Apelação Cível Nº 5025464-64.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: MARILENE DE ALMEIDA DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença, publicada em 18/03/2020 (e.35.1 e e.45.1), nestes termos:
"Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do CPC/2015, JULGO PROCEDENTE o pedido contido na inicial e, por consequência, CONDENO o INSS a:
[a] RESTABELECER o benefício de auxílio-doença NB 6224137882, cessado em 03/05/2018 (fl. 14), observadas as regras do art. 60 e seguintes da Lei n. 8.213/91, nos termos da fundamentação, observado o disposto no art. 60, §§ 8º e 9º da Lei 8.213/91, incluído pela Lei 13.457/17;
[b] PAGAR as prestações vencidas e vincendas, devidamente atualizadas, descontados eventuais valores de benefícios recebidos na esfera administrativa que forem incompatíveis com a benesse reconhecida como devida na presente decisão, observada a prescrição quinquenal.
DEFIRO, ainda, o pedido de antecipação de tutela formulado para determinar que o réu implante em favor da parte autora o benefício reconhecido como devido na presente decisão, no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, contados da intimação."
Na sentença dos embargos de declaração (e.45.1), o julgador explicitou:
"Nesse contexto, verifico que não qualquer erro material. Isso porque, conforme fundamentação, fixou-se como termo inicial do benefício a data da juntada do laudo, ou seja, 24/10/2019 (fls. 86/88).
No dispositivo, apenas foi determinado o restabelecimento do "auxílio-doença NB 6224137882, cessado em 03/05/2018 (fl. 14)" (grifou-se), o que não significa que foi fixada tal data como termo inicial."
O INSS comprovou a implantação do benefício em favor da autora com DIB em 24/10/2019, DIP em 01/04/2020 e DCB em 28/07/2020 (e.52.1/2).
Nas razões recursais, a autora insurge-se contra a fixação da data de início do benefício na data da juntada do laudo pericial aos autos (24/10/2019), sustentando, em suma, que, apesar de o perito não ter considerado possível fixar a data de início da incapacidade laboral, os documentos anexados aos autos comprovam que o quadro incapacitante remonta ao início de 2018. Postula, pois, a reforma da sentença, no ponto, para que a data de início do benefício seja fixada na data da cessação do benefício n. 31/622.413.788-2, ocorrida em 03/05/2018 (e.53.1).
Embora intimado, o INSS não apresentou contrarrazões.
Vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Insurge-se a autora contra a fixação da data de início do AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA na data da juntada do laudo pericial aos autos (24/10/2019), sustentando, em suma, que incapacidade laboral remonta ao início de 2018, devendo a DIB ser fixada na data da cessação do benefício n. 31/622.413.788-2, ou seja, em 03/05/2018.
Merece acolhida a insurgência.
Na perícia judicial, realizada em 10/10/2019 (e.21.1/1), o perito, Dr. Marcelo Beirão (CRM ), especialista em ortopedia e traumatologia, constatou que a autora é portadora de espondilolistese e dor lombar crônica e, em razão disso, encontra-se parcial e definitivamente incapacitada para o trabalho. Disse, ainda, que a incapacidade decorre da progressão da patologia, mas não foi capaz de estabelecer a data de início da doença ou a data de início da incapacidade laboral.
Com base nas conclusões do perito, o julgador a quo, na sentença, condenou o INSS a conceder à autora o benefício de auxílio por incapacidade temporária a contar da data da juntada do laudo pericial aos autos (24/10/2019).
Ora, no que pertine ao termo inicial do benefício por incapacidade, cumpre salientar que não é possível confundir a data do diagnóstico com a data do início da incapacidade.
Com efeito, a data da perícia é uma ficção que recorre à variável menos provável. O momento da perícia é o momento do diagnóstico e, dificilmente, exceto uma infeliz coincidência, a data da instalação da doença e provável incapacitação. Quando se recorre às ficções, por que não é possível precisar a data da incapacidade a partir de elementos outros, sobretudo os clínicos-médicos, é preciso levar em conta em mínimo de realidade, e esta indica a relativa improvabilidade do marco aleatório. O histórico médico e outros elementos contidos nos autos, inclusa a DER e as regras da experiência sobre a evolução no tempo de doenças, devem se sobrepor às ficções, notadamente aquelas que se estabelecem in malan parte, consoante inúmeros julgados deste Colegiado:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORAL TEMPORÁRIA. TERMO INICIAL. [...] 2. Tendo o conjunto probatório apontado a existência de incapacidade laboral desde a época da cessação administrativa do auxílio-doença, o benefício é devido desde então. (TRF4, AC 5007386-55.2017.4.04.7209, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 06/09/2019)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORAL. TERMO INICIAL. [....] 2. Tendo o conjunto probatório apontado a existência de incapacidade laboral desde a época do requerimento administrativo, o benefício de auxílio-doença é devido desde então, devendo ser convertido em aposentadoria por invalidez a partir da perícia médica judicial, que atestou a incapacidade definitiva da parte autora para o trabalho como caldeireiro. (TRF4 5068030-33.2017.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 08/02/2018)
No caso concreto, embora o julgador tenha fixado o termo inicial do benefício na data da juntada do laudo pericial aos autos, a autora trouxe aos autos documentos que indicam que a incapacidade laboral remonta à época da cessação do benefício anterior (03/05/2018), tais como:
a) exame de ressonância magnética da coluna lombar, realizado em 19/02/2018 (e.1.8, p. 5):
b) atestado médico com data de 20/03/2018 (e.1.7, p. 1):
c) atestado médico, com data de 25/04/2018, declarando piora no quadro de CID M51 (outros transtornos de discos intervertebrais) - e.1.7, p. 2:
Analisando os documentos acima arrolados, verifico que aqueles referidos nas alíneas "a" e "b" foram apresentados ao INSS, quando da perícia administrativa realizada em 03/04/2018, o que ensejou a concessão do benefício de auxílio por incapacidade temporária n. 622.413.788-2 no período de 20/03/2018 a 03/05/2018, devido ao CID M51 (outros transtornos de discos intervertebrais) - e.8.2, pp. 4 e 25.
Já o documento arrolado na alínea "c" supra foi apresentado ao INSS na perícia administrativa realizada em 03/05/2018 - data em que o benefício foi cessado (e.8.2, p. 26). No entanto, de acordo com o teor do referido atestado, a autora apresentava piora atual em seu quadro de lombociatalgia crônica e estava em tratamento ortopédico, além de apresentar queixas cervicais associadas, com discopatia e estenose cervical, ou seja, quadro praticamente idêntico ao referido no atestado médico de 20/03/2018, a indicar a permanência do quadro incapacitante em 25/04/2018 (data do atestado), não sendo crível que apenas 8 dias depois, quando realizada a perícia administrativa, a autora tenha recuperado a capacidade para o labor.
Em razão disso, entendo que a incapacidade laboral da demandante remonta à DCB (03/05/2018), merecendo acolhida o apelo, para que o termo inicial do benefício concedido retroaja a tal data.
Como a ação foi ajuizada em 12/02/2019, não há parcelas prescritas .
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-102019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.
Honorários advocatícios recursais
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Deixo de aplicar a regra do art. 85, §11, do NCPC. Isso porque os honorários advocatícios recursais previstos pela nova sistemática do § 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015 decorrem não apenas do trabalho adicional posterior à sentença, mas, igualmente, da própria sucumbência da parte em seu pleito recursal. Com efeito, a majoração da verba honorária é estabelecida no intuito de desestimular a interposição de recurso manifestamente improcedente interposto pela parte sucumbente na ação.
Logo, no caso, não tendo havido recurso da parte sucumbente, o percentual da verba honorária deve ser mantida no patamar estipulado pelo juízo de origem, consoante precedente deste Colegiado:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. TERMO FINAL. HONORÁRIOS RECURSAIS. [...] 2. Não tendo havido recurso da parte sucumbente, incabível a majoração dos honorários advocatícios prevista no art. 85, §11, do CPC. (TRF4, AC 5026720-13.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 11/10/2019)
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).
Conclusão
Reforma-se, parcialmente, a sentença, para condenar o INSS ao restabelecimento do AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA desde a DCB (03/05/2018).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002533513v15 e do código CRC d7bb3c1b.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5025464-64.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: MARILENE DE ALMEIDA DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. restabelecimento de AUXÍLIO por incapacidade temporária desde a dcb. TERMO INICIAL DA INCAPACIDADE. DATA DA PERÍCIA. FICÇÃO EM MALAN PARTE. PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ DO SEGURADO.
1. Descabe fixar a data de início da incapacidade laboral na data da perícia ou da juntada do laudo pericial aos autos, tendo em vista que não é possível confundir a data do diagnóstico com a data do início da incapacidade.
2. Existindo indícios nos autos de que o quadro mórbido já estava instalado desde a DCB, o restabelecimento do benefício deve retroagir a tal data, porquanto a data da perícia é uma ficção que recorre à variável menos provável. O momento da perícia é o momento do diagnóstico e, dificilmente, exceto uma infeliz coincidência, a data da instalação da doença e provável incapacitação.
3. Quando se recorre às ficções, porque não é possível precisar a data da incapacidade a partir de elementos outros, sobretudo os clínicos-médicos, é preciso levar em conta um mínimo de realidade, e esta indica a relativa improbabilidade do marco aleatório.
4. O histórico médico e outros elementos contidos nos autos, inclusa a DER e as regras da experiência sobre a evolução no tempo de doenças, devem se sobrepor às ficções, notadamente aquelas que se estabelecem in malan parte, consoante inúmeros julgados deste Colegiado.
5. In casu, restou comprovado que a incapacidade laboral remonta à data de cessação do benefício anterior.
6. Reconhecido, in casu, o direito da parte autora ao restabelecimento do AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA desde a DCB (03/05/2018).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 24 de maio de 2021.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002533514v3 e do código CRC ea2f50e2.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 17/05/2021 A 24/05/2021
Apelação Cível Nº 5025464-64.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: MARILENE DE ALMEIDA DA SILVA
ADVOGADO: NILZO BUZZANELLO (OAB SC031783)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/05/2021, às 00:00, a 24/05/2021, às 16:00, na sequência 131, disponibilizada no DE de 06/05/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Juíza Federal ÉRIKA GIOVANINI REUPKE
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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