APELAÇÃO CÍVEL Nº 5033656-59.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
APELANTE | : | ANDREIA FERNANDES DA SILVA |
ADVOGADO | : | GISELE APARECIDA SPANCERSKI |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. PRESCRIÇÃO. TRABALHADORA RURAL BOIA-FRIA. AUSÊNCIA DE PROVA ORAL. PREJÚIZO À AMPLA DEFESA E AO CONTRADITÓRIO. SENTENÇA ANULADA.
1. O salário maternidade é prestação previdenciária que substitui a verba salarial, de natureza eminentemente alimentar, para que a segurada possa ter dedicação exclusiva ao absolutamente incapaz, não se afigurando razoável prejudicar a criança pela inércia de sua genitora em obter o benefício tempestivamente, mormente, quando a genitora era, ao tempo do parto, igualmente menor de idade. Precedentes.
2. A ausência de prova oral inviabiliza a consecução do direito da parte, violando, assim, os Princípios da Ampla Defesa e do Devido Processo Legal.
3. Sentença anulada, de ofício, para a produção de prova testemunhal no juízo de origem.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, anular, de ofício, a sentença e determinar o retorno dos autos à origem, prejudicado o apelo da autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 17 de abril de 2018.
Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9352355v8 e, se solicitado, do código CRC 1591FFB6. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5033656-59.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
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RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora, trabalhadora rural do tipo volante/boia-fria, postula a concessão de salário-maternidade em razão do nascimento de sua filha em 07/08/2009.
Sentenciado (sentença publicada em 24/07/2015) o juízo a quo julgou improcedente o pedido.
Irresignada, a autora interpôs apelação aduzindo que, ao tempo do nascimento, fato gerador do benefício, contava com apenas 15 anos de idade, de maneira que, contra ela não poderia haver a fluência do prazo prescricional. Entende que, ao contrário do que concluiu o juízo de primeiro grau, não há falar em prescrição no caso concreto. Requer, pois, seja julgado procedente o pedido com a devida concessão do salário-maternidade.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
DA PRESCRIÇÃO CONTRA INCAPAZES
Dos documentos colacionados a estes autos eletrônicos, extraio que a autora deu à luz a uma menina em 07/08/2009 (Ev. 1.2), sendo que, na data do parto, contava com apenas 15 anos de idade, já que nasceu em 08/09/1993 (Ev. 1.2, fl. 1).
A presente ação foi proposta em 17/12/2014 (Ev. 1) e o fato gerador do benefício (data do parto) em 04/08/2009. Não obstante, embora tenha transcorrido o lapso temporal de 5 (cinco) anos, forçoso reconhecer que a decisão preconizada viola o disposto no artigo 198, I, do Código Civil [Art. 198. Também não corre a prescrição: I - contra os incapazes de que trata o art. 3º;], pois não se pode olvidar que o salário maternidade não se destina exclusivamente à segurada, mas visa precipuamente à proteção suprema da infância justamente no período em que o ser humano recém-nascido se encontra mais fragilizado e necessitando de todo o amparo necessário à sobrevivência nos primeiros meses de vida. Nesse sentido, leciona Fabio Luiz dos Passos:
O salário maternidade é prestação previdenciária temporária prevista na Constituição Federal, destinada à proteção da segurada e do filho em razão da maternidade, em atenção ao primado constitucional de proteção à maternidade e à infância (CF/88, ART. 6º)
(Direito Previdenciário - Problemas e jurisprudência. Coordenação José Antonio Savaris. Curitiba: Alteridade Editora, 2015, p. 342, grifei)
Além da tutela constitucional conferida à infância pelo artigo 6º da Constituição da República [São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição] e pelo artigo 227 da Carta Magna [É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.], é forçoso reconhecer que a República Federativa do Brasil é signatária da Convenção sobre os Direitos da Criança, conforme Decreto nº 99.710, de 21 de novembro de 1990, a qual assegura inúmeros compromissos perante a comunidade internacional, dentre os quais se destacam os seguintes:
Artigo 3.1: Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança.
Artigo 18.2: A fim de garantir e promover os direitos enunciados na presente convenção, os Estados Partes prestarão assistência adequada aos pais e aos representantes legais para o desempenho de suas funções no que tange à educação da criança e assegurarão a criação de instituições, instalações e serviços para o cuidado das crianças.
Artigo 24: 1. Os Estados Partes reconhecem o direito da criança de gozar do melhor padrão possível de saúde e dos serviços destinados ao tratamento das doenças e à recuperação da saúde. Os Estados Partes envidarão esforços no sentido de assegurar que nenhuma criança se veja privada de seu direito de usufruir desses serviços sanitários.
2. Os Estados Partes garantirão a plena aplicação desse direito e, em especial, adotarão as medidas apropriadas com vistas a:
a) reduzir a mortalidade infantil;
b) assegurar a prestação de assistência médica e cuidados sanitários necessários a todas as crianças, dando ênfase aos cuidados básicos de saúde;
c) combater as doenças e a desnutrição dentro do contexto dos cuidados básicos de saúde mediante, inter alia, a aplicação de tecnologia disponível e o fornecimento de alimentos nutritivos e de água potável, tendo em vista os perigos e riscos da poluição ambiental;
d) assegurar às mães adequada assistência pré-natal e pós-natal;
e) assegurar que todos os setores da sociedade, e em especial os pais e as crianças, conheçam os princípios básicos de saúde e nutrição das crianças, as vantagens da amamentação, da higiene e do saneamento ambiental e das medidas de prevenção de acidentes, e tenham acesso à educação pertinente e recebam apoio para a aplicação desses conhecimentos;
Artigo 26: 1. Os Estados Partes reconhecerão a todas as crianças o direito de usufruir da previdência social, inclusive do seguro social, e adotarão as medidas necessárias para lograr a plena consecução desse direito, em conformidade com sua legislação nacional.
2. Os benefícios deverão ser concedidos, quando pertinentes, levando-se em consideração os recursos e a situação da criança e das pessoas responsáveis pelo seu sustento, bem como qualquer outra consideração cabível no caso de uma solicitação de benefícios feita pela criança ou em seu nome.
Como é cediço, a vedação da prescrição contra incapazes prevista no ordenamento jurídico pátrio demonstra a preocupação que o legislador teve em proteger os hipossuficientes descritos no artigo 3º, quais sejam, os menores de 16 anos, os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos, e os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade e não corre contra o absolutamente incapaz, independentemente de estar ou não representado, consoante lecionam Gustavo Tepedino, Heloisa Helena Barboza e Maria Celina Bodin de Morae (Código Civil interpretado conforme a Constituição da República. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 370).
Desse modo, considerando que o salário maternidade é prestação previdenciária que substitui a verba salarial, de natureza eminentemente alimentar, para que a segurada possa ter dedicação exclusiva ao absolutamente incapaz, não se afigura razoável prejudicar a criança pela inércia da sua genitora em obter o benefício tempestivamente. Note-se que este é raciocínio adotado pelos Tribunais em matéria de pensão por morte, haja vista que o direito ao pensionamento devido aos filhos menores de 16 anos de idade é assegurado a despeito da inércia de seus representantes:
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO E PAI. COMPROVAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO E DA UNIÃO ESTÁVEL. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. PRESCRIÇÃO. MENOR ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. NÃO INCIDÊNCIA. [...] 3. Não corre a prescrição contra os absolutamente incapazes, consoante as previsões legais insculpidas nos arts. 169, inciso I, e 5º, inciso I, ambos do Código Civil de 1916, e do art. 198, inciso I, do Código Civil c/c os arts. 79 e 103, parágrafo único, da Lei de Benefícios. Precedentes desta Corte. [...]5. No caso concreto, o requerimento administrativo ocorreu antes mesmo que as filhas do de cujus completassem 16 anos de idade, razão pela qual fazem jus às parcelas desde a data do óbito. (TRF4, APELREEX nº 0004813-09.2014.404.9999, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 18/11/2014).
Destarte, considerando que o filho da parte autora, beneficiário indireto do salário maternidade ora requestado por sua genitora, é menor de 16 anos, porquanto nascido em 07/08/2009 (Ev. 1.2), não há falar em transcurso do prazo prescricional, nos termos do artigo 198, I, do Código Civil.
Por tais razões, afasto a prescrição e passo a analisar o caso concreto.
DO SALÁRIO-MATERNIDADE - SEGURADA ESPECIAL
A respeito da concessão desse benefício à segurada especial, assim dispõem o art. 25, inciso III, da Lei nº 8.213/91, acrescentado pela Lei nº 9.876/99, e o art. 39, parágrafo único, da mesma Lei, na redação dada pela Lei nº 8.861/94:
Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral da Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
I- (...)
III- salário-maternidade para as seguradas de que tratam os incisos V e VII do art. 11 e o art. 13: dez contribuições mensais, respeitado o disposto no parágrafo único do art. 39 desta Lei.
Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do Art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício. (Parágrafo acrescentado pela Lei n.º 8.861, de 25.3.94).
No que tange ao início e à duração do benefício do salário-maternidade, assim dispõe o art. 71 da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 10.710/03, que vigorou a partir de 01/09/2003:
Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade. (Texto alterado pela Lei n.º 10.710, de 5.8.2003).
DO CASO CONCRETO - AUSÊNCIA DE PROVA ORAL. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DEVIDO PROCESSO LEGAL. SENTENÇA ANULADA.
No presente caso, observo que, apesar de ter sido requerida pela parte autora (Ev. 20.1), não foi produzida a necessária prova testemunhal com o objetivo de comprovar ou não a alegada qualidade de segurado especial da autora, afigurando-se afronta aos Princípios da Ampla Defesa e do Devido Processo Legal.
Assim, necessário a anulação da sentença e o retorno dos autos à origem para a complementação da instrução processual deficitária com a produção prova oral e posterior prolação de sentença de mérito.
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
CONCLUSÃO
De ofício, a sentença foi anulada para a produção de prova testemunhal no juízo de origem, prejudicado o apelo da autora.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por anular, de ofício, a sentença e determinar o retorno dos autos à origem, prejudicado o apelo da autora.
Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/04/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5033656-59.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00017777220148160110
RELATOR | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dra. Carmem Elisa Hessel |
APELANTE | : | ANDREIA FERNANDES DA SILVA |
ADVOGADO | : | GISELE APARECIDA SPANCERSKI |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/04/2018, na seqüência 207, disponibilizada no DE de 03/04/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU ANULAR, DE OFÍCIO, A SENTENÇA E DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM, PREJUDICADO O APELO DA AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
: | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT | |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Suzana Roessing, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9383108v1 e, se solicitado, do código CRC 3A369F20. | |
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