APELAÇÃO CÍVEL Nº 5048423-68.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
APELANTE | : | FERNANDA DE JESUS SOUZA |
ADVOGADO | : | CLAUDIO MARCIO DE ARAUJO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE . SEGURADA ESPECIAL. BOIA-FRIA. PROVA MATERIAL. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. NECESSIDADE. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. NOVA INSTRUÇÃO.
1. Para a concessão do benefício de salário-maternidade de segurada especial é imprescindível a prova do exercício de atividades rurais nos dez meses anteriores ao nascimento do filho.
2. A prova testemunhal é essencial à comprovação da atividade rural, pois se presta a corroborar os inícios de prova material apresentados. É prova que, segundo o entendimento desta Corte, é necessária e indispensável à adequada solução do processo.
3. O rigor na análise do início de prova material para a comprovação do labor rural do boia-fria deve ser mitigado, de sorte que o fato de a reduzida prova documental não abranger todo o período postulado não significa que a prova seja exclusivamente testemunhal quanto aos períodos faltantes.
4. Levando-se em consideração a necessidade da produção de prova testemunhal para a comprovação da atividade campesina, e a ausência de prejuízo na oitiva, ainda que não tenha havido o comparecimento na audiência anteriormente designada, se faz obrigatória a redesignação de nova audiência de instrução e julgamento.
5. Hipótese em que se acolhe o recurso da parte autora, para determinar a anulação da sentença, a fim de que seja reaberta a instrução e oportunizada a produção de prova testemunhal, para comprovação da condição de segurada especial da autora.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional Suplementar/PR do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso de apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 28 de agosto de 2017.
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9076386v7 e, se solicitado, do código CRC 97AF7658. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5048423-68.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
APELANTE | : | FERNANDA DE JESUS SOUZA |
ADVOGADO | : | CLAUDIO MARCIO DE ARAUJO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por Fernanda de Jesus Souza, objetivando a concessão do benefício de salário-maternidade, em razão do nascimento de seu filho, ocorrido em 24/06/2013.
Instruído o feito, sobreveio sentença julgando improcedente o pedido, com base no art. 487, I, do CPC, condenando a autora ao pagamento das custas e despesas processuais e de honorários advocatícios ao patrono do réu, fixados em R$ 800,00 (oitocentos reais), suspensa a exigibilidade por estar ao abrigo da AJG.
Irresignada, a parte autora apela, sustentando, inicialmente que a impugnação das testemunhas causou-lhe prejuízo, pois lhe foi negada a possibilidade de provar que laborou no meio rurícula como diarista bóia-fria. Refere que requereu nova audiência, mas não logrou êxito. Entende que, como as ações de natureza previdenciária têm nítido caráter social, em face da notória hipossuficiência daqueles que as exercitam, deve ser relativizado o rigorismo processual no que concerne à produção da prova necessária à demonstração do direito alegado. Alega que juntou cópia de certidão de nascimento da criança, ficha perinatal, ou seja, trabalhadora rural/boia-fria, condição que a beneficia como início de prova material. Afirma que nasceu em época que os pais eram eminentemente rurais e que para sobrevivência era necessário o exercício de atividade rural, ou seja, sempre trabalhou como trabalhadora rural. Pugna pelo provimento da apelação, a fim de que seja determinada a abertura da instrução processual, possibilitando-lhe a produção de prova testemunhal para demonstrar a sua condição de segurada especial.
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Da produção de prova testemunhal
Tratando-se de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de boia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
A respeito do "boia-fria", a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Resp nº 1.321.493/PR em 10/10/2012, recebido pela Corte como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
Como visto, o julgamento representativo de controvérsia firmou o entendimento de que a Súmula 149 daquela Corte se aplica também aos trabalhadores boias-frias. Sobressai do julgado que o rigor na análise do início de prova material para a comprovação do labor rural do boia-fria deve ser mitigado, de sorte que o fato de a reduzida prova documental não abranger todo o período postulado não significa que a prova seja exclusivamente testemunhal quanto aos períodos faltantes. Assim, é prescindível a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por robusta prova testemunhal, devendo ser consideradas as dificuldades probatórias do segurado especial.
Da mesmo forma posicionou-se a Terceira Seção deste Tribunal, por ocasião do julgamento dos EIAC nº 0004819-21.2011.404.9999, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. de 15-06-2012, cuja ementa apresenta o seguinte teor:
EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADOR RURAL BOIA-FRIA.
1. Nos casos dos trabalhadores rurais conhecidos como boias-frias, diaristas ou volantes, considerando a informalidade com que é exercida a profissão no meio rural, que dificulta a comprovação documental da atividade, o entendimento pacífico desta Corte, seguindo orientação adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, é no sentido de que a exigência de início de prova material deve ser abrandada, permitindo-se até mesmo a prova exclusivamente testemunhal.
2. A certidão de nascimento do filho em virtude do qual se postula o salário-maternidade é documento apto à constituição de início de prova material, até porque, segundo o entendimento do egrégio STJ, os dados constantes das certidões da vida civil são hábeis à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários. Precedente desta Terceira seção.
3. Caso em que a prova testemunhal foi uníssona e consistente ao corroborar o início de prova material apresentado, confirmando o labor rural da autora, na condição de boia-fria, inclusive durante a gestação, com indicação dos proprietários das terras nas quais trabalhou e dos intermediários que a transportavam ao serviço.
Com efeito, a prova testemunhal é essencial à comprovação da atividade rural, pois se presta a corroborar os inícios de prova material apresentados. É prova que, segundo o entendimento desta Corte, é necessária e indispensável à adequada solução do processo.
No caso concreto, o Juízo monocrático julgou improcedente a demanda por entender não haver prova material da atividade da autora no período equivalente ao da carência. No decorrer da instrução processual, a autora postulou pela produção de prova testemunhal e foi designada audiência para tanto. Todavia, não compareceu e nem apresentou justificativa. As testemunhas também não compareceram. Diante desta situação, foi determinada sua intimação para manifestar-se sobre o ocorrido e oportunizado que justificasse o motivo da ausência. A parte autora limitou-se a pugnar pela realização de nova audiência para oitiva das testemunhas, sem justificar a ausência na primeira audiência. Foi aberto prazo para memoriais escritos e em seguida proferida sentença de improcedência.
Ora, o entendimento pátrio desta Corte, como já referido, é no sentido de que, para o trabalhador rural boia-fria, é possível o reconhecimento da atividade rural apenas com base em prova testemunhal. Contudo, não é possível desde logo o julgamento pela Turma em razão de não ter sido produzida a prova testemunhal necessária para o deslinde da controvérsia. Assim, levando em consideração a necessidade da produção de prova testemunhal para a comprovação da atividade campesina e a ausência de prejuízo na oitiva, ainda que não tenha havido o comparecimento na audiência anteriormente designada, se faz obrigatória a redesignação de nova audiência de instrução e julgamento.
Outrossim, considerando a norma insculpida no artigo 370 do Código de Processo Civil, compete ao Juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo. Assim, resta claro que houve cerceamento de defesa, visto o sentenciamento da lide sem a devida instrução e produção das provas requeridas pela autora e indispensáveis para o julgamento da demanda.
Portanto, acolho o recurso da parte autora, para determinar a anulação da sentença, a fim de que seja reaberta a instrução e oportunizada a produção de prova testemunhal, para comprovação da condição de segurada da autora.
Ante o exposto, voto no sentido de dar provimento à apelação.
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 28/08/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5048423-68.2016.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00003297320158160128
RELATOR | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. Sérgio Cruz Arenhart |
APELANTE | : | FERNANDA DE JESUS SOUZA |
ADVOGADO | : | CLAUDIO MARCIO DE ARAUJO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 28/08/2017, na seqüência 299, disponibilizada no DE de 15/08/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO | |
: | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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