Apelação Cível Nº 5003209-15.2020.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: EDUARDO MASATO MURAOKA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
A parte autora propôs ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pedindo a concessão de seguro-desemprego a pescador artesanal.
Processado o feito, a sentença, publicada em 03/12/2019, tem o seguinte dispositivo (ev. 65):
Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I do CPC, JULGO IMPROCEDENTE o pedido o pedido contido na inicial.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios em favor dos procuradores da parte ré, os quais fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, nos termos do § 2º, do art. 85, do Novo Código de Processo Civil, observado o grau de zelo profissional, a natureza, importância e complexidade da causa, e otrabalho desenvolvido e tempo necessário para o serviço. Todavia, suspendo a exigibilidade, vez que concedo os benefícios da assistência judiciária gratuita
A parte autora apelou sustentando que faz jus ao beneficio de seguro defeso ao pescador profissional, uma vez comprovadamente exerce a atividade de pesca, sendo que a não oitiva das testemunhas lhe causou prejuízo. Pede o provimento do apelo para "determinar a abertura da instrução processual, possibilitando à parte autora a produção de prova testemunhal para demonstrar a sua atividade na pesca" (ev.71).
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Seguro-Desemprego. Pescador Artesanal.
O seguro-desemprego ao pescador artesanal é benefício concedido durante o período de defeso, quando a pesca é probida.
Sua previsão está na Lei 10.779/2003, com a redação dada pela Lei nº 13.134, de 2015:
Art. 1º O pescador artesanal de que tratam a alínea “b” do inciso VII do art. 12 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, e a alínea “b” do inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que exerça sua atividade profissional ininterruptamente, de forma artesanal e individualmente ou em regime de economia familiar, fará jus ao benefício do seguro-desemprego, no valor de 1 (um) salário-mínimo mensal, durante o período de defeso de atividade pesqueira para a preservação da espécie.
§ 1º Considera-se profissão habitual ou principal meio de vida a atividade exercida durante o período compreendido entre o defeso anterior e o em curso, ou nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do defeso em curso, o que for menor.
§ 2ºO período de defeso de atividade pesqueira é o fixado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, em relação à espécie marinha, fluvial ou lacustre a cuja captura o pescador se dedique.
§ 3º Considera-se ininterrupta a atividade exercida durante o período compreendido entre o defeso anterior e o em curso, ou nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do defeso em curso, o que for menor.
§ 4º Somente terá direito ao seguro-desemprego o segurado especial pescador artesanal que não disponha de outra fonte de renda diversa da decorrente da atividade pesqueira.
§ 5º O pescador profissional artesanal não fará jus, no mesmo ano, a mais de um benefício de seguro-desemprego decorrente de defesos relativos a espécies distintas.
§ 6º A concessão do benefício não será extensível às atividades de apoio à pesca nem aos familiares do pescador profissional que não satisfaçam os requisitos e as condições estabelecidos nesta Lei.
§ 7º O benefício do seguro-desemprego é pessoal e intransferível.
§ 8º O período de recebimento do benefício não poderá exceder o limite máximo variável de que trata o caput do art. 4o da Lei no 7.998, de 11 de janeiro de 1990, ressalvado o disposto nos §§ 4º e 5ºdo referido artigo.
Art. 2º Cabe ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) receber e processar os requerimentos e habilitar os beneficiários, nos termos do regulamento.
§ 1º Para fazer jus ao benefício, o pescador não poderá estar em gozo de nenhum benefício decorrente de benefício previdenciário ou assistencial de natureza continuada, exceto pensão por morte e auxílio-acidente.
§ 2º Para se habilitar ao benefício, o pescador deverá apresentar ao INSS os seguintes documentos:
I - registro como pescador profissional, categoria artesanal, devidamente atualizado no Registro Geral da Atividade Pesqueira (RGP), emitido pelo Ministério da Pesca e Aquicultura com antecedência mínima de 1 (um) ano, contado da data de requerimento do benefício;
II - cópia do documento fiscal de venda do pescado a empresa adquirente, consumidora ou consignatária da produção, em que conste, além do registro da operação realizada, o valor da respectiva contribuição previdenciária de que trata o § 7º do art. 30 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, ou comprovante de recolhimento da contribuição previdenciária, caso tenha comercializado sua produção a pessoa física; e
III - outros estabelecidos em ato do Ministério da Previdência Social que comprovem:
a) o exercício da profissão, na forma do art. 1o desta Lei;
b) que se dedicou à pesca durante o período definido no § 3o do art. 1o desta Lei;
c) que não dispõe de outra fonte de renda diversa da decorrente da atividade pesqueira.
§ 3º O INSS, no ato de habilitação ao benefício, deverá verificar a condição de segurado pescador artesanal e o pagamento da contribuição previdenciária, nos termos da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, nos últimos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao requerimento do benefício ou desde o último período de defeso até o requerimento do benefício, o que for menor, observado, quando for o caso, o disposto no inciso II do § 2º.
§ 4ºO Ministério da Previdência Social e o Ministério da Pesca e Aquicultura desenvolverão atividades que garantam ao INSS acesso às informações cadastrais disponíveis no RGP, de que trata o art. 24 da Lei no 11.959, de 29 de junho de 2009, necessárias para a concessão do seguro-desemprego.
§ 5º Da aplicação do disposto no § 4o deste artigo não poderá resultar nenhum ônus para os segurados.
§ 6º O Ministério da Previdência Social poderá, quando julgar necessário, exigir outros documentos para a habilitação do benefício.
§ 7º O INSS deverá divulgar mensalmente lista com todos os beneficiários que estão em gozo do seguro-desemprego no período de defeso, detalhados por localidade, nome, endereço e número e data de inscrição no RGP.
§ 8º Desde que atendidos os demais requisitos previstos neste artigo, o benefício de seguro-desemprego será concedido ao pescador profissional artesanal cuja família seja beneficiária de programa de transferência de renda com condicionalidades, e caberá ao órgão ou à entidade da administração pública federal responsável pela manutenção do programa a suspensão do pagamento pelo mesmo período da percepção do benefício de seguro-desemprego.
§ 9º Para fins do disposto no § 8ºo INSS disponibilizará aos órgãos ou às entidades da administração pública federal responsáveis pela manutenção de programas de transferência de renda com condicionalidades as informações necessárias para identificação dos beneficiários e dos benefícios de seguro-desemprego concedidos, inclusive as relativas à duração, à suspensão ou à cessação do benefício.
Em síntese, os requisitos de concessão do benefício, previstos nos parágrafos dos artigos 1º e 2º da referida Lei, são: (1) o exercício da atividade profissional de pescador artesanal, de forma individual ou em regime de economia familiar; (2) o registro enquanto pescador profissional, na categoria artesanal, no Registro Geral da Atividade Pesqueira (RGP), devidamente atualizado e emitido pelo menos um ano antes do requerimento do benefício; (3) a comprovação de comercialização do produto, a pessoa física ou jurídica, através de documento fiscal em que conste o valor da contribuição previdenciária ou o comprovante de recolhimento de contribuição previdenciária, no caso de transação com pessoa física; (4) a comprovação de que o segurado não está em gozo de nenhum outro benefício de prestação continuada da Previdência Social ou Assistência Social; e (5) a comprovação de que o requerente não dispõe de outra fonte de renda diversa da decorrente da atividade pesqueira.
Caso concreto
No caso, o INSS indeferiu o benefício em razão da falta de prova do exercício da atividade pesqueira como única fonte de renda durante todo o período necessário para o reconhecimento do direito ao benefício (ev. 1, out6):
A sentença julgou improcedente o pedido em razão da ausência de prova testemunhal para corroborar a prova documental (ev. 65):
A parte apelante pede a reabertura da instrução processual, para a produção da prova testemunhal.
Tal prova não foi produzida em razão do autor e das testemunhas não terem comparecido em audiência (ev.51):
A justificativa foi apresentada no ev. 55:
Todavia, não foi acolhida, conforme decisão no ev. 57:
Entretanto, por se tratar de prova imprescindível ao esclarecimento dos fatos, acerca do efetivo exercício da atividade pesqueira de modo exclusivo, entendo que deve ser deferida outra oportunidade para a sua produção, sob pena de sacrificar definitivamente o direito material alegado, em razão de questão formal que poderia ter sido sanada mediante a redesignação da audiência, na medida em que a justificativa apresentada, em que pese relativamente genérica, não é absolutamente desarrazoada, considerando que se trata de pessoas humildes, residentes em pequeno município.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO PROVA MATERIAL. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. NECESSIDADE. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. NOVA INSTRUÇÃO. 1. Para fins de comprovação do exercício da atividade rural, não se exige prova robusta, sendo necessário que o segurado especial apresente início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, sendo admitidos inclusive documentos em nome de terceiros do mesmo grupo familiar, a teor da Súmula nº 73 do TRF da 4ª Região. 2. A prova testemunhal é essencial à comprovação da atividade rural, pois se presta a corroborar os inícios de prova material apresentados. É prova que, segundo o entendimento desta Corte, é necessária e indispensável à adequada solução do processo. 3. Levando-se em consideração a necessidade da produção de prova testemunhal para a comprovação da atividade campesina, e a ausência de prejuízo na oitiva, se faz obrigatória a designação de audiência de instrução e julgamento. 4. Hipótese em que, de ofício, se determina a anulação da sentença, a fim de que seja reaberta a instrução e realizada produção de prova testemunhal, para comprovação da condição de segurada especial da parte autora. (TRF4, AC 5000034-55.2017.4.04.7012, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, 11/12/2020)
PROCESSUAL E PREVIDENCIÁRIO. PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. PROVA MATERIAL. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. NECESSIDADE. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. NOVA INSTRUÇÃO. 1. Dentre as inovações promovidas pelo novo Código de Processo Civil, está a exigência de prévia oitiva das partes sobre fatos e questões da causa, sendo vedado ao juiz surpreendê-las na tomada de decisão ou na valoração de prova não submetida ao prévio contraditório. 2. Levando-se em consideração a necessidade da produção de prova testemunhal para a comprovação da atividade campesina, e a ausência de prejuízo na oitiva, ainda que não tenha havido o comparecimento na audiência anteriormente designada, se faz obrigatória a redesignação de nova audiência de instrução e julgamento. 3. Hipótese em que se acolhe o recurso da parte autora, para determinar a anulação da sentença, a fim de que seja reaberta a instrução e oportunizada a produção de prova testemunhal, para comprovação da condição de segurada especial da autora. (TRF4, AC 5065990-78.2017.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO,02/10/2019)
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- apelação da parte autora: provida, para anular a sentença e determinar a reabertura da instrução processual.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002328601v5 e do código CRC 5a2d3a22.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 10/3/2021, às 14:54:35
Conferência de autenticidade emitida em 18/03/2021 04:01:27.
Apelação Cível Nº 5003209-15.2020.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: EDUARDO MASATO MURAOKA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SEGURO-DEFESO. REQUISITOS. PROVA.
1. Os requisitos para a concessão do seguro-defeso, previstos na Lei n. 10.779/2003, com as alterações incluídas pela Lei n. 13.134/2015, são: o exercício da atividade profissional de pescador artesanal, de forma individual ou em regime de economia familiar; o registro pescador profissional, na categoria artesanal, no Registro Geral da Atividade Pesqueira (RGP), emitido pelo menos um ano antes do requerimento do benefício, e devidamente atualizado; a comprovação de comercialização do produto, a pessoa física ou jurídica, através de documento fiscal em que conste o valor da contribuição previdenciária ou o comprovante de recolhimento de contribuição previdenciária, no caso de transação com pessoa física; a comprovação de que o segurado não está em gozo de outro benefício de prestação continuada da Previdência Social ou Assistência Social; a comprovação de que o requerente não dispõe de outra fonte de renda.
2. Sendo imprescindível a prova testemunhal para complementar o início de prova documental e esclarecer sobre as condições em que o autor exercia a atividade pesqueira, anula-se a sentença e determina-se a reabertura da instrução.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 09 de março de 2021.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002328602v3 e do código CRC 62bdb4e6.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 10/3/2021, às 14:54:35
Conferência de autenticidade emitida em 18/03/2021 04:01:27.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 02/03/2021 A 09/03/2021
Apelação Cível Nº 5003209-15.2020.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
APELANTE: EDUARDO MASATO MURAOKA
ADVOGADO: CLAUDIO MARCIO DE ARAUJO (OAB PR056118)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído no 1º Aditamento da Sessão Virtual, realizada no período de 02/03/2021, às 00:00, a 09/03/2021, às 16:00, na sequência 1009, disponibilizada no DE de 19/02/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 18/03/2021 04:01:27.