| D.E. Publicado em 20/03/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015637-90.2015.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ADENISIA ALCIDES NUNES |
ADVOGADO | : | Clauto João de Oliveira e outro |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. REMESSA OFICIAL. NÃO-SUJEIÇÃO. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO DA MATERNIDADE E DO LABOR RURAL. QUALIFICAÇÃO DE AGRICULTOR EM CERTIDÕES DA VIDA CIVIL. PENSÃO POR MORTE. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS.
1. A sentença que dá provimento ao pedido de concessão benefício de salário-maternidade (benefício previdenciário no valor de um salário mínimo, devido durante quatro meses), por prescindir de liquidação ou com condenação não excedente de sessenta salários-mínimos, não está sujeita à remessa oficial.
2. É devido o salário-maternidade às seguradas especiais que fizerem prova do nascimento dos filhos e do labor rural exercido no período de doze meses antecedentes ao início do benefício, ou nos dez meses precedentes ao parto (artigo 25, inciso III, c/c artigo 39, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91, e no artigo 93, § 2º, do Decreto n.º 3.048/99).
3. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal.
4. A certidão de nascimento do filho em que aparece a requerente como agricultora caracteriza o início de prova material exigido pela legislação previdenciária, até porque, segundo o entendimento do egrégio STJ, os dados constantes das certidões da vida civil são hábeis à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários. Precedentes da Terceira Seção.
5. A pensão por morte percebida pela autora não afasta, por si só, o direito à concessão do salário-maternidade, pois o valor do benefício excede o de valor mínimo da Previdência Social em quantia irrisória (R$ 5,67), restando evidente que o trabalho rural da demandante se faz necessário para o sustento da família.
6. Havendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, o INSS está isento do pagamento de custas, mas obrigado ao pagamento de eventuais despesas processuais, consoante o disposto no art. 11 da Lei Estadual n. 8.121/85, na redação dada pela Lei n. 13.471, de 23 de junho de 2010.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, conhecer em parte do apelo do INSS, para, no conhecido, negar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de março de 2017.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8784178v5 e, se solicitado, do código CRC C564785F. | |
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| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 14/03/2017 10:06 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015637-90.2015.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ADENISIA ALCIDES NUNES |
ADVOGADO | : | Clauto João de Oliveira e outro |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação contra sentença que julgou procedente o pedido de concessão de salário-maternidade formulado por ADENISIA ALCIDES NUNES em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, para condenar a autarquia a conceder à requerente o benefício pleiteado, pelo período de 120 dias, no montante de um salário-mínimo mensal, em razão do nascimento de seu filho Wuian Rodrigo Nunes de Almeida, ocorrido em 21/08/2013. Determinou o Juízo a quo que as parcelas em atraso sejam pagas acrescidas de correção monetária pela TR até o dia 25/03/2015 e, a partir de então, pelo INPCA-E, bem como de juros de mora de 0,5% ao mês, a contar da citação. Foi o requerido condenado, ainda, no pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, que foram fixados em R$ 900,00 (novecentos reais).
Em suas razões, requer a autarquia, de início, que seja a sentença submetida ao reexame necessário. No que diz respeito ao mérito, alega que não faz jus a requerente ao benefício postulado, pois estaria afastado o regime de economia familiar, uma vez que percebe ela pensão por morte de trabalhador urbano em valor superior ao salário-mínimo. Defende que, em havendo outra fonte de renda, a atividade rural desempenhada não seria indispensável para a subsistência familiar. Refere que a prova testemunhal produzida em Justificação Administrativa não se mostrou suficientemente idônea, pois as testemunhas ouvidas mostraram desconhecer fatos notórios da vida da postulante, revelados por ela mesma na entrevista rural, tais como o fato de ter residido na cidade de Ibiraiaras e de receber pensão por morte do esposo. No que tange à correção monetária, requer a incidência do art. 1º-F da Lei 9.494/97, tal como fixada pela Lei 11.960/09. Por fim, postula que seja reconhecida a isenção do pagamento das custas processuais, nos moldes do previsto no art. 11 da Lei 8.121/85, com a redação dada pela Lei 13.471/2010. Requer que seja provido o apelo e julgado improcedente o pedido formulado na inicial.
Transcorrido in albis o prazo para as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra nas hipóteses referidas, justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Da remessa oficial
Não se desconhece o entendimento do e. Superior Tribunal de Justiça no sentido de que as sentenças ilíquidas estão sujeitas ao reexame necessário. No entanto, tendo em vista que se trata de salário-maternidade - benefício previdenciário no valor de um salário mínimo, devido durante apenas 4 (quatro) meses -, a condenação jamais excederá sessenta salários mínimos.
Em sendo assim, a sentença prescinde de liquidação e não está sujeita ao reexame necessário, por força do disposto no § 2º do artigo 475 do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei n.º 10.352/01, diploma legal aplicável ao presente caso (sentença proferida anteriormente a 18/03/2016).
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. REEXAME NECESSÁRIO. INADMISSÍVEL. Tratando-se de salário-maternidade postulado por trabalhadora rural, cujo benefício, de acordo com a lei, corresponde ao valor de um salário mínimo e a apenas quatro prestações mensais, a condenação representa montante inferior a 60 (sessenta) salários mínimos. Assim, a sentença prescinde de liquidação e não deve ser submetida ao reexame necessário, nos termos do disposto no art. 475, § 2º, do Código de Processo Civil. (TRF4, REOAC 0006142-22.2015.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 15/07/2015)
Não merece, assim, acolhida o apelo do INSS no ponto.
Do salário-maternidade à segurada especial
A Constituição Federal, nos artigos 6º e 201, inciso II, assegura proteção "à maternidade, especialmente à gestante", mediante a inclusão do direito de "licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias" (inc. XVIII do art. 6º, CF).
Posteriormente, a Lei nº 8.213/91 dispôs sobre a matéria, na seção destinada aos benefícios, nos seguintes termos:
Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade. (Texto alterado pela Lei nº 10.710, de 5.8.2003).
A trabalhadora rural, apesar de havida como segurada especial da previdência social, consoante previsão do art. 11, inc. VII, da Lei nº 8.213/91, somente foi contemplada com o benefício em questão pela edição da Lei nº 8.861, de 23-03-1994, que acrescentou o § único ao art. 39, Lei nº 8.213/91, com a seguinte redação:
"Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício."
Com a edição da Lei nº 9.876, de 26-11-1999, regulamentada pelo Dec. nº 3.048, art. 93, § 2º, com a redação do Dec. 3.265, de 29-11-1999, foi acrescentado que a segurada especial deve comprovar o exercício de atividade rural nos últimos dez meses imediatamente anteriores ao requerimento do benefício, ainda que de forma descontínua.
Portanto, para fazer jus ao benefício, a segurada especial deve comprovar o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, pelo período de 12 meses anteriores ao início do benefício (carência exigida), ou nos dez meses precedentes ao parto, consoante interpretação mais benéfica do próprio INSS, com fundamento no artigo 25, inciso III, c/c artigo 39, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91, e no artigo 93, § 2º, do Decreto n.º 3.048/99.
De outra monta, a comprovação da atividade rural, no caso da segurada especial, pauta-se pelo disposto nos artigos 55, § 3º, e 106 da Lei nº 8.213/91, que dispõem:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o Art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no Art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.
Art. 106 - Para comprovação do exercício de atividade rural será obrigatória, a partir de 16 de abril de 1994, a apresentação da Carteira de Identificação e Contribuição - CIC referida no § 3º do art. 12 da Lei n.º 8.212, de 24 de julho de 1991.
Parágrafo único. A comprovação do exercício de atividade rural referente a período anterior a 16 de abril de 1994, observado o disposto no § 3º do art. 55 desta Lei, far-se-á alternativamente através de:
I - contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II - contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III - declaração do sindicato de trabalhadores rurais, desde que homologada pelo Ministério Público ou por outras autoridades constituídas definidas pelo CNPS;
IV - comprovante de cadastro do INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar;
V - bloco de notas do produtor rural.
(Redação dada pela Lei n.º 9.063/95)
Não se exige prova plena da atividade rural em relação a todo o período de carência, mas somente início de documentação, que, aliada à prova testemunhal, viabilize a formação de conjunto probatório suficiente ao convencimento do Julgador. O artigo 106 relaciona documentos hábeis a esta comprovação; porém tal rol não é exaustivo, mas exemplificativo.
Estampa a jurisprudência:
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO DA MATERNIDADE E DO LABOR RURAL. CERTIDÃO DE NASCIMENTO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL.
1. Nos termos dos arts. 71 e seguintes da Lei n. 8.213/91, é devido o salário-maternidade às seguradas especiais que fizerem prova do nascimento dos filhos e do labor rural no período de dez meses que antecede o início do benefício.
2. A certidão de nascimento do filho em virtude do qual se postula o salário-maternidade é documento apto à constituição de início de prova material, até porque, segundo o entendimento do egrégio STJ, os dados constantes das certidões da vida civil são hábeis à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários. Precedente desta Terceira Seção.
3. Preenchidos os requisitos legais, é de se conceder o benefício à autora.
(AC: 0004805-66.2013.404.9999/PR;Relator Des. Fed. Celso Kipper; 6ª T, D.E. 14/06/2013).
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PERÍODO DE CARÊNCIA. CONDIÇÃO DE SEGURADA ESPECIAL DEMONSTRADA.
1. A parte autora faz jus à concessão do salário-maternidade quando demonstradas a maternidade, a atividade rural e a qualidade de segurada especial durante o período de carência.
2. O exercício de atividades rurais, para fins previdenciários, pode ser demonstrado através de início razoável de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea.
3. Tratando-se de pedido de concessão de salário-maternidade à trabalhadora rural, deve ser mitigada a exigência de demonstração plena do exercício de atividades rurais sob pena de tornar impossível a concretização de um dos objetivos deste benefício, qual seja, a proteção à criança.
(AC: 0004209-82.2013.404.9999/ PR, Relator Des. Fed. Rogerio Favreto,5ª T. , D.E. 18/06/2013).
Observa-se, ainda, que as certidões da vida civil são eficazes a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
Da contemporaneidade da prova material
É importante frisar que a Lei de Benefícios não exige que o início de prova material seja contemporâneo à época dos fatos que se pretende comprovar, conforme se vê da transcrição do § 3º, do art. 55 da Lei 8.213, que segue:
A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.
Não há justificativa legal, portanto, para que se exija prova material contemporânea ao período a ser reconhecido, nos termos reiteradamente defendidos pela Autarquia Previdenciária; tal exigência administrativa implica a introdução indevida de requisito, impondo limites que não foram estabelecidos pelo legislador.
Consequentemente, em ações desta natureza devem ser consideradas as notórias e por vezes insuperáveis dificuldades probatórias do segurado especial, sendo dispensável a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por prova testemunhal, nada impedindo que sejam contemplados os documentos extemporâneos ou emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.
Da prova da atividade em regime de economia familiar
O §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII da Lei 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação "empregador II b" nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural. Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71.
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" para descaracterizar a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também que irrelevante a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
Do caso concreto
No caso em tela, a maternidade da autora restou comprovada a fls. 30, por meio da certidão de nascimento de WUIAN RODRIGO NUNES DE ALMEIDA, em 21/08/2013, filho também de Rodrigo Correa de Almeida.
O requerimento administrativo formulado em 04/09/2013 foi indeferido pela autarquia ao argumento de que não foi comprovado o exercício de atividade rural nos dez meses anteriores ao requerimento (fls. 66).
Para comprovar o exercício do labor campesino, a autora acostou aos autos:
- cópia da certidão de nascimento do filho em que aparecem tanto a requerente como o pai da criança qualificados como agricultores (fls. 30);
- Declaração de Nascido Vivo do filho em que está a demandante qualificada como agricultora (fls. 31);
- declaração do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Seberi (fls. 38/39);
- notas fiscais de produtor rural em nome dos pais da autora, datadas de 2012 e 2013 (fls. 42/45);
- Ficha de Cadastramento de Produtor Rural da Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul em que consta como produtor titular o pai da autora e, como produtores participantes, a mãe e a própria demandante (fls. 46/49);
- Comprovante de recolhimento da "Contribuição Sindical Agricultor Familiar" em nome da requerente, relativo ao exercício de 2013 (fls. 50).
Consta dos autos, ainda, cópia da entrevista rural (fls. 60/61), em que se verifica ter a requerente informado que se afastou da atividade rural por dois anos, em 2007, quando se casou (certidão de casamento de fls. 36), tendo residido na cidade de Ibiraiaras à época; que permaneceu na referida cidade por cerca de dois anos, tendo retornado para a casa dos pais, no interior, bem como para as lides rurais, logo após o falecimento do marido, ocorrido em 2010 (certidão de óbito de fls. 37); que mora e trabalha nas terras dos pais, na Linha Castanho, interior de Seberi, onde cultivam milho, soja e feijão, dentre outras miudezas, e criam alguns porcos, galinhas e vacas de leite; que, atualmente, tem outro companheiro, que também auxilia a demandante e seus pais na agricultura; que recebe pensão por morte do primeiro marido, em valor pouco superior ao salário mínimo. Em tal oportunidade, concluiu o servidor da autarquia que, embora se tratasse de trabalhadora rural, não faria jus a demandante ao benefício postulado pois descaracterizada a condição de segurada especial, uma vez que a requerente recebe pensão por morte em valor superior ao salário-mínimo.
Assiste razão ao Juízo a quo ao referir que a prova documental produzida, corroborada que foi pela testemunhal produzida em Justificação Administrativa, é suficiente para comprovar que a autora exerceu atividade rural em regime de economia familiar, na companhia de seus pais, no período correspondente à carência do benefício.
Ocorre que a certidão de nascimento do filho em que aparece a própria demandante qualificada como agricultora é documento apto à constituição de início de prova material do labor rural, até porque, segundo o entendimento do egrégio STJ, os dados constantes das certidões da vida civil são hábeis à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários (STJ, 3ª Seção, REsp 1.321.493-PR, procedimento dos recurso repetitivos, j.10/10/2012). No referido julgado, concluiu-se imprescindível a prova material para fins previdenciários, ainda que o labor tenha sido exercido à margem da formalidade, cabendo às instâncias ordinárias a verificação da condição de trabalhador, nos seguintes termos:
"E, nesse aspecto, por mais que o trabalho seja informal, é assente na jurisprudência desta Corte que há incontáveis possibilidades probatórias de natureza material. Por exemplo, ainda que o trabalho tenha sido informal, constatando-se que o segurado tem filhos ou é casado, devem ser juntadas certidões de casamento e de nascimento, o que deve ser averiguado pelas instâncias ordinárias."
No mesmo sentido, a jurisprudência desta Casa Julgadora abaixo exemplificada:
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO DA MATERNIDADE E DO LABOR RURAL. CERTIDÃO DE NASCIMENTO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. 1. Nos termos dos arts. 71 e seguintes da Lei n. 8.213/91, é devido o salário-maternidade às seguradas especiais que fizerem prova do nascimento dos filhos e do labor rural no período de dez meses que antecede o início do benefício. 2. A certidão de nascimento do filho em virtude do qual se postula o salário-maternidade é documento apto à constituição de início de prova material, até porque, segundo o entendimento do egrégio STJ, os dados constantes das certidões da vida civil são hábeis à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários. Precedente desta Terceira Seção. 3. Preenchidos os requisitos legais, é de se conceder o benefício à autora. (TRF4, AC 0015570-04.2010.404.9999, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 16/06/2015)
A autora, quando ouvida na Justificação Administrativa, afirmou que exerce a atividade rural nas terras de seus pais, com extensão de 1,5 hectares, desde o falecimento de seu marido, onde cultivam milho, soja e feijão, dentre outros produtos que destinam ao consumo da família, comercializando apenas o excedente. As testemunhas ouvidas na esfera administrativa em tal oportunidade também foram uníssonas ao confirmar o desempenho da atividade rural pela autora, na companhia de seus pais, durante o período de carência. Saliente-se, por importante, que o fato de não terem as testemunhas informado o período em que a demandante esteve afastada das lides rurais, tampouco referido que percebia ela pensão por morte, como mencionado pelo INSS, não prejudica os depoimentos produzidos, uníssonos que foram no sentido de que a autora residia com os pais durante a gestação e com eles labutava na roça (fls. 99/101).
Tampouco merece acolhida a alegação do INSS no sentido de que, percebendo a autora pensão por morte, em valor superior ao salário mínimo, restaria descaracterizado o regime de economia familiar.
Ocorre que, como bem ressaltou a Juíza Monocrática, muito embora a demandante efetivamente percebesse, por ocasião do requerimento administrativo de salário-maternidade, em 04/09/2013, o montante de R$ 683,67, quando o salário mínimo era de R$ 678,00, a diferença a maior no valor de R$ 5,67 é ínfima e não se presta para afastar a condição de segurada especial da autora. Além disso, logo depois, isto é, em 30/04/2014, o valor da pensão por morte percebido pela requerente passou a ser de valor mínimo - R$ 724,00 à época (fls. 88), patamar este que permanece até os dias atuais (CNIS ora juntado aos autos) .
Ainda que assim não fosse, e sem desconhecer o teor do disposto no art. 11, § 9º, inc. I, da Lei 8213/91, que refere não ser considerado segurado especial o membro de grupo familiar que possuir outra fonte de renda, exceto, "pensão por morte cujo valor não supere o de menor benefício de prestação continuada da Previdência Social," tenho eu que o limite fixado não pode ser absoluto. Ocorre que, na hipótese dos autos, como já referido, a pensão por morte percebida pela demandante à época do requerimento administrativo excedia o benefício de valor mínimo da Previdência Social em valor irrisório, isto é, em apenas R$ 5,67 (cinco reais e sessenta e sete centavos), quantia esta insuficiente para afastar a condição de segurada especial da requerente. Além disso, o citado benefício, considerando que a autora tem duas filhas, por certo, não era o suficiente para dispensar os ganhos provenientes da atividade rural por ela desempenhada com vistas ao sustento do grupo familiar, como bem demonstrado pela prova documental em nome próprio juntada aos autos e testemunhal produzida na esfera administrativa.
Diante do exposto, conclui-se que deve ser mantida, no mérito, a sentença que reconheceu o direito da autora ao salário-maternidade pleiteado.
Da Correção Monetária
No que diz respeito à correção monetária, no entanto, merece parcial acolhida a insurgência do INSS.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101, 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, dá-se parcial provimento ao apelo do INSS no ponto, apenas para diferir para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009.
Das custas e despesas processuais
Havendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, o INSS está isento do pagamento de custas, mas obrigado ao pagamento de eventuais despesas processuais, consoante o disposto no art. 11 da Lei Estadual n. 8.121/85, na redação dada pela Lei n. 13.471, de 23 de junho de 2010.
Considerando que a sentença condenou o INSS a arcar apenas com as despesas processuais (fls. 110), não há falar em interesse recursal por parte do INSS, não se conhecendo do apelo no ponto.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por conhecer, em parte do apelo do INSS, para, no conhecido, negar-lhe provimento, nos termos da fundamentação.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 07/03/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015637-90.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00006456720148210133
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Juarez Mercante |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ADENISIA ALCIDES NUNES |
ADVOGADO | : | Clauto João de Oliveira e outro |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 07/03/2017, na seqüência 206, disponibilizada no DE de 14/02/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU CONHECER, EM PARTE DO APELO DO INSS, PARA, NO CONHECIDO, NEGAR-LHE PROVIMENTO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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