APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5015517-21.2014.4.04.7113/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOAO DA LUZ SOBRINHO |
ADVOGADO | : | ANDRÉ ALEXANDRINI |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. TETO. EMENDAS CONSTITUCIONAIS 20/98 E 41/03.
1. No caso não há reexame necessário, pois se trata de matéria decidida pelo Plenário do STF no julgamento do Recurso Extraordinário nº 564.354.
2. Na hipótese não incide a decadência ou a prescrição de fundo do direito, pois não se trata da revisão do ato de concessão do benefício prevista no art. 103, caput, da Lei nº 8.213/91.
3. Fixado pelo Supremo Tribunal Federal o entendimento de que o limitador (teto do salário de contribuição) é elemento externo à estrutura jurídica dos benefícios previdenciários, o valor apurado para o salário de benefício integra-se ao patrimônio jurídico do segurado, razão pela qual todo o excesso não aproveitado em razão da restrição poderá ser utilizado sempre que alterado o teto, adequando-se ao novo limite. Em outras palavras, o salário de benefício, expressão do aporte contributivo do segurado, será sempre a base de cálculo da renda mensal a ser percebida em cada competência, respeitado o limite máximo do salário de contribuição então vigente. Isto significa que, elevado o teto do salário de contribuição sem que tenha havido reajuste das prestações previdenciárias (como no caso das Emendas Constitucionais 20/1998 e 41/2003), ou reajustado em percentual superior ao concedido àquelas, o benefício recupera o que normalmente receberia se o teto à época fosse outro, isto é, sempre que alterado o valor do limitador previdenciário, haverá a possibilidade de o segurado adequar o valor de seu benefício ao novo teto constitucional, recuperando o valor perdido em virtude do limitador anterior, pois coerente com as contribuições efetivamente pagas.
4. O ajuizamento da Ação Civil Pública nº 0004911-28.2011.4.03.6183, em 5/5/2011, promoveu a interrupção da prescrição quinquenal, que perdura até a decisão proferida naquele feito transitar em julgado. Portanto, a prescrição quinquenal, no caso, conta-se retroativamente daquela data.
5. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, de modo a racionalizar o andamento do processo, e diante da pendência, nos tribunais superiores, de decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre (RS), 27 de julho de 2016.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8429622v5 e, se solicitado, do código CRC 573595D8. | |
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5015517-21.2014.4.04.7113/RS
RELATOR | : | SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOAO DA LUZ SOBRINHO |
ADVOGADO | : | ANDRÉ ALEXANDRINI |
RELATÓRIO
O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS interpôs apelação contra sentença que julgou procedente a ação, para condená-lo a revisar o valor mensal do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição do autor (espécie 42 com DIB em 08/08/1989), aplicando os tetos fixados pelas Emendas Constitucionais nº 20/98 e 41/03 sobre o valor real do benefício, isto é, o valor do benefício calculado quando da concessão acrescido de todos os reajustes legais, servindo os valores assim revisados de base para incidência dos reajustes previdenciários subsequentes, e a pagar as diferenças apuradas, respeitada a prescrição das parcelas anteriores a 05/05/2006, acrescidas de correção monetária, desde o vencimento, pelo INPC, e juros moratórios, desde a citação, na forma da Lei n. 11.960/09, bem como a pagar honorários advocatícios, em percentual a ser apurado em liquidação de sentença (art. 85, §4º, II, do CPC), observada a Súmula n. 111/STJ.
Em suas razões, o apelante alegou, em resumo, a decadência, com fundamento no art. 103 da lei n. 8.213/91. Sustentou que a decisão do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário n. 564.354/SE tem aplicação limitada aos benefícios concedidos a partir de 5 de abril de 1991, pois antes não havia lei disciplinando a fórmula de recuperação do valor que excedia ao teto, incremento que foi introduzido no ordenamento jurídico pelo art. 26 da Lei n. 8.870/94, e que as Emendas Constitucionais n. 20/1998 e n. 41/2003 não podem ser aplicadas retroativamente. Frisou que o precedente do STF poderá, eventualmente, melhorar os benefícios dos segurados que, em 12/98 e 12/2003, recebiam, respectivamente, R$ 1.081,50 e R$ 1.869,34. Por fim, disse devida a aplicação da Lei n. 11.960/2009 quanto aos juros e correção monetária.
Sem contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
VOTO
Nos termos do art. 1.046 do Código de Processo Civil (CPC) em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei 5. 869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este art. 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu art. 14.
Nos termos do art. 496, §4º, II, do novo Código de Processo Civil, já vigente à época em que proferida a sentença, não há reexame necessário no caso, pois se trata de matéria decidida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº 564.354.
Decadência
Não incide, na hipótese, a decadência ou a prescrição de fundo do direito, pois o art. 103, caput, da Lei nº 8.213/91 prevê prazo extintivo de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão do benefício, de que ora não se trata.
Nesse sentido já se pronunciou a Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no precedente que recebeu a seguinte ementa:
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE REVISÃO. ALTERAÇÃO DO ART. 103 DA LEI DE BENEFÍCIOS PELA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.523-9 DE 28/06/1997. LLIMITAÇÃO AO TETO PREVIDENCIÁRIO. NÃO INCIDÊNCIA. OFENSA LITERAL A ARTIGO DE LEI. NÃO OCORRÊNCIA. RESCISÓRIA JULGADA IMPROCEDENTE.
1. Não há que se falar em decadência do direito de revisão, prevista no artigo 103 da Lei nº. 8.213/1991, porquanto se trata de pedido de revisão dos critérios de reajuste da renda mensal - utilização do excedente ao teto do salário-de-benefício por ocasião de alteração do teto máximo do salário-de-contribuição.
2. Estando a pretensão rescisória dirigida a jurisprudência pacífica desta Corte no sentido não aplicabilidade da norma que prevê a decadência de revisão do ato de concessão da aposentadoria para os pedidos de revisão dos critérios de reajuste da renda mensal, não há falar em ofensa literal a artigo de lei e procedência da ação rescisória.
(AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0003356-97.2013.404.0000/SC, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D. E. 01-09-2014)
Também nessa linha o precedente do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. APLICAÇÃO DOS TETOS DAS EC 20/1998 E 41/2003. DECADÊNCIA. ART. 103, CAPUT, DA LEI 8.213/1991. NÃO INCIDÊNCIA.
1. Trata-se de Recurso Especial questionando a aplicação dos tetos previstos nas Emendas Constitucionais 20/1998 e 41/2003 a benefícios concedidos anteriormente à vigência de tais normas. O INSS defende que essas ações são de revisão do ato de concessão do benefício previdenciário, o que faria incidir a decadência prevista no art. 103 da Lei 8.213/1991.
2. O escopo do prazo decadencial da Lei 8.213/1991 é o ato de concessão do benefício previdenciário, que pode resultar em deferimento ou indeferimento da prestação, consoante se denota dos termos iniciais de contagem do prazo constante no art. 103, caput, da Lei 8.213/1991.
3. Por ato de concessão deve ser entendida toda matéria relativa aos requisitos e critérios de cálculo do benefício submetida ao INSS no pedido de benefício, do que pode resultar o deferimento ou indeferimento do pleito.
4. A pretensão veiculada na presente ação consiste na revisão das prestações mensais pagas após a concessão do benefício para fazer incidir os novos tetos dos salários de benefício, e não do ato administrativo que analisou o pedido de deferimento da prestação previdenciária.
5. Por conseguinte, não incide a decadência prevista no art. 103, caput, da Lei 8.213/1991 nas pretensões de aplicação dos tetos das Emendas Constitucionais 20/1998 e 41/2003 a benefícios previdenciários concedidos antes dos citados marcos legais, pois consubstanciam mera revisão das prestações supervenientes ao ato de concessão.
6. Não se aplica, na hipótese, a matéria decidida no REsp 1.309.529/PR e no REsp 1.326.114/SC, sob o rito do art. 543-C do CPC, pois naqueles casos o pressuposto, que aqui é afastado, é que a revisão pretendida se refira ao próprio ato de concessão.
7. Recurso Especial não provido.
(REsp nº 144.755-1/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 26-11-2014)
Teto
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 564354, tendo como relatora a Ministra Carmem Lúcia Antunes Rocha, entendeu, por ampla maioria de votos "que só após a definição do valor do benefício é que se aplica o limitador (teto). Ele não faz parte do cálculo do benefício a ser pago. Assim, se esse limite for alterado, ele é aplicado ao valor inicialmente calculado". Considerou o STF, portanto, como disse o Ministro Gilmar Mendes, que "o teto é exterior ao cálculo do benefício". Em outras palavras, o teto, segundo tal interpretação, tem por função apenas limitar o valor do benefício previdenciário no momento de seu pagamento, não impedindo que o valor eventualmente glosado em virtude de sua incidência venha a ser, total ou parcialmente, considerado por ocasião de um aumento real do valor do teto, o que ocorreu por intermédio das Emendas Constitucionais 20/98 e 41/03.
O julgado recebeu a seguinte ementa:
DIREITOS CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. ALTERAÇÃO NO TETO DOS BENEFÍCIOS DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA. REFLEXOS NOS BENEFÍCIOS CONCEDIDOS ANTES DA ALTERAÇÃO. EMENDAS CONSTITUCIONAIS N. 20/1998 E 41/2003. DIREITO INTERTEMPORAL: ATO JURÍDICO PERFEITO. NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO DA LEI INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DAS LEIS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Há pelo menos duas situações jurídicas em que a atuação do Supremo Tribunal Federal como guardião da Constituição da República demanda interpretação da legislação infraconstitucional: a primeira respeita ao exercício do controle de constitucionalidade das normas, pois não se declara a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma lei sem antes entendê-la; a segunda, que se dá na espécie, decorre da garantia constitucional da proteção ao ato jurídico perfeito contra lei superveniente, pois a solução de controvérsia sob essa perspectiva pressupõe sejam interpretadas as leis postas em conflito e determinados os seus alcances para se dizer da existência ou ausência da retroatividade constitucionalmente vedada.
2. Não ofende o ato jurídico perfeito a aplicação imediata do art. 14 da Emenda Constitucional n. 20/1998 e do art. 5º da Emenda Constitucional n. 41/2003 aos benefícios previdenciários limitados a teto do regime geral de previdência estabelecido antes da vigência dessas normas, de modo a que passem a observar o novo teto constitucional.
3. Negado provimento ao recurso extraordinário.
(RE 564354, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 08-09-2010, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-030 DIVULG 14-02-2011 PUBLIC 15-02-2011 EMENT VOL-02464-03 PP-00487)
Na linha de entendimento adotada pelo STF, o salário de benefício é o resultado da média corrigida dos salários de contribuição que compõem o período básico de cálculo, calculada nos termos da lei previdenciária e com a incidência do fator previdenciário, quando couber. Após, para fins de apuração da renda mensal inicial, o salário de benefício é limitado ao valor máximo do salário de contribuição vigente no mês do cálculo do benefício (art. 29, § 2º, da Lei nº 8.213/91) e, ato contínuo, recebe a aplicação do coeficiente de cálculo relativo ao tempo de serviço/contribuição. Portanto, segundo o STF, o salário de benefício é preexistente à referida glosa.
Ocorre que o salário de benefício reflete o histórico contributivo do segurado, traduzindo, nos termos da lei, o aporte das contribuições vertidas ao longo da vida laboral e a devida contraprestação previdenciária mensal, substitutiva dos ganhos decorrentes do trabalho anteriormente exercido. Assim, em princípio, a renda mensal inicial do benefício deveria corresponder ao valor do salário de benefício apurado, proporcional ao tempo de serviço/contribuição do segurado, e assim se manter, submetida à política de reajustes da Previdência Social.
Contudo, a legislação previdenciária estabelece tetos que devem ser respeitados, no que diz respeito tanto ao valor máximo da contribuição previdenciária que deve ser recolhida pelo segurado em cada competência (art. 28, § 5º, da Lei nº 8.212/91) como ao valor máximo de benefício a ser pago pela Previdência Social (artigos 29, § 2º, 33 e 41-A, § 1º, todos da Lei nº 8.213/91). Tais limites são fixados levando em consideração que o salário de contribuição é a principal base de cálculo das contribuições arrecadadas e, também, das prestações previdenciárias. Da escolha dos critérios técnicos e políticos para a fixação desses limites depende o equilíbrio atuarial do sistema de seguridade social.
Conclui-se, assim, que, embora o segurado fizesse jus à percepção de benefício em montante superior ao limite estabelecido na lei, pois lastreado em contribuições suficientes para tanto, não poderá receber da Seguradora contraprestação mensal em valor que exceda ao teto do salário de contribuição.
Deve-se observar, no entanto, que o entendimento manifestado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº 564354 é no sentido de que a restrição existe apenas para fins de pagamento, não havendo redução do salário de benefício, que, como se viu, é a própria média corrigida dos salários de contribuição integrantes do período básico de cálculo, com a incidência do fator previdenciário, quando couber. Assim, a equação original no momento da concessão fica inalterada: o salário de benefício, expressão do aporte contributivo do segurado, será sempre a base de cálculo da renda mensal a ser percebida em cada competência, respeitado o limite máximo do salário de contribuição então vigente.
Isto significa que, elevado o teto do salário de contribuição sem que tenha havido reajuste das prestações previdenciárias (como no caso das Emendas Constitucionais 20/1998 e 41/2003), ou reajustado em percentual superior ao concedido àquelas, o benefício "recupera o que normalmente receberia se o teto à época fosse outro", no dizer do Ministro Marco Aurélio, ou, de acordo com o Ministro Ayres Britto, "os já aposentados segundo um teto vigente à época da aposentadoria são catapultados para o novo teto automaticamente".
A questão é muito bem esclarecida pelo Ministro Gilmar Mendes em seu voto, que peço licença para transcrever em parte:
Com o objetivo de contextualizar as questões constitucionais incidentes, consideremos a seguinte cronologia legislativa relativa ao tema central do Recurso Extraordinário:
- Julho/1991 - Lei nº 8.213/91: "o benefício não poderá ser superior ao limite máximo do salário de contribuição".
- 16/12/1998 - EC 20/98: fixa o limite em R$ 1.200,00.
- 31/12/2003 - EC 41/03: fixa o limite em R$ 2.400,00.
Os valores mencionados sofriam atualizações periódicas. Assim, por ocasião da superveniência da EC 20/98, o valor do limitador de benefícios previdenciários era de R$ 1.081,50 (mil e oitenta e um reais e cinquenta centavos) - valor estabelecido em junho de 1998; na superveniência da EC 41/03, o valor correspondia a R$ 1.869,34 (mil oitocentos e sessenta e nove reais e trinta e quatro centavos) - valor fixado em junho de 2003.
Presente essa cronologia, pode-se concluir que as contribuições e os benefícios previdenciários encontravam-se sujeitos a dois limitadores distintos: a) limite máximo do salário de contribuição; b) teto máximo do salário de benefício.
Partindo-se do pressuposto de que o segurado é obrigado a respeitar o limite do salário de contribuição mensal, uma primeira indagação deve ser enfrentada: como é possível a consolidação de um salário de benefício superior ao teto? A resposta pode ser buscada nos diferentes índices utilizados para corrigir as contribuições pagas pelos segurados (salário de contribuição) e o valor nominal do limitador dos benefícios, fenômeno que perdurou até 2/2004, quando os índices foram uniformizados, conforme se demonstra a seguir:
(...) omissis [tabelas com os índices mencionados]
Assim, e apenas para exemplificar, no período de 12/1998 a 11/2003, o salário de contribuição recebeu uma atualização monetária acumulada de 98,43%. Nesse mesmo período o limitador previdenciário sofreu uma atualização acumulada de somente 55,77%, ou seja, o segurado contribuiu dentro do limite legalmente permitido, e da atualização dos salários de contribuição (um índice específico - maior) decorreu um salário de benefício que superou o teto em vigor na época da concessão, cujo valor é atualizado por outro índice (menor).
Esclarecida a origem meramente contábil da discrepância entre valor máximo do salário de contribuição e o valor do limitador previdenciário ("teto previdenciário"), a questão central do debate reside na elucidação da natureza jurídica do limitador previdenciário. Tenho que o limitador previdenciário, a partir de sua construção constitucional, é elemento externo à estrutura jurídica do benefício previdenciário, que não o integra. O salário de benefício resulta da atualização dos salários de contribuição. A incidência do limitador previdenciário pressupõe a perfectibilização do direito, sendo-lhe, pois, posterior e incidindo como elemento redutor do valor final do benefício.
Dessa forma, sempre que alterado o valor do limitador previdenciário, haverá a possibilidade de o segurado adequar o valor de seu benefício ao novo teto constitucional, recuperando o valor perdido em virtude do limitador anterior, "pois coerente com as contribuições efetivamente pagas". ( CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 12 ed. Florianópolis: Conceito Editorial. 2010. p. 557/558)
(grifos no original)
Portanto, fixado pelo STF o entendimento de que o limitador (teto do salário de contribuição) é elemento externo à estrutura jurídica do benefício previdenciário, o valor apurado para o salário de benefício integra-se ao patrimônio jurídico do segurado, razão pela qual todo o excesso não aproveitado em razão da restrição poderá ser utilizado sempre que alterado o teto, adequando-se ao novo limite.
Com base nos argumentos acima expostos, e considerando a defasagem histórica do teto do salário de contribuição no mês de junho/92, ante a irrisória atualização que lhe foi deferida nos meses de março e abril de 1990, quando o país sofria com a hiperinflação, inúmeros benefícios concedidos no período chamado "buraco negro" e recalculados por força do art. 144 da Lei 8.213/91, ainda que com salário de benefício abaixo do teto na data da concessão, ao serem reajustados pelo INPC até junho/92 alcançaram valor superior ao limite máximo do salário de contribuição naquela competência, razão pela qual também a eles aplica-se o entendimento manifestado pela Corte Maior.
Uma vez que não é casuisticamente calculada a existência de prejuízos pela limitação aos tetos, o que ocorrerá somente na fase de execução, inclusive porque é possível a existência de correlato pleito (na via administrativa ou judicial) de elevação do salário de benefício da parte autora, deve ser acolhido o pedido inicial.
Prescrição
A parte autora requereu a interrupção do prazo prescricional ocasionada pelo ajuizamento da Ação Civil Pública nº 0004911-28.2011.4.03.6183, em 5 de maio de 2011, perante a 1ª Vara Previdenciária de São Paulo, pelo Ministério Público Federal e o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos da Força Sindical.
Com efeito, o Código de Processo Civil de 1973 dispunha, em seu art. 219, que a citação válida interrompe a prescrição, e o §1º dizia que esta interrupção retroagia à data da propositura da ação. De outra banda, desde a vigência do Código Civil de 1916, havia previsão de interrupção da prescrição a ser promovida: a) pelo próprio titular do direito em via de prescrição; b) por quem legalmente o represente; c) por terceiro que tenha legítimo interesse (art. 174). A disposição no sentido de que a prescrição pode ser interrompida por qualquer interessado foi mantida no art. 203 do Código Civil atualmente em vigor.
Portanto, a propositura de ação civil pública, precedentemente ao ajuizamento individual de ação com assemelhado objeto, teve por consequência a interrupção do prazo prescricional.
A não se entender assim, restaria esvaziada a razão de ser da ação com índole constitucional, instrumento adequado e de recomendável manejo processual, favorecedor da economia e praticidade, a obviar o inconveniente do ingresso de centenas de ações individuais e a injustiça de não se reparar o prejuízo daqueles que, por ignorância ou dificuldade de meios, não dispõem do acesso ao Poder Judiciário para a defesa de seus direitos.
Reconhecida a causa interruptiva do prazo prescricional, estão prescritas as parcelas anteriores ao quinquênio imediatamente anterior à propositura da ação civil pública, na data acima referida.
Consectários. Juros moratórios e correção monetária.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que sejam definidos na fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016).
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a decisão acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, prejudicada a apelação, no ponto.
Honorários advocatícios
Honorários advocatícios, nos termos do art. 85, §3º, do CPC, em percentual a ser apurado em liquidação de sentença (art. 85, §4º, inciso II), observada a Súmula 111/STJ.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/07/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5015517-21.2014.4.04.7113/RS
ORIGEM: RS 50155172120144047113
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Cláudio Dutra Fontela |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOAO DA LUZ SOBRINHO |
ADVOGADO | : | ANDRÉ ALEXANDRINI |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/07/2016, na seqüência 188, disponibilizada no DE de 11/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8484597v1 e, se solicitado, do código CRC F2B97667. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 28/07/2016 11:49 |
