Apelação Cível Nº 5007145-14.2021.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ISABEL CEZIMBRA PORTO
RELATÓRIO
ISABEL CEZIMBRA PORTO ajuizou ação ordinária contra o INSS em 20/06/2018, postulando salário-maternidade em razão do nascimento de seu filho Pedro Henrique, em 29/06/2017. O requerimento administrativo foi feito em 23/01/2018.
A sentença (Evento 2-SENT6), proferida em 24/04/2020, julgou procedente o pedido, condenando o INSS à concessão do benefício, e ao pagamento dos atrasados com correção monetára pelo INPC, desde cada vencimento, e juros desde a citação, pelos mesmos índices aplicados à poupança. O INSS foi isentado do pagamento de custas, e não houve condenação em honorários, com fundamento na Lei 9.099/1995. O julgado não foi submetido ao reexame necessário.
A autora apelou (Evento 11), requerendo a condenação do INSS em honorários.
O INSS também apelou (Evento 17), afirmando que a autora não tem carência necessária à concessão pretendida, nem mantém a qualidade de segurado na data do parto.
Com contrarrazões de ambas as partes, veio o processo a este Tribunal.
VOTO
Sentença não sujeita ao reexame necessário
MÉRITO
O INSS alega que a autora não teria carência suficiente para a concessão do benefício pretendido, que é de dez meses, e nem qualidade de segurada na data do parto. Conforme o extrato do CNIS juntado no Evento 2-VOL1-p. 21, a autora teve dois vínculos de emprego, o primeiro de 12/07/2013 a 06/01/2015, e o segundo de 15/02/2016 a 17/02/2016. Após, nada consta no CNIS ou na CTPS. Seu filho Pedro Henrique Porto Gomes nasceu em 29/06/2017, conforme a certidão de nascimento (Evento 2-VOL1-p. 16).
O art. 15 da Lei 8.213/1991 assim dispõe:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício, exceto do auxílio-acidente;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
Conjugando-se o inciso II e o § 4º acima transcritos, verifica-se que a autora não perdeu a qualidade de segurada no lapso entre os dois vínculos de emprego (01/2015-02/2016). Por outro lado, após ser demitida, em 17/02/2016, a autora não voltou a estar empregada. Dessa forma, ela pode se beneficiar não apenas do inciso II , mas também do § 2º, de forma que a qualidade de segurado se estende por 24 meses (2 anos) após o término do último vínculo de emprego, já no ano de 2018. Portanto, quando do nascimento da criança, em 29/06/2017, a autora ainda estava no período de graça, e superava a carência de dez meses, sendo devido o benefício.
CONSECTÁRIOS
Honorários
O juízo de primeiro grau não condenou o INSS ao pagamento de honorários advocatícios por entender que a ação, caso fosse impetrada no Juizado Especial Federal (JEF), não implicaria honorários. Assim, por analogia à Justiça Federal, entendeu incabível verba honorária nas ações afetas à competência delegada.
No que diz respeito à questão, há entendimento fixado no STJ que nos casos de competência federal delegada não se aplica o rito dos JEFs, devendo ser aplicado o rito ordinário, como pode ser visto nas ementas que seguem:
RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. APLICAÇÃO DO RITO ESPECIAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS ÀS CAUSAS JULGADAS PELO JUIZ DE DIREITO INVESTIDO DE JURISDIÇÃO FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE. VEDAÇÃO EXPRESSA CONTIDA NO ARTIGO 20 DA LEI Nº 10.259/2001.
1. Em razão do próprio regramento constitucional e infraconstitucional, não há competência federal delegada no âmbito dos Juizados Especiais Estaduais, nem o Juízo Estadual, investido de competência federal delegada (artigo 109, parágrafo 3º, da Constituição Federal), pode aplicar, em matéria previdenciária, o rito de competência do Juizado Especial Federal, diante da vedação expressa contida no artigo 20 da Lei nº 10.259/2001.
2. Recurso especial provido.
(REsp 661.482/PB, Rel. Ministro NILSON NAVES, Rel. p/ Acórdão Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 05/02/2009, DJe 30/03/2009)
PREVIDENCIÁRIO. CONFLITO NEGATIVO. JUÍZO DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL E JUÍZO DE DIREITO INVESTIDO DE JURISDIÇÃO FEDERAL.
COMPETÊNCIA DO STJ PARA DIRIMIR O CONFLITO. ART. 105, I, ALÍNEA "D" DA CF. JUÍZO ESTADUAL. COMPETÊNCIA EXCEPCIONAL. JULGAMENTO DE CAUSAS PREVIDENCIÁRIAS. ARTIGO 109, § 3º DA CF. INTELIGÊNCIA. ARTIGO 20 DA LEI 10.259/01. JUSTIÇA ESTADUAL E JUIZADO ESPECIAL ESTADUAL.
INAPLICABILIDADE. JUIZADO ESPECIAL ESTADUAL. JULGAMENTO DE CAUSAS PREVIDENCIÁRIAS. IMPOSSIBILIDADE. LEI ORDINÁRIA. EXTENSÃO. VEDAÇÃO.
COMPETÊNCIA DE CUNHO CONSTITUCIONAL. PROIBIÇÃO DO ARTIGO 20 DA LEI 10.259/01. REMOÇÃO. PROCEDIMENTO DOS ARTIGOS 97 DA CF C/C 480 DO CPC. PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO. ILEGITIMIDADE DE SER PARTE. JUIZADO ESPECIAL ESTADUAL. ART. 8º DA LEI 9.099/95. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR COMPETENTE O JUÍZO DE DIREITO DA 3ª VARA CÍVEL.
I - Cabe afirmar a competência desta Corte para dirimir o presente conflito instaurado entre Juízo de Direito, a quem se atribui a competência constitucional de julgar causas previdenciárias, nos termos do artigo 109, § 3º da Constituição Federal - e Juízo de Direito do Juizado Especial Estadual Cível. Este é o entendimento que se infere do artigo 105, I, d da Constituição Federal, porque, in casu, os juízes em conflito não estão vinculados ao mesmo Tribunal, já que não existe sujeição entre juízes do Juizado Especial Estadual e os TRFs.
II - A literalidade do parágrafo 3º do artigo 109 da Constituição Federal deixa certo que à Justiça Estadual foi atribuída a competência excepcional para processar e julgar, no foro do domicílio dos segurados ou beneficiários, exclusivamente, as causas em que forem parte instituição de previdência social e segurado, sempre que a comarca não seja sede de vara federal, como ocorre na hipótese dos autos.
III - O artigo 20 da Lei 10.259/01 é claro ao vedar, expressamente, a aplicação da Lei 10.259/01 ao juízo estadual. A referida Lei não delegou aos Juizados Especiais Estaduais competência para processar e julgar, nas comarcas que não disponham de Varas Federais, causas em que forem parte instituição de previdência social e segurado, e nem poderia fazê-lo, pois tal atribuição é de cunho constitucional.
IV - A vedação prevista no artigo 20 da Lei 10.259/01 somente poderá ser removida se for declarada a sua inconstitucionalidade, no foro e procedimento previstos no artigo 97 da Constituição Federal c/c os artigos 480 e seguintes do Código de Processo Civil. Nenhum Tribunal pode deixar de aplicar a lei, sem declarar-lhe a inconstitucionalidade.
V - A teor do artigo 8º da Lei 9.099/95 (aplicável aos Juizados Especiais Federais, por força do artigo 1º da Lei 10.259/01), as pessoas jurídicas de direito público não podem ser partes em ação processada perante nos Juizados Especiais Estaduais.
VI - Neste contexto, no caso vertente, como o domicílio do segurado não é sede de Vara Federal, o Juízo Estadual torna-se o competente para processar e julgar o feito, por força da chamada competência federal delegada, de acordo com a inteligência do multicitado artigo 109, § 3º da Constituição Federal, devendo o feito tramitar sob o rito ordinário.
VII - Conflito conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da 3ª Vara Cível de Teófilo Otoni - MG.
(CC 46.672/MG, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 14/02/2005, DJ 28/02/2005, p. 184) (grifo meu)
Esta também tem sido a cognição deste Tribunal, como pode ser visto nos seguintes julgados:
EMENTA: AGRAVO. PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA DELEGADA. RITO ESPECIAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. Não é possível a aplicação do rito estabelecido na Lei Nº 10.259/01 aos processos que tramitam na Justiça Estadual em razão da delegação de competência. Precedentes. (TRF4, AG 0000702-40.2013.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relator CELSO KIPPER, D.E. 26/03/2013)
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA DELEGADA. RITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA VEDAÇÃO PREVISTA NO ART. 20, PARTE FINAL, DA LEI Nº 10.259/2001. IMPOSSIBILIDADE. 1. Não é possível a aplicação do rito estabelecido na Lei 10.259/2001 (Juizados Especiais Federais) aos processos que tramitam na Justiça Estadual em razão da delegação de competência. 2. A Constituição Federal, no art. 109, § 3º, delegou a competência federal somente para a Justiça Estadual Comum, nas causas previdenciárias, e investiu os Tribunais Regionais Federais no controle decorrente da delegação, concedendo-lhes a competência para o julgamento dos respectivos recursos. 3. Assim, a adoção do rito dos Juizados Especiais Federais nas ações propostas perante o juiz de direito investido por delegação em competência federal criaria até mesmo um problema de impugnação recursal, uma vez que os procedimentos são distintos. 4. Hipótese em que, tratando-se de competência delegada, deve a ação ser processada e julgada no Juízo Estadual, sob o rito ordinário. (TRF4, AG 0009333-07.2012.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, D.E. 11/12/2012)
Dessa forma, uma vez fixado que nas ações previdenciárias julgadas na justiça estadual em face da competência federal delegada deve ser aplicado o rito ordinário próprio do juízo estadual, não há como aplicar analogicamente o rito especial dos JEFs em relação aos honorários advocatícios. Impõe-se, portanto, a necessidade de fixação dos honorários de sucumbência nas ações afetas à competência federal delegada.
Honorários - fixação
Sucumbente, o INSS deve arcar com a integralidade da obrigação pelo pagamento de honorários.
Fixo os honorários de sucumbência no percentual mínimo das faixas de incidência previstas no § 3º do art. 85, percentual a ser definido por ocasião da liquidação do julgado, nos termos do art. 85, § 4º, II, ambos do NCPC.
Inaplicável a majoração recursal prevista no §11º do art. 85 do CPC, pois tal acréscimo só é permitido sobre verba anteriormente fixada, consoante definiu o STJ (AgInt no AResp nº 829.107).
Termo final dos honorários de sucumbência
Considerando os termos da Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência", e da Súmula 111 do STJ (redação da revisão de 06/10/2014): "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença", os honorários no percentual fixado supra incidirão sobre as parcelas vencidas até a data da sentença.
CONCLUSÃO
Negado provimento à apelação do INSS. Dado provimento à apelação da parte autora para fixação de honorários advocatícios na forma da fundamentação.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e dar provimento à apelação da autora.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002496936v9 e do código CRC 799bfa7a.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 30/4/2021, às 16:44:6
Conferência de autenticidade emitida em 19/05/2021 04:01:24.
Apelação Cível Nº 5007145-14.2021.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ISABEL CEZIMBRA PORTO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE.
1. Devido o salário-maternidade quando comprovada a maternidade, a qualidade de segurada, e a carência de dez meses anterior ao parto.
2. Necessidade de fixação de honorários em processos oriundos de competência federal delegada. Precedentes deste Tribunal e do STJ.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e dar provimento à apelação da autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 11 de maio de 2021.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002496937v3 e do código CRC 7a8a1fe3.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 11/5/2021, às 17:43:16
Conferência de autenticidade emitida em 19/05/2021 04:01:24.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 04/05/2021 A 11/05/2021
Apelação Cível Nº 5007145-14.2021.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): CARLOS EDUARDO COPETTI LEITE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ISABEL CEZIMBRA PORTO
ADVOGADO: JOSIELE BASTOS OLIVEIRA PARKER (OAB RS064650)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 04/05/2021, às 00:00, a 11/05/2021, às 14:00, na sequência 514, disponibilizada no DE de 23/04/2021.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA AUTORA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 19/05/2021 04:01:24.