APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5025403-74.2014.4.04.7200/SC
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | EDGAR SCHUTZ |
ADVOGADO | : | NORMA TERESINHA DOS SANTOS FRANZONI |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ILEGALIDADE. INDENIZAÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES, NÃO-RECOLHIDAS CONTEMPORANEAMENTE, EFETUADA EM VALOR MENOR AO CALCULADO PELA AUTARQUIA PREVIDENCIÁRIA. EXCLUSÃO DO RESPECTIVO TEMPO DE SERVIÇO. DIREITO DE REAVER O VALOR PAGO DE BOA-FÉ, AINDA QUE A MENOR. APOSENTADORIA POR IDADE. CARÊNCIA NÃO IMPLEMENTADA.
1. A Administração, em atenção ao princípio da legalidade, tem o poder-dever de anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornem ilegais (Súmulas 346 e 473 do STF).
2. Comprovada a irregularidade na concessão do benefício, configurada pelo cômputo de tempo de serviço relativo a competências cujas contribuições foram recolhidas em valor menor ao indicado pela própria autarquia previdenciária, deve ser confirmado o ato administrativo que determinou a sua suspensão.
3. Excluído o cômputo, como tempo de serviço, das competências cuja indenização foi feita em valor insuficiente, deve ser reconhecido o direito da parte autora de reaver o que pagou, de boa-fé, a título de indenização a menor, sob pena de enriquecimento sem causa do ente público.
4. Tratando-se de aposentadoria por idade urbana, a carência a ser cumprida é a prevista no art. 142 da Lei º 8.213/91, observada aquela para o ano em que cumprido o requisito etário, podendo até mesmo ser implementada posteriormente.
5. Não cumprido o requisito carência, não faz jus a parte autora ao benefício de aposentadoria por idade.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 16 de fevereiro de 2016.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8064279v5 e, se solicitado, do código CRC FEA8B6DF. | |
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| Signatário (a): | Rogerio Favreto |
| Data e Hora: | 02/03/2016 16:35 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5025403-74.2014.4.04.7200/SC
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | EDGAR SCHUTZ |
ADVOGADO | : | NORMA TERESINHA DOS SANTOS FRANZONI |
RELATÓRIO
Trata-se de ação de rito ordinário ajuizada em 01/08/2014 por EDGAR SCHUTZ contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, visando o restabelecimento de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição (NB 42/137.795.909-8), com DER em 21/03/2006, e cancelado em novembro de 2010, por supostas irregularidades no cômputo do tempo de serviço, relativas a recolhimentos de contribuinte individual efetuados em atraso, progressão indevida na escala de salário base, divergências entre os valores efetivamente pagos através de guias e as planilhas de cálculo do benefício, recolhimentos indevidos, por estarem no mesmo DEBCAD. Afirma que sempre laborou como professor, palestrante e congressista, e que o recolhimento mensal de suas contribuições previdenciárias ficava ao encargo de contadores, nunca tendo exercido fiscalização a respeito. Assim, no intuito de se aposentar, foi informado por seu procurador que não havia recolhimento de contribuições previdenciárias em relação a todo o período de atividade, de modo que ele teria de proceder ao recolhimento das contribuições em atraso. Aduz que, fornecidas pelo INSS as respectivas guias consolidadas, efetuou o recolhimento das contribuições em atraso pessoalmente em caixa eletrônico. Postulou a procedência da ação, nos seguintes termos:
1) Em primeiro, em face da urgência, que SEJA CONCEDIDA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA para, suspendendo os efeitos da decisão administrativa, determinar que o Réu INSS restabeleça incontinenti o provento integral de aposentadoria por tempo de contribuição ao Autor, abstendo-se de descontar qualquer valor a título de repetição, até o julgamento final da presente ação;
(...)
REQUER o julgamento procedente da presente ação para RECONHECER e DECLARAR o direito do Autor de incluir, total ou parcialmente, os períodos excluídos pelo Réu em seu tempo de contribuição, quais sejam:
a) os recolhimentos e pagamentos em atraso das contribuições, bem como a validade das competências e valores, referente ao período de 01/1990 a 04/1995, conforme guia consolidada fornecida pelo INSS e seu comprovante de pagamento; referente ao período de 07/1980 a 04/1989, em guia consolidada fornecida pelo INSS e seu comprovante de pagamento; referente ao período de 05/1995 a 09/1999, em guia consolidada fornecida pelo INSS e seu comprovante de pagamento; e, referente ao período de 10/99 a 03/2003 em guia consolidada fornecida pelo INSS e seu comprovante de pagamento;
REQUER o julgamento procedente da presente ação para:
a) RECONHECER e DECLARAR o direito do Autor AO RESTABELECIMENTO da Aposentadoria por Tempo de Contribuição desde a data da sua suspensão em 01.10.2010, CONDENANDO o Réu ao pagamento de todos os proventos não pagos acrescido de juros de mora e de correção monetária, sem a devolução de qualquer importância, TORNANDO DEFINITIVA a Antecipação de Tutela, se concedida de plano;
b) CONDENAR o Réu a pagar ao Autor todas as diferenças dos proventos que lhe foram pagos a menor, desde a data do pedido administrativo até a data do efetivo pagamento, com base no salário de benefício recalculado, com a inclusão total ou parcial das contribuições excluídas pelo Réu, acrescidas de juros de mora e de correção monetária;
c) e, sucessivamente, sempre, considerando aquela aposentadoria que segundo o valor do benefício lhe seja mais benéfica, em obediência ao Princípio da Melhor Aposentadoria, CONCEDER APOSENTADORIA POR IDADE, nela incluindo todas as contribuições aportadas após dezembro de 2005 em nome do Autor e com a inclusão total ou parcial das contribuições pagas em atraso excluídas pelo Réu, bem como REQUER o PAGAMENTO INTREGAL DOS PROVENTOS correspondentes a mesma, sem qualquer desconto;
d) a DEVOLUÇÃO dos valores correspondentes a toda e qualquer contribuição, total ou parcial, considerada como incorreta e inválida por este MM. Juízo, devidamente corrigidos e acrescidos dos juros de mora, ante o recolhimento de boa fé do Autor, em atendimento a ordem emanada do Réu, sobre a qual não havia como se opor.
(...)
Em contestação, o INSS aduziu que o autor não comprovou o exercício de atividade nos períodos pagos em atraso e também efetuou progressão indevida na escala de salário base em 04/1995. Verificou, ainda, divergências entre as guias referentes aos períodos de 07/1980 a 05/1989 e de 01/1990 a 04/1995 e as planilhas constantes do processo administrativo, sendo que das duas guias de recolhimento constou indevidamente o mesmo identificador DEBCAD (identificador gerado pelo sistema para o recolhimento de competências em atraso).
Sentenciando em 21/08/2015, o juízo "a quo" reconheceu como irregulares os recolhimentos em atraso das contribuições de contribuinte individual apontadas pelo INSS no processo administrativo. No entanto, por inexistência de má-fé, reconheceu o direito do autor à sua restituição, bem como deferiu a antecipação de tutela para determinar ao INSS que proceda à imediata implantação do benefício de aposentadoria por idade em seu favor, com DIP em 01/09/2015, julgando parcialmente procedente o pedido para:
a) declarar que as parcelas do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 42/137.795.909-8) pagas indevidamente ao autor no período de 21/03/2006 a 30/09/2010 são irrepetíveis, não podendo ser exigida, pelo INSS, a restituição do quantum (R$ 69.148,76, atualizado até 12/01/2012);
b) condenar o INSS a pagar, devidamente atualizados, os valores relativos às contribuições previdenciárias que o autor recolheu em 01/03/2006, referente às competências de 07/1980 a 05/1989, de 01/1990 a 04/1995, de 05/1995 a 09/1999 e de 10/1999 a 03/2003, o que fez por intermédio das guias anexadas no evento 1, PROCADM4, p. 32-35, e;
c) reconhecer o direito do autor à obtenção do benefício de aposentadoria por idade, cuja data de início recairá na data da citação do INSS (em 02/09/2014 - evento 11), e condenar a autarquia previdenciária ao pagamento das prestações mensais vencidas e vincendas com os acréscimos legais, nos termos da fundamentação.
Condeno o INSS ao pagamento de honorários de advogado, que fixo em 10% (dez por cento) das diferenças de prestações devidas até a data da prolação desta sentença (Súmulas 76 do TRF da 4ª Região e 111 do STJ), devendo também ser considerado na base de cálculo da sucumbência os valores a serem restituídos ao autor, descritos no item "b" acima.
O INSS é isento do pagamento das custas no âmbito da Justiça Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96).
Sentença sujeita ao reexame necessário.
Inconformado, o INSS interpôs apelação, aduzindo que o autor obrou de má-fé, visto que não é pessoa iletrada que desconheça as práticas de gestão empresarial. Alega restar comprovado, no processo administrativo, que o demandante efetuou o pagamento a menor do que aquele calculado e apresentado pelo INSS, sem atualizações. Defende que há sérios indícios de que o autor agiu de má-fé, não podendo ser desobrigado do ressarcimento das quantias recebidas indevidamente. Por fim, acaso mantida a sentença, postula a aplicação da Lei nº 11.960/09, no que diz respeito aos critérios de correção monetária e juros moratórios incidentes sobre o montante da condenação.
Oportunizadas contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
A parte autora (EVENTO2) postulou a intimação do INSS para que comprovasse a implementação do benefício de aposentadoria por idade, antecipada pela sentença.
O INSS (EVENTO3) aduziu que a ação foi julgada parcialmente procedente para condenar-lhe a devolver os valores referentes às competências de 07/1980 a 05/1989, de 01/1990 a 04/1995, de 05/1995 a 09/1999 e de 10/1999 a 03/2003, recolhidos por intermédio das guias consideradas irregulares pela autarquia previdenciária (EVENTO 1, PROCADM4, p. 32-35). Assim, como serão devolvidos os referidos valores, as respectivas competências devem ser excluídas do tempo de contribuição, não implementando o autor a carência mínima de 180 contribuições para a concessão do benefício de aposentadoria por idade. Requereu, portanto, a suspensão do cumprimento da decisão que antecipou a tutela.
Intimado, o autor alegou que implementa 188 contribuições, mesmo após a exclusão das competências determinada pela sentença e que o cálculo de tempo de serviço que acompanhou a manifestação do EVENTO3 não considerou todas as outras contribuições aportadas pelo segurado ao longo de sua vida ativa e já computadas pelo INSS por ocasião da concessão de seu benefício NB 42/137.795.909-8. Postulou a implementação do benefício, a fixação de prazo para cumprimento e de multa diária por descumprimento.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório.
VOTO
MÉRITO
A sentença concluiu pela regularidade do procedimento administrativo que resultou na suspensão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço percebido pelo autor, visto que observados os princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal. Julgou, ainda, procedente o pedido de restituição da indenização referente aos valores das contribuições previdenciárias atrasadas, entendendo não restar comprovada a má-fé do autor a ensejar a devolução dos valores do benefício percebido até a sua suspensão. Considerando o preciso exame efetuado pelo juiz federal Adriano José Pinheiro, peço licença para transcrever parte da sentença, a fim de evitar tautologia:
"(...)
Diante dos documentos apresentados, observa-se que, no aspecto formal, não houve qualquer irregularidade ou ilegalidade no procedimento administrativo que resultou na suspensão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço do autor, uma vez que foram respeitados os princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal.
Oportunizados ao segurado, ora autor, o contraditório e ampla defesa, ele deixou de apresentar documentos que pudessem tornar injustificável a alegação das irregularidades apontadas no procedimento administrativo em comento, limitando-se a asseverar, nos presentes autos, que o INSS (...) não o informou, nem o orientou no que deveria fazer para que sua aposentadoria revisada fosse mantida, ainda que com valor diverso do deferido inicialmente; bem como não o esclareceu qual comprovação deveria fazer, o que tornou inócua toda e qualquer manifestação sua, inobstante tivesse, efetivamente condições de comprovar a regularidade da concessão (evento 18, PET1), sem mencionar qualquer fato tendente a demonstrar que o procedimento realizado pelo INSS foi indevido ou irregular.
Via de consequência, uma vez que não restou demonstrada qualquer invalidade ou ilegalidade na revisão administrativa do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição do autor (NB 42/137.795.909-8), que foi procedida em razão da comprovação de diversas irregularidades por ocasião da sua concessão, não há como reconhecer o pretenso direito ao restabelecimento do indigitado benefício.
De outro lado, visando evitar o enriquecimento sem causa do INSS, procede o pedido do autor para reaver, devidamente atualizados, os valores relativos às contribuições previdenciárias que recolheu em 01/03/2006 visando o cômputo do tempo de contribuição referente às competências de 07/1980 a 05/1989, de 01/1990 a 04/1995, de 05/1995 a 09/1999 e de 10/1999 a 03/2003, o que fez por intermédio das guias anexadas no evento 1, PROCADM4, p. 32-35, que foram considerados irregulares pela autarquia previdenciária pelos motivos expostos no relatório individual datado em 11/11/2009 (evento 1, PROCADM8, p. 34):
a) Valor de R$ 22.284,44 (referente às competências de 07/1980 a 05/1989 - evento 1, PROCADM4, p. 32);
b) Valor de R$ 8.589,24 (referente às competências de 01/1990 a 04/1995 - evento 1, PROCADM4, p. 33);
c) Valor de R$ 2.882,01 (referente às competências de 05/1995 a 09/1999 - evento 1, PROCADM4, p. 34); e
d) Valor de R$ 14.969,97 (referente às competências de 10/1999 a 03/2003 - evento 1, PROCADM4, p. 35).
As contribuições recolhidas em atraso pelo autor configuram indenização para cômputo de tempo de contribuição, tratando-se de uma faculdade do segurado que queira contar tempo de serviço para se aposentar (art. 45-A Lei 8.213/91). Ora, levando-se em conta que o INSS considerou irregulares e insuficientes referidas indenizações e, outrossim, levando-se em conta que em sua contestação o referido ente autárquico nada referiu quanto a este particular, não há razão jurídica que impeça o reconhecimento do direito da parte autora de reaver o que pagou a esse título, sob pena, frise-se, de enriquecimento sem causa do ente público.
Ademais, ainda que não haja arguição a respeito, não há se falar em prescrição quinquenal quanto a esse pedido (item "d" da petição inicial), tendo em vista que a decisão administrativa do INSS que reconheceu a irregularidade dos valores das contribuições previdenciárias por ele pagas em atraso foi proferida em 11/11/2009 (evento 1, PROCADM8, p. 34), data a partir da qual se computa o prazo prescricional de 05 (cinco) anos. Como a ação foi proposta em 01/08/2014, não houve prescrição.
Restituição ao Erário dos valores pagos indevidamente ao autor
A documentação apresentada nos autos não caracteriza de modo inequívoco a má-fé do autor.
Assim, considerando o caráter alimentar dos benefícios previdenciários e a ausência de efetiva comprovação da má-fé do autor/segurado, considero que as parcelas do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 42/137.795.909-8) a ele pagas indevidamente no período de 21/03/2006 a 30/09/2010 devem ser tidas como irrepetíveis, não podendo ser exigida, pelo INSS, a restituição do quantum (R$ 69.148,76, atualizado até 12/01/2012).
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região já consolidou o entendimento no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias.
Cito, a título de exemplo, os seguintes julgados:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. RESTITUIÇÃO DE VALORES DECORRENTES DE BENEFÍCIO FRAUDULENTO. BOA-FÉ DO BENEFICIÁRIO.
1. A Terceira Seção desta Corte sedimentou o entendimento de serem irrepetíveis as parcelas indevidas de benefícios previdenciários recebidas de boa-fé, em face do seu caráter eminentemente alimentar.
2. Não havendo indícios de que a segurada tenha participado da fraude perpetrada contra o INSS, não se deve exigir a repetição do valor recebido irregularmente.
(TRF4, APELREEX 5008131-35.2012.404.7104, Sexta Turma, Relatora p/ Acórdão Luciane Merlin Clève Kravetz, D.E. 27/09/2013)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REPETIÇÃO DE VALORES INDEVIDAMENTE PERCEBIDOS. BOA-FÉ. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE PROFISSIONAL PARALELA.
I. Esta Corte vem se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, em razão do caráter alimentar das prestações previdenciárias, restando relativizada a regra inscrita no art. 115, inciso II, da Lei n. 8.213/91.
II. A má-fé deve ser cabalmente comprovada, não podendo ser presumida em prejuízo do segurado.
(TRF4, APELREEX 5002500-68.2012.404.7118, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Gerson Godinho da Costa, D.E. 30/09/2013)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. DESCONTOS ADMINISTRATIVOS. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ.
1. Esta Corte vem se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99.
2. Hipótese em que, diante do princípio da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos, deve ser afastada a cobrança dos valores determinada pela autarquia.
(TRF4, APELREEX 5020951-74.2012.404.7108, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Rogerio Favreto, D.E. 26/09/2013)
No mesmo sentido vem se manifestando o Superior Tribunal de Justiça, conforme se pode observar do seguinte precedente:
'AGRAVO REGIMENTAL. DEVOLUÇÃO DE DIFERENÇAS RELATIVAS A PRESTAÇÃO ALIMENTAR. DESCABIDA.
O caráter eminentemente alimentar dos benefícios previdenciários faz com que tais benefícios, quando recebidos a maior em boa-fé, não sejam passíveis de devolução.
Agravo regimental a que se nega provimento'.
(AgRg no Resp nº 705.249/SC, Rel. Ministro Paulo Medina, DJ de 20/02/2006)
(...)" (destaquei)
Não vejo motivos para modificar a tão bem fundamentada sentença, que examinou com precisão toda a prova produzida nestes autos, inclusive as alegações ora reiteradas, em sede de apelação.
De fato, o mero recolhimento da indenização em valor menor do que o calculado não é suficiente para configurar a má-fé do segurado, visto que cabia à Autarquia ré admitir, ou não, o montante recolhido como correto, bem como atribuir-lhe os respectivos efeitos previdenciários. E, na hipótese de ter acolhido tal montante e concedido o benefício de forma equivocada, deveria, diante do princípio da legalidade, anular o referido ato administrativo, porque eivado de vícios que o tornavam ilegal.
Considerando-se que somente a boa-fé é presumida, tenho que, no caso em concreto, a parte ré não logrou êxito em comprovar a alegada má-fé do segurado, não bastando para tanto meras alegações de que o segurado "não é pessoa iletrada que desconheça as práticas de gestão empresarial."
Assim, não merece provimento o apelo e a remessa oficial quanto ao ponto, devendo ser confirmada a sentença.
Portanto, por força da remessa oficial, passo ao exame do direito à aposentadoria por idade, deferida pela sentença desde a data da citação do INSS (02/09/2014).
Prevê o art. 48 da Lei nº 8.213/91:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 28.4.95)
Como visto, dois são os requisitos para a obtenção da aposentadoria por idade urbana: a) idade mínima (65 anos para o homem e 60 anos para a mulher) e b) carência.
A carência foi fixada pela Lei nº 8.213/1991 em 180 meses de contribuição (art. 25, II, da Lei nº 8.213/91). Na revogada CLPS/1984, ela era de 60 contribuições (art. 32, caput, dessa Consolidação). No que tange à carência, todavia, a Lei nº 8.213/1991 estabeleceu norma de transição, haja vista o aumento que se verificou no número de contribuições exigido (de 60 para 180). Também estabeleceu o artigo 142 do referido diploma que a carência deve levar em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício.
Não se pode perder de vista, outrossim, o que estabelece o § 1º do art. 102, da Lei n.º 8.213/91:
Art. 102. A perda da qualidade de segurado importa em caducidade dos direitos inerentes a essa qualidade.
§ 1º A perda da qualidade de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos.
Interpretando os dispositivos acima transcritos, à luz dos princípios da ampla proteção e da razoabilidade, e tendo em vista que a condição essencial para a concessão da aposentadoria por idade é o suporte contributivo correspondente, consubstanciado na carência implementada, a jurisprudência nacional caminhou no sentido de entender que é irrelevante a perda da condição de segurado para a concessão do referido benefício.
Desta forma, os requisitos necessários à obtenção do benefício (idade e carência) podem ser preenchidos separadamente (EREsp 551997/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 27/04/2005, DJ 11/05/2005, p. 162).
Assim, fica evidente não importar a circunstância de ter a carência sido preenchida anteriormente à perda da qualidade de segurado e do implemento etário. O fator relevante é o somatório das contribuições, vertidas a qualquer tempo anteriormente à perda da qualidade de segurado, alcançar o mínimo exigido para a obtenção da carência, a qual se encontra atualmente delineada na tabela do art. 142 da Lei n.º 8.213/91 e no regime da CLPS/84, em seu art. 32. A questão é atuarial. O que se exige é que o benefício esteja lastreado em contribuições suficientes, de modo a ser minimamente suportado pelo Sistema Previdenciário. Implementado esse requisito, resta apenas atingir a idade mínima prevista em lei.
Nesse sentido, o disposto no parágrafo 1º do artigo 3º da Lei n.º 10.666/2003:
"Art. 3º - A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial.
§ 1º Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício.
§ 2º A concessão do benefício de aposentadoria por idade, nos termos do §1º, observará, para os fins de cálculo do valor do benefício, o disposto no art. 3º, caput e §2º, da Lei nº 9.876, de 26 de novembro de 1999, ou, não havendo salários de contribuição recolhidos no período a partir da competência julho de 1994, o disposto no art. 35 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991."
No presente caso, observo que a parte autora preencheu o requisito etário, 65 (sessenta) anos, em 06/04/2011, porquanto nascida em 06/04/1946.
Dessa forma, a parte autora deve comprovar o recolhimento de contribuições no período de 180 meses.
Pois bem, por ocasião da concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço (NB 137.795.909-8), o INSS computou 35 anos, 9 meses e 21 dias de tempo de serviço e 432 contribuições para fins de carência (EVENTO15, PROCADM2, págs. 9-10).
A exclusão das competências de 07/1980 a 05/1989 e de 01/1990 a 03/2003, efetuada pela sentença, importou em redução do tempo de serviço para 13 anos, 7 meses e 21 dias e de carência para 166 meses na data da DER (21/03/2006), o que é insuficiente para o restabelecimento do benefício de aposentadoria por tempo de serviço.
Por outro lado, mesmo que fossem consideradas as competências em que houve recolhimento como contribuinte individual, posteriores à DER, constantes do CNIS (11/2006 e de 03/2007 a 09/2007), ainda assim o demandante computaria apenas 14 anos, 3 meses e 21 dias de tempo de serviço e 174 meses de carência até a data da citação (02/09/2014 - limite considerado pela sentença). Tal configuração é insuficiente inclusive para a concessão do benefício de aposentadoria por idade, visto que o autor, nascido em 06/04/1946, implementou 65 anos em 06/04/2011, necessitaria comprovar 180 meses de carência, o que não ocorreu. Merece alteração a sentença no ponto.
Na petição acostada em 17/12/2015 (EVENTO7) a parte autora sustenta que implementa 188 contribuições, mesmo após a exclusão das competências determinada pela sentença, e que o cálculo de tempo de serviço que acompanhou a manifestação do EVENTO3 não considerou todas as outras contribuições aportadas pelo segurado ao longo de sua vida ativa e já computadas pelo INSS por ocasião da concessão de seu benefício NB 42/137.795.909-8.
Parcial razão assiste ao autor, no entanto. De fato, o cálculo apresentado no EVENTO3 (OUT2) desconsidera diversas competências reconhecidas administrativamente e não excluídas pela sentença.
Portanto, devem ser consideradas as contribuições já computadas pelo INSS, constante da cópia do processo administrativo (EVENTO15, PROCADM2, págs. 9-10), que acompanhou a contestação. No entanto, constata-se, consoante planilha de tempo de serviço em anexo (parte integrante do presente julgado), que o segurado não totaliza as alegadas 188 contribuições.
Sinale-se que, contrário ao afirmado pelo demandante no EVENTO7, não restaram computados pelo INSS, por ocasião da concessão, tampouco acostados nestes autos os comprovantes de recolhimento relativos às seguintes competências: 05/2003 a 07/2003, 08/2004, 08/2005, 02/2006 a 06/2006, 12/2006 a 02/2007. Ora, não havendo reconhecimento na esfera administrativa, deveria o segurado postular o reconhecimento na esfera judicial. Não o fazendo, inviável que sejam consideradas as referidas competências como tempo de contribuição incontroverso entre as partes.
Assim, não implementando a parte autora a carência de 180 contribuições, necessária à concessão do benefício de aposentadoria por idade no ano de 2011, deve ser reformada a sentença no ponto e, por conseqüência, revogada a antecipação de tutela concedida.
Concluindo, tenho que a sentença merece ser reformada quanto à concessão do benefício de aposentadoria por idade.
CONCLUSÃO
Em provimento à remessa oficial, a sentença resta parcialmente reformada para afastar-se a concessão do benefício de aposentadoria por idade ao autor.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à remessa oficial e negar provimento à apelação do INSS.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 23/02/2016
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5025403-74.2014.4.04.7200/SC
ORIGEM: SC 50254037420144047200
RELATOR | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Carlos Eduardo Copetti Leite |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | EDGAR SCHUTZ |
ADVOGADO | : | NORMA TERESINHA DOS SANTOS FRANZONI |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 23/02/2016, na seqüência 268, disponibilizada no DE de 03/02/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
: | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT | |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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