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PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. VULNERABILIDADE SOCIAL COMPROVADA. TRF4. 5003651-60.2021.4.04.7213...

Data da publicação: 03/07/2024, 11:01:37

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. VULNERABILIDADE SOCIAL COMPROVADA. 1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família. 2. No que diz respeito ao requisito econômico, seria paradoxal que o Judiciário, apesar de ter reconhecido a inconstitucionalidade do critério econômico de acessibilidade ao BPC (renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo), enquanto aqui se discute a renda mínima de cidadania universalizada (Projeto de Lei 4856/19), a exemplo de outros países e estados, como Itália, Quênia, Finlândia, Barcelona, Canadá (Ontário), Califórnia (Stockton), Escócia, Holanda, Reino Unido, Índia e outros, que já colocaram em funcionamento ou estão preparando programas-piloto de renda básica universalizada, para enfrentar o grave problema das desigualdades econômicas decorrentes do modelo capitalista, persista medindo com régua milimétrica a insuficiência de recursos familiares das pessoas que, além de estarem em situação de vulnerabilidade, sofrem com as barreiras naturais e as que a sociedade lhes impõe, em razão da idade avançada ou da deficiência. Não foi em vão que o Tribunal da Cidadania, em precedente prolatado no REsp nº 1.112.557/MG, pela 3ª Seção, sendo Relator o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, publicado em 20/11/09, processado como representativo de controvérsia, nos termos do art. 543-C, do CPC, assentou a relativa validade do critério legal, tornando vinculante a necessidade de exame mais compreensivo para a análise judicial da hipossuficiência econômica. 3. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de vulnerabilidade, razão pela está consolidada a jurisprudência deste Tribunal. 4. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário 580.963/PR, realizado em 17-04-2013, declarou, outrossim, a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", baseado nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas com deficiência. Segundo o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados. Portanto, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima. 5. Hipótese em que o exame do conjunto probatório demonstrou que o autor é deficiente, bem como encontra-se em situação de vulnerabilidade social, restando necessária a reforma da sentença, para determinar o restabelecimento do benefício cessado. (TRF4, AC 5003651-60.2021.4.04.7213, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 25/06/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003651-60.2021.4.04.7213/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: MAGNUN CARDOSO (Civilmente Incapaz - Art. 110, 8.213/91) (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação interposta por MAGNUN CARDOSO em face da sentença publicada em 04-02-2024 que julgou parcialmente procedente demanda de restabelecimento de benefício assistencial e declaração de inexistência de débito, nestes termos (e.88.1):

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido, resolvendo o mérito, na forma do art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil, para declarar a inexigibilidade do débito de R$ 101.336,89, cobrado pelo INSS no âmbito do processo administrativo de apuração de indício de irregularidade, nos termos da fundamentação.

Sustenta, em síntese, que preenche os requisitos necessários ao restabelecimento do benefício de prestação continuada desde a DCB, em 01-12-2021, pois a vulnerabilidade social do autor restou demonstrada pelo estudo social (e.95.1).

Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte para julgamento.

A Procuradoria Regional da República da 4ª Região opinou pelo provimento do recurso (e.5.1).

É o relatório.

VOTO

A controvérsia recursal cinge à comprovação da vulnerabilidade social.

Destaca-se, a propósito, o seguinte excerto da sentença (e.88.1).

"A renda familiar, segundo a Assistente Social, é composta da aposentadoria da Sra. Gertrudes e Sr, Cecílio, os quais recebem, respectivamente um salário mínimo (vigente na época do laudo - R$ 1.320,00) e R$ 2.228,00 gerando uma renda total de R$ 4.868,00 (​evento 78, LAUDO_SOC_ECON1). Por outro lado, o laudo aponta que os gastos efetuados pelo núcleo familiar chega em média a R$ 2.887,41, envolvendo pagamento de luz, água, internet, alimentação e medicação. No entanto, a assistente social pontua a necessidade de gastos esporádicos sem especificá-los.​​​

Com efeito, verifica-se que as despesas declaradas são inferiores ao valor da renda obtida pelos avós de Magnun. Desse modo, à época do estudo social a renda per capita do grupo familiar supera o critério objetivo de 1/4 do salário mínimo, não se tratando de situação de hipossuficiência econômica em caráter absoluto.

Nesse contexto, à luz dos elementos de prova coligidos aos autos, e a despeito deste juízo não duvidar das dificuldades financeiras vivenciadas no cotidiano pelo autor, entendo que ele não logrou êxito em comprovar que vive em situação de risco social (miserabilidade econômica) na extensão que a norma do art. 20 da Lei Orgânica de Assistência Social, à luz do texto constitucional, estabeleceu como condicionante para a concessão do benefício de prestação continuada.

Logo, considerando que não estão presentes os requisitos cumulativos para a obtenção benefício assistencial, impõe-se o julgamento pela improcedência do pedido, sem prejuízo de que seja pleiteado novamente, caso se alterem as condições socioeconômicas do núcleo familiar".

No caso em tela, o núcleo familiar é composto pelo autor e seus avós, sendo a renda auferida por eles proveniente de aposentadoria. Outrossim, conforme laudo social juntado aos autos, a avó do autor recebe aposentadoria no valor de um salário mínimo, enquanto o avô, aposentadoria no valor de R$ 2.228,00 (e.78.1):

"A renda mensal da família é proveniente da aposentadoria que seus avós recebem, Dona Gertrudes um salário mínimo vigente e Seu Cecílio, cerca de R$2228,00."

Igualmente, as despesas da família totalizam aproximadamente R$ 2.887,41, uma vez que trata-se de pessoa com deficiência, podendo haver gastos excepcionais. Ainda, na conclusão do referido laudo, a assistente social afirma que o autor encontra-se em situação de risco e de vulnerabilidade social:

"A idade avançada e os comprometimentos de saúde dos avós, coloca Magnun em situação de risco, visto que ele não possui uma rede de apoio fortalecida. Seus tios se preocupam com a Avó e não com ele, tal situação gera preocupação em Dona Gertrudes de quem irá cuidar dele. Seu Cecílio também demonstrou que seu cognitivo não está preservado, perguntando várias vezes qual motivo da minha visita.

Neste sentido, entende-se que Magnun encontra-se em vulnerabilidade social."

Pois bem, como bem observou a Procuradoria Regional da República da 4ª Região em parecer juntado aos autos, os benefícios previdenciários por incapacidade ou aqueles de um salário mínimo ou até o limite de um salário mínimo, percebidos por idosos, devem ser excluídos do cálculo da renda per capita (e.5.1):

"Observa-se no estudo social (E28, E78, origem), que o autor vive com os avós, em casa própria, simples, de madeira e alvenaria, consoante fotos anexadas aos autos.

A renda familiar é proveniente das aposentadorias dos avós idosos, ambos com 75 anos de idade, sendo que o avô do autor está aposentado por invalidez, em valor pouco superior ao mínimo e avó recebe aposentadoria por idade em valor mínimo (E1.22, pg. 17, origem). Ainda, tem-se que a avó Gertrudes apresenta problemas de saúde e faz uso de diversos medicamentos (E68.25, origem).

Ora, sabe-se que benefício previdenciário em valor mínimo auferido por idoso ou benefício por incapacidade recebido por integrante de grupo familiar, independente de idade, devem ser excluídos de computo da renda per capita, conforme demonstrado no julgado a seguir:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RESTABELECIMENTO. EXCLUSÃO DE VALORES. IDOSO ACIMA DE 65 ANOS. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. DEVOLUÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. 1. São dois os requisitos para a concessão do benefício assistencial : a) condição de deficiente ou idoso (65 anos ou mais); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família. 2. No cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por pessoa idosa a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima. 3. De igual modo, deverá ser desconsiderado o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade. 4. Procedente o pedido de restituição do benefício assistencial, descabe cogitar de recebimento irregular dos valores no período anterior. 5. Apelação do INSS improvida e apelo da autora provido. (TRF4 5000419-92.2021.4.04.7131, QUINTA TURMA, Relator FRANCISCO DONIZETE GOMES, juntado aos autos em 26/07/2022)

Assim, tem-se que a renda recebida pela família, mostra-se, realisticamente, aquém do necessário para prover o sustento digno da família. Afinal, trata-se de família composta por uma pessoa com deficiência física com comprometimento importante no desenvolvimento neuropsicomotor e seus avós idosos que apresentam problemas de saúde."

No que diz respeito ao requisito econômico, seria paradoxal que o Judiciário, apesar de ter reconhecido a inconstitucionalidade do critério econômico de acessibilidade ao BPC (renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo), enquanto aqui se discute a renda mínima de cidadania universalizada (Projeto de Lei 4856/19), a exemplo de outros países e estados, como Itália, Quênia, Finlândia, Barcelona, Canadá (Ontário), Califórnia (Stockton), Escócia, Holanda, Reino Unido, Índia e outros, que já colocaram em funcionamento ou estão preparando programas-piloto de renda básica universalizada, para enfrentar o grave problema das desigualdades econômicas decorrentes do modelo capitalista, persista medindo com régua milimétrica a insuficiência de recursos familiares das pessoas que, além de estarem em situação de vulnerabilidade, sofrem com as barreiras naturais e as que a sociedade lhes impõe, em razão da idade avançada ou da deficiência.

Não foi em vão que o Tribunal da Cidadania, em precedente prolatado no REsp nº 1.112.557/MG, pela 3ª Seção, sendo Relator o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, publicado em 20/11/09, processado como representativo de controvérsia, nos termos do art. 543-C, do CPC, assentou a relativa validade do critério legal, tornando vinculante a necessidade de exame mais compreensivo para a análise judicial da hipossuficiência econômica:

“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.

3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).

4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.

5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.

6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.

7. Recurso Especial provido (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).

Com efeito, no que diz respeito ao requisito econômico, cabe ressaltar o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de vulnerabilidade, razão pela está consolidada a jurisprudência deste Tribunal (v.g. AC 5001745-37.2018.4.04.7214, 9ª TURMA, de minha Relatoria, juntado aos autos em 13/12/2019; AC 5014437-21.2019.4.04.9999, 9ª TURMA, Relator Des. Federal CELSO KIPPER, juntado aos autos em 12/12/2019; AC 5018881-97.2019.4.04.9999, 10ª TURMA, Relator Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 04/02/2020; AC 5025288-22.2019.4.04.9999, 10ª TURMA, Relator Des. Federal MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 07/02/2020; AC 5001203-69.2019.4.04.9999, 6ª TURMA, Relator Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 17/10/2019; AC 5005447-10.2017.4.04.7122, 5ª TURMA, Relator Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 26/08/2019).

Assim, forçoso reconhecer que as despesas com os cuidados necessários da parte autora (v.g. medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico) podem ser levadas em consideração na análise da condição de vulnerabilidade da família da parte demandante.

A propósito, a eventual percepção de recursos do Programa Bolsa Família, que, segundo consta no site do Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/), destina-se à "transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País" e "tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70,00 mensais, e está baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos", não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui prova indiciária acima de qualquer dúvida razoável de que a unidade familiar se encontra em situação de grave risco social.

Registre-se, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário 580.963/PR, realizado em 17-04-2013, declarou, outrossim, a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", baseado nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas com deficiência. Segundo o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados.

Este TRF, aliás, já vinha julgando no sentido da desconsideração da interpretação restritiva do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso.

Assim, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (EIAC nº 0006398-38.2010.404.9999/PR, julgado em 04-11-2010), ou de benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (EIAC N.º 2004.04.01.017568-9/PR, Terceira Seção, julgado em 02-07-2009. Ressalto que tal pessoa, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerada na composição familiar, para efeito do cálculo da renda per capita. Diante disso, sobreveio a Portaria nº1.282, de 22 de março de 2021, do NSS:

Art. 1º Estabelecer que não será computado para o cálculo da renda per capita familiar o benefício previdenciário de até um salário-mínimo ou o Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS) concedido a idoso, acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, ou a pessoa com deficiência, para a concessão do BPC/LOAS, diante do disposto no § 14 do art. 20 da Lei nº 8.742, 7 de dezembro de 1993, incluído pela Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020.

Dessarte, consoante parecer da Procuradoria Regional da República da 4ª Região, bem como considerando-se as conclusões do laudo social juntado aos autos, faz-se necessária a reforma da sentença, a fim de restabelecer o benefício assistencial desde 01-12-2021 (DCB e.1.13), uma vez que, excluídas as rendas dos idosos até o limite de um salário mínimo, bem como as despesas com medicamentos, o valor auferido pelo núcleo familiar do autor não é o suficiente para suprir suas necessidades básicas, ressaltando-se que seus avós, além de idosos, também são pessoas doentes e que fazem uso de diversos medicamentos.

Dos consectários

Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:

Correção monetária

Em relação aos benefícios assistenciais, devem ser observados os seguintes critérios de correção monetária, porquanto não afetados pela decisão do STJ no Tema 905:

- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91).

- IPCA-E (a partir de 30-06-2009, conforme decisão do STF na 2ª tese do Tema 810 (RE 870.947), j. 20/09/2017, ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22-09-2017, com eficácia imediata nos processos pendentes, nos termos do artigo 1.035, § 11, do NCPC e acórdão publicado em 20-11-2017, cuja modulação foi rejeitada pela maioria do Plenário do STF por ocasião do julgamento dos embargos de declaração em 03-10-2017).

Juros moratórios

Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.

A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.

SELIC

A partir de dezembro de 2021, a variação da SELIC passa a ser adotada no cálculo da atualização monetária e dos juros de mora, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021:

"Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente."

Honorários advocatícios recursais

Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do CPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).

Deixo de aplicar a regra do art. 85, §11, do CPC. Isso porque os honorários advocatícios recursais previstos pela nova sistemática do artigo 85, § 11 do Código de Processo Civil de 2015 decorrem não apenas do trabalho adicional posterior à sentença, mas, igualmente, da própria sucumbência da parte em seu pleito recursal. Com efeito, a majoração da verba honorária é estabelecida no intuito de desestimular a interposição de recurso manifestamente improcedente interposto pela parte sucumbente na ação.

Logo, no caso, não tendo havido recurso da parte sucumbente, o percentual da verba honorária deve ser mantida no patamar estipulado pelo juízo de origem, consoante precedente deste Colegiado:

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. TERMO FINAL. HONORÁRIOS RECURSAIS. [...] 2. Não tendo havido recurso da parte sucumbente, incabível a majoração dos honorários advocatícios prevista no art. 85, §11, do CPC. (TRF4, AC 5026720-13.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 11/10/2019)

Custas Processuais

O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).

Tutela específica - implantação do benefício

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTORestabelecer Benefício
NB1062143326
ESPÉCIE
DIB
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB01/12/2021
RMIA apurar
OBSERVAÇÕES

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo da parte autora, bem como determinar o restabelecimento do benefício, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004453311v18 e do código CRC 1f3738ad.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 25/6/2024, às 9:10:4


5003651-60.2021.4.04.7213
40004453311.V18


Conferência de autenticidade emitida em 03/07/2024 08:01:36.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003651-60.2021.4.04.7213/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: MAGNUN CARDOSO (Civilmente Incapaz - Art. 110, 8.213/91) (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. restabelecimento de BENEFÍCIO ASSISTENCIAL à pessoa com deficiência. vulnerabilidade social comprovada.

1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.

2. No que diz respeito ao requisito econômico, seria paradoxal que o Judiciário, apesar de ter reconhecido a inconstitucionalidade do critério econômico de acessibilidade ao BPC (renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo), enquanto aqui se discute a renda mínima de cidadania universalizada (Projeto de Lei 4856/19), a exemplo de outros países e estados, como Itália, Quênia, Finlândia, Barcelona, Canadá (Ontário), Califórnia (Stockton), Escócia, Holanda, Reino Unido, Índia e outros, que já colocaram em funcionamento ou estão preparando programas-piloto de renda básica universalizada, para enfrentar o grave problema das desigualdades econômicas decorrentes do modelo capitalista, persista medindo com régua milimétrica a insuficiência de recursos familiares das pessoas que, além de estarem em situação de vulnerabilidade, sofrem com as barreiras naturais e as que a sociedade lhes impõe, em razão da idade avançada ou da deficiência. Não foi em vão que o Tribunal da Cidadania, em precedente prolatado no REsp nº 1.112.557/MG, pela 3ª Seção, sendo Relator o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, publicado em 20/11/09, processado como representativo de controvérsia, nos termos do art. 543-C, do CPC, assentou a relativa validade do critério legal, tornando vinculante a necessidade de exame mais compreensivo para a análise judicial da hipossuficiência econômica.

3. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de vulnerabilidade, razão pela está consolidada a jurisprudência deste Tribunal.

4. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário 580.963/PR, realizado em 17-04-2013, declarou, outrossim, a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", baseado nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas com deficiência. Segundo o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados. Portanto, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima.

5. Hipótese em que ​o exame do conjunto probatório demonstrou que o autor é deficiente, bem como encontra-se em situação de vulnerabilidade social, restando necessária a reforma da sentença, para determinar o restabelecimento do benefício cessado.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao apelo da parte autora, bem como determinar o restabelecimento do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 20 de junho de 2024.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004453312v4 e do código CRC b917559b.Informações adicionais da assinatura:
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5003651-60.2021.4.04.7213
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Conferência de autenticidade emitida em 03/07/2024 08:01:36.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 13/06/2024 A 20/06/2024

Apelação Cível Nº 5003651-60.2021.4.04.7213/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PROCURADOR(A): RODOLFO MARTINS KRIEGER

APELANTE: MAGNUN CARDOSO (Civilmente Incapaz - Art. 110, 8.213/91) (AUTOR)

ADVOGADO(A): JEFERSON AURELIO BECKER (OAB SC041163)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/06/2024, às 00:00, a 20/06/2024, às 16:00, na sequência 459, disponibilizada no DE de 04/06/2024.

Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA, BEM COMO DETERMINAR O RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 03/07/2024 08:01:36.

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