| D.E. Publicado em 22/06/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003244-65.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | GENI FOCHEZATTO SANTOS |
ADVOGADO | : | Mauricio Ferron e outros |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REVISIONAL DE BENEFÍCIO. REEXAME NECESSÁRIO. SENTENÇA PROFERIDA NA VIGÊNCIA DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RECONHECIMENTO DE LABOR EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. HIDROCARBONETOS. EPI. REQUISITOS ATENDIDOS. TUTELA ESPECÍFICA. IMEDIATA REVISÃO.
1. O art. 496 do atual CPC (Lei 13.105/2015) estabelece que está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público. Está excluído, contudo, o duplo grau de jurisdição obrigatório sempre que a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos para a União, respectivas autarquias e fundações de direito público (art. 496, §3º, I).
2. No ano em vigência, o salário mínimo está em R$ 937,00, correspondendo o limite de mil salários-mínimos a R$ 937.000,00 (novecentos e trinta e sete mil reais). Considerando que o teto da previdência está atualmente em R$ 5.531,31 e que a sentença condenatória alcançará, em regra, cinco anos, com 13 prestações mensais, chega-se a um valor de R$ 359.535,15, muito inferior ao limite legal.
3. Em matéria previdenciária, na atual sistemática, não haverá mais reexame necessário, pois, salvo em hipóteses excepcionais, o valor da condenação jamais alcançará o limite legal de mil salários mínimos.
4. Comprovado o exercício de atividade especial, conforme os critérios estabelecidos na lei vigente à época do exercício, o segurado tem direito adquirido ao cômputo do tempo de serviço como tal.
5. Até 28.4.1995, é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29.4.1995, necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; e, a contar de 6.5.1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.
6. No Quadro Anexo do Decreto nº 53.831, de 25-03-1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24-01-1979, e o Anexo IV do Decreto nº 2.172, de 05-03-1997, constam como insalubres as atividades expostas a poeiras, gases, vapores, neblinas e fumos de derivados do carbono nas operações executadas com derivados tóxicos do carbono, em que o segurado ficava sujeito habitual e permanentemente (Códigos 1.2.11, 1.2.10; 1.0.3, 1.017 e 1.0.19).
7. Apesar de não haver previsão específica de especialidade pela exposição habitual e permanente a hidrocarbonetos em decreto regulamentador, há o enquadramento de atividade especial, pois a sua manipulação já é suficiente para o reconhecimento da atividade exposta ao referido agente nocivo (Precedentes desta Corte).
8. O uso de EPIs (equipamentos de proteção), por si só, não basta para afastar o caráter especial das atividades desenvolvidas pelo segurado. Seria necessária uma efetiva demonstração da elisão das consequências nocivas, além de prova da fiscalização do empregador sobre o uso permanente dos dispositivos protetores da saúde do obreiro durante toda a jornada de trabalho.
9. Para atividades exercidas até a data da publicação da MP 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei 9.732, de 11 de dezembro de 1998, que alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/1991, a utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador.
10. A determinação de revisão imediata do benefício, com fundamento nos artigos supracitados, não configura violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973 e 37 da CF/1988.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, conhecer parcialmente do recurso, e no ponto conhecido, dar-lhe parcial provimento, determinando a imediata revisão do benefício, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de junho de 2017.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9017086v3 e, se solicitado, do código CRC 89232301. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 14/06/2017 16:02 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003244-65.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | GENI FOCHEZATTO SANTOS |
ADVOGADO | : | Mauricio Ferron e outros |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação contra sentença que julgou procedente o pedido revisional, nos seguintes termos:
Isso posto, Julgo procedentes os pedidos formulados por GENI FOCHEZATO SANTOS em desfavor do INSS e, por conseguinte, reconhecço como sendo tempo de trabalho especial, o período de 02/10/97 a 27/08/98 e 22/03/99 a 25/06/2006, e determino que o demandado averbe esse período bem como condeno a Autarquia ré a revisar a renda mensal inicial do benefício previdenciário da aposentadoria por tempo de serviço percebido pela autora, devendo as parcelas vencidas serem atualizadas nos termos da fundamentação supra.
Condeno o INSS ao pagamento das custas processuais pela metade, nos termos da Súmula 02 do TARGS, porquanto devidas, nos termos da Súmula 178 do STJ, estas até a vigência da Lei Estadual 13.471/2010, nos termos do Ofício-Circular nº 595/07- CGJ e Ofício-Circular nº 098/2010 -CGJ, e ao pagamento das despesas processuais nos termos do Ofício-Circular nº 012/2011 - CGJ, e liminar concedida no Agravo Regimental nº 70039278296 com relação à suspensão da Lei Estadual nº 13.471/2010, postulada na ADI nº 70038755864.
Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador da parte autora, que fixo em R$ 2.000,00 (dois mil reais), fulcro no art. 85, §8º do NCPC, considerando a singeleza do feito o tempo de tramitação e o labor exercido pelo profissional.
Sem reexame necessário, por inteligência do artigo 496, §3º, inciso II, NCPC.
Sustenta a autarquia, primeiramente, a necessidade do reexame oficial. Refere a impossibilidade do reconhecimento da especialidade, bem como requer a limitação dos honorários advocatícios ao percentual de 10% das parcelas vencidas. Assevera a isenção quanto à taxa única de serviços judiciais. Por fim, refere a aplicabilidade dos critérios definidos pela Lei 11960/2009, ao cálculo da correção monetária do débito judicial.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, importa referir que o apelo deve ser conhecido, por ser próprio, regular e tempestivo.
Saliento que tendo em conta a DIB do benefício em 02/03/2011, e a data da propositura da presente ação revisional em 28/07/2011, não há falar na ocorrência da decadência do direito de revisar o benefício.
Da Remessa Oficial
O art. 496 do atual CPC (Lei 13.105/2015) estabelece que está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público.
Está excluído, contudo, o duplo grau de jurisdição obrigatório sempre que a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos para a União, respectivas autarquias e fundações de direito público (art. 496, §3º, I).
No ano de 2017, o salário mínimo está em R$ 937,00, correspondendo o limite de mil salários-mínimos a R$ 937.000,00 (novecentos e trinta e sete mil reais). Considerando que o teto da previdência está atualmente em R$ 5.531,31 e que a sentença condenatória alcançará, em regra, cinco anos, com 13 prestações mensais, chega-se a um valor de R$ 359.535,15, muito inferior ao limite legal.
Conclui-se, portanto, que, em matéria previdenciária, na atual sistemática, não haverá mais reexame necessário, pois, salvo em hipóteses excepcionais, o valor da condenação nunca chegará a mil salários mínimos.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA PROFERIDA NA VIGÊNCIA DO NCPC. REMESSA OFICIAL NÃO CONHECIDA. 1. Não se desconhece o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a sentença ilíquida está sujeita a reexame necessário (Súmula 490). 2. Considerando que o art. 29, § 2º, da Lei nº 8.213/91 dispõe que o valor do salário de benefício não será inferior ao de um salário mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário de contribuição na data de início do benefício, e que a Portaria Interministerial nº 01, de 08/01/2016, dos Ministérios da Previdência Social e da Fazenda, estabelece que, a partir de 01/01/2016, o valor máximo do teto dos salários de benefícios pagos pelo INSS é de R$ 5.189,82 (cinco mil, cento e oitenta e nove reais e oitenta e dois centavos), é forçoso reconhecer que, mesmo na hipótese em que a RMI da aposentadoria especial deferida à parte autora seja fixada no teto máximo, e as parcelas em atraso pagas nos últimos 05 anos (art. 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91), o valor da condenação, ainda que acrescida de correção monetária e juros de mora, jamais excederá à quantia de 1.000 (mil) salários-mínimos, montante exigível para a admissibilidade do reexame necessário. (TRF4, REOAC 0022586-67.2014.404.9999, QUINTA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, D.E. 28/10/2016)
O caso dos autos se insere na hipótese de dispensa do reexame necessário, não alcançando a condenação o valor estabelecido na nova lei processual civil, pelo que não merece acolhida o recurso, quanto ao tópico.
Das atividades especiais
Considerações gerais
O reconhecimento da especialidade da atividade é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (AR n. 3320/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 24-09-2008; EREsp n. 345554/PB, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ de 08-03-2004; AGREsp n. 493.458/RS, Quinta Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJU de 23-06-2003; e REsp n. 491.338/RS, Sexta Turma, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 23-06-2003) e por esta Corte: (EINF n. 2005.71.00.031824-5/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. de 18-11-2009; APELREEX n. 0000867-68.2010.404.9999/RS, Sexta Turma, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. de 30-03-2010; APELREEX n. 0001126-86.2008.404.7201/SC, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. de 17-03-2010; APELREEX n. 2007.71.00.033522-7/RS; Quinta Turma, Rel. Des. Federal Fernando Quadros da Silva, D.E. de 25-01-2010).
Feita essa consideração e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28-04-1995, quando vigente a Lei nº 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n. 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor (STJ, AgRg no REsp n. 941885/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe de 04-08-2008; e STJ, REsp n. 639066/RJ, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ de 07-11-2005), em que necessária a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes;
b) a partir de 29-04-1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção daquelas a que se refere a Lei n. 5.527/68, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13-10-1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória nº 1.523, de 14-10-1996, que revogou expressamente a Lei em questão - de modo que, no interregno compreendido entre 29-04-1995 (ou 14-10-1996) e 05-03-1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n. 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;
c) a partir de 06-03-1997, data da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória nº 1.523/96 (convertida na Lei n. 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), nº 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo II) até 28-04-1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e n. 83.080/79 (Anexo I) até 05-03-1997, e os Decretos n. 2.172/97 (Anexo IV) e n. 3.048/99 a partir de 06-03-1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto nº 4.882/03. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula nº. 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP n. 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30-06-2003).
Dos hidrocarbonetos
Com relação ao agente nocivo hidrocarbonetos (e outros compostos de carbono), o Quadro Anexo do Decreto nº 53.831, de 25-03-1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24-01-1979, e o Anexo IV do Decreto nº 2.172, de 05-03-1997, cuidando de detalhar os critérios para efeitos de concessão da aposentadoria especial aos 25 anos de serviço, consideravam insalubres as atividades expostas a poeiras, gases, vapores, neblinas e fumos de derivados do carbono nas operações executadas com derivados tóxicos do carbono, em que o segurado ficava sujeito habitual e permanentemente (Códigos 1.2.11, 1.2.10; 1.0.3, 1.017 e 1.0.19, na devida ordem).
De outro lado, o e. Superior Tribunal de Justiça fixou a tese de que as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser havidas como distintas as atividades que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao trabalhador, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, e em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991).
Eis a ementa:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE ELETRICIDADE. SUPRESSÃO PELO DECRETO 2.172/1997 (ANEXO IV). ARTS. 57 E 58 DA LEI 8.213/1991. ROL DE ATIVIDADES E AGENTES NOCIVOS. CARÁTER EXEMPLIFICATIVO. AGENTES PREJUDICIAIS NÃO PREVISTOS. REQUISITOS PARA CARACTERIZAÇÃO. SUPORTE TÉCNICO MÉDICO E JURÍDICO. EXPOSIÇÃO PERMANENTE, NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE (ART. 57, § 3º, DA LEI 8.213/1991).
1. Trata-se de Recurso Especial interposto pela autarquia previdenciária com o escopo de prevalecer a tese de que a supressão do agente eletricidade do rol de agentes nocivos pelo Decreto 2.172/1997 (Anexo IV) culmina na impossibilidade de configuração como tempo especial (arts. 57 e 58 da Lei 8.213/1991) de tal hipótese a partir da vigência do citado ato normativo.
2. À luz da interpretação sistemática, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991). Precedentes do STJ. (grifei)
3. No caso concreto, o Tribunal de origem embasou-se em elementos técnicos (laudo pericial) e na legislação trabalhista para reputar como especial o trabalho exercido pelo recorrido, por consequência da exposição habitual à eletricidade, o que está de acordo com o entendimento fixado pelo STJ.
4. Recurso Especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. ( (REsp 1306113/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, julgado em 14/11/2012, DJe 07/03/2013).
Assim, mesmo que não haja previsão, atualmente, em decreto regulamentar, se comprovada a insalubridade do ambiente de trabalho pela exposição habitual e permanente a hidrocarbonetos, há o enquadramento de atividade especial. Os riscos ocupacionais gerados por esses agentes não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa. A sua manipulação já é suficiente para o reconhecimento da atividade especial, conforme se vê do entendimento jurisprudencial desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. HIDROCARBONETOS.
(...)3. Havendo previsão legal para o reconhecimento da especialidade de atividade que envolva o manuseio de hidrocarbonetos e não apenas sua fabricação, deve ser confirmada, no caso concreto, a sentença no tocante ao reconhecimento da especialidade do período de 01-05-1984 a 31-10-1989, em que trabalhou como mecânico de manutenção dos equipamentos da empresa, nos quais o autor esteve exposto de modo habitual e permanente a hidrocarbonetos, em especial graxas e óleos minerais, fazendo jus o autor a aposentadoria por tempo de serviço proporcional com base em 30 anos, 05 meses e 23 dias, à razão de 70% do salário-de-benefício. (AC 2005.72.10.001038-0, 5ª T, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper, D.E. 31/08/2009).
Prova técnica por similaridade
A prova pericial é meio adequado para atestar a sujeição do trabalhador a agentes nocivos à saúde para seu enquadramento legal em atividade especial.
Cumpre consignar que, diante do caráter social da Previdência, o trabalhador segurado não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção da prova técnica em decorrência de fatores para os quais não tenha contribuído. A propósito, a orientação do Superior Tribunal de Justiça é pela possibilidade de o trabalhador lançar mão de perícia produzida de modo indireto, em empresa similar àquela em que trabalhou, quando não houver meio de reconstituir as condições físicas do local onde efetivamente exerceu atividades especiais. Veja-se o julgado daquela E. Corte:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO. PERÍCIA INDIRETA EM EMPRESA SIMILAR. LOCAL DE TRABALHO ORIGINÁRIO INEXISTENTE. POSSIBILIDADE. 1. "Mostra-se legítima a produção de perícia indireta, em empresa similar, ante a impossibilidade de obter os dados necessários à comprovação de atividade especial, visto que, diante do caráter eminentemente social atribuído à Previdência, onde sua finalidade primeira é amparar o segurado, o trabalhador não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção, no local de trabalho, de prova, mesmo que seja de perícia técnica". (REsp 1.397.415/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 20.11.2013). 2. Agravo Regimental não provido.(AgRg no REsp 1422399/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/03/2014, DJe 27/03/2014)
Havendo, portanto, elementos materiais a subsidiar a realização da perícia, como documentos e/ou depoimento de testemunhas que delimitem as tarefas desempenhadas pelo segurado no período, é perfeitamente cabível a produção de prova pericial por similaridade e/ou utilização de laudo técnico de empresa semelhante, do mesmo ramo de atuação.
Equipamentos de Proteção - EPI
A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei 9.732, de 11 de dezembro de 1998, que alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/1991, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. A própria autarquia já adotou esse entendimento na Instrução Normativa 45/2010 (art. 238, § 6º).
Em período posterior a dezembro de 1998, a desconfiguração da natureza especial da atividade em decorrência de EPIs é admissível desde que haja laudo técnico afirmando, inequivocamente, que a sua utilização pelo trabalhador reduziu efetivamente os efeitos nocivos do agente agressivo a níveis toleráveis, ou os neutralizou (STJ, REsp 720.082/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJ 10/04/2006, p. 279; TRF4, EINF 2001.72.06.002406-8, Terceira Seção, Relator Fernando Quadros da Silva, D.E. 08/01/2010).
Oportuno mencionar que restou reconhecida pelo e. STF a existência de repercussão geral atinente ao fornecimento de equipamento de proteção individual (Tema 555). No julgamento do ARE 664.335 (Tribunal Pleno, Rel Min. Luiz Fux, publ. no DJ do dia 12/02/2015), a Corte Suprema fixou duas teses: 1) "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial"; e 2) "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Ademais, para afastar o caráter especial das atividades desenvolvidas pelo segurado é necessária uma efetiva demonstração da elisão das consequências nocivas, além de prova da fiscalização do empregador sobre o uso permanente dos dispositivos protetores da saúde do obreiro durante toda a jornada de trabalho.
Caso concreto
Nos termos do laudo pericial por similaridade, acostado aos autos (fls. 215/231), a parte autora efetivamente estava exposta ao agente químico Hidrocarbonetos e outros compostos de carbono, conforme faz ver o seguinte excerto:
6) Conclusão:
Diante do que foi fundamentado ao longo do laudo pericial, conclui-se que as atividades que foram desenvolvidas pela autora para as empresas Paquetá Calçados Ltda, no período de 02/10/97 a 27/08/98, e São Paulo Alpargatas S/A, no período de 22/03/99 a 25/04/06, são consideradas insalubres em grau médio (20%), conforme determina a NR - 15 em seu anexo nº 13 Emprego de produtos contendo hidrocarbonetos aromáticos (solvente, cola e tinta a base de solventes), de acordo com a Portaria Ministerial nº 3214 de 08 de julho de 1978.
Também, há enquadramento no Regulamento Geral da Previdência Social:
Considerações: Como a Ordem de Serviço INSS/DSS nº 557 estabeleceu ainda que, qualquer que seja a data da entrada do requerimento , as atividades exercidas em condições especiais deverão ser analisadas da seguinte forma:
Diante do que foi fundamentado ao longo do laudo pericial, conclui-se que as atividades insalubres verificadas nos ambientes de trabalho da autora, nas empresas, foram as seguintes:
De 05/03/97 a 05/05/99:
a) NR 15 Anexo nº 13 - Hidrocarbonetos e outros compostos de Carbono: emprego de produtos contendo hidrocarbonetos aromáticos (solvente, cola e tinta a base de solventes);
b) Anexo IV do Decreto nº 2172, de 05/03/97, item 1.0.3- Benzeno e seus compostos tóxicos: utilização de produtos que contenham benzeno, como tintas e solventes.
A partir de 06/05/1999:
a) NR 15 Anexo nº 13 - Hidrocarbonetos e outros compostos de carbono: emprego de produtos contendo hidrocarbonetos aromáticos (solvente, cola e tinta a base de solventes);
b) Anexo IV do Decreto nº 3.048, de 06/05/99 item 1.01.3 - Benzeno e seus compostos tóxicos: utilização de produtos que contenham benzeno, como tintas e solventes.
Conforme informações obtidas da autora, da análise da documentação contida nos autos, das vistorias efetuadas em ambiente similar aos de trabalho da autora, e da análise técnica científica elaborada, baseada no Art. 429 do CPC, conclui-se que as atividades desenvolvidas pela trabalhadora foram efetuadas em contato com agente nocivo e insalubre químico, que é considerado prejudicial à sua saúde e integridade física, gerando direito a aposentadoria especial.
Por conseguinte, em virtude do reconhecimento do período desempenhado em condições especiais, multiplicado por 0,2, que acresce 01 ano 07 meses e 06 dias, somados ao período já reconhecido pelo INSS de 28 anos 11 meses e 21 dias, totaliza a autora 30 anos 06 meses e 27 dias de tempo de serviço/contribuição, devendo o INSS, ser condenado à revisar o benefício da parte autora, com o conseqüente recálculo da RMI, desde a data de concessão do benefício, respeitada a prescrição qüinqüenal, uma vez que na ocasião do requerimento, o segurado já detinha o direito à aposentadoria com renda mensal majorada.
Correção Monetária e Juros de mora
Deixo de conhecer do apelo quanto ao tópico, uma vez que a sentença recorrida aplicou os critérios definidos pela Lei 11960/2009.
Honorários
Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e Súmula nº 76 deste TRF. Restando confirmada a sentença no mérito, majoro referido percentual, elevando-o para 15% sobre as parcelas vencidas, considerando as variáveis dos incisos I a IV do §2º do artigo 85 do NCPC.
Custas
Havendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, o INSS está isento do pagamento de custas, mas obrigado ao pagamento de eventuais despesas processuais, consoante o disposto no art. 11 da Lei Estadual n. 8.121/85, na redação dada pela Lei n. 13.471, de 23 de junho de 2010.
Imediata revisão do benefício
A Terceira Seção desta Corte, ao julgar a Questão de Ordem na Apelação Cível nº 2002.71.00.050349-7, firmou entendimento no sentido de que, nas causas previdenciárias, deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (QUOAC 2002.71.00.050349-7, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007).
O mesmo tratamento deve ser concedido à hipótese de revisão, conforme decidido por esta Turma no processo N.º 5005419-61.2010.4.04.7001/PR, Relator Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 04/07/2016.
Em razão disso, sendo procedente o pedido, o INSS deverá revisar o benefício no prazo de 45 dias, consoante os parâmetros acima definidos, sob pena de multa.
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata/revisão do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973, e 37 da CF/1988, esclareço que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
Conclusão
Parcialmente conhecido o recurso, e no ponto conhecido, parcialmente provido, para fixar a verba honorária em percentual sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por conhecer parcialmente do recurso, e no ponto conhecido, dar-lhe parcial provimento, determinando a imediata revisão do benefício.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 13/06/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003244-65.2017.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00034104720118210058
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Sérgio Cruz Arenhart |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | GENI FOCHEZATTO SANTOS |
ADVOGADO | : | Mauricio Ferron e outros |
Certifico que este processo foi incluído no Aditamento da Pauta do dia 13/06/2017, na seqüência 1046, disponibilizada no DE de 02/06/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU CONHECER PARCIALMENTE DO RECURSO, E NO PONTO CONHECIDO, DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, DETERMINANDO A IMEDIATA REVISÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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