Apelação Cível Nº 5016515-41.2013.4.04.7107/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: EVALDO DIEMER DE CAMARGO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação ajuizada sob o rito ordinário contra o INSS, em que a parte autora postula a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o cômputo de períodos de exercício de atividade rural, em regime de economiar familiar, e a contabilização do período de 01/01/1978 a 31/12/1980, em que frequentou o Instituto Leonardo Murialdo na condição de aluno-aprendiz.
A sentença, proferida em 21/07/2016, determinou a averbação do tempo de serviço laborado na agricultura, conforme postulado, para fins de futura jubilação. O pedido de averbação do período em que esteve no Instituto Leonardo Murialdo como aluno-aprendiz foi julgado improcedente, por não ter ficado demonstrado o vínculo empregatício e a retribuição pecuniária à conta do Orçamento. Considerando que ambas as partes quedaram sucumbentes, o autor e o INSS foram havidos por isentos do pagamento das custas processuais, e condenados ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, à luz dos §§ 2º e 3º do art. 85 do NCPC, em relação a cada um deles, suspensa a exigibilidade em relação ao autor tendo em vista o benefício da gratuidade da justiça.
Irresignado, o autor apelou da sentença, sustentando que embora o Colégio Murialdo não recebesse contribuição do governo Federal, era mantido por dotação orçamentária do Tesouro do Estado do RS, cuja destinação corresponde ao conteúdo da Súmula 96 do Tribunal de Contas da União. Pede a procedência do pedido
É o relatório.
VOTO
CPC/2015
Conforme o art. 14 do CPC/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Logo, serão examinados segundo as normas do CPC/2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Tendo em vista que a sentença foi publicada posteriormente a esta data, o recurso será analisado em conformidade com o CPC/2015.
ATIVIDADE COMO ALUNO-APRENDIZ
Pretende o autor averbar o período de 01/01/1978 a 31/12/1980 no qual afirma ter frequentado o Curso Colegial Agrícola - Habilitação em Agropecuária, no Colégio Murialdo - Escola de 2º Grau.
A jurisprudência deste Tribunal já se pacificou no sentido de que é possível o cômputo do período de atividade como aluno-aprendiz, desde que atendidos os requisitos da Súmula 96 do TCU, que assim dispõe: "Conta-se para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado, na qualidade de aluno-aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas para terceiros". Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. ALUNO-APRENDIZ. NÃO COMPROVAÇÃO. 1. Para fins de reconhecimento do tempo de serviço prestado na condição de aluno-aprendiz, é necessária a demonstração de que estiveram presentes os seguintes requisitos: (1) prestação de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz e (2) retribuição pecuniária à conta do orçamento público, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar ou parcela de renda auferida com a execução de encomendas por terceiros. 2. Caso em que não restou comprovada a presença dos requisitos autorizadores do reconhecimento do tempo de serviço prestado na condição de aluno-aprendiz. 3. Sentença de improcedência mantida. (TRF4, AC 5071268-03.2012.404.7100, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 18/10/2017)
PREVIDENCIÁRIO. ALUNO-APRENDIZ. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REVISÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS. 1. Para fins de reconhecimento do tempo de serviço prestado na condição de aluno-aprendiz, é necessária a comprovação dos seguintes requisitos: (1) prestação de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz e (2) retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de (a) alimentação, (b) fardamento, (c) material escolar e (d) parcela de renda auferida com a execução de encomendas por terceiros. 2. Hipótese na qual restou comprovada a qualidade de aluno-aprendiz do autor, durante o período alegado. 3. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à revisão da RMI da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, a contar da data do requerimento administrativo, respeitada a prescrição quinquenal. 4. Nos termos do julgamento do RE nº 870.947/SE (Tema 810), pelo STF, em 20/09/2017, a correção monetária dos débitos da Fazenda Pública se dá através do IPCA-e. Os juros moratórios devem atender a disciplina da Lei nº 11.960/09. (TRF4, APELREEX 0013837-27.2015.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, D.E. 20/10/2017)
A sentença apelada assim dirimiu a controvérsia:
2. Reconhecimento de tempo de serviço – Período de 01/01/1978 a 31/12/1980 (Aluno-aprendiz - Instituto Leonardo Murialdo)
A contagem de tempo de serviço na condição de aluno aprendiz no âmbito administrativo é disciplinada nos artigos 76 a 78 da Instrução Normativa INSS/PRES nº 77/2015.
O artigo 76 da referida Instrução Normativa garante, em seu inciso III, o cômputo, como tempo de serviço/contribuição, dos períodos de frequência em escolas industriais ou técnicas da rede de ensino federal, escolas equiparadas ou reconhecidas, desde que tenha havido retribuição pecuniária à conta do orçamento respectivo do Ente Federativo, ainda que fornecida de maneira indireta ao aluno. Outrossim, a alínea ‘b’ do citado inciso define como equiparadas as escolas industriais ou técnicas mantidas e administradas pelos Estados ou pelo Distrito Federal e que tenham sido autorizadas pelo Governo Federal, na forma do Decreto-Lei nº 4.073/1942.
De acordo com o artigo 78, III da Instrução Normativa em tela, a comprovação do período de frequência em curso do aluno aprendiz far-se-á ‘por meio de Certidão de Tempo de Contribuição - CTC, na forma da Lei nº 6.226/1975 e do Decreto nº 85.850/1981, quando se tratar de frequência em escolas industriais ou técnicas da rede federal, bem como em escolas equiparadas ou reconhecidas citadas nas alíneas "b" e "c" do inciso III do art. 76, nos casos de entes federativos estaduais, distritais e municipais, desde que à época, o Ente Federativo mantivesse RPPS’.
Para corroborar suas alegações, o autor apresentou Declaração de Tempo de Serviço emitida pelo Instituto Leonardo Murialdo (fls. 02-03, OFIC1, evento 58), a qual informa frequência à Instituição, na condição de aluno aprendiz, no período de 01/03/1978 a 15/12/1980.
A Lei Orgânica do Ensino Industrial (Decreto-Lei 4.073/42), em seu art. 16, dispunha que os cursos industriais eram profissionalizantes e se destinavam à formação de artífices, mestres e técnicos em habilitações regulamentadas pelo Decreto 8.673/42.
O mesmo diploma legal, que sistematizou o ensino industrial em nível nacional, modificado pelo Decreto-Lei 8.590/46, previu a inclusão de entidades de ensino não-federais, autorizando-as a executar, a título de trabalhos práticos, encomendas de repartições públicas ou de particulares, devendo a renda ser incorporada à receita da União ou do Estado mantenedor. Em seu art. 5º estabeleceu que o orçamento anualmente consignaria um percentual sobre o total da receita bruta, arrecadada no ano anterior e resultante dos serviços executados, destinada ao custeio da mão-de-obra dos alunos.
O art. 60 do Decreto-Lei 4.073/42 fazia expressa distinção entre as escolas federais e as demais:
Art. 60. Além das escolas industriais e escolas técnicas federais, mantidas e administradas sob a responsabilidade da União, poderá haver duas outras modalidades desses estabelecimentos de ensino: os equiparados e os reconhecidos.
§ 1º Equiparadas serão as escolas industriais ou escolas técnicas mantidas e administradas pelos Estados ou pelo Distrito Federal, e que hajam sido autorizadas pelo Governo Federal.
§ 2º Reconhecida serão as escolas industriais ou escolas técnicas mantidas e administradas pelos Municípios ou por pessoa natural ou pessoa jurídica de Direito Privado, e que hajam sido autorizadas pelo Governo Federal.
§ 3º Conceder-se-á equiparação ou o reconhecimento, mediante prévia verificação, ao estabelecimento de ensino, cuja organização, sob todos os pontos de vista, possuir as imprescindíveis condições de eficiência.
§ 4º A equiparação ou reconhecimento será concedido com relação a um ou mais cursos de formação profissional determinados, podendo, mediante a necessária verificação, estender-se a outros cursos também de formação profissional.
§ 5º A equiparação ou reconhecimento será suspenso ou cassado, para um ou mais cursos, sempre que o estabelecimento de ensino, por deficiência de organização ou quebra de regime, não assegurar a existência das condições de eficiência imprescindíveis.
§ 6º O Ministério da Educação exercerá inspeção sobre as escolas industriais e escolas técnicas equiparadas e reconhecidas, e lhes dará orientação pedagógica.
§ 7º Escolas industriais ou escolas técnicas federais, não incluídas na administração do Ministério da Educação, deste receberão orientação pedagógica.
Posteriormente, a Lei 3.552/59, regulamentada pelo Decreto 47.038/59, conferiu aos estabelecimentos de ensino industrial personalidade jurídica própria, bem como autonomia didática, técnica, administrativa e financeira, mantendo a autorização para os trabalhos práticos efetuados na forma descrita logo acima.
Com base nas atividades assim exercidas e respectiva remuneração, foi editada a Súmula nº 96 pelo Tribunal de Contas da União (em 21/03/1980), que assim dispôs:
Conta-se, para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado, na qualidade de aluno-aprendiz, em escola profissional, desde que haja vínculo empregatício e retribuição pecuniária à conta do orçamento.
Em face dos embates surgidos da dificuldade dos alunos-aprendizes comprovarem o vínculo empregatício com o estabelecimento de ensino e a retribuição pecuniária, eis que na maioria dos casos esta se dava de forma indireta, consubstanciada no custeio alimentar, fardamento, material escolar, etc, o TCU reviu, em sessão administrativa realizada em 08/12/1994, o texto da referida Súmula, nos seguintes termos:
Conta-se, para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado, na qualidade de aluno-aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomenda para terceiros.
Além disso, a súmula 18 da TNU aponta que "provado que o aluno aprendiz de Escola Técnica Federal recebia remuneração, mesmo que indireta, à conta do orçamento da União, o respectivo tempo de serviço pode ser computado para fins de aposentadoria previdenciária".
No caso em tela, em relação ao tempo em que esteve no Instituto Leonardo Murialdo, não ficou demonstrado o vínculo empregatício e a retribuição pecuniária à conta do Orçamento.
Com efeito, a declaração emitida pelo Instituto informa que a instituição de ensino é particular e a venda dos produtos excedentes eram comercializados, sendo que o resultado da venda era destinado ao próprio custeio dos estudos (fl. 02, OFICIO/C1, evento 42). Outrossim, o ofício enviado pelo Instituto Leonardo Murialdo informa que não eram recebidas contribuições do Governo Federal relativo ao Curso de Técnico em Agropecuário realizado pelo autor no período de 01/01/1978 a 31/12/1980 (fl. 01, OFIC1, evento 58).
Em verdade, o que a jurisprudência autorizou e hoje vem retratado no inciso XXII do art. 60 do RPS no sentido de que é tempo de contribuição "o tempo exercido na condição de aluno-aprendiz referente ao período de aprendizado profissional realizado em escola técnica, desde que comprovada a remuneração, mesmo que indireta, à conta do orçamento público e o vínculo empregatício". Jamais a condição de aluno de escola particular autorizará que se compute o lapso como tempo de contribuição.
Conforme se vê dos documentos que constam dos autos, os mesmos não permitem o reconhecimento do tempo de serviço como aluno-aprendiz, pois a própria instituição de ensino de que trata dos autos declara ser escola particular (OFICIO/C1, evento 42), e não ser mantido pelo Tesouro do Estado, como quer fazer crer o apelante. Além disso, segundo se extrai, não era fornecida à parte autora remuneração, uniforme e material escolar, ou retribuição pecuniária à conta do orçamento da União Federal. Assim sendo, o simples fato de ter sido aluno interno de instituição de ensino, não lhe assegura a condição de aluno-aprendiz para fins de reconhecimento como tempo de serviço.
Mantida, portanto, a sentença recorrida.
Honorários advocatícios - Majoração
Uma vez que a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC), aplica-se a majoração prevista no art. 85, §11, desse diploma, observados os ditames dos §§ 2º a 6º quanto aos critérios e limites estabelecidos.
Assim, majoro a verba honorária devida pela parte autora para 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, observada a concessão de assistência judiciária gratuita, restanto inalterados os honorários advocatícios devidos pelo INSS, ante a sucumbência recíproca.
CONCLUSÃO
Mantido o não reconhecimento da equiparação a aluno-aprendiz nos períodos de 01/01/1978 a 31/12/1980; majorado o percentual fixado a título de honorários advocatícios.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5016515-41.2013.4.04.7107/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: EVALDO DIEMER DE CAMARGO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO COMO ALUNO-APRENDIZ. REQUISITOS.
. Para fins de reconhecimento do tempo de serviço prestado na condição de aluno-aprendiz, é necessária a comprovação dos seguintes requisitos: (1) prestação de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz e (2) retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de (a) alimentação, (b) fardamento, (c) material escolar e (d) parcela de renda auferida com a execução de encomendas por terceiros. Precedentes deste Tribunal e dicção da Súmula 96 do TCU.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de setembro de 2018.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000662782v3 e do código CRC 7ea1fb8d.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/09/2018
Apelação Cível Nº 5016515-41.2013.4.04.7107/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: EVALDO DIEMER DE CAMARGO (AUTOR)
ADVOGADO: ELIANE PATRICIA BOFF
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/09/2018, na seqüência 272, disponibilizada no DE de 13/09/2018.
Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª Turma , por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal FÁBIO VITÓRIO MATTIELLO
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 20:35:26.