Apelação Cível Nº 5023910-94.2020.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: THAYANY COELHO GROTTO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, postulando a concessão do benefício de salário-maternidade, cuja sentença, publicada em 09.09.2020, tem o seguinte dispositivo (ev. 52, SENT1):
Ex Positis, resolvendo o litígio com resolução de mérito, na forma do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo improcedente o pedido inicial.
Pela sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios os quais arbitro, conforme o art. 85, CPC, em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, contudo, com a sua exigibilidade suspensa ante a concessão da assistência judiciária gratuita.
A autora apela requerendo a reforma da sentença e a concessão do benefício pretendido. Alega que o recebimento de uma indenização trabalhista por justa causa não interfere nesta presente demanda de benefício previdenciário (ev. 58, PET1).
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Salário-maternidade
O salário-maternidade, benefício previdenciário que visa substituir a remuneração da segurada ou do segurado da Previdência Social em virtude de nascimento de filho ou de adoção ou guarda judicial de criança, está previsto nos artigos 71 e 71-A, da Lei de Benefícios da Previdência Social (Lei nº 8.213/91), nos termos seguintes:
Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.
Art. 71-A. Ao segurado ou segurada da Previdência Social que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança é devido salário-maternidade pelo período de 120 (cento e vinte) dias. (Redação dada pela Lei nº 12.873, de 2013).
Para as seguradas empregada, trabalhadora avulsa e empregada doméstica, a concessão do benefício independe de carência:
Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
(...)
VI – salário-maternidade para as seguradas empregada, trabalhadora avulsa e empregada doméstica.
O salário-maternidade foi estendido à categoria das seguradas especiais em virtude da alteração do artigo 39 da Lei de Benefícios, promovida pela Lei 8.861/94, que acrescentou o parágrafo único ao dispositivo citado, in verbis:
Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
(...)
Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício.
Posteriormente, a Lei 9.876/99 acrescentou o inciso III e o parágrafo único ao artigo 25 da Lei 8.213/91, com a seguinte redação:
Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
(...)
III - salário-maternidade para as seguradas de que tratam os incisos V e VII do art. 11 e o art. 13: dez contribuições mensais, respeitado o disposto no parágrafo único do art. 39 desta Lei.
Parágrafo único. Em caso de parto antecipado, o período de carência a que se refere o inciso III será reduzido em número de contribuições equivalente ao número de meses em que o parto foi antecipado.
Assim, dois são os requisitos para a concessão do salário-maternidade à segurada especial:
a) o nascimento do filho ou a adoção de criança, em regra;
b) a comprovação do exercício de atividade rural da mãe, na forma descrita no artigo 11, inciso VII, da Lei 8.213/91, ainda que descontínuo, nos dez meses imediatamente anteriores ao início do benefício, salvo em caso de parto antecipado, em que aplicável a redução proporcional acima exposta.
No que tange à qualidade de segurado especial, prevê o artigo 11, inciso VII, da Lei 8.213/91:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
VII - como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 (quatorze) anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo.
Na hipótese de trabalhador rural boia-fria, importante frisar que este Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) já pacificou o entendimento de que o trabalhador rural boia-fria deve ser equiparado ao segurado especial, de que trata o artigo 11, VII, da Lei 8.213/91, sendo dispensado o recolhimento das contribuições para fins de obtenção do benefício. Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. SEGURADA ESPECIAL. TRABALHADORA RURAL BOIA-FRIA. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. CUMPRIMENTO DO PERÍODO DE CARÊNCIA. (...) 1. Esta Corte já pacificou o entendimento de que o trabalhador rural boia-fria deve ser equiparado ao segurado especial de que trata o art. 11, VII, da Lei de Benefícios, sendo-lhe dispensado, portanto, o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário. 2. O salário maternidade é devido à trabalhadora que comprove o exercício da atividade rural pelo período de 10 meses anteriores ao início do benefício, este considerado do requerimento administrativo (quando ocorrido antes do parto, até o limite de 28 dias), ou desde o dia do parto (quando o requerimento for posterior). 3. Cumprido o período de carência no exercício da atividade rural, faz jus a parte autora ao salário-maternidade na qualidade de segurada especial. (...) (TRF4, AC 5008229-26.2016.4.04.9999, 5ª T., Rel. Juiz Federal Altair Antonio Gregório, 15.09.2017)
Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, como forma a inviabilizar a pretensão, mas apenas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Além disso, a certidão de nascimento do(a) filho(a), na qual o pai e/ou a mãe estão qualificados como "lavrador(es)" ou "agricultor(es)", constitui início de prova material, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL.VALORAÇÃO. I - A certidão de nascimento, onde o cônjuge da autora é qualificado como lavrador, constitui início de prova material apta à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários. II - Procedeu-se à valoração, e não ao reexame, da documentação constante dos autos. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 951.518/SP, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., DJe 29.09.2008)
No mesmo sentido, os seguintes precedentes deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. SEGURADO ESPECIAL. RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO. DESNECESSIDADE. (...) 2. A certidão de nascimento do filho em virtude do qual se postula o salário-maternidade é documento apto à constituição de início de prova material. (...) (TRF4, AC 5040285-78.2017.4.04.9999, 5ª T., Rel. Des. Federal Osni Cardoso Filho, 12.09.2018)
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO ORDINÁRIA. SALÁRIO-MATERNIDADE. CONCESSÃO. SEGURADA ESPECIAL. TRABALHADORA RURAL. PROVA DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL. (...). 1. Para a concessão do benefício de salário-maternidade de segurada especial é imprescindível a prova do exercício de atividades rurais nos dez meses anteriores ao nascimento do filho. 2. A própria certidão de nascimento do filho em virtude do qual se postula o salário-maternidade constitui início de prova material, pois o egrégio STJ pacificou entendimento no sentido de reconhecer como início probatório as certidões da vida civil. (...) (TRF4, AC 5035375-08.2017.4.04.9999, TRS/PR, Rel. Des. Federal Fernando Quadros da Silva, 03.05.2018)
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Caso concreto
O benefício foi indeferido administrativamente ao fundamento de que a responsabilidade pelo pagamento do benefício era da empresa, "considerando a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante" (ev. 1, OUT6).
A maternidade restou comprovada pela autora por meio da juntada da certidão do nascimento, ocorrido em 15.02.2016 (ev. 39, OUT8, p. 15).
Quanto ao mérito da demanda, entendo correta a análise feita na sentença conforme fundamentos abaixo transcritos, os quais adoto como razões de decidir, in verbis (ev. 52, SENT1):
Salienta-se que não obstante a requerente tenha obtido decisão favorável em reclamação trabalhista de nº 0010011-87.2015.5.09.0325 ajuizada perante a 2ª Vara do Trabalho de Umuarama/PR contra a empresa OPP INDUSTRIA TEXTIL LTDA, a condenação sofrida pela empresa compreende as indenizações correspondentes ao período em que a autora teria direito em razão da estabilidade gestacional, restando expressamente consignado na sentença proferida por aquele Juízo que “ considerando o rompimento do contrato de trabalho, por iniciativa da reclamada, sem justa causa, ocorreu em 03/08/2015, com aviso prévio indenizado de 33 dias, a reclamante faz jus aos salários e demais direitos referentes ao restante da estabilidade provisória, na forma do inciso II, da Súmula 244 do TST, correspondente ao período de 06/09/2015, primeiro dia seguinte ao término do período do aviso prévio, que foi indenizado, até 15/07/2016” (cf. sentença de mov. 39.9, fls. 219).
Ainda, conforme se denota da parte dispositiva da sentença proferida por aquele Juízo Trabalhista, a empresa OPP INDUSTRIA TEXTIL LTDA restou condenada ao pagamento de “[...] a) indenização do período de estabilidade, de 06/09/2015 até 15/0/2016, equivalente ao salário base percebido ao tempo da dispensa (R$ 1.177,20), férias acrescidas de 1/3, 13º salário e FGTS; [...]” (seq. 39.10). A esse respeito já se posicionou o E. Tribunal Regional da 4ª Região:
SALÁRIO-MATERNIDADE. REQUISITOS LEGAIS. RECEBIMENTO MEDIANTE ACORDO TRABALHISTA REALIZADO COM O EMPREGADOR. 1. "O pagamento de indenização trabalhista à empregada demitida sem justa causa, correspondente ao período em que a gestante gozaria de estabilidade, exclui o fundamento racional do pagamento do benefício de salário-maternidade, caso reste demonstrado que a quantia paga pelo ex-empregador abrange os salários que deveriam ser recebidos pela segurada no período da estabilidade" (TNU, INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO JEF's Nº 5010236-43.2016.4.04.7201, D.E. 14/09/2017). 2. Uma vez que já recebida a verba indenizatória trabalhista correspondente ao período em que a gestante gozaria de estabilidade, não há embasamento jurídico para a concessão do benefício de salário-maternidade frente ao INSS, pois implicaria em pagamento em duplicidade. (TRF-4 - APL: 50409040820174049999 5040904-08.2017.4.04.9999, Relator: MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Data de Julgamento: 18/06/2019, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR) (g.n)
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. SEGURADA EMPREGADA URBANA. estabilidade da trabalhadora urbana gestante. salário maternidade. pagamento em acordo trabalhista. 1. Demonstrada a maternidade e a manutenção da qualidade de segurada, nos termos do art. 15 da LBPS, é devido à autora o salário-maternidade, ainda que cessado o vínculo empregatício na data do nascimento. 2. Tendo em vista acordo celebrado em reclamatória trabalhista, em que foi conferido o pagamento de indenização equivalente aos direitos do período da estabilidade da trabalhadora gestante e outros direitos, é indevido o pagamento de salário-maternidade pelo INSS. (TRF-4 - AC: 50255523920194049999 5025552-39.2019.4.04.9999, Relator: JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Data de Julgamento: 19/06/2020, SEXTA TURMA) (g.n)
Desta forma, a autora NÃO assiste direito ao recebimento do benefício de salário-maternidade referente a verba atrasada correspondente ao período de 120 (cento e vinte) dias, nos termos do art. 71, da Lei de Benefícios, mormente pelo fato de que já recebeu indenização trabalhista equivalente aos direitos do período de estabilidade devido à trabalhadora gestante, reconhecido judicialmente em Reclamatória Trabalhista de nº 0010011-87.2015.5.09.0325 (seq. 39.8/39.10), o que configuraria pagamento em duplicidade, motivo pelo qual o pedido há de ser julgado improcedente.
Portanto, conclui-se que não restou caracterizada a possibilidade de concessão do benefício pretendido. A autora não faz jus, portanto, ao salário-maternidade.
Desta forma, deve ser mantida a sentença.
Honorários advocatícios
Os honorários de sucumbência são fixados no valor de R$ 572,40 (15% o valor da causa), considerando-se a majoração em grau recursal (CPC, art. 85, § 11), ficando sua exigibilidade suspensa nos termos do art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil, em razão do benefício da assistência judiciária gratuita deferido à parte autora.
Custas processuais
Inexigibilidade temporária das custas, em razão da assistência judiciária gratuita deferida à autora.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- apelação improvida;
- honorários advocatícios majorados na instância recursal.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora.
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Apelação Cível Nº 5023910-94.2020.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: THAYANY COELHO GROTTO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. salário-maternidade. REQUISITOS LEGAIS. RECEBIMENTO MEDIANTE ACORDO TRABALHISTA REALIZADO COM O EMPREGADOR.
1. Recebida a verba indenizatória trabalhista correspondente ao período em que a gestante gozaria de estabilidade, não há embasamento jurídico para a concessão do benefício de salário-maternidade frente ao INSS, pois implicaria em pagamento em duplicidade. Precedentes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 25 de maio de 2021.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 18/05/2021 A 25/05/2021
Apelação Cível Nº 5023910-94.2020.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
APELANTE: THAYANY COELHO GROTTO
ADVOGADO: JOÃO LUIZ SPANCERSKI (OAB PR033257)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído no 2º Aditamento da Sessão Virtual, realizada no período de 18/05/2021, às 00:00, a 25/05/2021, às 16:00, na sequência 1946, disponibilizada no DE de 07/05/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
SUZANA ROESSING
Secretária
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