APELAÇÃO CÍVEL Nº 5037376-63.2017.4.04.9999/RS
|
RELATOR |
: |
JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ivo dos santos rocha |
ADVOGADO | : | ORÉLIO BRAZ BECKER DA SILVA |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. ATIVIDADE URBANA. CTPS. PROVA PLENA. CONTAGEM RECÍPROCA DO TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. OPÇÃO PELA RMI MAIS VANTAJOSA. TUTELA ESPECÍFICA.
1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários, a partir dos 12 anos, pode ser demonstrado através de início de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea. 2. O reconhecimento de tempo de serviço prestado na área rural até 31-10-1991, para efeito de concessão de benefício no Regime Geral da Previdência Social, não está condicionado ao recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes, exceto para efeito de carência. 3. Comprovado o tempo de serviço urbano, por meio de prova material idônea, devem os períodos urbanos ser averbados previdenciariamente. 4. O registro constante na CTPS goza da presunção de veracidade juris tantum, devendo a prova em contrário ser inequívoca, constituindo, desse modo, prova plena do serviço prestado nos períodos ali anotados. 5. Comprovado o tempo de serviço urbano como servidor público estatutário, por meio de prova material idônea, deve o período correspondente ser averbado para fins previdenciários, uma vez que a lei prevê a compensação financeira entre os diferentes sistemas de previdência social. 6. Se o segurado implementar os requisitos para a obtenção de aposentadoria pelas regras anteriores à Emenda Constitucional n.º 20/98, pelas Regras de Transição e/ou pelas Regras Permanentes, poderá inativar-se pela opção que lhe for mais vantajosa. 7. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso do INSS e à remessa necessária e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 11 de dezembro de 2017.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9253685v4 e, se solicitado, do código CRC E6940A36. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 15/12/2017 16:09 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5037376-63.2017.4.04.9999/RS
|
RELATOR |
: |
JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ivo dos santos rocha |
ADVOGADO | : | ORÉLIO BRAZ BECKER DA SILVA |
RELATÓRIO
Cuida-se de remessa necessária e de apelação interposta da sentença que julgou procedente o pedido de concessão do benefício de Aposentadoria por Tempo de Contribuição mediante o reconhecimento do período rural de 01/08/1965 a 03/04/1974, alegadamente trabalhado em regime de economia familiar pela parte autora, bem como mediante o reconhecimento dos períodos urbanos de 01/05/1974 a 31/03/1977, 01/04/1978 a 22/09/1978 (laborados na Prefeitura Municipal de Torres/RS) e 02/01/2012 a 27/06/2013 (laborado na empresa Quatro Lagos Urbanizadora Ltda.), condenando o INSS, ainda, ao pagamento das despesas judiciais, de metade das custas processuais e dos honorários advocatícios, esses fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a publicação da sentença.
Em suas razões, o INSS requer a reforma do julgado. Inicialmente informa que o autor, que foi servidor público do Estado do Rio Grande do Sul desde 1978, obteve a concessão do benefício de aposentadoria no RPPS desse Estado em 2005, sendo tal benefício cassado em 2012, em decorrência de processo administrativo disciplinar. Com a revogação de sua aposentadoria no RPPS, a parte autora requereu, em 27/06/2013, a inativação junto ao RGPS, que foi indeferida na via administrativa.
Alega a autarquia que o autor carece de interesse de agir em relação ao pedido de reconhecimento do período rural de 01/01967 a 28/02/1973 e dos períodos laborados na Prefeitura Municipal de Torres/RS, de 01/05/1974 a 31/03/1977 e 01/04/1978 a 22/09/1978, uma vez que tais intervalos já foram computados pelo Estado do Rio Grande do Sul no ato de concessão da aposentadoria posteriormente revogada, e integraram os períodos declarados na Certidão de Tempo de Serviço cujo aproveitamento no RGPS ora é requerido.
Também requer a anulação da sentença, por não ter enfrentado questão prejudicial ao mérito, qual seja, o fato de o ato de cassação da aposentadoria concedida no Regime Próprio - em cujo período básico de contribuição foram computados os intervalos em que se baseia o presente pedido de concessão de benefício - ainda estar sub judice na ação de n° 001/1.13.0146896-8, ajuizada na Primeira Vara da Fazenda Pública da Comarca de Porto Alegre/RS. Alega que, ainda que verificado que a parte autora implementa, mediante contagem recíproca, tempo suficiente à concessão do benefício requerido, não lhe poderá ser deferido o pedido, uma vez que tal possibilidade de realização da contagem recíproca está a depender da manutenção, ou não, do ato administrativo de cassação do benefício concedido com base nesses períodos. Feitas essas considerações, afirma que o pedido ora formulado é juridicamente impossível.
Na sequência, afirma que apenas remanesce o interesse processual do segurado na presente demanda quanto aos períodos rurais de 01/08/1965 a 31/07/1967 e 01/03/1973 a 30/04/1974, e quanto ao período urbano de 02/01/2012 a 27/06/2013.
Em relação aos períodos de alegado labor rural, afirma que, no primeiro intervalo, é impossível a averbação uma vez que o eventual labor foi prestado antes de o segurado completar 14 anos de idade. Quanto ao segundo intervalo, afirma que o autor declarou na entrevista rural que, na altura, já havia migrado para a cidade, abandonando as lides rurícolas.
Já em relação ao lapso urbano de 02/01/2012 a 27/06/2013, laborado na empresa Quatro Lagos Urbanizadora Ltda., alega se tratar de vínculo fraudulento, uma vez que o autor já prestava serviços como advogado a essa empresa sem vinculação empregatícia no período anterior. Afirma que a contratação do segurado deu-se extemporaneamente, mediante GFIP substituta. Refere que se evidencia o ardil contra a Previdência Social pelo fato de o vínculo contestado possuir a exata duração do interregno faltante para o implemento do tempo necessário à concessão do benefício (equivocadamente calculado na ocasião, uma vez que fora computado como tempo de contribuição, por constar na CTC, o período de 2005 a 2012, em que o segurado esteve aposentado). Assim, requer o afastamento desse intervalo como período de contribuição ou então a realização de oitiva de testemunhas para fins de comprovação da veracidade ou não vínculo, diligência requerida pelo INSS e não deferida pelo Juízo a quo.
Pela eventualidade, prequestiona a matéria alegada para fins recursais e pugna pela aplicação da Lei 11.960/2009 no tocante aos consectários legais. Ainda pela eventualidade, requer o reconhecimento da isenção do pagamento das custas processuais, prevista para as pessoas jurídicas de direito público na Lei Estadual n° 14.634/2014, que instituiu a Taxa Única de Serviços Judiciais do Estado do Rio Grande do Sul e revogou o antigo Regimento de Custas (Lei Estadual nº 8.121/85).
Regularmente processados, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Da remessa necessária
Não se desconhece o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a sentença ilíquida está sujeita a reexame necessário (Súmula 490: "A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas").
Contudo, também não é razoável ignorar que, em matéria previdenciária, o art. 29, § 2.º, da Lei n.º 8.213/91 dispõe que o valor do salário de benefício mínimo não será inferior ao de um salário mínimo, nem superior ao limite máximo do salário de contribuição na data de início do benefício, e que a Portaria Interministerial n.º 01, de 08/01/2016, dos Ministérios da Previdência Social e da Fazenda, estabelece que, a partir de 01/01/2016, o valor máximo do teto dos salários de benefício pagos pelo INSS é de R$ 5.189,82 (cinco mil cento e oitenta reais e oitenta e dois centavos), sendo forçoso reconhecer que, mesmo na hipótese em que a RMI dos benefícios deferidos à parte autora seja fixada no teto máximo, e as parcelas em atraso pagas, como regra, nos últimos 5 anos (art. 103, parágrafo único, da lei n.º 8.213/91), o valor da condenação, ainda que acrescida de correção monetária e juros de mora, dificilmente excederá à quantia de 1.000 (mil) salários mínimos, montante exigível para a admissibilidade do reexame necessário. Nesta hipótese, diante de dúvida razoável, recomendável o encaminhamento às divisões de Contadoria, sem que com isso se inviabilize o funcionamento dessas divisões.
Considerando tal critério, é possível concluir com segurança que, embora não conste das sentenças em matéria previdenciária o cálculo do quantum debeatur, este não atingirá, na quase totalidade dos processos, o patamar estabelecido de mil salários mínimos (art. 496, § 3º, I, do NCPC).
Por isso, é possível defender que as sentenças previdenciárias, nas quais há condenação em pecúnia, data de início do benefício (DER) ou da revisão, não podem ser propriamente consideradas ilíquidas, pois contém ou referem todos os elementos necessários para se apurar, mediante cálculo aritmético de baixa complexidade (com instrumentos de cálculo informatizados disponíveis gratuitamente nos sítios da Justiça Federal desta Quarta Região, na rede de computadores internet - https://www2.jfrs.jus.br/menu-dos-programas-para-calculos-judiciais/), o valor final da condenação, consideradas as parcelas até a data da sentença.
Dessa forma, como nas sentenças condenatórias previdenciárias vêm delimitado o termo inicial do pagamento (DER do benefício ou da revisão) e o número de meses devidos até a data da sentença, considerada a prescrição quinquenal, ou mesmo aqueles casos em que não se verificar sua incidência, mas for possível apurar o número de meses devidos, e mediante um simples cálculo aritmético for possível aferir o quantum debeatur, não se justifica a não adoção de uma a visão mais alinhada ao espírito inspirador do instituto e do prestígio à eficiência da Administração da Justiça, no sentido de que, em matéria previdenciária, sempre se está diante de sentença com todos os parâmetros de liquidez. Portanto, não seria dispensável a ela o mesmo tratamento dado às sentenças ilíquidas.
Vale mencionar que essa compreensão não é novidade nas Turmas Previdenciárias deste Tribunal, já que se tem entendido que não há reexame necessário nos casos de salário-maternidade postulado por trabalhadora rural, ainda que não se tenha fixado a quantia devida na sentença:
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. REEXAME NECESSÁRIO. INADMISSÍVEL. Tratando-se de salário-maternidade postulado por trabalhadora rural, cujo benefício, de acordo com a lei, corresponde ao valor de um salário mínimo e a apenas quatro prestações mensais, a condenação representa montante inferior a 60 (sessenta) salários mínimos. Logo, a sentença prescinde de liquidação e não deve ser submetida ao reexame necessário, nos termos do disposto no art. 475, §2°, do Código de Processo Civil. (TRF4 5015381-62.2015.404.9999, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 11/06/2015).
PREVIDENCIÁRIO, SALÁRIO-MATERNIDADE. REMESSA OFICIAL. NÃO CONHECIDA. E entendimento do Superior Tribunal de Justiça que a sentença ilíquida está sujeita a reexame necessário. Entretanto, casos de concessão de salário-maternidade, o beneficio, de acordo com a lei, tem o valor de um salário mínimo, pago mensalmente, por 120 dias, sendo devidas apenas quatro prestações. Assim, tenho por inadmissível o reexame necessário. (TRF4, REOAC 0018819-89.2012.404.9999, Quinta Turma, Relatora Vivian Jose te Pantaleão Caminha, D.E. 12/03/2013).
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. REEXAME NECESSÁRIO. INADMISSÍVEL. Dispensado o reexame necessário, em conformidade com o art. 475, §2°, do Código de Processo Civil, uma vez que o salário-maternidade representa montante inferior a 60 (sessenta) salários mínimos. (TRF4, REOAC 0015551-27.2012.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 06/12/2012).
A conclusão não infirma, igualmente, aquilo que foi decidido no REsp 1.101.727/PR, rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Corte Especial, julgado em 04/11/2009, e que, posteriormente, culminou com o advento da Súmula 490 (DJ-e, 01/08/2012):
RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO. SENTENÇA ILÍQUIDA. CABIMENTO.
E obrigatório o reexame da sentença ilíquida proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público (Código de Processo Civil, artigo 475, parágrafo 2o).
Recurso especial provido. Acórdão sujeito ao procedimento do artigo 543-C do Código de Processo Civil.
Naquela ocasião, a discussão central travada pelo Superior Tribunal de Justiça dizia respeito à possibilidade, ou não, de utilização do valor da causa como parâmetro para a dispensa da remessa necessária, caso a sentença fosse ilíquida, prevalecendo a inviabilidade deste parâmetro, dado que nem sempre aquele valor corresponderia ao efetivo montante da condenação.
Há que se fazer, portanto, a devida distinção entre os casos em que é válido utilizar-se o valor da causa e as sentenças condenatórias de cunho previdenciário, como parâmetro indicativo da existência ou não de remessa. Não há que se confundir o estabelecimento de um valor aproximado, como o versado na inicial, com a constatação objetiva de que, mesmo sem procedimento liquidatório propriamente dito, há certeza de que a condenação não atingirá o mínimo necessário para que haja remessa necessária.
De fato, parece-me contraproducente abarrotar as Divisões de Contadoria com pedidos de elaboração de cálculo. Note-se que seria necessário solicitar ao próprio INSS os dados necessários e aguardar o retorno via petição para elaborar as contas, como única forma de agilizar os trabalhos, visto que hoje a Contadoria, muitas vezes, faz as pesquisas nos sistemas disponíveis, sem se valer das informações diretas da autarquia para, justamente, não lhe impor mais um ônus.
Essa me parece, portanto, a solução mais adequada e consentânea com o anseio de proteção do interesse público de que se reveste o próprio instituto que, diante do Novo Código de Processo Civil, passa a mirar as causas de maior expressão econômica, afastadas, daí, em geral, as de natureza previdenciária.
Registre-se ainda que, para tal efeito, impõe-se aferir o montante da condenação na data em que proferida a sentença. Valores sujeitos a vencimento futuro não podem ser considerados, pois não é possível estimar por quanto tempo o benefício será mantido. Não se confundem valor da condenação e valor da causa. Se é a sentença que está ou não sujeita a reexame, é no momento de sua prolação que o valor da condenação, para tal finalidade, deve ser estimado.
Com efeito, deixo de conhecer da remessa necessária.
Da questão controversa
A questão controversa nos presentes autos cinge-se à possibilidade de reconhecimento do desempenho de atividade rural pela parte autora no período de 01/08/1965 a 03/04/1974, à possibilidade de reconhecimento do desempenho de atividade urbana nos períodos de 01/05/1974 a 31/03/1977, 01/04/1978 a 22/09/1978 e 02/01/2012 a 27/06/2013, à possibilidade de cômputo, mediante contagem recíproca, do período de contribuição que a parte autora possui averbado junto ao Regime Próprio de Previdência Social dos servidores do Estado do Rio Grande do Sul, que ensejou a concessão de aposentadoria nesse regime, posteriormente cancelada em processo administrativo.
Da possibilidade jurídica do pedido
Alega o INSS a impossibilidade jurídica do pedido formulado pela parte autora, de aproveitamento, mediante contagem recíproca, do período em que foi servidor público do estado do Rio Grande do Sul, vinculado a Regime Próprio de Previdência, uma vez que tais intervalos já foram aproveitados para fins de concessão de benefício de aposentadoria naquele regime, a qual, embora tenha sido cassada pela Administração Pública, ainda pode ser restabelecida em virtude da pendência de julgamento de ação judicial em que se discute a validade desse ato de cancelamento.
Tenho que não assiste razão ao recorrente. Com efeito, a partir da cassação do benefício outrora concedido ao segurado, seus efeitos jurídicos, dentre os quais o aproveitamento dos períodos que basearam aquela concessão, deixam de existir. Assim, verifico que a situação atual da parte autora é de não aposentado, sendo que os intervalos ora sub judice não se encontram atualmente aproveitados por qualquer benefício.
Ademais, verifico que a ação de anulação do processo administrativo de cassação de aposentadoria que a parte autora move contra o Estado do Rio Grande do Sul, autuada sob o n° 001/1.l3.0146896-8, foi julgada improcedente na Primeira Vara da Fazenda Pública do Foro Central da Comarca de Porto Alegre/RS, tendo sido tal decisão confirmada em segunda instância (nº Themis 70071656839), estando pendente apenas de julgamento dos recursos extraordinário e especial interpostos, de modo que, é seguro dizer, não haverá mais análise do substrato probatório produzido no feito.
Assim, admito a possibilidade de cômputo no RGPS, mediante contagem recíproca (aproveitamento de tempo laborado em um regime de previdência para obtenção de benefício em regime diverso) do período exercido pela parte autora como servidor público do Estado do Rio Grande do Sul. Entretanto, apenas deverá ser aproveitado o intervalo de 22/09/1978 a 01/11/2005, no qual o segurado esteve na ativa. Afasto a possibilidade de cômputo do período de 02/11/2005 a 11/04/2012, no qual o autor esteve em gozo de aposentadoria concedida no RPPS do Estado do Rio Grande do Sul, posteriormente cancelada.
Por fim, impõe-se salientar que, caso mantida a sentença concessória do benefício, se faz necessária a observância das disposições contidas no art. 96, III, da Lei nº 8.213/91.
Da comprovação do tempo de atividade rural
Tratando-se de rurícola, cumpre ao julgador valorar os fatos e circunstâncias evidenciados com ênfase no artigo 5.º da Lei de introdução às normas do direito brasileiro - LIDB, e levar em conta a realidade social em que inserido o trabalhador rural, na qual predomina a informalidade na demonstração dos fatos. Vale lembrar que não se mostra razoável exigir que os documentos carreados ao processo sigam sempre a forma prescrita em lei, por isso devem ser considerados válidos quando de outra forma atingir a finalidade precípua de comprovar o exercício da atividade rural, consoante disposto no art. 244 do CPC.
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida, exclusivamente, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, a teor do art. 55, § 3.º, da Lei n.º 8.213/1991, Súmula n.º 149 do STJ e REsp n.º 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1.ª Seção, julgado em 10-10-2012, DJe 19-12-2012 (recurso representativo da controvérsia). Cabe salientar que embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo. Outrossim, não há impedimento a que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que indiquem a continuidade da atividade rural.
Não se exige, por outro lado, prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período requerido, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural, de acordo com a Súmula n.° 73 desta Corte, haja vista que o trabalho com base em uma única unidade produtiva tem como regra a documentação emitida em nome de uma única pessoa.
Tal orientação, agora sumulada, decorre da própria interpretação possibilitada pelo art. 11 da Lei de Benefícios, que define o regime de economia familiar como aquele em que os membros da família exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo certo, repita-se, que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta exercida, normalmente, pelo genitor ou cônjuge masculino (AgRg no AREsp 363462, STJ, 1.ª T, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe de 04/02/2014; AgRg no REsp 1226929/SC, STJ, 5.ª T, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe de 14/11/2012).
Assim, a qualificação de lavrador ou agricultor em atos do registro civil tem sido considerada, também, como início de prova material, se contemporânea aos fatos, podendo estender-se ao cônjuge, se caracterizado o regime de economia familiar (AgRg no AREsp 517671/PR, 2.ª T, Rel. Min. Assussete Magalhães, DJe de 21/08/2014 e AgRg no AREsp 241687/CE, STJ, 6.ª T, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 11/03/2013).
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de boia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (integrantes do grupo familiar, proprietários de terras, arrendatários).
O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n.º 1.321.493-PR, recebido pela Corte como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes a respeito do boia-fria:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. (...) (grifo nosso)
No tocante à possibilidade do cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12/03/2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade do cômputo do tempo de serviço laborado em regime de economia familiar a partir dessa idade, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça (AgRg no REsp 1043663/SP, 6.ª T, Rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira, DJe de 01/07/2013 e AgRg no REsp 1192886/SP, 6.ª T, Rel. Min. Og Fernandes, DJe de 26/09/2012).
(Da dispensa) do recolhimento de contribuições
Sobre a matéria, dispõe a Lei n.º 8.213/91, ipsis literis:
Art. 55, §2.º - O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
Já o art. 96, que regula os critérios dentro dos quais a contagem recíproca é admitida, consigna em seu inciso IV:
Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:
(...) IV- O tempo de serviço anterior ou posterior à obrigatoriedade de filiação à Previdência Social só será contado mediante indenização da contribuição correspondente ao período respectivo, com acréscimo de juros moratórios de 0,5% ao mês, capitalizados anualmente, e multa de 10%". (redação dada pela MP nº 2.022-17, de 23/05/2000, atual MP nº 2.187-13, de 24/08/2001)
O correto alcance e aplicação dos dispositivos referidos foi objeto de julgamento nos Tribunais Superiores, onde restou consignado (1) que o tempo de serviço rural anterior à vigência da Lei n.º 8.213/91 pode ser computado para a aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, sem recolhimento de contribuições, por expressa ressalva do § 2.º do art. 55, acima transcrito, salvo para carência (STJ, AgRg nos EDcl no REsp 1465931/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 09/12/2014; AR 3902/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe de 07/05/2013), e (2) que não cabe indenização das exações correspondentes ao interregno de trabalho rural (constante do inciso IV do art. 96, também transcrito) nos períodos nos quais o trabalhador rural estava desobrigado de contribuir ao Regime Geral de Previdência Social, justificando-se a imposição da indenização apenas em relação à contagem recíproca de tempo de serviço público (AgRg no REsp 1413730/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, 2.ª Turma, DJe de 09/12/2013; REsp 1266143/SP, Rel. Jorge Mussi, 5.ª Turma, DJe de 09/10/2014).
No que tange ao termo inicial de eventual indenização, tratando-se o tributo para custeio do sistema de benefícios da Previdência Social como integrante da espécie contribuição social, a sua incidência deve observar o ditame do art. 195, §6.º, da Constituição Federal. Dessarte, as exações em comento, a princípio só poderiam ser exigidas após noventa dias da data da publicação da lei que as instituiu, de sorte que, tendo a normativa de regência sido publicada em 25 de julho de 1991, a data de início da cobrança das contribuições previdenciárias seria dia 22 de outubro daquele ano, à míngua da correspondente fonte de custeio de tempo de serviço rural em regime de economia familiar, posicionamento, aliás, já assentado no art. 184, inc. V, do Decreto n.º 2.172/97 e no art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/1999, o qual expressamente refere que o tempo de contribuição do segurado trabalhador rural anterior à competência de novembro de 1991 será computado. Assim, possível a extensão daquela data até 31/10/1991.
Concluindo, observamos as seguintes possibilidades: (1) o tempo de trabalho rural anterior a 31/10/1991 pode ser aproveitado para fins de aposentadoria dentro do RGPS independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias (exceto para os fins de carência); (2) o mesmo período pode ser aproveitado para aposentação em regime diverso do RGPS, mediante indenização (art. 96, IV, da Lei 8.213/91); (3) o aproveitamento de período posterior a 31/10/1991 sempre implica indenização.
Por fim, ressalte-se que o tempo de serviço rural sem o recolhimento das contribuições, em se tratando de regime de economia familiar, aproveita tanto ao arrimo de família como aos demais dependentes do grupo familiar que com ele laboram (STJ - REsp 506.959/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, j. em 07/10/2003 e REsp n.º 603.202, Rel. Min. Jorge Scartezzini, decisão de 06/05/2004).
Do caso concreto
Inicialmente, cumpre salientar que o INSS já reconheceu o exercício da atividade rural em regime de economia familiar pela parte autora no período de 01/01/1969 a 28/02/1973, consoante se vê nos resumos de cálculo de do evento 3 (anexospet4, página 176), razão pela qual, quanto a esse intervalo, deve o pedido ser extinto sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC/2015.
Assim, subsiste o interesse processual da parte autora quanto ao reconhecimento do labor rural nos períodos de 01/08/1965 a 31/12/1968 e 01/03/1973 a 30/04/1974.
Visando à demonstração do exercício da atividade rural, a parte autora juntou aos autos os seguintes documentos (anexados ao evento 3, anexospet4):
- CTPS própria, emitida em 1973 (página 12);
- ficha de associação de seu pai ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Torres/RS, datada de 1968 (página 56);
- certidão emitida pela Delegacia da Fazenda Estadual de Taquara/RS informando que o pai do segurado esteve inscrito como produtor rural desde 1966, com recadastramento em 1975, na localidade de Rua Nova, 7º Distrito de Torres/RS (página 57);
- declaração do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Torres/RS, informando que o pai do autor foi associado de 1698 a 1975 (página 58);
- certidão de cadastro de imóvel rural emitida pelo INCRA, informando o cadastramento de um imóvel rural de 24 hectares de área em nome do pai do autor, relativamente ao período de 1969 a 1978 (página 59);
- histórico escolar do autor, relativo aos anos de 1969 a 1972, em que consta a profissão de seu pai como lavrador (páginas 60 a 73).
Na audiência de instrução e julgamento realizada no feito autuado sob o n° 2000.71.12.001713-5, tramitado na Segunda Vara Judicial da Comarca de Torres/RS, foram ouvidas duas testemunhas, as quais confirmaram o exercício de atividade rurícola pelo autor durante todo o período ora pretendido. Com efeito, o senhor Antonio Lopes Magnus afirmou que foi vizinho do autor na localidade de Mampituba, onde presenciou o desempenho da atividade rural pelo mesmo desde tenra infância. Afirmou que depois que ele, depoente, retornou da prestação do serviço militar, em 1969, o autor permaneceu na zona rural por aproximadamente mais cinco anos, quando foi residir em Torres. O senhor Thome Lopes Pereira, por sua vez, afirmou que o autor desempenhou a atividade rural com seus familiares até, aproximadamente, a idade de 22 anos, quando foi residir em Torres. Afirmou ainda que toda a família do autor laborava na agricultura nessa época e vivia exclusivamente dessa atividade (evento 3, anexospet4, páginas 140 e seguintes).
Desse modo, a partir dos documentos acostados aos autos, os quais constituem início de prova material, corroborados pelo depoimento testemunhal, foi devidamente comprovado o trabalho agrícola desenvolvido pela parte autora de 01/08/1965 a 31/12/1968 e 01/03/1973 a 30/04/1974, totalizando 4 anos, 7 meses e 1 dia.
Mantida a sentença quanto a esse ponto.
Dos períodos urbanos
A parte autora pretende o cômputo dos períodos de 01/05/1974 a 31/03/1977 e de 01/04/1978 a 22/09/1978, em que laborou na Prefeitura Municipal de Torres/RS, bem como do período de 02/01/2012 a 27/06/2013, em que laborou na empresa Quatro Lagos Urbanizadora Ltda., e, para tanto, trouxe aos autos cópia de sua CTPS, na qual estão registrados esses vínculos (evento 3, anexospet4, página 13).
Quanto aos intervalos laborados na Prefeitura Municipal de Torres/RS, impõe-se salientar que não se trata de hipótese de contagem recíproca de tempo de contribuição, uma vez que tal atividade foi prestada em regime celetista, conforme se verifica no CNIS do segurado (evento 3, anexospet4, página 33).
Verifico que tais períodos estão devidamente comprovados mediante CTPS, CNIS, bem como mediante certidão emitida pela Prefeitura Municipal (evento 3, anexospet4, página 118), de modo que não há razões para a sua não averbação. Ademais, conforme certidão emitida pela Secretaria de Administração e Recursos Humanos do Estado do Rio Grande do Sul, esses intervalos não foram computados na aposentadoria concedida ao servidor (evento 3, anexospet4, página 180).
Assim, tem-se como comprovado o exercício de atividade urbana nos períodos de 01/05/1974 a 31/03/1977 e de 01/04/1978 a 22/09/1978, totalizando 3 anos, 4 meses e 23 dias, os quais devem ser averbados pelo INSS.
Por fim, impõe-se analisar a possibilidade de reconhecimento do período de 02/01/2012 a 27/06/2013, laborado na empresa Quatro Lagos Urbanizadora Ltda., vínculo que o INSS deixou de computar por considerá-lo fraudulento.
Alega a autarquia que o segurado não foi realmente empregado da referida empresa, pois, antes da data de início do alegado vínculo, já lhe prestava serviços como advogado, sem vinculação empregatícia, tendo tal vínculo sido forjado, após a cassação da aposentadoria do autor no Regime Próprio, tão somente para colmatar o tempo de contribuição necessário à concessão de aposentadoria no Regime Geral.
Sobre essa questão, para evitar tautologia, adoto os fundamentos da sentença, nos seguintes termos:
Ademais, as anotações da CTPS do autor evidenciam que ele laborou na Prefeitura Municipal de Torres de 01-5-1974 a 31-3-1977 e de 01-4-1978 a 22-9-1978, além de ter trabalhado como advogado para a Empresa Quatro Lagos de 02-1-2012 a 27-6-2013 (fl. 22), devendo, então, a autarquia anotar corretamente no CNIS do autor tais períodos.
Vale ressaltar que o registro constante na CTPS goza da presunção de veracidade juris tantum, devendo a prova em contrário ser inequívoca, constituindo, desse modo, prova plena do serviço prestado nos períodos ali anotados, ressaltando-se que a anotação posterior não constitui, por si só, qualquer indício de fraude.
Assim, tenho por comprovado o exercício da atividade rural pelo autor na condição de segurado especial durante o período de 01-8-1965 a 30-4-1974, o qual, somado ao tempo de serviço urbano ora reconhecido e também àquele reconhecido administrativamente pelo INSS (fls. 51/52), perfaz tempo mais do que suficiente para a concessão do benefício pleiteado.
Portanto, não merece prosperar a alegação da autarquia de que houve irregularidades porque o autor era advogado da empresa muito antes da suposta admissão, haja vista que, na condição de advogado, pode o autor trabalhar como autônomo e também como empregado, não existindo obrigatoriedade de atuação exclusiva.
O simples fato de a parte autora já ter prestado serviços como advogado para a empresa antes de ser por ela contratado como empregado não gera qualquer presunção quanto à irregularidade ou falsidade do vínculo, que se encontra devidamente registrado. Assim, não tendo o INSS logrado êxito em provar a falsidade da relação empregatícia, derrubando a prova apresentada pelo autor, inclusive por CTPS, deve-se concluir pela procedência do pedido.
Dessarte, resta devidamente comprovado o período urbano, de 02/01/2012 a 27/06/2013, totalizando 1 ano, 5 meses e 26 dias, que também deve ser averbados pelo INSS.
Dirimida a questão acerca da comprovação do tempo de serviço controvertido, cabe a análise do direito à aposentadoria pretendida.
Em razão da promulgação da Emenda Constitucional n.º 20/98, em 16/12/1998, houve alteração das regras inicialmente consagradas pela Lei n.º 8.213/91. Assim, a Aposentadoria por Tempo de Serviço foi extinta, sendo instituídas novas regras para o alcance da agora chamada Aposentadoria por Tempo de Contribuição.
Sinale-se, entretanto, que a referida Emenda, em seu art. 3.º, ressalvou o direito adquirido dos segurados que até a data de sua publicação haviam preenchidos os requisitos legais para a concessão de benefício previdenciário, bem como introduziu a Regra de Transição (art. 9.º), a qual assegura a concessão de Aposentadoria por Tempo de Contribuição proporcional ou integral ao segurado filiado ao RGPS até a data de publicação dessa emenda.
Assim, se o segurado se filiou à Previdência Social antes da vigência da EC n.º 20/98 e conta tempo de serviço posterior àquela data, poderá trazer ao caso concreto a incidência de três hipóteses:
1) das Regras Antigas, com limitação do tempo de serviço e carência em 16/12/1998, para verificar o preenchimento das condições legais para a Aposentadoria por Tempo de Serviço, seja proporcional ou integral, cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei n. 8.213/91: exige-se o implemento da carência e do tempo de serviço mínimo de 25 anos para a segurada e 30 anos para o segurado, que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 6% (seis por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que dará ensejo à inativação integral (conforme previsto nos arts. 142, 52 e 53, I e II, todos da Lei n.º 8213/91);
2) das Regras Permanentes (EC n.º 20/98), sem qualquer restrição temporal pela legislação previdenciária, apenas com limitação na DER. A Aposentadoria por Tempo de Contribuição é devida ao segurado que, cumprindo a carência exigida, prevista no art. 142 da Lei 8213/91, completar 35 anos de contribuição, se homem, e 30 anos de contribuição, se mulher e por fim,
3) das Regras de Transição - Aposentadoria por Tempo de Contribuição proporcional ou integral, com o cômputo do tempo trabalhado até 28/11/1999, dia anterior à edição da lei do fator previdenciário (Lei n.º 9876/99), cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei n.º 8.213/91. Para a inativação proporcional é preciso o implemento da carência (art. 142 da Lei n.º 8213/91) e do tempo de contribuição mínimo de 25 anos, se mulher e 30 anos, se homem e, respectivamente, a idade mínima de 48 anos e 53 anos e, se for o caso, do pedágio de 20% para a aposentadoria integral ou 40% para a proporcional que, em 16/12/1998, faltava para atingir aquele mínimo necessário à outorga da inativação (art. 9.º, § 1.º, I, "a" e "b", da EC n.º 20/98), que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 5% (cinco por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que corresponderá à inativação integral (inciso II da norma legal antes citada). Ressalte-se, porém, que não se aplica a exigência da idade e do pedágio para a aposentadoria integral, porquanto mais gravosa ao segurado, entendimento, inclusive, do próprio INSS (Instrução Normativa INSS/DC n.º 57/2001), mantido nos regramentos subsequentes.
Importante lembrar que independentemente do tempo encontrado impõe-se a realização das simulações possíveis, uma vez que os salários de contribuição poderão variar nos períodos apurados e não necessariamente de um tempo de serviço mais reduzido advirá uma RMI menor.
Da carência
A carência exigida no caso de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição é de 180 contribuições. No entanto, para os segurados inscritos na Previdência Social Urbana até 24/07/1991, bem como para os trabalhadores e empregadores rurais cobertos pela Previdência Social Rural, a carência para as aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá à tabela de acordo com o ano em que o segurado implementou as condições necessárias à obtenção do benefício (art. 142 da LB).
Da concessão do benefício
No caso, a parte autora conta com os seguintes períodos já reconhecidos na via administrativa: 22/09/1978 a 01/11/2005 (período laborado como servidor público, averbado mediante contagem recíproca, conforme RDCTC em evento 3, anexospet4, página 42) e 01/01/1969 a 28/02/1973 (período de atividade rural em regime de economia familiar, reconhecido por meio de ação judicial, conforme averbação em RDCTC no evento 3, anexospet4, página 176), totalizando 31 anos, 3 meses e 8 dias.
Salienta-se que foi excluído da contagem do tempo de contribuição já averbado o lapso de 02/11/2005 a 11/04/2012, no qual o segurado esteve em gozo de aposentadoria no RPPS.
A esses períodos já averbados devem ser somados o tempo de labor rural admitido na presente ação (01/08/1965 a 31/12/1968 e 01/03/1973 a 30/04/1974, totalizando 4 anos, 7 meses e 1 dia), bem como os períodos urbanos (01/05/1974 a 31/03/1977, 01/04/1978 a 22/09/1978 e 02/01/2012 a 27/06/2013, totalizando 4 anos, 10 meses e 19 dias), com o que a parte autora implementa, até a DER, 28/06/2013, 40 anos, 8 meses e 28 dias, fazendo jus à Aposentadoria por Tempo de Contribuição, a contar da data do requerimento administrativo, uma vez que o requisito da carência (art. 142 da LB) também foi cumprido.
Registre-se que a influência de variáveis, como valor dos salários de contribuição, período básico de cálculo a ser considerado, coeficiente de cálculo utilizado, diferença de acréscimo de coeficiente e incidência ou não de fator previdenciário, conforme seja considerado o tempo apurado até 16/12/1998, até 28/11/1999 ou até a data do requerimento, não permite identificar de plano qual a alternativa mais benéfica à parte autora. De qualquer sorte, está claro o seu direito à aposentadoria, devendo, por ocasião da implementação, ser observada a renda mais vantajosa.
Convém salientar que o próprio INSS ao processar pedidos de aposentadoria faz simulações, quando for o caso, considerando as hipóteses já referidas, concedendo o benefício mais benéfico. Se a própria Administração tem essa conduta, não tem sentido que em juízo se proceda de maneira diversa. Assim, como o que pretende o segurado é a concessão da aposentadoria, se prestando a DER apenas para definir a data a partir da qual o benefício é devido, em tais casos simplesmente deve ser reconhecido o direito ao benefício, relegando-se a definição da RMI para momento posterior.
Com o intuito de evitar possíveis discussões acerca da natureza jurídica do provimento jurisdicional deve ser esclarecido que não há falar em acórdão condicional, pois o comando é único: determinar que o INSS conceda o benefício com o cálculo que for mais vantajoso ao segurado.
Tutela Específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3.ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício postulado, no prazo de 45 dias.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Dos consectários
A correção monetária e os juros de mora devem ser adequados aos parâmetros a seguir fixados:
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91.
- IPCA-E a partir de 30/06/2009.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo STF, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Da Verba Honorária
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Das Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, de acordo com disposto no art. 5°, I, da Lei Estadual nº 14.634/14, que institui a Taxa Única de Serviços Judiciais desse Estado, ressalvando-se que tal isenção não o exime da obrigação de reembolsar eventuais despesas judiciais feitas pela parte vencedora (§ único do art. 5º). Salienta-se, ainda, que nessa taxa única não estão incluídas as despesas processuais mencionadas no § único do art. 2° da referida Lei, tais como remuneração de peritos e assistentes técnicos, despesas de condução de oficiais de justiça, entre outras.
Conclusão
Dou parcial provimento à remessa necessária e ao recurso do INSS apenas para reconhecer a isenção de que goza a Autarquia quanto ao pagamento das custas processuais ao litigar na Justiça Federal e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul.
Extingo, sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC/2015, o pedido de reconhecimento do exercício de atividade rural em regime de economia familiar pela parte autora no período de 01/01/1969 a 28/02/1973, já averbado pelo INSS.
Mantenho o reconhecimento do desempenho de atividade rural nos períodos de 01/08/1965 a 31/12/1968 e 01/03/1973 a 30/04/1974, bem como do desempenho de atividade urbana nos períodos de 01/05/1974 a 31/03/1977, 01/04/1978 a 22/09/1978 e 02/01/2012 a 27/06/2013.
Admito a possibilidade de cômputo no RGPS, mediante contagem recíproca, do período laborado como servidor público para o Estado do Rio Grande do Sul, de 22/09/1978 a 01/11/2005, intervalo que foi aproveitado para a concessão de aposentadoria no RPPS desse Estado, posteriormente revogada, excluindo, todavia, a possibilidade de cômputo do período de 02/11/2005 a 11/04/2012, no qual a parte autora esteve em gozo da referida aposentadoria.
Determino a concessão, em favor da parte autora, do benefício de Aposentadoria por Tempo de Contribuição, a contar da data do requerimento na via administrativa.
Saliento, por oportuno, a necessidade de observância das disposições contidas no art. 96, III, da Lei nº 8.213/91.
Frente ao exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso do INSS e à remessa necessária e determinar a implantação do benefício.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9253684v4 e, se solicitado, do código CRC C0EE8DB6. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 15/12/2017 16:09 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 11/12/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5037376-63.2017.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00098926120148210072
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Maurício Pessutto |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ivo dos santos rocha |
ADVOGADO | : | ORÉLIO BRAZ BECKER DA SILVA |
Certifico que este processo foi incluído no Aditamento da Pauta do dia 11/12/2017, na seqüência 806, disponibilizada no DE de 28/11/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS E À REMESSA NECESSÁRIA E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ | |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9272215v1 e, se solicitado, do código CRC 53D588BF. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 11/12/2017 18:43 |
