessado na data devida. Assim, o segurado continuou recebendo até o mês de janeiro de 2013, quando da constatação do fato, sendo o benefício efetivamente cessado em 09/01/2013.
É fato, portanto, que a autarquia deixou de cessar o benefício por erro administrativo. De outra parte, é plausível a tese do autor de que somente teve ciência da manutenção do benefício em 09/2011, ocasião em que se afastou do trabalho, conforme demonstra o processo administrativo (evento 1 - PROCADM8, p. 57), o que corrobora o argumento de recebimento dos valores de boa-fé.
O INSS, incorrendo em erro administrativo em razão do não cancelamento do benefício, não pode transferir a responsabilidade do recebimento indevido à parte autora, porquanto continuou a disponibilizar os valores. Tendo a parte autora os recebido de boa-fé, pois se julgava ainda incapaz para o trabalho.
Nesse caso, não há demonstração de ter ação de má-fé da parte autora para percepção dos valores decorrentes do benefício de auxílio-doença. Por isso, não se pode presumir tenha se utilizado de subterfúgio para concessão do benefício ou esteja fundado o seu pedido em intenção maliciosa.
Assim, os valores recebidos se referem a verbas de caráter alimentar recebidas com induvidosa boa-fé, o que implica em prevalência do princípio da irrepetibilidade dos alimentos.
Não obstante tenham sido pagos valores indevidamente ao segurado, é incabível a restituição dos valores recebidos a esse título.
Está consolidado o entendimento jurisprudencial no sentido de que em se tratando de valores percebidos de boa-fé pelo segurado, seja por erro da Administração, seja em razão de antecipação de tutela, não é cabível a repetição das parcelas pagas.
Os princípios da razoabilidade, da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana, aplicados à hipótese, conduzem à impossibilidade de repetição das verbas previdenciárias. Trata-se de benefício de caráter alimentar, recebido pelo beneficiário de boa-fé.
Deve-se ter por inaplicável o art. 115 da Lei 8.213/91 na hipótese de inexistência de má-fé do segurado. Não se trata de reconhecer a inconstitucionalidade do dispositivo, mas que a sua aplicação ao caso concreto não é compatível com a generalidade e a abstração de seu preceito, o que afasta a necessidade de observância da cláusula de reserva de plenário (art. 97 da Constituição Federal). Nesse sentido vem decidindo o STF, v.g.: AI 820.685-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie; AI 746.442-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia.
Um dos precedentes, da relatoria da Ministra Rosa Weber, embora não vinculante, bem sinaliza para a orientação do STF quanto ao tema:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO RECEBIDO POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL. DEVOLUÇÃO. ART. 115 DA LEI 8.213/91. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ E CARÁTER ALIMENTAR. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 97 DA CF. RESERVA DE PLENÁRIO: INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 22.9.2008. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado em virtude de decisão judicial não está sujeito à repetição de indébito, dado o seu caráter alimentar. Na hipótese, não importa declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei 8.213/91, o reconhecimento, pelo Tribunal de origem, da impossibilidade de desconto dos valores indevidamente percebidos. Agravo regimental conhecido e não provido. (STF, ARE 734199 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 09/09/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-184 DIVULG 22-09-2014 PUBLIC 23-09-2014)."
Em tais condições, a restituição de valores pagos indevidamente, seja por iniciativa do INSS, seja com base em antecipação da tutela posteriormente revogada, é incabível.
Registro, ainda, que no caso concreto, tendo o beneficiário agido de boa-fé, a devolução pretendida pelo INSS não tem fundamento. A boa-fé, ademais, é presumida, cabendo ao INSS a prova em contrário.
Honorários advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.
O juízo de origem, considerando recíproca a sucumbência, condenou ambas as partes ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, na proporção de 50% para cada um, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, com base no art. 85, §4º, inciso III, do CPC, cuja exigibilidade restou suspensa em relação à parte autora por ser beneficiária de AJG.
Mantida a decisão em grau recursal, impõe-se a majoração dos honorários, com relação ao INSS, por incidência do disposto no §11 do mesmo dispositivo legal.
Assim, a parte que cabe ao INSS deve ser acrescida de 50%, observado o trabalho adicional realizado em grau recursal.
Conclusão
Remessa necessária não conhecida.
A sentença resta integralmente mantida.
Majorados os honorários advocatícios, na forma da fundamentação supra.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial e negar provimento à apelação do INSS.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 30/08/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002760-58.2015.4.04.7113/RS
ORIGEM: RS 50027605820154047113
RELATOR | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Cláudio Dutra Fontella |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | WANDERLEY BESKOW |
ADVOGADO | : | VAGNER AUGUSTO CAINELLI |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 30/08/2017, na seqüência 688, disponibilizada no DE de 14/08/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9156607v1 e, se solicitado, do código CRC 6B156334. | |
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