APELAÇÃO CÍVEL Nº 5048478-63.2014.404.7000/PR
RELATOR | : | PAULO PAIM DA SILVA |
APELANTE | : | MATEUS GRANJA PINTO LESSA |
PROCURADOR | : | ALEIXO FERNANDES MARTINS (DPU) DPU048 |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. RESTITUIÇÃO. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ.
1. Adotada a concepção ética da boa-fé, predominante no nosso direito, caberá a restituição de valores indevidamente pagos pela Previdência Social, em decorrência do recebimento de benefício, sempre que a ignorância do erro pelo beneficiário não for desculpável.
2. Caso em que a parte autora que recebia benefício assistencial, concedido em razão da miserabilidade e da incapacidade para o trabalho, passou a ter vínculo laboral, não comunicando o fato ao INSS.
3. "É devida a restituição de benefício previdenciário indevidamente percebido por pensionista de servidor público, quando não se cogita do desconhecimento da ilegitimidade do pagamento, estando afastada a presunção de boa-fé". (STJ. Precedente da Corte Especial: MS 13.818/DF, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 17.04.13).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de fevereiro de 2015.
Juiz Federal Paulo Paim da Silva
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Paulo Paim da Silva, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7333125v2 e, se solicitado, do código CRC B60678B6. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Paulo Paim da Silva |
| Data e Hora: | 27/02/2015 10:31 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5048478-63.2014.404.7000/PR
RELATOR | : | PAULO PAIM DA SILVA |
APELANTE | : | MATEUS GRANJA PINTO LESSA |
PROCURADOR | : | ALEIXO FERNANDES MARTINS (DPU) DPU048 |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
A presente ação foi ajuizada pelo INSS para cobrança de valores de benefício previdenciário que teriam sido pagos indevidamente à parte requerida, em função da percepção de benefício de amparo social com atividade laborativa concomitante, o que teria ocorrido de abril/2012 a janeiro/2014.
A sentença foi de procedência, condenando-se a parte ré ao ressarcimentos dos valores, a serem atualizados pelo INPC e juros moratórios de 1% ao mês.
Recorre a parte ré, representada pela Defensoria Pública da União, alegando que não cabe restituição, tendo em vista o caráter alimentar dos valores recebidos e a boa-fé.
Com contrarrazões, vieram os autos.
VOTO
No presente caso não há remessa oficial, uma vez que a Fazenda Pública é autora, e não foi condenada a qualquer pagamento.
Recebimento indevido de benefício assistencial
A parte autora recebia benefício assistencial, concedido em razão da miserabilidade e da incapacidade para o trabalho, benefício concedido a contar de 12/11/1997, quando a autora contava com 10 anos de idade (nascida em 04/02/1987). Todavia, passou a ter vínculos trabalhistas registrados no CNIS a partir de abril de 2012, situação que não se coaduna com a natureza assistencial do benefício que recebia, possibilitando a suspensão, nos termos do artigo 21-A da Lei 8.742/93.
No caso inviável reconhecer boa-fé, como observado na sentença:
A impossibilidade de alegar ignorância como escusa ao cumprimento da lei se funda na idéia de que a lei, uma vez publicada, torna-se de conhecimento geral. Trata-se de presunção iure et de iure, contra a qual não se admite prova.
Vale notar que o realinhamento da jurisprudência do STJ não foi no sentido de se admitir a repetição de valores indiscriminadamente, mas de delimitar o alcance da irrepetibilidade. Passou-se então a adotar o critério da boa-fé objetiva, traduzida em expectativa legítima do beneficiário de que os valores recebidos são lícitos. Considerando, entretanto, que a ninguém é dado escusar-se do cumprimento da lei alegando sua ignorância, não se poderia reputar legítima a confiança do requerido ante a vedação legal de percepção de outra renda. Assim, não se verifica a boa-fé objetiva no caso.
O requerido alegou também dificuldades financeiras que o teriam levado a procurar outras fontes de renda, ainda assim precárias segundo sustenta. A precariedade de tais fontes estaria demonstrada, segundo seu entendimento, pela curta duração dos vínculos e pela baixa remuneração. Tais circunstâncias não elidem, contudo, o fato de que ao requerido é possível exercer algum tipo de trabalho remunerado, estando superada a barreira que a deficiência lhe impunha até então.
Vale notar que as informações contidas no CNIS indicam que o primeiro dos vínculos firmados sob a vigência do benefício encerrou-se por iniciativa do próprio empregado (evento 19, CNIS3, p. 3). O terceiro contrato foi firmado a termo e o quarto ainda estaria em vigor, ao menos até julho do presente ano, última competência para qual consta remuneração no extrato do CNIS (evento 19, CNIS3, p. 4). Ressalvado o segundo contrato, rescindido por iniciativa do empregador, pode-se perceber que o requerido não teve dificuldades em encontrar novas colocações.
Também se infere do extrato no CNIS, que as remunerações auferidas, ao menos no último contrato, superam o valor do salário mínimo e, portanto, do próprio benefício. Tal circunstância torna secundário o caráter alimentar do benefício, pois suplantada sua necessidade pela remuneração advinda do trabalho. Isto porque, ainda que o requerido enfrente despesas com tratamento de saúde, o benefício perdeu sua finalidade de suprir a falta de renda, passando a um mero acréscimo patrimonial para o beneficiário.
Ocorre que a recuperação da capacidade para o trabalho retira desse 'acréscimo' a causa jurídica para o pagamento. Com isso, seu recebimento pelo requerido tornou-se indevido, fazendo-se à custa da Previdência Social e, assim, configurando o enriquecimento sem causa como definido no Código Civil:
Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
Entende-se, ainda, pela existência duas espécies de boa-fé no âmbito do direito. Uma objetiva, referente ao padrão de conduta a ser tomado pelos indivíduos em suas relações sociais, e outra subjetiva, pertinente a aspectos anímicos do indivíduo em situações concretas. No tocante à análise de questões referentes à restituição de benefícios previdenciários é de se perquirir a segunda, a boa-fé subjetiva, que diz respeito ao ânimus do beneficiário.
Neste aspecto refiro conclusão do Desembargador Federal Rômulo Pizzolatti, em artigo intitulado 'A restituição de benefícios previdenciários pagos indevidamente e seus requisitos', inserido na Revista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, nº 78, p. 11/122, verbis:
'(...) Adotada a concepção ética da boa-fé, predominante no nosso direito, caberá então a restituição de valores indevidamente pagos pela Previdência Social, em decorrência de erro administrativo, sempre que a ignorância do erro pelo beneficiário não for desculpável. A meu ver, não é desculpável o recebimento de benefícios inacumuláveis (Lei nº 8.213, de 1991, art. 124), porque a lei é bastante clara, sendo de exigir-se o seu conhecimento pelo beneficiário. Também não será escusável o recebimento, em virtude de simples revisão, de valor correspondente a várias vezes o valor do benefício. Do mesmo modo, não cabe alegar boa-fé o pensionista que recebe pensão de valor integral e continua a receber o mesmo valor, ciente de que outro beneficiário se habilitou e houve o desdobramento da pensão. De qualquer modo, serão os indícios e circunstâncias que indicarão, em cada caso concreto, se a ignorância do erro administrativo pelo beneficiário é escusável ou não.'
Daí se conclui que se o erro não for desculpável, resta caracterizada a má-fé.
No presente caso, a parte autora recebeu benefício que sabia indevido, porque concomitante com o exercício de atividade laboral:
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA PELO RECONHECIMENTO DE MÁ-FÉ NA CONCESSÃO. 1. Recebendo benefício previdenciário por erro na concessão, é cabível a restituição, com reconhecimento de má-fé, quando a ignorância do erro pelo beneficiário não for desculpável. 2. Situação em que o beneficiário tinha ciência de que o benefício não lhe era devido, pois quando da concessão foi computado tempo de serviço que sabia inexistente. 3. Caracterizada má-fé no recebimento de benefício indevido afasta-se a ocorrência de prazo decadencial para revisão por parte do INSS. Decadência que corre normalmente, todavia, em relação a pedido do beneficiário para alteração do ato de concessão. (TRF4, AC 5011495-92.2011.404.7122, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Paulo Paim da Silva, juntado aos autos em 30/05/2014)
Confirma-se, pois, o dever de restituir os valores recebidos indevidamente, mantendo-se a forma de atualização do débito, ante a ausência de recurso no ponto.
Prequestionamento
Para fins de possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores dou por prequestionadas as matérias constitucionais e legais alegadas em recurso pelas partes, nos termos das razões de decidir já externadas no voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou tidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do declinado.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo da parte autora.
Juiz Federal Paulo Paim da Silva
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Paulo Paim da Silva, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7333124v2 e, se solicitado, do código CRC F78A216E. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Paulo Paim da Silva |
| Data e Hora: | 27/02/2015 10:31 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/02/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5048478-63.2014.404.7000/PR
ORIGEM: PR 50484786320144047000
RELATOR | : | Juiz Federal PAULO PAIM DA SILVA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal CELSO KIPPER |
PROCURADOR | : | Procuradora Regional da República Solange Mendes de Souza |
APELANTE | : | MATEUS GRANJA PINTO LESSA |
PROCURADOR | : | ALEIXO FERNANDES MARTINS (DPU) DPU048 |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/02/2015, na seqüência 1098, disponibilizada no DE de 10/02/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal PAULO PAIM DA SILVA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal PAULO PAIM DA SILVA |
: | Des. Federal CELSO KIPPER | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7380109v1 e, se solicitado, do código CRC 15D4CC36. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 26/02/2015 15:59 |
