Apelação Cível Nº 5021511-29.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PEDRO RAMBO
RELATÓRIO
Trata-se de apelação de sentença publicada na vigência do CPC/2015, em que o magistrado singular julgou procedente o pedido, condenando o INSS a conceder à parte autora o seguro-defeso do ano de 2016, pelo período de vedação da pesca, pagando-lhe as parcelas devidas corrigidas monetariamente pelo IPCA-E e acrescidas de juros de mora de 6% ao ano, a contar da citação. O INSS foi condenado, ainda, ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação. Sem custas processuais.
Sustenta o INSS, preliminarmente, a ocorrência de prescrição quinquenal e sua ilegitimidade passiva, tendo em vista que o ônus financeiro para pagamento do benefício é da União. No mérito, argumenta que não restou provado que durante o período reclamado o autor teria retirado seu sustento, exclusivamente, da pesca, pois houve a juntada de uma nota relativa à comercialização de gado, não fazendo jus, portanto, ao benefício. Caso assim não entendido, postula a aplicação da Lei n. 11.960/2009 para fins de atualização monetária.
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo do INSS, interposto em 10/06/2019, preenche os requisitos de admissibilidade.
Prescrição quinquenal
Não há falar em prescrição quinquenal, tendo em vista que o requerimento administrativo foi realizado em novembro de 2016 (evento 3 - anexospet4 - fl. 5) e a ação foi ajuizada em 27/01/2017).
Ilegitimidade Passiva
O apelo, no ponto, não merece ser conhecido, uma vez que a questão restou decidida por esta Corte no julgamento do Conflito de Competência n. 5022.218-55.2018.4.04.0000/RS, transitado em julgado em 13/02/2019, em que afirmada a natureza previdenciária do benefício de seguro-defeso e, portanto, legítimo o INSS para responder pela lide, bem como a competência do juízo de Direito da 1ª Vara Cível de Santo Cristo/RS, nos termos do artigo 109, §3º, da CF/88.
Mérito
A Lei nº 10.779/03 prevê os seguintes requisitos para habilitação ao recebimento do seguro desemprego pelo pescador profissional artesanal:
Art. 2º Para se habilitar ao benefício, o pescador deverá apresentar ao órgão competente do Ministério do Trabalho e Emprego os seguintes documentos:
I - registro de pescador profissional devidamente atualizado, emitido pela Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República, com antecedência mínima de um ano da data do início do defeso;
II - comprovante de inscrição no Instituto Nacional do Seguro Social - INSS como pescador, e do pagamento da contribuição previdenciária;
III - comprovante de que não está em gozo de nenhum benefício de prestação continuada da Previdência ou da Assistência Social, exceto auxílio acidente e pensão por morte; e
IV - atestado da Colônia de Pescadores a que esteja filiado, com jurisdição sobre a área onde atue o pescador artesanal, que comprove:
a) o exercício da profissão, na forma do art. 1o desta Lei;
b) que se dedicou à pesca, em caráter ininterrupto, durante o período compreendido entre o defeso anterior e o em curso; e
c) que não dispõe de outra fonte de renda diversa da decorrente da atividade pesqueira.
Parágrafo único. O Ministério do Trabalho e Emprego poderá, quando julgar necessário, exigir outros documentos para a habilitação do benefício.
Como se observa, os requisitos são cumulativos e, à exceção dos constantes nas alíneas b e c, os demais não foram objeto de impugnação pela Autarquia Previdenciária, restando incontroversos.
Sustenta o INSS que no período antecedente ao intervalo pretendido como seguro-defeso, a parte autora teria exercido atividade diversa da pesca artesanal, não merecendo crédito as testemunhas ouvidas em juízo, as quais atestaram o exercício do labor pesqueiro nos últimos dez anos antes da audiência, ou seja, desde 2007.
Sem razão a Autarquia. Há a comprovação por meio de notas fiscais e Guias da Previdência Social (evento3 - anexos pet4) de que o demandante exerceu a atividade pesqueira durante o período compreendido entre o defeso anterior e que postula (anterior ao requerimento do benefício em novembro de 2016). De outro lado, as testemunhas ouvidas em juízo (evento 7 desta instância) foram claras em afirmar que o autor era pescador há pelo menos dez anos (desde 2007), não possuindo outra fonte de renda que não a pesca.
O fato de haver uma única nota fiscal datada de 07/2016, em seu nome, referente à venda de gado, não tem o condão de retirar sua condição de segurado especial - pescador. Não se pode perder de vista que se a atividade rural era desempenhada pela esposa do requerente, não é incomum o uso do bloco de notas fiscais pelos integrantes do grupo familiar.
Por essas razões, é de ser mantida a sentença.
- Correção monetária
A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei n.º 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).
A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, que fora prevista na Lei 11.960/2009, que introduziu o art. 1º-F na Lei 9.494/97, foi afastada pelo STF no julgamento do tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, o que restou confirmado, no julgamento de embargos de declaração por aquela Corte, sem qualquer modulação de efeitos. O precedente do STF é aplicável desde logo, uma vez que, nos termos da decisão do Relator, a pendência do julgamento dos embargos de declaração é que motivava a suspensão nacional dos processos.
No julgamento do tema 905, através do REsp 1.495146, e interpretando o julgamento do STF, o STJ definiu quais os índices que se aplicariam em substituição à TR, concluindo que aos benefícios assistenciais deveria ser utilizado IPCA-E, conforme decidiu a Suprema Corte, no recurso representativo da controvérsia e que, aos previdenciários, voltaria a ser aplicável o INPC, uma vez que a inconstitucionalidade reconhecida restabeleceu a validade e os efeitos da legislação anterior, que determinava a adoção deste último índice, nos termos acima indicados.
A conjugação dos precedentes dos tribunais superiores resulta, assim, na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.
Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).
Honorários advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.
O juízo de origem, tendo por aplicáveis as disposições do art. 85, §§ 3º e 4º do novo CPC, fixou os honorários de sucumbência em 10% sobre o valor das parcelas vencidas.
Mantida a decisão em grau recursal, impõe-se a majoração dos honorários, por incidência do disposto no §11 do mesmo dispositivo legal.
Assim, os honorários vão fixados em 15% sobre o valor das parcelas vencidas, observado o trabalho adicional realizado em grau recursal.
Tutela específica
Não é caso de se determinar a implantação do benefício, pois o seguro-defeso possui número fixo de parcelas, conforme dispõe o artigo 1º, §2º, da Lei n. 10.779/2003.
Conclusão
Apelo do INSS conhecido em parte e, nessa extensão, desprovido. Adequados os critérios de juros de mora.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo do INSS.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Juíza Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001569247v7 e do código CRC 15274263.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5021511-29.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PEDRO RAMBO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SEGURO-DEFESO. REQUISITOS. PREENCHIMENTO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.
1. Os requisitos para a concessão do seguro-defeso estão previstos na Lei nº 10.779/03 e devem ser preenchidos de forma cumulativa.
2. Restando comprovado que a parte autora exerceu de forma ininterrupta a atividade pesqueira no período compreendido entre o defeso anterior e o pretendido, viável a outorga do benefício.
3. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, sem modulação de efeitos.
4. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.
5. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29/06/2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 12 de fevereiro de 2020.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Juíza Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001569248v4 e do código CRC 53c85f1b.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 12/02/2020
Apelação Cível Nº 5021511-29.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR(A): THAMEA DANELON VALIENGO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PEDRO RAMBO
ADVOGADO: ANA PATRICIA CARDOSO (OAB RS102251)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 12/02/2020, na sequência 560, disponibilizada no DE de 24/01/2020.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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