Apelação Cível Nº 5006737-28.2018.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DORIVAL DALPONTE
RELATÓRIO
Cuida-se de recurso de apelação interposto contra sentença, publicada em 10-11-2017, em que o magistrado singular julgou procedente o pedido, condenando o INSS a:
[a] REVISAR o benefício auxílio-doença (NB 609.759.077-0), aplicando o disposto no art. 29, § 10º, da Lei n. 8.213/91;
[b] PAGAR as diferenças de proventos decorrentes da revisão determinada no item a, em parcela única, devidamente atualizadas, na forma da fundamentação;
[c] IMPLANTAR o benefício de auxílio-acidente previdenciário, observadas as regras do art. 86 da Lei n. 8.213/91, tendo por marco inicial o dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença (17/5/2015), nos termos da fundamentação; e
[d] PAGAR as prestações vencidas e vincendas, devidamente atualizadas, descontados eventuais valores incompatíveis nos termos da fundamentação, observada a prescrição quinquenal.
Condenou a autarquia, ainda, ao pagamento das custas processuais pela metade e dos honorários advocatícios em favor da parte autora, os quais devem respeitar a Súmula 111 do STJ.
Em suas razões recursais, o INSS aduz que, embora o inciso II do artigo 29 da Lei n. 8.213/1991 siga vigente, a Medida Provisória n. 664/2014 inseriu nesse mesmo artigo o parágrafo 10. Alega que o §10 não modificou ou alterou a forma de cálculo do benefício, mas sim inseriu um LIMITADOR ao seu valor. Nesse sentido, sustenta que seria inadequada a sua aplicação enquanto forma de apuração do salário de benefício, em substituição ao inciso II do artigo 29 da Lei n. 8.213/1991, e postula a reforma da sentença.
Apresentadas contrarrazões pela parte autora.
Vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Reexame necessário
Tendo sido o presente feito sentenciado na vigência do atual Diploma Processual Civil, não há falar em remessa oficial, porquanto foi interposto recurso voluntário pelo INSS, o que vai de encontro ao disposto no art. 496, § 1º, do vigente CPC. Com efeito, a redação do mencionado dispositivo é clara e inequívoca, não admitindo o seu texto outra interpretação, que seria ampliativa do condicionamento do trânsito em julgado da sentença ao reexame necessário. Trata-se de instituto excepcional e, sendo assim, há de ser restritivamente interpretado.
A propósito, Humberto Theodoro Júnior percucientemente observa que a novidade do CPC de 2015 é a supressão da superposição de remessa necessária e apelação. Se o recurso cabível já foi voluntariamente manifestado, o duplo grau já estará assegurado, não havendo necessidade de o juiz proceder à formalização da remessa oficial. (in Curso de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum. 57. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 1101).
Nesta exata linha de conta, colaciona-se o seguinte aresto do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:
REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. ACIDENTE DE TRABALHO. DESCABIMENTO DO DUPLO GRAU OBRIGATÓRIO DE JURISDIÇÃO. INCOMPATIBILIDADE LÓGICA ENTRE REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO FAZENDÁRIA NA SISTEMÁTICA PROCESSUAL NOVA (ART. 496, § 1º, DO CPC VIGENTE). REMESSA NÃO CONHECIDA. AUXÍLIO-ACIDENTE. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO NA ESPÉCIE. REDUÇÃO FUNCIONAL SUFICIENTEMENTE EVIDENCIADA. 1. Reexame necessário. De acordo com o artigo 496 ,§ 1º, do novo Código de Processo Civil, é descabida a coexistência de remessa necessária e recurso voluntariamente interposto pela Fazenda Pública. Com efeito, a nova codificação processual instituiu uma lógica clara de mútua exclusão dos institutos em referência, resumida pela sistemática segundo a qual só caberá remessa obrigatória se não houver apelação no prazo legal; em contrapartida, sobrevindo apelo fazendário, não haverá lugar para a remessa oficial. Precedentes doutrinários. Caso em que a apelação interposta pelo ente público dispensa o reexame oficioso da causa. Remessa necessária não conhecida. [...]. REEXAME NECESSÁRIO NÃO CONHECIDO. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E, NESTA, DESPROVIDA. (TJ/RS, 9ª Câmara Cível, Apelação e Reexame Necessário nº 70076942127, Rel. Des. Carlos Eduardo Richinitti, julg. 30-05-2018)
No mesmo sentido, inclusive, recentemente pronunciou-se esta Turma Julgadora:
PREVIDENCIÁRIO. REEXAME (DES)NECESSÁRIO. NÃO CABIMENTO EM CASO DE RECURSO DA FAZENDA PÚBLICA. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS COMPROVADOS E NÃO QUESTIONADOS PELO APELANTE. ANULAÇÃO DA PERÍCIA. DESCABIMENTO. IMPUGNAÇÃO À PESSOA DO PERITO EM MOMENTO INOPORTUNO. PRECLUSÃO.
1. O reexame necessário é instituto de utilidade superada no processo civil diante da estruturação atual da Advocacia Pública, que inclusive percebe honorários advocatícios de sucumbência. Nada obstante, persiste positivado com aplicabilidade muito restrita. Considerada a redação do art. 496, § 1º, do NCPC, somente tem cabimento quando não houver apelação da Fazenda Pública. São incompatíveis e não convivem o apelo da Fazenda Pública e o reexame necessário, mera desconfiança em relação ao trabalho dos procuradores públicos, que compromete o tempo da Justiça, sobretudo da Federal.
2. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter temporário da incapacidade.
3. In casu, pretendendo o INSS impugnar a nomeação do perito designado pelo juiz, deveria tê-lo feito, sob pena de preclusão, na primeira oportunidade em que tomou conhecimento de que a perícia seria realizada por aquele profissional. A impugnação do perito realizada após a perícia - a qual foi desfavorável ao Instituto - não tem o condão de afastar a preclusão.
4. Embora de acordo com o novo CPC não seja cabível agravo de instrumento da decisão interlocutória que rejeitou a impugnação do INSS ao perito, o que, em tese, poderia ensejar a aplicação do disposto no § 1º do art. 1.009, de modo a permitir que a matéria fosse reiterada em apelação, no caso, a referida impugnação ocorreu depois da realização da perícia, e não assim que o Instituto teve conhecimento de que a perícia seria realizada pelo profissional contestado, o que afasta a possibilidade de aplicação daquela regra. (TRF4, TRS/SC, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, unânime, julg. 12-12-2018).
Logo, conforme a regra da singularidade estabelecida pela nova Lei Adjetiva Civil, tendo sido, no caso, interposta apelação pela Autarquia Previdenciária, a hipótese que se apresenta é de não cabimento da remessa necessária.
Mérito
A controvérsia cinge-se ao pedido, elaborado pela autarquia previdenciária, no sentido do afastamento da aplicação do art. 29, §10, enquanto forma de cálculo do salário-de-benefício, sob o fundamento de que essa não seria a aplicação mais adequada do artigo, que se presta somente a estabelecer um limitador; e de sua substituição pelo inciso II do mesmo artigo.
Revisão de acordo com art. 29, II, da Lei n. 8.213/91
Conforme relatado, postula o INSS que o cálculo do benefício seja realizado de acordo com o disposto no art. 29, inc. II, da Lei n. 8.213/1991, porquanto o art. 29, §10 dessa lei se prestaria somente a aplicação de um limitador ao salário-de-benefício - e não a determinaçao de uma forma de cálculo.
Para aclarar o objeto da controvérsia, veja-se o que determinam os dispositivos legais mencionados:
Art. 29. O salário-de-benefício consiste: (...)
II - para os benefícios de que tratam as alíneas a, d, e e h do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo.
[..]
§ 10. O auxílio-doença não poderá exceder a média aritmética simples dos últimos 12 (doze) salários-de-contribuição, inclusive em caso de remuneração variável, ou, se não alcançado o número de 12 (doze), a média aritmética simples dos salários-de-contribuição existentes. (Incluído pela Lei nº 13.135, de 2015)
A partir da leitura do texto legal supracitado, conclui-se que assiste razão ao INSS.
Isso porque, de fato, o inciso II do art. 29 da Lei n. 8.213/91 expõe a forma de cálculo do benefício, enquanto o §10 desse mesmo artigo se limita a limitar o valor máximo do salário-de-benefício, calculado nos moldes do inciso II.
Nesse mesmo sentido, colaciono excerto do Boletim Legislativo do Senado Federal de n. 21, publicado no ano de 2015 e intitulado "ANÁLISE DA MP Nº 664, DE 2014: ALTERAÇÕES NA PENSÃO POR MORTE E NO AUXÍLIO-DOENÇA", que interpretou a alteração legislativa da mesma forma:
Relativamente ao auxílio-doença, a MP nº 664, de 2014, alterou seu valor e a forma de custeio do afastamento do segurado. Passa a existir um novo teto para o auxílio, que não poderá ser maior do que a média dos salários de contribuição do segurado dos doze meses anteriores. Anteriormente, o valor era baseado na média dos 80% maiores salários de contribuição de todo o período contributivo do segurado (salário de benefício). - Grifo aposto. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/boletins-legislativos/bol21. Página 08.
Com efeito, deve ser provido o recurso interposto pela autarquia, para que se reforme a sentença no sentido de determinar a revisão do benefício de auxílio-doença percebido pela parte autora (NB 609.759.077-0), respeitando a forma de cálculo contida no art. 29, inc. II, da Lei n. 8.213/91, bem como o teto contido no §10 desse mesmo artigo.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas judiciais na Justiça Federal, nos termos do art. 4º, I, da Lei n. 9.289/96, e na Justiça Estadual de Santa Catarina, a teor do que preceitua o art. 33, parágrafo primeiro, da Lei Complementar Estadual n. 156/97, com a redação dada pela Lei Complementar Estadual n. 729/2018.
Honorários advocatícios
Considerando que a sentença foi publicada após 18-03-2016, data definida pelo Plenário do STJ para início da vigência do NCPC (Enunciado Administrativo nº 1-STJ), bem como o Enunciado Administrativo n. 7 - STJ (Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC), aplica-se ao caso a sistemática de honorários advocatícios ora vigente.
Desse modo, os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, ressaltando ser incabível, no caso, a majoração dos honorários prevista § 11 do art. 85 do NCPC, a teor do posicionamento que vem sendo adotado pelo STJ (v.g. AgIntno AREsp 829.107/RJ, Relator p/ Acórdão Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, DJe 06-02-2017 e AgInt nos EDcl no REsp 1357561/MG, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Terceira Turma, DJe 19-04-2017), restando suspensa a satisfação respectiva, por ser a parte beneficiária da gratuidade de justiça.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso de apelação interposto pelo INSS.
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Apelação Cível Nº 5006737-28.2018.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DORIVAL DALPONTE
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. ART. 29, II e art. 29, § 10º, DA LEI 8.213/91, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 13.135/2015. forma de cálculo. teto.
1. O inciso II do art. 29 da Lei n. 8.213/91 expõe a forma de cálculo do benefício, enquanto o §10 desse mesmo artigo se limita a limitar o valor máximo do salário-de-benefício, calculado nos moldes do inciso II.
2. Caso em que a revisão do benefício deve ser calculada com base no disposto no art. 29, II, da Lei n. 8.213/91, e respeitando o teto contido no §10 desse mesmo artigo.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso de apelação interposto pelo INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de fevereiro de 2021.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002232706v7 e do código CRC 72dfa73e.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 08/02/2021 A 17/02/2021
Apelação Cível Nº 5006737-28.2018.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DORIVAL DALPONTE
ADVOGADO: JAMILTO COLONETTI (OAB SC016158)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 08/02/2021, às 00:00, a 17/02/2021, às 17:00, na sequência 902, disponibilizada no DE de 27/01/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO PELO INSS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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