Apelação Cível Nº 5008612-29.2020.4.04.7003/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
APELANTE: ANTONIO MARQUES DA SILVA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária em que postulada a revisão de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 140.788.415-5 - DIB 22/05/2007), mediante o reconhecimento da especialidade da atividades exercidas no período de 09/08/1974 a 21/05/2007.
Instruído o feito, sobreveio sentença de parcial procedência, nos seguintes termos (ev. 53):
DISPOSITIVO
Ante o exposto, reconheço a ocorrência de decadência quanto a revisão da concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 140.788.415-5, com DIB em 22/05/2007) e com fulcro no artigo 487, inc. II, do Código de Processo Civil, JULGO EXTINTO O PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
CONDENO o parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios ao procurador da parte ré, os quais, sopesados os critérios legais, fixo sobre o valor de 10 % sobre o valor da causa.
Custas pela parte autora.
Interposto recurso de apelação, intime-se o apelado para apresentar contrarrazões no prazo legal. Havendo apelação adesiva, intime-se o apelante para apresentar contrarrazões. Após, decorridos os prazos, remetam-se os autos ao e. Tribunal Regional Federal da 4ª Região, independentemente de juízo de admissibilidade (art. 1.010 do CPC/2015).
Dou esta sentença por publicada com a sua liberação no sistema. Registrada eletronicamente. Intimem-se e oportunamente arquivem-se os autos.
A parte autora apela alegando a não ocorrência da decadência. Sustenta que o prazo decadencial inicia após a decisão definitiva da ação trabalhista que concedeu adicional de insalubridade no período requerido, bem como alega a especialidade do período.
Sem contrarrazões, os autos vieram conclusos.
É o relatório.
Peço dia.
VOTO
MÉRITO
DECADÊNCIA
A decadência em matéria previdenciária está regulada pelo art. 103 da Lei de Benefícios (Lei nº 8.213/91).
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE nº 626.489, (Tema 313), sob a sistemática da repercussão geral, fixou as diretrizes para o reconhecimento da decadência em casos de revisão de benefícios previdenciários, cujo acórdão restou assim ementado:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL (RGPS). REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. DECADÊNCIA.
1. O direito à previdência social constitui direito fundamental e, uma vez implementados os pressupostos de sua aquisição, não deve ser afetado pelo decurso do tempo. Como consequência, inexiste prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário.
2. É legítima, todavia, a instituição de prazo decadencial de dez anos para a revisão de benefício já concedido, com fundamento no princípio da segurança jurídica, no interesse em evitar a eternização dos litígios e na busca de equilíbrio financeiro e atuarial para o sistema previdenciário.
3. O prazo decadencial de dez anos, instituído pela Medida Provisória 1.523, de 28.06.1997, tem como termo inicial o dia 1º de agosto de 1997, por força de disposição nela expressamente prevista. Tal regra incide, inclusive, sobre benefícios concedidos anteriormente, sem que isso importe em retroatividade vedada pela Constituição.
4. Inexiste direito adquirido a regime jurídico não sujeito a decadência.
5. Recurso extraordinário conhecido e provido.
(RE 626.489, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe 22/09/2014)
Diante disso, em relação aos benefícios concedidos até 27/06/1997, ou seja, anteriormente à introdução do instituto da decadência, o prazo respectivo tem início no dia 01/08/1997, levando em conta que a primeira prestação superveniente à instituição da decadência foi paga em 07/1997, em decorrência da interpretação da aplicação do dispositivo - a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação (art. 103 da Lei de Benefícios).
No mesmo sentido, ademais, o Superior Tribunal de Justiça decidiu anteriormente o Tema 544 (julgado em 28/11/2012), in verbis:
O suporte de incidência do prazo decadencial previsto no art. 103 da Lei 8.213/1991 é o direito de revisão dos benefícios, e não o direito ao benefício previdenciário. Incide o prazo de decadência do art. 103 da Lei 8.213/1991, instituído pela Medida Provisória 1.523-9/1997, convertida na Lei 9.528/1997, no direito de revisão dos benefícios concedidos ou indeferidos anteriormente a esse preceito normativo, com termo a quo a contar da sua vigência (28.6.1997).
Mais recentemente, em 08/2020, o Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar a matéria relativa ao Tema 975, firmou tese no sentido de que "Aplica-se o prazo decadencial de dez anos estabelecido no art. 103, caput, da Lei 8.213/1991 às hipóteses em que a questão controvertida não foi apreciada no ato administrativo de análise de concessão de benefício previdenciário."
A ementa do julgado tem o seguinte teor, in verbis (grifada originalmente):
PREVIDENCIÁRIO. CONTROVÉRSIA SUBMETIDA AO REGIME DOS ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. TEMA 975/STJ. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO. QUESTÕES NÃO DECIDIDAS. DECADÊNCIA ESTABELECIDA NO ART. 103 DA LEI 8.213/1991. CONSIDERAÇÕES SOBRE OS INSTITUTOS DA DECADÊNCIA E DA PRESCRIÇÃO. AFASTAMENTO DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ACTIO NATA.
IDENTIFICAÇÃO DA CONTROVÉRSIA
1. Trata-se de Recurso Especial (art. 105, III, "a" e "c", da CF/1988) em que se alega que incide a decadência mencionada no art. 103 da Lei 8.213/1991, mesmo quando a matéria específica controvertida não foi objeto de apreciação no ato administrativo de análise de concessão de benefício previdenciário.
2. A tese representativa da controvérsia, admitida no presente feito e no REsp 1.644.191/RS, foi assim fixada (Tema 975/STJ): "questão atinente à incidência do prazo decadencial sobre o direito de revisão do ato de concessão de benefício previdenciário do regime geral (art. 103 da Lei 8.213/1991) nas hipóteses em que o ato administrativo da autarquia previdenciária não apreciou o mérito do objeto da revisão."
FUNDAMENTOS DA RESOLUÇÃO DA CONTROVÉRSIA
3. É primordial, para uma ampla discussão sobre a aplicabilidade do art. 103 da Lei 8.213/1991, partir da básica diferenciação entre prescrição e decadência.
4. Embora a questão seja por vezes tormentosa na doutrina e na jurisprudência, há características inerentes aos institutos, das quais não se pode afastar, entre elas a base de incidência de cada um deles, fundamental para o estudo da decadência do direito de revisão dos benefícios previdenciários.
5. A prescrição tem como alvo um direito violado, ou seja, para que ela incida deve haver controvérsia sobre o objeto de direito consubstanciada na resistência manifestada pelo sujeito passivo, sendo essa a essência do princípio da actio nata (o direito de ação nasce com a violação ao direito). Essa disciplina está disposta no art. 189 do CC: "art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206."
6. Por subtender a violação do direito, o regime prescricional admite causas que impedem, suspendem ou interrompem o prazo prescricional, e, assim como já frisado, a ação só nasce ao titular do direito violado.
7. Já a decadência incide sobre os direitos exercidos independentemente da manifestação de vontade do sujeito passivo do direito, os quais são conhecidos na doutrina como potestativos. Dessarte, para o exercício do direito potestativo e a consequente incidência da decadência, desnecessário haver afronta a esse direito ou expressa manifestação do sujeito passivo para configurar resistência, pois o titular pode exercer o direito independentemente da manifestação de vontade de terceiros.
8. Não há falar, portanto, em impedimento, suspensão ou interrupção de prazos decadenciais, salvo por expressa determinação legal (art. 207 do CC).
9. Por tal motivo, merece revisão a corrente que busca aplicar as bases jurídicas da prescrição (como o princípio da actio nata) sobre a decadência, quando se afirma, por exemplo, que é necessário que tenha ocorrido a afronta ao direito (explícito negativa da autarquia previdenciária) para ter início o prazo decadencial.
10. Como direito potestativo que é, o direito de pedir a revisão de benefício previdenciário prescinde de violação específica do fundo de direito (manifestação expressa da autarquia sobre determinado ponto), tanto assim que a revisão ampla do ato de concessão pode se dar haja ou não ostensiva análise do INSS. Caso contrário, dever-se-ia impor a extinção do processo sem resolução do mérito por falta de prévio requerimento administrativo do ponto não apreciado pelo INSS.
11. Isso é reforçado pelo art. 103 da Lei 8.213/1991, que estabelece de forma específica o termo inicial para o exercício do direito potestativo de revisão quando o benefício é concedido ("a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação") ou indeferido ("do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo").
12. Fosse a intenção do legislador exigir expressa negativa do direito vindicado, teria ele adotado o regime prescricional para fulminar o direito malferido. Nesse caso, o prazo iniciar-se-ia com a clara violação do direito e aplicar-se-ia o princípio da actio nata.
13. Não é essa compreensão que deve prevalecer, já que, como frisado, o direito que se sujeita a prazo decadencial independe de violação para ter início.
14. Tais apontamentos corroboram a tese de que a aplicação do prazo decadencial independe de formal resistência da autarquia e representa o livre exercício do direito de revisão do benefício pelo segurado, já que ele não se subordina à manifestação de vontade do INSS.
15. Considerando-se, por fim, a elasticidade do lapso temporal para os segurados revisarem os benefícios previdenciários, a natureza decadencial do prazo (não aplicação do princípio da actio nata) e o princípio jurídico básico de que ninguém pode alegar desconhecimento da lei (art. 3º da LINDB), conclui-se que o prazo decadencial deve ser aplicado mesmo às questões não tratadas no ato de administrativo de análise do benefício previdenciário.
FIXAÇÃO DA TESE SUBMETIDA AO RITO DOS ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015
16. Para fins dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015, a controvérsia fica assim resolvida (Tema 975/STJ): "Aplica-se o prazo decadencial de dez anos estabelecido no art. 103, caput, da Lei 8.213/1991 às hipóteses em que a questão controvertida não foi apreciada no ato administrativo de análise de concessão de benefício previdenciário."
RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO
17. Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem entendeu de forma diversa do que aqui assentado, de modo que deve ser provido o Recurso Especial para se declarar a decadência do direito de revisão, com inversão dos ônus sucumbenciais (fl. 148/e-STJ), observando-se a concessão do benefício da justiça gratuita.
CONCLUSÃO
18. Recurso Especial provido. Acórdão submetido ao regime dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015.
(STJ, REsp repetitivos nºs 1.648.336/RS e 1.644.191/RS, 1ª Seção, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, maioria, acórdão publicado em 04/08/2020)
Portanto, a conclusão a que se chega é que deve ser reconhecida a decadência - quando decorrido o prazo de 10 anos previsto no disposto no art. 103 da Lei de Benefícios - inclusive nas situações em que a questão controvertida não tenha sido apreciada no ato administrativo de análise de concessão de benefício.
Defende o autor que a fluência do prazo decadencial deve ser computado após o trânsito em julgado da ação trabalhista que reconheceu a insalubridade do período.
Contudo, conforme bem pontuado na sentença, "na Justiça Trabalhista não houve reconhecimento de tempo de serviço não computado pelo INSS", e, "apesar do reconhecimento de adicional de insalubridade, a percepção de tal verba não é imprescindível para o reconhecimento da especialidade, logo, o prévio manejo da reclamatória trabalhista não seria condição imprescindível para impugnar a especialidade do período, não havendo que se falar em impossibilidade de buscar seu direito antes da conclusão da ação trabalhista".
Portanto, não sendo o caso de reclamatória trabalhista para reconhecimento de tempo de serviço, não serve o trânsito da reclamatória como marco inicial do prazo decadencial, pois a especialidade do período poderia ter sido postulada independente da mesma.
Nesse sentido julgado desta Corte:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. DECADÊNCIA. AÇÃO TRABALHISTA. TEMPO ESPECIAL. 1. Pretendendo o segurado a revisão do benefício mediante o reconhecimento de diferenças salariais reconhecidas em reclamatória trabalhista, o termo inicial da decadência deve ser fixado na data em que redefinidos, naquela ação, os salários de contribuição do período básico de cálculo, uma vez que, se o autor pode exercer o direito à revisão do benefício previdenciário apenas a partir de então, não é razoável admitir a fluência do prazo extintivo em momento anterior. Hipótese em que a demanda judicial não foi apenas declaratória ou condenatória em obrigação de fazer, mas também constitutiva de uma nova condição jurídica. 2. Diversa é a hipótese em que o segurado pretende a revisão do benefício mediante reconhecimento de tempo especial, uma vez que a decisão da ação trabalhista não é condição sine qua non para o ajuizamento da ação revisional, porquanto o segurado poderia ter pleiteado, administrativa ou judicialmente, o reconhecimento da especialidade do período de labor, inclusive requerendo a realização de prova pericial visando à comprovação da exposição a agentes nocivos ou perigosos, até porque se reconhece que não há total identidade entre o pagamento de periculosidade ou insalubridade, em relação trabalhista e o reconhecimento de atividade especial para fins previdenciários. 3. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos REsp nºs 1648336/RS e 1644191/RS (Tema 975), submetidos ao rito dos recursos especiais repetitivos, decidiu que se aplica o prazo decadencial de dez anos estabelecido no art. 103, caput, da Lei 8.213/1991 às hipóteses em que a questão controvertida não foi apreciada no ato administrativo de análise de concessão de benefício previdenciário. O trânsito em julgado do acórdão deu-se em 24/08/2021. 4. Hipótese em que ocorreu a decadência. (TRF4, AC 5001952-79.2021.4.04.7101, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 08/04/2022)
No entanto, por razão diversa daquela apresentada na apelação, entendo pela não ocorrência da decadência, tendo em vista que, no entendimento deste Juízo, "quando houve pedido tempestivo de revisão do benefício na via administrativa, o prazo decadencial tem início no dia em que o segurado tomar conhecimento da decisão de indeferimento do pedido de revisão. Entendimento do Superior Tribunal de Justiça". (TRF4, AC 5001970-13.2020.4.04.7012, DÉCIMA TURMA, Relatora FLÁVIA DA SILVA XAVIER, juntado aos autos em 25/08/2022).
No mesmo sentido, os julgados:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. DECADÊNCIA. ART. 103 DA LEI Nº 8.213/1991. TEMA 313/STF. TEMA 975/STJ. TEMA 966/STJ. TEMA 1.057/STJ. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. 1. O prazo decadencial de dez anos, instituído pela Medida Provisória 1.523/1997, tem como termo inicial o dia 01.08.1997, para os benefícios concedidos antes da sua vigência. 2. Para os benefícios concedidos após a vigência da Medida Provisória nº. 1.523/1997, o prazo decadencial tem início no primeiro dia do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação. 3. "Aplica-se o prazo decadencial de dez anos estabelecido no art. 103, caput, da Lei 8.213/1991 às hipóteses em que a questão controvertida não foi apreciada no ato administrativo de análise de concessão de benefício previdenciário." (Tema 975/STJ) 4. "Incide o prazo decadencial previsto no caput do artigo 103 da lei 8.213/1991 para reconhecimento do direito adquirido ao benefício previdenciário mais vantajoso" (Tema 966/STJ). 5. Quando houve pedido tempestivo de revisão do benefício na via administrativa, o prazo decadencial tem início no dia em que o segurado tomar conhecimento da decisão de indeferimento do pedido de revisão. Entendimento do Superior Tribunal de Justiça. 6. No caso de benefício derivado, em que se busque a revisão do benefício originário, incide a decadência se o direito não foi exercido pelo segurado instituidor no prazo legal. (TRF4 5002745-40.2020.4.04.7008, DÉCIMA TURMA, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 14/09/2022)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. DECADÊNCIA. PEDIDO ADMINISTRATIVO. INTERRUPÇÃO. DIREITO AO MELHOR BENEFÍCIO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TUTELA ESPECÍFICA. 1. O pedido administrativo de revisão do benefício previdenciário constitui exceção à regra da ininterruptividade do prazo decadencial. 2. Uma vez verificado que o segurado possuía na DIB direito à modalidade de aposentadoria mais vantajosa, deve-se reconhecer a possibilidade de revisão do ato para concedê-la, por aplicação da tese do direito adquirido ao melhor benefício consagrada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 630501. 3. Consectários legais fixados nos termos do decidido pelo STF (Tema 810) e pelo STJ (Tema 905). 4. Honorários advocatícios fixados na forma do art. 85, § 4º, III, do Código de Processo Civil. 5. Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do CPC. (TRF4, AC 5025605-90.2019.4.04.7001, DÉCIMA TURMA, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 07/07/2022)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. DECADÊNCIA. PEDIDO ADMINISTRATIVO. 1. O pedido administrativo de revisão, realizado em momento anterior ao prazo de dez anos, tem por efeito afastar a decadência, tendo em vista que representa o exercício do direito de impugnar o ato de concessão do benefício. 2. Hipótese em que não se pode falar em afronta ao quanto decidido no tema 975 do STJ. (TRF4 5015274-76.2019.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, juntado aos autos em 26/10/2022)
No caso, o benefício que se pretende revisar foi concedido em 22/05/2007. Em 22/12/2016, o autor requereu administrativamente a revisão do benefício, postulando o reconhecimento de tempo especial, o qual foi indeferido em 18/09/2017 (evento 1, JUSTIF_ADMIN4), sendo a ação ajuizada em 09/07/2020.
Assim, tendo em vista que não decorridos dez anos entre a concessão e o pedido administrativo de revisão, bem como entre o final deste e o ajuizamento da ação, não transcorrido o prazo decadencial.
Destarte, afasto a decadência.
DO TEMPO ESPECIAL
DAS ATIVIDADES ESPECIAIS
Com relação ao reconhecimento das atividades exercidas como especiais, cumpre ressaltar que o tempo de serviço é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Tal entendimento foi manifestado pelo STJ em julgamento de recurso repetitivo já transitado em julgado - que estabeleceu também a possibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum, mesmo após 1998. É teor da ementa, que transitou em julgado em 10/05/2011:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. RITO DO ART. 543-C, § 1º, DO CPC E RESOLUÇÃO N. 8/2008 - STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADA. AUSÊNCIA DE IDENTIDADE FÁTICA. DESCABIMENTO. COMPROVAÇÃO DE EXPOSIÇÃO PERMANENTE AOS AGENTES AGRESSIVOS. PRETENSÃO DE REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. ÓBICE DA SÚMULA N. 7/STJ.
[...]
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL APÓS 1998. MP N. 1.663-14, CONVERTIDA NA LEI N. 9.711/1998 SEM REVOGAÇÃO DA REGRA DE CONVERSÃO.
1. Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/1991.
2. Precedentes do STF e do STJ.
CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM. OBSERVÂNCIA DA LEI EM VIGOR POR OCASIÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE. DECRETO N. 3.048/1999, ARTIGO 70, §§ 1º E 2º. FATOR DE CONVERSÃO. EXTENSÃO DA REGRA AO TRABALHO DESEMPENHADO EM QUALQUER ÉPOCA.
1. A teor do § 1º do art. 70 do Decreto n. 3.048/99, a legislação em vigor na ocasião da prestação do serviço regula a caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais. Ou seja, observa-se o regramento da época do trabalho para a prova da exposição aos agentes agressivos à saúde: se pelo mero enquadramento da atividade nos anexos dos Regulamentos da Previdência, se mediante as anotações de formulários do INSS ou, ainda, pela existência de laudo assinado por médico do trabalho.
2. O Decreto n. 4.827/2003, ao incluir o § 2º no art. 70 do Decreto n. 3.048/99, estendeu ao trabalho desempenhado em qualquer período a mesma regra de conversão. Assim, no tocante aos efeitos da prestação laboral vinculada ao Sistema Previdenciário, a obtenção de benefício fica submetida às regras da legislação em vigor na data do requerimento.
3. A adoção deste ou daquele fator de conversão depende, tão somente, do tempo de contribuição total exigido em lei para a aposentadoria integral, ou seja, deve corresponder ao valor tomado como parâmetro, numa relação de proporcionalidade, o que corresponde a um mero cálculo matemático e não de regra previdenciária.
4. Com a alteração dada pelo Decreto n. 4.827/2003 ao Decreto n. 3.048/1999, a Previdência Social, na via administrativa, passou a converter os períodos de tempo especial desenvolvidos em qualquer época pela regra da tabela definida no artigo 70 (art. 173 da Instrução Normativa n. 20/2007).
5. Descabe à autarquia utilizar da via judicial para impugnar orientação determinada em seu próprio regulamento, ao qual está vinculada. Nesse compasso, a Terceira Seção desta Corte já decidiu no sentido de dar tratamento isonômico às situações análogas, como na espécie (EREsp n. 412.351/RS).
6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (REsp 1151363/MG, STJ, 3ª Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 05/04/2011)
Isto posto, e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, faz-se necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei n° 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n° 8.213/91 (Lei de Benefícios) em sua redação original (artigos 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor/frio, casos em que sempre será necessária a mensuração dos níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes). Para o enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos n° 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), n° 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e n° 83.080/79 (Anexo II);
b) de 29/04/1995 e até 05/03/1997 foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 05/03/1997 (período em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n° 9.032/95 no artigo 57 da Lei de Benefícios), é necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova - considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico (com a ressalva dos agentes nocivos ruído e calor/frio, cuja comprovação depende de perícia, como já referido). Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos n° 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e n° 83.080/79 (Anexo I);
c) a partir de 06/03/1997, quando vigente o Decreto n° 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória n° 1.523/96 (convertida na Lei n° 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerado os Decretos n° 2.172/97 (Anexo IV) e n° 3.048/99.
d) a partir de 01/01/2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (artigo 148 da Instrução Normativa nº 99 do INSS, publicada no DOU de 10/12/2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.
Intermitência
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, § 3º, da Lei n° 8.213/91) não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual ou ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho, e em muitas delas a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24/10/2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).
Agentes Químicos (Óleos, Graxas, Hidrocarbonetos Aromáticos, Poeiras Minerais e Fumos Metálicos )
A exigência relativa à necessidade de explicitação da composição e concentração dos agentes químicos a que o segurado estava exposto não encontra respaldo na legislação previdenciária, a qual reconhece a especialidade do labor quando existe contato com agentes químicos nocivos à saúde, elencados na legislação de regência. Nesse sentido: Embargos Infringentes nº 5004090-13.2012.404.7108, 3ª Seção, Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, por unanimidade, juntado aos autos em 06/12/2013.
Ainda no tocante à necessidade de análise quantitativa dos agentes químicos, a Norma Regulamentadora n.º 15 (NR-15), do Ministério do Trabalho, somente é aplicável a partir de 03/12/1998, data da publicação da MP n.º 1.729, convertida na Lei 9.732/1998, quando a redação do artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/1991 passou a incluir a expressão "nos termos da legislação trabalhista". Também o Decreto nº 3.265/99, de 29/11/1999, modificou o item 1.0.0 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, passando a prever que o agente químico é nocivo quando apresenta "nível de concentração superior aos limites de tolerância estabelecidos."
Contudo, mesmo após essas alterações, é dispensável o exame da concentração do agente químico (análise quantitativa) para as substâncias arroladas no Anexo 13 da NR 15, em relação às quais é suficiente a avaliação qualitativa de risco. Isso porque a própria norma regulamentadora dispensa, em relação a esses agentes químicos, a análise quantitativa, a qual fica reservada aos agentes arrolados no Anexo 11. Essa distinção é inclusive reconhecida administrativamente pelo INSS, que a incorporou à Instrução Normativa nº 45/2010 (art. 236, § 1º, I) e à Instrução Normativa nº 77/2015 (art. 278, § 1º).
Os óleos minerais são agentes químicos nocivos à saúde, enquadrados na subespécie Hidrocarbonetos e Outros Compostos de Carbono, independente de especificação sobre qual o tipo de óleo (STJ, AgInt no AREsp 1204070/MG, Rel. Min. Francisco Falcão, 2ª T., j. 08.05.2018).
Ainda, tratando-se de agentes químicos como hidrocarbonetos aromáticos, o contato com esses agentes é responsável por frequentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo, bem como problemas hepáticos, pulmonares e renais (nesse sentido: Apelação n° 0001699-27.2008.404.7104/RS, Relator Des. Federal Celso Kipper, DE 26/09/2011, unânime).
Nesse sentido, "os hidrocarbonetos constituem agente químico nocivo (Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080/1979, o Anexo IV do Decreto nº 2.172/1997 e o Anexo IV do Decreto nº 3.048/99 - códigos 1.2.11, 1.2.10; 1.0.3, 1.017 e 1.0.19, respectivamente), de modo que a atividade exercida sob a sua exposição habitual e permanente goza de especialidade" (TRF4 5024866-96.2014.4.04.7000, TRS/PR, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 05.08.2018).
Com relação ao agente fumos metálicos, decorrente da utilização de solda de peças metálicas, tem previsão no código 1.2.11 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 (fumos metálicos decorrentes da utilização de solda elétrica), consubstanciando a especialidade da atividade, inclusive independentemente do nível de sujeição sofrida pelo demandante.
Em suma, "a exposição a hidrocarbonetos aromáticos e fumos metálicos enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial" (TRF4, APELREEX 0009385-37.2016.4.04.9999, 6ª T., Rel. Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, D.E. 01.08.2018; TRF4, REOAC 0017047-23.2014.4.04.9999, TRS/SC, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 20.07.2018).
CASO CONCRETO
Discute-se sobre a especialidade do labor exercido pela parte autora com exposição ao agente químico 'gastoxin' no período de 09/08/1974 a 21/05/2007.
A sentença examinou as provas manifestando-se sobre a questão com exatidão, mediante fundamentos com os quais concordo e utilizo como razões de decidir, nos seguintes termos:
2.2. Do tempo especial
Com relação ao reconhecimento do exercício de atividade em condições especiais prejudiciais à saúde e à integridade física, o tempo de serviço é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. A lei nova que venha a estabelecer restrição ao cômputo do tempo de serviço não pode ser aplicada retroativamente.
A Súmula 16 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais foi cancelada em 27/03/2009, o que vem reforçar, pelo menos em princípio, a inexistência de limite temporal para o reconhecimento do labor exercido sob condições especiais.
A parte autora requer o reconhecimento da especialidade do período de 09/08/1974 a 21/05/2007, em que trabalhou como classificador de grãos, na Empresa Companhia de Desenvolvimento Agropecuário do Paraná CODAPAR.
A função de classificador de grãos não é e nunca foi prevista na legislação de regência como especial, não sendo possível o reconhecimento daquela com base no mero enquadramento.
Para comprovar a especialidade a parte apresentou Perfil Profissiográfico Previdenciário (E1 - PADM3 - fl. 4), no qual descreve suas atribuições no item 14.2, como:
"Realiza visitas em armazéns de cereais, onde colhe amostras dos grãos e os leva até o laboratório de classificação onde faz homogeneização e a classificação. Emite laudos sobre a classificação realizada. Aplica o produto "Gastoxim" (fosfeto de alumínio) nas amostras que não tiverem sido analisadas para que mantenham as características normais. Realiza todas estas atividades de forma habitual e permanente, não ocasional nem intermitente".
Quanto a presença de agentes nocivos, aponta como fator de risco a exposição ao fosfeto de alumínio.
Em sede de reclamatória trabalhista foi realizada perícia judicial (E10 - INTEIRO_TEOR10 - fl. 11/, sendo que os agentes químicos são descritos no item 7.8 do laudo, o qual transcrevo:
"7.8.1 – Agentes Químicos – GASTOXIN
O Gastoxin é um produto para controle de pragas em produtos armazenados.
Conforme descrito no item 5.1 desde laudo pericial, uma vez ao mês o Reclamante colocava o produto Gastoxin nas prateleiras onde ficavam armazenadas as amostras de cereais a serem analisadas.
Segundo a Ficha de Informações de Segurança de Produtos Químicos – FISPQ, o produto contém em sua composição Fosfeto de Alumínio, Carbamato de Amônia, Agente Deslizante, Absorvente de Umidade, Adsorvente e Outros Ingredientes.
O Fosfeto de Alumínio ao entrar em contato com água ou ar produz o Fosfeto de Hidrogênio ou Gás Fosfina, agente químico altamente tóxico, classificado como insalubre, em grau máximo, pelo Ministério do Trabalho e Emprego, na NR-15, Anexo 11.
Segundo a FISPQ o produto Gastoxin é altamente tóxico, exigindo a utilização de máscaras semifaciais ou faciais inteiras com filtro para fosfeto de hidrogênio, luvas de borracha nitrílica, PVC ou outro produto impermeável, óculos de segurança para produtos químicos e macacão impermeável com mangas compridas e botas de PVC.
Ainda com base na FISPQ do produto, a reentrada de pessoas na área em que o produto foi aplicado somente pode ser efetuada após o intervalo de segurança que é de 3 dias para soja e 4 dias para as demais culturas.
Caso seja necessária a reentrada antes do intervalo de segurança, deverá ser realizada por trabalhadores protegidos por EPI’s (luvas de borracha nitrílica, PVC ou outro produto impermeável, óculos de segurança para produtos químicos e macacão impermeável com mangas compridas e botas de PVC).
Conforme descrito no item 6 deste laudo pericial, não há registro de entrega de EPI’s anexado nos autos e o Reclamante alega que, nos últimos 4 anos, recebeu máscara pff2, protetor auricular plug, capacete, óculos contra pó, botina e jaleco".
Verifica-se do referido laudo que o produto Gastoxin era empregado para manter a propriedade das amostras a serem classificadas, sendo que após ministrar aquele é necessário aguardar período de segurança de entrada no laboratório de 3 dias para a soja e 4 dias para as demais culturas.
Desta forma, o perito nomeado atestou quanto a insalubridade em relação ao agente químico - GASTOXIN que haveria duas possibilidades:
"Se for comprovada a entrega periódica dos EPI’s (luvas de borracha nitrílica, PVC ou outro produto impermeável, óculos de segurança para produtos químicos e macacão impermeável com mangas compridas e botas de PVC), ou que o intervalo de segurança de reentrada na área aplicada era respeitado, as atividades do Reclamante eram SALUBRES, o que descaracteriza a percepção do adicional de insalubridade para este agente;
Se NÃO for comprovada a entrega periódica dos EPI’s (luvas de borracha nitrílica, PVC ou outro produto impermeável, óculos de segurança para produtos químicos e macacão impermeável com mangas compridas e botas de PVC), ou que o intervalo de segurança de reentrada na área aplicada NÃO era respeitado, as atividades do Reclamante eram INSALUBRES EM GRAU MÁXIMO (40%)".
Em 19 de fevereiro de 2014 foi realizada audiência para colheita de dados acerca da profissiografia, bem como para colher informações acerca do respeito ao intervalo de segurança de reentrada (E1- - INTEIRO_TEOR11 - fl. 22/24).
A testemunha Elena Maria Nobre Lacerda declarou:
"1. que trabalhou por cerca de 35 anos da reclamada, tendo saído por ocasião do PDV, em novembro/2012; 2. que sempre trabalhou no laboratório de sementes em Maringá, sendo que ocasionalmente auxiliava no laboratório químico, que também fica em Maringá; 3. que ocasionalmente colocava o gastoxin para expurgar a câmara seca do laboratório de sementes, usando como EPIs apenas jalecos, além de máscaras e luvas descartáveis; 4. que quando colocavam o gastoxin na sexta-feira à tarde, voltavam a adentrar no local apenas na terça de manhã; 5. que o procedimento era o mesmo independentemente de se tratar de semente de soja, trigo ou outro cereal; (...) 11. que não sabe ao certo, mas acredita que o expurgo com o gastoxin era feito uma vez a cada 3 meses, aproximadamente; (...)".
Conforme se verifica do depoimento colhido em sede de Reclamatória Trabalhista, a aplicação do produto Gastroxin era realizado esporadicamente, a cada 3 meses.
Note-se que como o produto em questão possui por escopo preservar as características normais das amostrar a serem analisadas ao chegarem no laboratório, essa periodicidade mais espaçada é crível, correspondendo ao tempo de colheita dos diversos cereais e grãos que eram classificados na unidade que o autor trabalhava.
Ainda conforme restou apurado na Justiça Trabalhista a aplicação do produto Gastroxin era realizadas às sextas-feiras, com reentrada apenas na terça-feira, sendo respeitada o período de reentrada para a soja (3 dias), sendo um pouco antecipado em relação aos demais cereais (4 dias).
No laudo complementar, foi indagado ao perito a frequência em que era procedidos os expurgos das amostras, tendo afirmado que: "Segundo informações, o produto era colocado nas amostras 1 vez ao mês" (E10 - INTEIRO_TEOR11 - fl. 6, quesito 1).
No caso dos autos a aplicação do produto químico que alega gerar a especialidade é realizada de forma intermitente, com um intervalo de 1 a 3 meses, às sextas-feiras, havendo a reentrada apenas nas terças feiras, respeitado o período de reentrada do cultivo da soja, frise-se, principal produto agrícola da região em que o autor laborou.
Ainda que em relação ao demais cereais a reentrada tenha ocorrido pouco antes (poucas horas) de completar o período de isolamento, este contato ocorria de forma esporádica, não sendo hábil para comprovar a especialidade requerida.
A legislação previdenciária em qualquer tempo previu que a exposição a agentes nocivos para gerar a especialidade era imprescindível que aquela ocorre-se de forma habitualidade e permanência, o quê não restou caracterizado no caso dos autos.
Como já dito no tópico em que acolheu a preliminar de decadência o tratamento dispensado pelo Direito do Trabalho e pela Legislação Previdenciária nem sempre são idênticos.
A intermitência foi reconhecida pela Justiça do Trabalho, onde foi considera a aplicação uma vez ao mês do Gastroxin, na parte da tarde de sexta-feira, com reentrada na manhã de terça feira.
Essa intermitência, diferente do que ocorre no âmbito previdenciário, não possui o condão de afastar a verba salarial correspondente, ante ao tratamento diverso do Direito do Trabalho, conforme se verifica do voto da Desembargadora, Dra.. Márcia Domingues (E10 - INTEIRO_TEOR14 - fl. 61):
"Nesse contexto, acrescente-se que o trabalho executado em condições insalubres, ainda que em caráter intermitente, não afasta, só por essa circunstância, o direito à percepção do respectivo adicional (Súmula 47 do TST)".
Desta forma, ainda que fosse superada a decadência, a parte não faria jus ao reconhecimento da especialidade do vínculo requerido, visto que a exposição a agentes nocivos ocorria de forma meramente intermitente e ocasional.
Conforme bem apontado na sentença, restou comprovado que o autor tinha contado uma vez por mês com o agente químico, não sendo constatada a habitualidade e permanência.
Registro, ainda, que no laudo pericial realizado na ação trabalhista, na descrição das atividades, também é referido que a aplicação do produto 'gastoxin' ocorria uma vez ao mês: (ev. 10, INTEIRO_TEOR10, p. 20)
5 DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES E AMBIENTE DE TRABALHO
5.1 Atividades do Reclamante
Função: CLASSIFICADOR
Realizava visitas em armazéns da Reclamada
Fazia amostragem de cereais;
o Com uma sonda, fazia a coleta de cereais em um balde;
o Manipulava os cereais coletados;
o Retirava amostragem representativa dos cereais e levava até o laboratório de
classificação;
Levava os cereais até o laboratório de classificação;
o Fazia a homogeneização;
o Fazia a separação de grãos, grãos ardidos, sujidades, insetos mortos, etc;
o Pesava e fazia o percentual do que foi separado;
Emitia laudos sobre a classificação dos produtos e enviava aos interessados.
Uma vez ao mês, o Reclamante aplicava produto chamado “Gastoxin” nas amostras que não tinham sido analisadas ainda, para que estas não estragassem e mantivessem as características normais. O produto é embalado em sachês e tem formato de pastilhas. O produto é colocado nas prateleiras onde as amostras ficam armazenadas.
Ainda que para o reconhecimento da especialidade não se exija que a exposição às condições insalubres ocorra durante todos os momentos da prática laboral, na hipótese, vê-se que a exposição não era ínsita e integrada a rotina de trabalho do autor, pois o contato ocorria uma vez ao mês, não havendo exposição a agentes nocivos em período razoável de sua prestação laboral.
Desse modo, entendo que não restou demonstrada a especialidade no período.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
A partir da jurisprudência do STJ (em especial do AgInt nos EREsp 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, julgado em 09/08/2017, DJe 19/10/2017), para que haja a majoração dos honorários em decorrência da sucumbência recursal, é preciso o preenchimento dos seguintes requisitos simultaneamente: (a) sentença publicada a partir de 18/03/2016 (após a vigência do CPC/2015); (b) recurso não conhecido integralmente ou improvido; (c) existência de condenação da parte recorrente no primeiro grau; e (d) não ter ocorrido a prévia fixação dos honorários advocatícios nos limites máximos previstos nos §§2º e 3º do artigo 85 do CPC (impossibilidade de extrapolação). Acrescente-se a isso que a majoração independe da apresentação de contrarrazões.
Na espécie, diante do não acolhimento do apelo, impõe-se a majoração dos honorários advocatícios de 10% sobre a base de cálculo fixada na sentença para 15% sobre a mesma base de cálculo, com base no artigo 85, §11, do CPC.
PREQUESTIONAMENTO
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.
CONCLUSÃO
Apelação da parte autora: desprovida.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003638644v26 e do código CRC ce4f1898.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Data e Hora: 8/2/2023, às 17:17:57
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Apelação Cível Nº 5008612-29.2020.4.04.7003/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
APELANTE: ANTONIO MARQUES DA SILVA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. decadência. reclamatória trabalhista. pedido administrativo de revisão. agentes químicos. habitualidade e permanência.
1. Na hipótese em que a reclamatória trabalhista não trata de reconhecimento de tempo de serviço, não serve o trânsito da reclamatória como marco inicial do prazo decadencial, pois a especialidade do período poderia ter sido postulada independente da mesma.
2. Quando houve pedido tempestivo de revisão do benefício na via administrativa, o prazo decadencial tem início no dia em que o segurado tomar conhecimento da decisão de indeferimento do pedido de revisão. Entendimento do Superior Tribunal de Justiça.
3. Constatado que o contado com o agente nocivo ocorria uma vez ao mês, não resta demonstrada a habitualidade e permanência, não cabendo o reconhecimento do período pleiteado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 07 de fevereiro de 2023.
Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003638645v5 e do código CRC 07f3be01.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Data e Hora: 8/2/2023, às 17:17:58
Conferência de autenticidade emitida em 15/02/2023 04:01:34.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 30/01/2023 A 07/02/2023
Apelação Cível Nº 5008612-29.2020.4.04.7003/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM
APELANTE: ANTONIO MARQUES DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO(A): ANTONIO CLAUDIO MAXIMIANO (OAB PR028165)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 30/01/2023, às 00:00, a 07/02/2023, às 16:00, na sequência 507, disponibilizada no DE de 16/12/2022.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 15/02/2023 04:01:34.