Apelação Cível Nº 5000392-55.2020.4.04.7031/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: FRANCISCO DO CARMA BAHU (AUTOR) E OUTRO
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
A parte autora propôs ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) pretendendo a revisão do seu benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 42/163.187.068-5, com DIB em 26042013).
Processado o feito, sobreveio sentença em sede de embargos de declaração, publicada em 14/06/2021, cujo dispositivo tem o seguinte teor (ev. 23):
Dispositivo
Ante o exposto, reconheço a prescrição quinquenal e, no mérito, JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS DA PETIÇÃO INICIAL, nos termos do artigo 487, I do Código de Processo Civil, para:
- declarar o direito do autor à revisão da renda mensal inicial de seu benefício (NB 163.187.068-5), mediante o cálculo dos salários de contribuição informados no cálculo de liquidação homologado pelo Juízo da esfera trabalhista (evento 01, procadm6, págs.39/44) para o intervalo de 01/07/1994 a 31/01/2008;
- condenar a parte ré ao pagamento das diferenças de prestações vencidas e não prescritas, consideradas aquelas anteriores a 22/12/2014, apurado o valor da condenação de acordo com os critérios de atualização fixados na fundamentação.
- determinar ao INSS recalcular a RMI e RMA do benefício ora revisado, considerando ser detentor dos elementos necessários, bem como a realizar aos cálculos das parcelas atrasadas, desde a DIB em 11/08/2011.
Pela sucumbência, condeno o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios ao advogado da parte autora.
Fica isento de pagamento de custas, conforme art. 4º, inciso I, da Lei 9.289/96. Considerando que não houve adiantamento das custas pela parte vencedora, ante o deferimento da gratuidade de justiça, também não há obrigação do reembolso referido no parágrafo único desse mesmo artigo.
Observando os parâmetros do § 2º, do art. 85, do CPC, fixo os honorários advocatícios no percentual mínimo previsto nos incisos do §3º do mesmo dispositivo (10%, 8%, 5%, 3% ou 1%, a depender do valor de condenação alcançado), a incidir sobre o valor das prestações vencidas até a data da publicação desta sentença, de acordo com a Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça. Não havendo parcelas em atraso, o percentual deverá incidir sobre o valor atribuído à causa.
Por estimativa de cálculo, considerando a renda inicial do benefício no teto, multiplicando-se pelo número de meses abrangidos pela condenação, o valor da condenação ainda assim ficaria abaixo de 1.000 salários mínimos. Portanto, a sentença não está sujeita à remessa necessária, conforme art. 496, § 3º, inciso I, do CPC.
Sentença registrada eletronicamente. Publicada com a liberação no sistema eletrônico. Intimem-se.
O INSS apelou alegando, em preliminar, a nulidade do processo tendo em conta que o INSS não foi intimado para apresentar contestação. No mérito, diz que não se pode admitir a sentença trabalhista como prova para revisão de benefício junto a Autarquia tendo em conta a ausência de prova do efetivo exercício da atividade alegada, de acordo prescrições probatórias estabelecidas pelo Direito Previdenciário (início de prova material através de prova documental idônea), não há que se falar no reconhecido de qualquer tempo de serviço com base em conciliação oriunda da Justiça do Trabalho. Aponta que o cálculo elaborado e homologado na reclamatória trabalhista compreende apenas o período não prescrito de abril de 2003 a janeiro de 2008. Assim, somente esse período poderá ser incluído no cálculo do benefício previdenciário, seja porque não há detalhamento do período anterior, seja porque não houve a incidência de contribuições sobre o período prescrito. Aponta, ainda, que não seria possível considerar, pura e simplesmente, o valor declarado como salário-de-contribuição de R$ 800,00 para todo o período, desde 1988 ou desde julho de 1994, pois o valor fixado na sentença refletia o valor da remuneração do segurado na época do encerramento do vínculo. O INSS pugna pela aplicação do INPC em caso de existirem valores atrasados devidos, acrescidos de juros de poupança a partir da citação, como preceitua o art. 1-F da Lei 9494/97.
A parte autora, por sua vez, requer a reforma da sentença, a fim de que seja determinado que as prestações vencidas deverão ser corrigidas pelo INPC, nos termos da tese fixada no Tema 905 do STJ. Postula, ainda, o deferimento da tutela de urgência, para imediata revisão do benefício uma vez que o apelante é idoso, contando com 61 (sessenta e um) anos e precisa da renda oriunda da aposentadoria para sua sobrevivência.
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Preliminar. Nulidade. ausência de citação.
Inicialmente, afasto a alegação de nulidade do processo pela ausência de citação do INSS, pois citada, a Autarquia não apresentou contestação (eventos 06 e 09).
Mérito
Discute-se nos autos os efeitos no âmbito previdenciário de sentença trabalhista que reconheceu vínculo empregatício do autor com a empresa Orfal Indústria e Comércio de Móveis Ltda. no intervalo de 01/07/1994 a 31/01/2008.
A sentença restou consignada nos seguintes termos, in verbis:
(...)
A parte autora é titular do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição nº 42/163.187.068-5, com data de início de benefício (DIB) em 11/08/2011. Pleiteia a revisão do benefício para incorporar aos salários de contribuição as diferenças de verbas remuneratórias reconhecidas em reclamatória trabalhista.
Relata que durante o período de 01/10/1988 a 31/01/2008, o trabalhou junto a empresa Orfal Indústria e Comércio de Móveis Ltda., cujo vínculo laboral restou reconhecido e sua anotação em CTPS determinada, nos autos do Processo Trabalhista n.0034600-28.2008.5.09.0669, cuja cópia foi anexada ao pedido de revisão.
Quando do cálculo do valor do benefício concedido, o autor afirma ter sido prejudicado uma vez que lançados salários mínimos nas competências de 07/1994 a 01/2008, redundando na utilização do salário mínimo como salário de contribuição para o cálculo da sua renda mensal inicial.
Afirma que a sentença de parcial procedência proferida em sede trabalhista reconheceu o vínculo de emprego no período de 04/10/1988 a 31/01/2008, durante o qual exerceu a função de marceneiro, mediante a percepção de remuneração mensal equivalente a R$ 800,00 (oitocentos reais). Restou determinada, ainda, a execução dos valores relativos à contribuição previdenciária devida sobre os valores pagos em relação ao período contratual reconhecido (artigo 876, parágrafo único, da CLT), observando-se o regime de competência (artigo 276, § 4º, do Decreto 3.048/99), com estrita observância das alíquotas correspondentes, na forma da Lei 8.212/91.
A questão controvertida consiste na integração das diferenças de verbas salariais reconhecidas e pagas ao segurado na Justiça do Trabalho aos salários de contribuição considerados para o cálculo da renda mensal inicial do seu benefício.
Para o cálculo da renda mensal inicial do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, foram utilizados os salários de contribuição informados no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), conforme determina o artigo 29-A da Lei n° 8.213/91.
Contudo, a sentença trabalhista reconheceu diferenças salariais e seus reflexos no intervalo de 01/10/1988 a 31/01/2008.
Os dados informados no cálculo de liquidação homologado pelo Juízo da esfera trabalhista (evento 01, procadm6, págs.39/44) são suficientes para a apuração do novo valor dos salários de contribuição do trabalhador no período questionado.
No caso concreto, apesar de o INSS não estar abrangido pela coisa julgada formada no processo trabalhista, por não ser parte naquela relação jurídica, a demonstração da retificação do contrato de trabalho, com reflexos sobre o vínculo previdenciário devem ser objeto de readequação pelo ente previdenciário.
Com efeito, havendo o reconhecimento do efetivo conteúdo econômico do contrato laboral, tanto o órgão fiscal detém competência para autuar e proceder a cobrança das diferenças de contribuições previdenciárias, não havendo justificativa para denegar o reconhecimento dos reflexos na situação previdenciária do segurado.
A relação laboral é o elemento jurídico que torna o sujeito segurado obrigatório do sistema previdenciário do regime geral, servindo de baliza para a relação tributária regida pela Lei n. 8.212/91 e, paralelamente, para a situação previdenciária do empregado nos termos da Lei n. 8.213/91.
Se a empresa, espontânea ou forçadamente, paga determinadas verbas ao segurado empregado e elas se enquadram no conceito do art. 28, I, da Lei nº 8.212/91, esses valores, para todos os efeitos, são parte do salário de contribuição e devem ser observados pelo INSS, salvo prova de fraude no processo ou violação do art. 29, § 4º, da Lei nº 8.213/91.
Ademais, se, em regra, são utilizados os salários de contribuição informados pela empresa no cálculo da renda mensal inicial dos benefícios, da mesma forma devem ser utilizados os salários de contribuição reconhecidos pelo empregador na Justiça do Trabalho.
A readequação da categoria jurídica dos elementos de composição do salário de contribuição do segurado possuem reflexos tributários e previdenciários que devem ser observados, pois a partir da nova situação jurídica é imperativo o redimensionamento da hipótese tributária e da situação previdenciária.
O salário de contribuição é a base de cálculo sobre a qual incidem as alíquotas das contribuições previdenciárias, cujos recolhimentos à Previdência Social são de responsabilidade da empresa. Caberia à fiscalização competente verificar se os recolhimentos das contribuições previdenciárias estavam incidindo sobre os verdadeiros salários de contribuição da parte autora, ficando a referida empresa diretamente responsável pela importância que arrecadou em desacordo com o regramento tributário (art. 30, I, “a” e art. 33, caput e § 5º, todos da Lei n. 8.212/91).
Dessa forma, nada há que possa desconstituir a eficácia da sentença trabalhista com relação aos efeitos previdenciários do reconhecimento de verbas salariais, sendo cabível sua consideração para o fim de revisar o benefício.
Nestes termos, também dispõe o artigo 34, I da Lei 8.213/91:
“Art. 34. No cálculo do valor da renda mensal do benefício, inclusive o decorrente de acidente do trabalho, serão computados:
I – para o segurado empregado e trabalhador avulso, os salários-de-contribuição referentes aos meses de contribuições devidas, ainda que não recolhidas pela empresa, sem prejuízo da respectiva cobrança e da aplicação das penalidades cabíveis;”
Em caso semelhante já decidiu o TRF da 4.ª Região:
“PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DA RENDA MENSAL INICIAL. CABIMENTO. AÇÃO TRABALHISTA. RECONHECIMENTO DE PARCELAS SALARIAIS. O êxito do segurado em reclamatória trabalhista, com relação ao reconhecimento de parcelas salariais, atribui-lhe o direito de postular a revisão dos salários-de-contribuição componentes do período de cálculo do benefício, ainda que a Autarquia Previdenciária não tenha participado da relação processual." (TRF4 5003543-65.2010.404.7100, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Néfi Cordeiro, juntado aos autos em 08/04/2013).
A Turma Recursal do Paraná também tem se manifestado no mesmo sentido, conforme se infere do julgamento proferido nos autos de processo nº 5002117-71.2013.404.7016, Segunda Turma Recursal do PR, Relator p/ Acórdão Leonardo Castanho Mendes, julgado em 27/11/2014.
Como o salário de contribuição é o valor básico usado para o cálculo da renda mensal inicial dos principais benefícios previdenciários de pagamento continuado, o aumento da remuneração da parte autora, através da inclusão dos valores indicados em sentença proferida em reclamatória trabalhista e apurados em liquidação de sentença, refletirá diretamente no salário de benefício da aposentadoria por tempo de contribuição da parte autora.
Assim, para o cálculo da nova renda mensal inicial do benefício da parte autora, o INSS deverá apurar o novo valor dos salários de contribuição no período de 01/10/1988 a 31/01/2008, tendo em conta as diferenças de remuneração reconhecidas na reclamatória trabalhista.
(...)
Apelação do INSS
Sentença/Acordo em Ação Trabalhista
A jurisprudência deste Tribunal tem entendido possível o aproveitamento da sentença trabalhista como início de prova do vínculo empregatício, mesmo que o INSS não tenha sido parte naquele processo, desde que atendidos alguns requisitos, como forma de evitar o ajuizamento de reclamatória trabalhista apenas com fins previdenciários: a) ajuizamento da ação contemporâneo ao término do vínculo empregatício; b) a sentença não seja mera homologação de acordo; c) tenha sido produzida naquele processo prova do vínculo laboral; e d) não haja prescrição das verbas indenizatórias. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. OCORRÊNCIA. PROVIMENTO. (...) 3. A orientação jurisprudencial da 3ª Seção desta e. Corte é no sentido de ser possível a adoção da sentença trabalhista como prova plena do tempo de serviço para fins previdenciários, desde que: o ajuizamento da ação trabalhista seja contemporâneo ao término do vínculo laboral; a sentença não se configure em mera homologação de acordo entre empregador e empregado; tenha sido produzida prova do vínculo laboral; e não tenha ocorrido a prescrição das verbas indenizatórias. (TRF4 5022883-15.2012.404.7200, 5ª T., Relator Des. Federal Roger Raupp Rios, 14.06.2017)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CÔNJUGE. REQUISITOS. ÓBITO DO INSTITUIDOR. VÍNCULO DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDO. CONDIÇÃO DE SEGURADO OBRIGATÓRIO COMO TRABALHADOR URBANO. RECLAMATÓRIA TRABALHISTA MOVIDA POST MORTEM. SENTENÇA QUE HOMOLOGOU ACORDO EM AUDIÊNCIA. INSTRUÇÃO PROCESSUAL SEM CONTRADITÓRIO. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. NÃO COMPROVAÇÃO. (...) 2. A jurisprudência é firme no sentido de que a sentença trabalhista só pode ser considerada como início de prova material se fundada em elementos que demonstrem o labor exercido na função e os períodos alegados pelo trabalhador, sendo assim apta a comprovar o tempo de serviço. Não havendo instrução probatória, nem exame de mérito da demanda trabalhista que demonstre o efetivo exercício da atividade laboral, bem como sendo inseguros e contraditórios os depoimentos colhidos, é impossível o reconhecimento da qualidade de segurado na esfera previdenciária. (TRF4 5003177-60.2014.4.04.7011, TRS-PR, Relator Des. Federal Fernando Quadros da Silva, 18.12.2018)
EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. RECLAMATÓRIA TRABALHISTA AJUIZADA IMEDIATAMENTE APÓS O TÉRMINO DA RELAÇAO LABORAL, OCORRIDO MUITOS ANOS ANTES DO IMPLEMENTO DOS REQUISITOS PARA A OBTENÇÃO DE APOSENTADORIA. VALIDADE DA RESPECTIVA SENTENÇA COMO INÍCIO DE PROVA MATERIAL. 1. A sentença proferida em reclamatória trabalhista ajuizada logo em seguida ao término da relação laboral, ocorrido muitos anos antes do implemento das condições para a obtenção de aposentadoria, presta-se, por si só, como início de prova material, independentemente de qualquer outra circunstância. 2. Hipótese em que não há falar em reclamatória atípica, na qual o processo é empregado apenas para assegurar direitos perante a Previdência Social, pois a ação, além de ter sido contemporânea, teve por objeto a retomada do cargo pelo empregado, após haver prestado serviço militar, sendo que o vínculo com a empresa requerida era incontroverso. Assim, possuía típica natureza trabalhista, porquanto voltada à resolução da instalada cizânia. 3. Corroborando a prova testemunhal produzida nos autos o início de prova documental representado pela sentença da reclamatória, impõe-se o reconhecimento do tempo de serviço urbano e, consequentemente, a revisão da aposentadoria. (TRF4, EINF 0016619-80.2010.4.04.9999, 3ª S., Relator Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 10.04.2013)
AÇÃO RESCISÓRIA. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO DO FALECIDO ESPOSO. RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. ACORDO. (...) 3 - A sentença proferida em reclamatória trabalhista, só pode ser considerada como início de prova material da existência do vínculo empregatício, nos termos do § 3º do art. 55 da Lei de Benefícios, em ação objetivando a concessão de benefício previdenciário, se fundada em provas que demonstrem o exercício da atividade laborativa na função e nos períodos alegados na demanda previdenciária, sendo irrelevante o fato de não ter o INSS participado do processo trabalhista. 4 - Se não houve a produção de qualquer espécie de prova nos autos trabalhistas, uma vez que na audiência de conciliação, instrução e julgamento houve acordo, sem debates ou conflito, não há início de prova material que efetivamente demonstrasse o exercício de atividade urbana alegado. 5 - Ação improcedente. (TRF4, AR 0000975-87.2011.4.04.0000, 3ª S. Relator Juiz Federal Guilherme Beltrami, D.E. 22.02.2012)
No caso em tela, no
, constou a sentença de mérito proferida na Justiça do trabalhos nos autos nº 00346-2008-669-09-00-4, em que, diante da prova material juntada, reconheceu o vínculo laboral entre o autor e Orfal Indústria e Comércio de Móveis Ltda..Assim, nego provimento à apelação do INSS no ponto que se insurge quanto à adoção de sentença trabalhista que reconheceu o vínculo empregatício, com base em prova material, e as consequentes parcelas salariais para fins de revisão de benefício previdenciário.
RMI. Diferenças salariais e seus reflexos no intervalo de 01/10/1988 a 31/01/2008.
Aduz o INSS que o cálculo elaborado e homologado na reclamatória trabalhista compreende apenas o período não prescrito de abril de 2003 a janeiro de 2008. Assim, somente esse período poderá ser incluído no cálculo do benefício previdenciário, seja porque não há detalhamento do período anterior, seja porque não houve a incidência de contribuições sobre o período prescrito.
No entanto, tenho que, uma vez que a sentença trabalhista reconheceu diferenças salariais e seus reflexos no intervalo de 01/10/1988 a 31/01/2008, os dados informados no cálculo de liquidação homologado pelo Juízo da esfera trabalhista (evento 01, procadm6, págs.39/44) são suficientes para a apuração do novo valor dos salários de contribuição do trabalhador no período questionado.
Como bem assinalado na sentença, Se a empresa, espontânea ou forçadamente, paga determinadas verbas ao segurado empregado e elas se enquadram no conceito do art. 28, I, da Lei nº 8.212/91, esses valores, para todos os efeitos, são parte do salário de contribuição e devem ser observados pelo INSS, salvo prova de fraude no processo ou violação do art. 29, § 4º, da Lei nº 8.213/91.
Assim, para o cálculo da nova renda mensal inicial do benefício da parte autora, o INSS deverá apurar o novo valor dos salários de contribuição no período de 01/10/1988 a 31/01/2008 tendo em conta as diferenças de remuneração reconhecidas na reclamatória trabalhista. Mesmo que no cálculo elaborado e homologado na reclamatória trabalhista (e aplicável somente à esfera Trabalhista) compreenda apenas o período não prescrito de abril de 2003 a janeiro de 2008.
Nego provimento à apelação do INSS no ponto.
Salário-de-contribuição
Aponta, ainda, que não seria possível considerar, pura e simplesmente, o valor declarado como salário-de-contribuição de R$ 800,00 para todo o período, desde 1988 ou desde julho de 1994, pois o valor fixado na sentença refletia o valor da remuneração do segurado na época do encerramento do vínculo.
No ponto, prossigo transcrevendo a sentença proferida em sede de embargos de declaração Ev. 23:
(...)
Requer a parte ré, ora embargante, que no PBC do benefício em questão (NB 46/163.187.068-5), que tem início em 07/94, sejam incluídos somente os salários-de-contribuição posteriores a essa data para cálculo de tempo de contribuição.
O autor requereu a revisão do benefício de aposentadoria especial, objetivando o recálculo do valor do benefício, considerando-se como salários de contribuição, referentes às competências de 07/1994 a 01/2008, o valor de R$ 800,00 (oitocentos reais). O referido valor decorre da sentença prolatada no processo trabalhista n. 0034600-28.2008.5.09.0669 (Evento 1, PROCADM6, pág. 17/21), que reconheceu o vínculo de emprego entre o autor e a empresa Orfal Indústria e Comércio de Móveis Ltda.
A sentença reconheceu o direito do autor à revisão da renda mensal inicial de seu benefício (NB 163.187.068-5), mediante o cálculo dos salários de contribuição informados no cálculo de liquidação homologado pelo Juízo da esfera trabalhista (evento 01, procadm6, págs.39/44) para o intervalo de 01/10/1988 a 31/01/2008, na forma da fundamentação.
Cabe correção da sentença para reconhecer o direito do autor à revisão da renda mensal inicial de seu benefício (NB 163.187.068-5), mediante cálculo dos salários de contribuição informados no cálculo de liquidação homologado pelo Juízo da esfera trabalhista no intervalo de 01/07/1994 a 31/01/2008, adequando-se, assim melhor ao pedido.
Embora as verbas fora do PBC não interfiram na renda mensal inicial, a limitação do reconhecimento da aplicação dos valores reconhecidos em reclamatória trabalhista para compor o salário-de-contribuição do segurado restrito àqueles correspondentes ao período básico de cálculo do benefício - PBC, a correção é devida.
Quanto a alegação da autarquia ré de que o cálculo elaborado e homologado na reclamatória trabalhista compreende apenas o período não prescrito de abril de 2003 a janeiro de 2008, devendo, por essa razão, somente esse período poderia ser incluído no cálculo do benefício previdenciário, seja porque não há detalhamento do período anterior, seja porque não houve a incidência de contribuições sobre o período prescrito, essa não deve prosperar.
A ausência de contribuições sobre o período prescrito não deve prosperar uma vez que, reconhecido o vínculo empregatício, a ausência de informação e de comprovação da efetiva contribuição para o período de trabalho é irrelevante para a concessão do benefício, na medida em que a obrigação de recolhimento da contribuição é do empregador, nos termos do que hoje dispõe o artigo 30 da Lei n° 8.212/91 e artigo 34, I, da Lei n.º 8.213/91.
O intervalo de 07/97 (início do PBC) a 03/2003 (mês imediatamente anterior ao período não alcançado pela prescrição trabalhista) deve ser incluído no cálculo do benefício previdenciário.
Acerca do detalhamento do valor recebido no período anterior, também não deve prosperar uma vez que o INSS é naturalmente obrigado a observar a decisão dada pela Justiça do Trabalho, uma vez que regularmente formada uma nova situação jurídica que lhe atinge (eficácia da sentença). Entretanto, por não ser prejudicado pela coisa julgada lá formada, poderia oferecer defesa de mérito. Na hipótese dos autos, entretanto, o INSS não comprovou qualquer irregularidade que afaste o reconhecimento dos salários reconhecidos através da sentença trabalhista fazendo-o somente em sede de embargos.
No caso dos autos, o INSS não só deixou de alegar, por exemplo, colusão no processo trabalhista ou não enquadramento das verbas no conceito do art. 28, I, da Lei de Custeio, como também nada disse acerca dos valores que serviram de base para o pagamento das diferenças trabalhistas e que serviriam para a revisão dos salários de contribuição que formaram o salário de benefício do autor, apesar de a parte autora ter encartado cópia da reclamatória trabalhista no processo administrativo.
Dessa forma, nada há desconstituir a eficácia da sentença trabalhista com relação aos efeitos previdenciários do reconhecimento de verbas salariais, sendo cabível sua consideração para o fim de revisar o benefício.
Quanto à alegação de que não seria possível considerar, pura e simplesmente, o valor declarado como salário-de-contribuição de R$ 800,00 para todo o período, desde 1988 ou desde julho de 1994, pois o valor fixado na sentença refletia o valor da remuneração do segurado na época do encerramento do vínculo, conforme fundamentação lançada acima, o período ficou restrito à 07/1997 a 01/2008 e o valor a ser utilizado é o salário informado em sentença trabalhista de R$800,00 cabendo demais inconformismos serem objeto de recurso próprio.
(...)
A fundamentação transcrita enfrenta suficientemente todas a teses deste recurso, razão pela qual a ela me reporto para negar a apelação do INSS, na ausência de relevância da insurgência aqui manifestada.
Consectários da Condenação
Correção Monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo INPC a partir de abril de 2006 (Lei 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei 8.213/91), conforme decisão do Supremo Tribunal Federal no Tema 810, RE 870.947, Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, DJE de 20.11.2017, item "2" (embargos de declaração rejeitados sem modulação dos efeitos em 03.10.2019, trânsito em julgado em 03.03.2020), e do Superior Tribunal de Justiça no Tema 905, REsp. 1.492.221/PR, 1ª Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 20.03.2018 , item "3.2" da decisão e da tese firmada.
Juros Moratórios
Os juros de mora se aplicam desde a citação, nos termos Súmula nº 204/STJ, ressalvados os casos específicos em que incidam as teses fixadas no Tema 995/STJ em razão de reafirmação da DER. Os índices são os seguintes:
a) até 29.06.2009, 1% (um por cento) ao mês;
b) a partir de 30.06.2009, de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei 9.494/97, consoante decisão do STF no RE 870.947, DJE de 20.11.2017.
Dou provimento à apelação da parte autora e do INSS no ponto para alterar o critério de correção monetária conforme fundamentação supra.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (artigo 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96), mas não quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF/4ª Região).
Tutela Antecipada
Quanto à antecipação dos efeitos da tutela, nas causas previdenciárias, deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (TRF4, Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7, Rel. para Acórdão, Des. Federal Celso Kipper, 3ª S., j. 9.8.2007).
Assim sendo, o INSS deverá revisar o benefício concedido no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação a artigos do Código de Processo Civil e da Constituição Federal, esclareço que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- apelação da parte autora: provida para alterar o critério de correção monetária conforme fundamentação supra;
- apelação do INSS: provida parcialmente para alterar o critério de correção monetária conforme fundamentação supra;
- deferida a antecipação da tutela requerida pela parte autora, determinando-se a revisão do benefício no prazo de 45 dias.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora e dar parcial provimento à apelação do INSS, determinar a revisão do benefício no prazo de 45 dias.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003106111v33 e do código CRC 94e70ed5.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5000392-55.2020.4.04.7031/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: FRANCISCO DO CARMA BAHU (AUTOR) E OUTRO
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. Aposentadoria por tempo de contribuIção. RECLAMATÓRIA TRABALHISTA.
A jurisprudência deste Tribunal tem entendido possível o aproveitamento da sentença em ação trabalhista como início de prova material do vínculo empregatício, mesmo que o INSS não tenha sido parte naquele processo, desde que atendidos alguns requisitos, como forma de evitar o ajuizamento de reclamatória trabalhista apenas com fins previdenciários: a) ajuizamento da ação contemporâneo ao término do vínculo empregatício; b) a sentença não seja mera homologação de acordo; c) tenha sido produzida naquele processo prova do vínculo laboral; e d) não haja prescrição das verbas indenizatórias.
Demonstrado o preenchimento dos requisitos, o segurado tem direito à revisão da aposentadoria por tempo de contribuição, com os reflexos nos salários de contribuições decorrente do vínculo empregatícios e das verbas salariais relativos ao período reconhecido na justiça do trabalho.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora e dar parcial provimento à apelação do INSS, determinar a revisão do benefício no prazo de 45 dias???????, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 19 de abril de 2022.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003106112v4 e do código CRC 9946bc03.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 07/04/2022 A 19/04/2022
Apelação Cível Nº 5000392-55.2020.4.04.7031/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM
APELANTE: FRANCISCO DO CARMA BAHU (AUTOR)
ADVOGADO: BADRYED DA SILVA (OAB PR042071)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 07/04/2022, às 00:00, a 19/04/2022, às 16:00, na sequência 924, disponibilizada no DE de 29/03/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, DETERMINAR A REVISÃO DO BENEFÍCIO NO PRAZO DE 45 DIAS???????.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
SUZANA ROESSING
Secretária
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