APELAÇÃO CÍVEL Nº 5035630-97.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | SIMONE FABIANA DOS SANTOS SILVA |
ADVOGADO | : | LIANA REGINA BERTA |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. BOIA-FRIA. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO DA MATERNIDADE E DO LABOR RURAL. QUALIFICAÇÃO DE LAVRADOR EM CERTIDÕES DA VIDA CIVIL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. DIFERIMENTO.
1. É devido o salário-maternidade às seguradas especiais que fizerem prova do nascimento dos filhos e do labor rural exercido no período de doze meses antecedentes ao início do benefício, ou nos dez meses precedentes ao parto (artigo 25, inciso III, c/c artigo 39, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91, e no artigo 93, § 2º, do Decreto n.º 3.048/99).
2. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal.
3. As certidões de casamento e de nascimento do filho em que aparecem a requerente e o marido como lavradores são documentos aptos à constituição de início de prova material, até porque, segundo o entendimento do egrégio STJ, os dados constantes das certidões da vida civil são hábeis à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários. Precedentes da Terceira seção.
4. Nos termos da jurisprudência do STJ, são aceitos, como início de prova material, os documentos em nome de terceiros, membros da unidade familiar, desde que aliados à robusta prova testemunhal.
5. A definição dos índices de correção monetária e juros de mora deve ser diferida para a fase de cumprimento do julgado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da autarquia, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de novembro de 2016.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8664707v7 e, se solicitado, do código CRC C40589F4. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5035630-97.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | SIMONE FABIANA DOS SANTOS SILVA |
ADVOGADO | : | LIANA REGINA BERTA |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação contra sentença que julgou procedente o pedido de concessão de salário-maternidade formulado por SIMONE FABIANA DOS SANTOS em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e condenou o requerido a pagar à autora o salário maternidade de que trata o art. 39, parágrafo único, da Lei 8.212/91, em relação ao nascimento do filho Emmanuel Santos Silva, durante 120 dias, com início no período entre 28 dias antes do parto e a data de ocorrência deste e efeitos financeiros a partir da DER (06/08/2014), acrescido do abono anual. Foi a autarquia condenada a pagar as parcelas vencidas acrescidas de correção monetária a contar do vencimento de cada prestação e de juros a contar da citação, observado o índice oficial aplicada às cadernetas de poupança, devendo ser a correção monetária calculada com base no INPC e, a partir de 25/03/2015, pelo IPCA-E. Por sucumbente, foi o INSS condenado, ainda, no pagamento das custas e despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios que foram fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas, na forma da Súmula 111 do STJ.
O INSS apelou, alegando que a prova material apresentada não pode ser aproveitada pela demandante: a documentação em nome do marido, porque a ela não aproveita e, a certidão de nascimento do filho em que aparece a demandante qualificada com lavradora, porque extemporânea ao período de carência. Menciona, ainda, que a prova oral colhida em audiência é extremamente vaga e imprecisa, não fornecendo qualquer detalhe acerca da atividade rural desempenhada pela demandante. Na eventualidade de ser mantida a sentença de procedência, requer seja observada, para fins de correção monetária, a TR, a partir de 07/2009, com ao advento da Lei 11.960/09, que alterou o art. 1º-F da Lei 9.494/97.
Após as contrarrazões, vieram os autos conclusos.
É o relatório.
VOTO
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra nas hipóteses referidas, justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Do salário-maternidade à segurada especial
A Constituição Federal, nos artigos 6º e 201, inciso II, assegura proteção "à maternidade, especialmente à gestante", mediante a inclusão do direito de "licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias" (inc. XVIII do art. 6º, CF).
Posteriormente, a Lei nº 8.213/91 dispôs sobre a matéria, na seção destinada aos benefícios, nos seguintes termos:
Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade. (Texto alterado pela Lei nº 10.710, de 5.8.2003).
A trabalhadora rural, apesar de havida como segurada especial da previdência social, consoante previsão do art. 11, inc. VII, da Lei nº 8.213/91, somente foi contemplada com o benefício em questão pela edição da Lei nº 8.861, de 23-03-1994, que acrescentou o § único ao art. 39, Lei nº 8.213/91, com a seguinte redação:
"Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício."
Com a edição da Lei nº 9.876, de 26-11-1999, regulamentada pelo Dec. nº 3.048, art. 93, § 2º, com a redação do Dec. 3.265, de 29-11-1999, foi acrescentado que a segurada especial deve comprovar o exercício de atividade rural nos últimos dez meses imediatamente anteriores ao requerimento do benefício, ainda que de forma descontínua.
Portanto, para fazer jus ao benefício, a segurada especial deve comprovar o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, pelo período de 12 meses anteriores ao início do benefício (carência exigida), ou nos dez meses precedentes ao parto, consoante interpretação mais benéfica do próprio INSS, com fundamento no artigo 25, inciso III, c/c artigo 39, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91, e no artigo 93, § 2º, do Decreto n.º 3.048/99.
De outra monta, a comprovação da atividade rural, no caso da segurada especial, pauta-se pelo disposto nos artigos 55, § 3º, e 106 da Lei nº 8.213/91, que dispõem:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o Art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no Art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.
Art. 106 - Para comprovação do exercício de atividade rural será obrigatória, a partir de 16 de abril de 1994, a apresentação da Carteira de Identificação e Contribuição - CIC referida no § 3º do art. 12 da Lei n.º 8.212, de 24 de julho de 1991.
Parágrafo único. A comprovação do exercício de atividade rural referente a período anterior a 16 de abril de 1994, observado o disposto no § 3º do art. 55 desta Lei, far-se-á alternativamente através de:
I - contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II - contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III - declaração do sindicato de trabalhadores rurais, desde que homologada pelo Ministério Público ou por outras autoridades constituídas definidas pelo CNPS;
IV - comprovante de cadastro do INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar;
V - bloco de notas do produtor rural.
(Redação dada pela Lei n.º 9.063/95)
Não se exige prova plena da atividade rural em relação a todo o período de carência, mas somente início de documentação, que, aliada à prova testemunhal, viabilize a formação de conjunto probatório suficiente ao convencimento do Julgador. O artigo 106 relaciona documentos hábeis a esta comprovação; porém tal rol não é exaustivo, mas exemplificativo.
Estampa a jurisprudência:
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO DA MATERNIDADE E DO LABOR RURAL. CERTIDÃO DE NASCIMENTO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL.
1. Nos termos dos arts. 71 e seguintes da Lei n. 8.213/91, é devido o salário-maternidade às seguradas especiais que fizerem prova do nascimento dos filhos e do labor rural no período de dez meses que antecede o início do benefício.
2. A certidão de nascimento do filho em virtude do qual se postula o salário-maternidade é documento apto à constituição de início de prova material, até porque, segundo o entendimento do egrégio STJ, os dados constantes das certidões da vida civil são hábeis à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários. Precedente desta Terceira Seção.
3. Preenchidos os requisitos legais, é de se conceder o benefício à autora.
(AC: 0004805-66.2013.404.9999/PR;Relator Des. Fed. Celso Kipper; 6ª T, D.E. 14/06/2013).
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PERÍODO DE CARÊNCIA. CONDIÇÃO DE SEGURADA ESPECIAL DEMONSTRADA.
1. A parte autora faz jus à concessão do salário-maternidade quando demonstradas a maternidade, a atividade rural e a qualidade de segurada especial durante o período de carência.
2. O exercício de atividades rurais, para fins previdenciários, pode ser demonstrado através de início razoável de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea.
3. Tratando-se de pedido de concessão de salário-maternidade à trabalhadora rural, deve ser mitigada a exigência de demonstração plena do exercício de atividades rurais sob pena de tornar impossível a concretização de um dos objetivos deste benefício, qual seja, a proteção à criança.
(AC: 0004209-82.2013.404.9999/ PR, Relator Des. Fed. Rogerio Favreto,5ª T. , D.E. 18/06/2013).
Observa-se, ainda, que as certidões da vida civil são eficazes a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
Da contemporaneidade da prova material
É importante frisar que a Lei de Benefícios não exige que o início de prova material seja contemporâneo à época dos fatos que se pretende comprovar, conforme se vê da transcrição do § 3º, do art. 55 da Lei 8.213, que segue:
A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.
Não há justificativa legal, portanto, para que se exija prova material contemporânea ao período a ser reconhecido, nos termos reiteradamente defendidos pela Autarquia Previdenciária; tal exigência administrativa implica a introdução indevida de requisito, impondo limites que não foram estabelecidos pelo legislador.
Consequentemente, em ações desta natureza devem ser consideradas as notórias e por vezes insuperáveis dificuldades probatórias do segurado especial, sendo dispensável a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por prova testemunhal, nada impedindo que sejam contemplados os documentos extemporâneos ou emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.
Da prova da atividade rural prestada como boia-fria
No caso de exercício de trabalho rural caracterizado por sua notória informalidade, comprometendo a prova da atividade e, por conseguinte, a obtenção do benefício previdenciário, a jurisprudência pacificada por esta Corte era no sentido de abrandar a exigência relativa ao início de prova material, admitindo, até mesmo, em situações extremas, a comprovação da atividade exclusivamente por meio de prova testemunhal.
Todavia, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento, em 10-10-2012, do Resp nº 1.321.493/PR, representativo de controvérsia, firmou o entendimento de que se aplica também aos trabalhadores boias-frias a Súmula 149 daquela Corte. Sobressai do julgado que o rigor na análise do início de prova material para a comprovação do labor rural do boia-fria, diarista ou volante, deve ser mitigado, de sorte que o fato de a reduzida prova documental não abranger todo o período postulado não significa que a prova seja exclusivamente testemunhal quanto aos períodos faltantes. Assim, devem ser consideradas as dificuldades probatórias do segurado especial, sendo prescindível a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por robusta prova testemunhal.
Do caso concreto
No caso em tela, a maternidade da autora restou comprovada pela certidão de nascimento de EMMANUEL SANTOS SILVA, em 17/02/2014 (evento 1 - OUT8 - p. 3), filho também de Claudio Aparecido da Silva.
O requerimento administrativo do benefício, formulado em 06/08/2014 (evento 1 - OUT9), foi indeferido pela autarquia sob a alegação de falta de período de carência.
Para comprovar o exercício da atividade rural, a demandante acostou aos autos a seguinte documentação:
- certidão de casamento da autora, em que o cônjuge e pai da criança aparece qualificado como lavrador e, ela, como "do lar" (evento 1 - OUT 5);
- certidão de nascimento do filho Emmanuel, ocorrido em 17/02/2014, em que aparece o pai da criança qualificado como campeiro e, a autora, como lavradora (evento 1 - OUT8);
- cópia da CTPS do marido da autora, com anotações de vínculos trabalhistas de natureza rural nos anos de 1990, 1991, 1993, 1994 e 2008 (evento 1 - OUT 6).
Muito embora não seja robusta a documentação apresentada, tenho que suficiente para caracterizar o início de prova material exigido pela legislação previdenciária. Ocorre que, consideradas as notórias e por vezes insuperáveis dificuldades probatórias do trabalhador rural, especialmente em se tratando de boia-fria, é dispensável a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por prova testemunhal, nada impedindo que sejam contemplados os documentos extemporâneos ou emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural. Não se pode exigir que os documentos sejam apenas por si mesmos conclusivos ou suficientes para a formação de juízo de convicção. É aceitável que a prova contenha ao menos uma indicação segura de que o fato alegado efetivamente ocorreu, vindo daí a necessidade de sua complementação pela prova oral produzida em audiência, realizada em 05/045/2016, que, contrariamente ao alegado pela autarquia, confirmou de modo coerente o trabalho rural da parte autora, na condição de boia-fria, durante o período que antecedeu o nascimento do filho da autora, fornecendo detalhes e corroborando as pretensões expostas e os fatos alegados na inicial. Vejamos.
Em seu depoimento pessoal, informou a autora que tem dois filhos: Emmanuel, o mais novo e, Beatriz, a mais velha; que quando engravidou de seu segundo filho morava na Fazenda Zizinha, conhecida como Ferris, na região de Santa Cruz; que residia lá porque o marido trabalhava na citada fazenda como campeiro; que na Fazenda Zizinha tem produção de milho, mandioca e cana, além de criação de gado; que a citada Fazenda tem quase 400 alqueires; que, quando grávida de Emmanuel, trabalhava também na lavoura, pois eles contratam diaristas para carpir cana, plantar, etc. que trabalhava sempre que tinha serviço, normalmente cinco dias por semana; que trabalhou até o oitavo mês de gestação, sendo que, no final, fazia os serviços mais leves; que faz um ano que deixou de residir na citada Fazenda e passou a morar na Fazenda Santa Helena, onde o marido trabalha como retireiro; que a filha mais velha ficava com a avó, para a depoente pudesse trabalhar; que a diária, atualmente, é de aproximadamente R$ 50,00 (cinquenta reais).
A testemunha JOELMA MARIA SANTIAGO DA SILVA declarou que conhece a autora há bastante tempo, cerca de 20/25 anos; que a autora tem dois filhos; que recorda da autora grávida do filho Emmanuel; que, à época, a autora morava na Fazenda Zizinha, onde até hoje vive a depoente; que a autora morou na Fazenda Zizinha praticamente por toda a vida; que o marido da demandante é campeiro; que moram cinco famílias na citada Fazenda; que, normalmente, os maridos são registrados e, as mulheres, trabalham por dia na Fazenda; que a depoente trabalhou junto com a autora quando ela esteve grávida de seu filho; que cultivam mandioca, milho e cana, para confinamento de gado; que durante a gravidez, a autora fazia serviços mais leves, mas não deixava de ser contratada; que, na época da gravidez da autora, a diária era de aproximadamente R$ 30,00; que hoje está em R$ 50,00 a diária; que a autora trabalhou até o oitavo mês da gestação.
DAMIANA DANTAS DOS SANTOS, por fim, aduziu que já trabalhou com a autora na roça; que a conhece há cerca de dez anos; que trabalharam juntas na Fazenda Zizinha; que a depoente mora em uma Fazenda vizinha da Fazenda Zizinha, onde a autora residia e trabalhava; que a autora trabalhava também em outras fazendas da região de Santa Cruz como diarista, como a Santa Ângela e Três Marias; que se lembra da época em que a autora estava grávida de Emmanuel; que trabalhou mais de uma vez com a autora em tal época; que a autora plantava cana e carpia, mesmo grávida; que o marido da demandante "mexe com gado"; que em 2013 a diária era de quarenta a cinquenta reais; que a autora deixava a filha mais velha com a mãe para poder trabalhar; que os pagamentos são feitos pelos administradores das fazendas;
É de ressaltar-se, ainda, que, conforme entendimento já sedimentado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e ratificado pela recente decisão da sua Primeira Seção, no julgamento do REsp n.º 1.321.493-PR, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, embora não se possa eximir o boia-fria da apresentação de um início de prova material, tal exigência deve ser interpretada com temperamento, considerando-se suficiente documento que indique a condição de rurícola, mitigando-se a aplicação do disposto na Súmula n.º 149/STJ, sem, contudo, violá-la, desde que este início de prova seja complementado por idônea e robusta prova testemunhal.
Início de prova material não há que ser prova cabal; trata-se de algum registro por escrito que possa estabelecer liame entre o universo fático e aquilo que expresso pela testemunhal; o que, in casu, irrecusavelmente se verifica, pois as certidões de casamento e de nascimento do filho em que aparecem a autora e o marido qualificados como lavradores são documentos aptos à constituição de início de prova material, até porque, segundo o entendimento do egrégio STJ, os dados constantes das certidões da vida civil são hábeis à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários.
No mesmo sentido, já se posicionou a Terceira Seção desta Casa Julgadora, por ocasião do julgamento dos EIAC N. 0004819-21.2011.404.9999, de relatoria do Des. Federal Celso Kipper, publicado no D.E. de 15-06-2012, assim ementado:
EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADOR RURAL BOIA-FRIA.
(...).
2. A certidão de nascimento do filho em virtude do qual se postula o salário-maternidade é documento apto à constituição de início de prova material, até porque, segundo o entendimento do egrégio STJ, os dados constantes das certidões da vida civil são hábeis à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários. Precedente desta Terceira seção.
3. Caso em que a prova testemunhal foi uníssona e consistente ao corroborar o início de prova material apresentado, confirmando o labor rural da autora, na condição de boia-fria, inclusive durante a gestação, com indicação dos proprietários das terras nas quais trabalhou e dos intermediários que a transportavam ao serviço.
Importante referir, por fim, que os documentos apresentados em nome do marido podem ser aproveitados pela requerente pois, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
Nesse sentido, a jurisprudência do STJ abaixo exemplificada:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. SALÁRIO MATERNIDADE. DEMONSTRAÇÃO DO TRABALHO NO CAMPO. DOCUMENTOS EM NOME PAIS DA AUTORA. VÍNCULO URBANO DE UM DOS MEMBROS DA UNIDADE FAMILIAR QUE NÃO DESCARACTERIZA A CONDIÇÃO DE RURÍCOLA DOS DEMAIS. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE.1. A concessão de salário-maternidade rural, benefício previdenciário previsto no art. 71 da Lei 8213/91, exige que a trabalhadora demonstre o exercício de atividade laboral no campo, por início de prova material, desde que ampliado por prova testemunhal, nos dez meses imediatamente anteriores ao do início do benefício, mesmo que de forma descontínua. 2. Para esse fim, são aceitos, como início de prova material, os documentos em nome dos pais da autora que os qualificam como lavradores, aliados à robusta prova testemunhal. De outro lado, o posterior exercício de atividade urbana por um dos membros da família, por si só, não descaracteriza a autora como segurada especial, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar (REsp 1.304.479/SP, Rel.Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19/12/2012, recurso submetido ao rito do art. 543-C do CPC) .3. No caso dos autos, o juízo de origem, ao examinar o contexto fático-probatório dos autos, concluiu que ficou amplamente demonstrado o labor rural da segurada. Assim, a averiguação de que não existe regime de economia familiar em virtude de vínculo urbano mantido por um dos membros da unidade familiar, esbarra no óbice da Súmula 7/STJ ("A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial").4. Agravo regimental a que se nega provimento.(AgRg no AREsp 363.462/RS, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/12/2013, DJe 04/02/2014, grifado)
Destarte, considerando que foram preenchidos os requisitos legais, pois verificado, in casu, o início razoável de prova material do exercício da atividade rural pela demandante nos períodos legalmente exigidos, complementado pela prova testemunhal colhida em audiência, não merece reforma a sentença que reconheceu o direito da demandante ao salário-maternidade atinente ao nascimento de seu filho.
Da Correção Monetária e Juros de mora
Segundo o art. 491 do NCPC, "na ação relativa à obrigação de pagar quantia, ainda que formulado pedido genérico, a decisão definirá desde logo a extensão da obrigação, o índice de correção monetária, a taxa de juros, o termo inicial de ambos e a periodicidade da capitalização dos juros, se for o caso". Todavia, as recentes controvérsias acerca dos índices de correção monetária e juros de mora devidos pela Fazenda Pública, atualmente previstos na Lei n.º 11.960/2009, originadas após o julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 (inconstitucionalidade da TR como índice de correção monetária dos precatórios) pelo Supremo Tribunal Federal têm inviabilizado a aplicação do dispositivo. Isso porque ainda pende de julgamento o Recurso Extraordinário n.º 870.947 (tema 810), no qual a Suprema Corte irá decidir sobre a constitucionalidade dos índices também em relação aos momentos anteriores à expedição dos precatórios.
Nesse contexto, a controvérsia jurisprudencial a respeito do tema, de natureza acessória, tem impedido o trânsito em julgado das ações previdenciárias, considerando os recursos interpostos pelas partes aos Tribunais Superiores, fadados ao sobrestamento até que haja solução definitiva. Diante disso, as Turmas integrantes das 2ª e 3ª Seções desta Corte passaram a diferir para a fase de cumprimento do julgado a definição dos índices aplicáveis, os quais devem seguir a legislação vigente ao tempo de cada período em que ocorreu a mora da Fazenda Pública. Tal sistemática já foi adotada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do MS n.º 14.741/DF, relator Min. Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 15/10/2014. Assim, a conclusão da fase de conhecimento do litígio não deve ser obstada por discussão que envolve tema acessório, de aplicação pertinente justamente à execução do julgado, mormente quando existente significativa controvérsia judicial sobre a questão, pendente de solução pela Suprema Corte.
Sendo assim, merece parcial acolhida o apelo do INSS, para que seja diferida para a fase de cumprimento do julgado a estipulação dos índices de juros e correção monetária legalmente estabelecidos para cada período.
Dos Honorários
Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% sobre as parcelas vencidas, considerando as variáveis dos incisos I a IV do §2º do artigo 85 do NCPC.
Conclusão
Apelo do INSS provido em parte, para que a definição dos índices de correção monetária e juros de mora seja diferida para a fase de cumprimento do julgado.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo da autarquia.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/11/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5035630-97.2016.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00035628420148160105
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | SIMONE FABIANA DOS SANTOS SILVA |
ADVOGADO | : | LIANA REGINA BERTA |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/11/2016, na seqüência 1674, disponibilizada no DE de 16/11/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA AUTARQUIA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8741341v1 e, se solicitado, do código CRC 10657421. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 30/11/2016 17:00 |
