Apelação Cível Nº 5001410-97.2017.4.04.7102/RS
RELATOR: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
APELANTE: CARLOS EUGENIO VENTURINI MARTINS (AUTOR)
ADVOGADO: IRENA SACHET MASSONI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
CARLOS EUGÊNIO VENTURINI MARTINS propôs ação ordinária contra o Instituto Nacional de Seguro Social - INSS, em 21/02/2017, postulando a concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento do tempo de serviço na condição de menor aprendiz.
Em 09/03/2018 sobreveio sentença (ev. 60) que julgou improcedente o pedido formulado na inicial.
Inconformada a parte autora interpôs recurso de apelação (ev. 67), aduzindo, em síntese, ser impossível a prova da contraprestação do labor na condição de menor aprendiz, o que não deve ser empecilho a comprovar o labor executado.
Com contrarrazões ao recurso vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Recebimento do recurso
Importa referir que a apelação da parte deve ser recebida, por ser própria, regular e tempestiva.
Período como aluno-aprendiz
O tempo de serviço como aluno-aprendiz pode ser computado como tempo de serviço para todos os efeitos.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça estabeleceu que o tempo exercido como aluno-aprendiz pode ser computado, desde que haja vínculo empregatício e retribuição pecuniária à conta dos cofres públicos. Esta é a posição adotada no julgamento do Resp. 251.621, Resp. 263.000, Resp. 207.382 e no Resp. 336.797. Neste último julgado, o Min. HAMILTON CARVALHIDO, esclareceu em seu voto:
' Ademais, é firme o entendimento desta Corte Superior de Justiça no sentido de que o tempo de estudante prestado como aluno-aprendiz em escola técnica pode ser computado para fins de averbação de tempo de serviço, visando à concessão de benefícios previdenciários, desde que haja vínculo empregatício e retribuição pecuniária'.
Destarte, se exige que tenha existido retribuição pecuniária pela aprendizagem, caracterizando um vínculo empregatício. Nesse sentido, sobreveio a Súmula n° 96 do Tribunal de Contas da União:
'Conta-se para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas para terceiros.'
Nesse sentido o Acórdão 2024/2005 (nº interno AC-2024-46/05-P, processo 016.271/2003-9, Rel. Ministro Lincoln Magalhães da Rocha esclarecendo o sentido da Súmula 96 daquela Corte, representou um marco na orientação adotada pelo TCU, tendo sido assentado, em linhas gerais, o seguinte:
a) a simples percepção de auxílio financeiro não é suficiente para caracterizar a condição de aluno-aprendiz, que somente ocorre nos períodos em que os alunos efetivamente laboraram para o atendimento de encomendas recebidas pelas escolas;
b) a emissão de certidão de tempo de serviço de aluno-aprendiz deve estar baseada em documentos que comprovem o labor do então estudante na execução de encomendas recebidas pela escola e deve expressamente mencionar o período trabalhado, bem assim a remuneração percebida;
c) a simples percepção de auxílio financeiro ou em bens não é condição suficiente para caracterizar a condição de aluno-aprendiz, uma vez que pode resultar da concessão de bolsas de estudo ou de subsídios diversos concedidos aos alunos;
d) as certidões emitidas devem considerar apenas os períodos nos quais os alunos efetivamente laboraram, ou seja, indevido o cômputo do período de férias escolares;
e) não se admite a existência de aluno-aprendiz para as séries iniciais anteriormente à edição da Lei n º 3.552, de 16 de janeiro de 1959, a teor do art. 4º do Decreto-lei n.º 8.590, de 8 de janeiro de 1946.
Do voto proferido pelo Ministro Lincoln Magalhães da Rocha no Processo 016.230/2003-6 colhe-se o seguinte excerto:
"...
3. A orientação deste Tribunal sobre a matéria vem sendo no sentido de admitir a contagem do tempo de aluno-aprendiz para fins de aposentadoria, desde que comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, consoante a Súmula/TCU-96, in verbis:
"Conta-se para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado, na qualidade de aluno-aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas para terceiros."
4. A contagem do referido tempo é admitida por força dos artigos 67 e 69 do Decreto-lei 4.073/42 e 2º e 3º e 5º, do Decreto-lei 8.590/46, que constituem o fundamento da Súmula.
5. De acordo com os dispositivos citados, os alunos aprendizes detinham a condição de empregados nas escolas de aprendizagem e o pagamento de sua mão-de-obra era realizada à conta de recursos consignados anualmente no Orçamento da União.
6. O entendimento deste Tribunal era o de que essa sistemática havia vigorado até a edição da Lei 3.552/59, que, em seu artigo 32 e parágrafo único, determinou que a referida mão-de-obra passaria a ser remunerada com o pagamento das encomendas e não mais à conta do Orçamento. Por conseguinte, o trabalho realizado por aluno-aprendiz a partir de 17.02.1959, data em que começou a vigorar a Lei 3.552/59, não mais se enquadrava nos casos especificados pela Súmula 96 e desse modo não poderia mais ser computado para fins de aposentadoria.
7. Em face dessa orientação, a Sefip ao verificar que o Sr. Cláudio Roberto Marques da Silva havia exercido atividades como aluno-aprendiz posteriormente à edição da Lei 3.552/59, concluiu que o tempo em comento não poderia ser aproveitado para a sua inativação.
10. Todavia, vale ressaltar que este Tribunal reviu essa compreensão quanto ao aproveitamento do tempo de exercício como aluno-aprendiz após a edição da Lei 3.552/59, mediante o Acórdão 2024/2005-Plenário (in Ata 46/2005, Sessão de 23/11/2005), em face de diversas deliberações no âmbito do Judiciário, em especial do Superior Tribunal de Justiça - STJ, prevendo o cômputo, como tempo de serviço, para fins previdenciários, do período de estudos como aluno-aprendiz junto a escolas técnicas, à conta do orçamento da União, ainda que sob a vigência da Lei 3.552/59 (Acórdãos 264132, 262991, 217162, 246581, dentre vários outros).
.................... (omissis)
14. O Exmo. Sr. Ministro Benjamin Zymler, naquela oportunidade, apresentou voto revisor e ao reportar-se à jurisprudência atual do STJ no sentido de permitir o cômputo do tempo de aluno-aprendiz para fins de aposentadoria pelo regime geral, em virtude da contagem recíproca de tempo de serviço, prevista no § 9º do artigo 201 da Constituição Federal, expôs o seu entendimento de que deve esta Corte de Contas acompanhar essa compreensão, contudo, orientando as diversas entidades federais de ensino sobre os fundamentos para emissão de certidão de tempo de serviço, a serem utilizadas para a obtenção de benefícios do regime geral ou do regime próprio de previdência.
15. Por essa razão, ante a contribuição do ilustre Ministro, fez-se constar no item 9.3 do Acórdão 2024/2005-Plenário em comento determinação à Secretaria Federal de Controle Interno para que orientasse as diversas escolas federais de ensino profissionalizante no sentido de que:
"9.3.1. a emissão de certidão de tempo de serviço de aluno-aprendiz deve estar baseada em documentos que comprovem o labor do então estudante na execução de encomendas recebidas pela escola e deve expressamente mencionar o período trabalhado, bem assim a remuneração percebida;
9.3.2. a simples percepção de auxílio financeiro ou em bens não é condição suficiente para caracterizar a condição de aluno-aprendiz, uma vez que pode resultar da concessão de bolsas de estudo ou de subsídios diversos concedidos aos alunos;
9.3.3. as certidões emitidas devem considerar apenas os períodos nos quais os alunos efetivamente laboraram, ou seja, indevido o cômputo do período de férias escolares;
9.3.4. não se admite a existência de aluno-aprendiz para as séries iniciais anteriormente à edição da Lei nº 3.552, de 16 de janeiro de 1959, a teor do art. 4º do Decreto-lei nº 8.590, de 8 de janeiro de 1946".
(Acórdão 241/2006 - Segunda Câmara. Número Interno do Documento AC-0241-04/06-2. Grupo/Classe/Colegiado: Grupo II / Classe V / Segunda Câmara. Processo 016.230/2003-6. Relator: Ministro LINCOLN MAGALHÃES DA ROCHA)
Segue a ementa do precedente cujo voto foi acima parcialmente transcrito:
Aposentadoria. Processo consolidado. Cômputo para fins de inativação do Sr. Cláudio Roberto Marques da Silva de tempo de serviço prestado como aluno-aprendiz após o advento da Lei 3.552/59. Nova orientação sobre a matéria ante a jurisprudência atual do STJ. Acórdão 2024/2005-TCU- Plenário. Possibilidade do cômputo do tempo de aluno-aprendiz mesmo após a edição da Lei 3.552/59 para a obtenção da aposentadoria, desde que devidamente comprovado mediante certidão de tempo de serviço emitida, observando-se a orientação presente no item 9.3. do Acórdão 2024/2005-Plenário. Diligência nesse sentido. Legalidade dos atos em favor dos demais servidores. Registro. (Acórdão 241/2006 - Segunda Câmara. Número Interno do Documento AC-0241-04/06-2. Grupo/Classe/Colegiado: Grupo II / Classe V / Segunda Câmara. Processo 016.230/2003-6. Relator: Ministro LINCOLN MAGALHÃES DA ROCHA)
As diretrizes estabelecidas pela Corte de Contas não vinculam os órgãos judiciais. Prestam-se apenas para auxiliar no balizamento a ser definido para fins de reconhecimento do tempo de serviço desenvolvido como aluno-aprendiz.
E neste Tribunal prevalece o entendimento de que para o reconhecimento de tempo de serviço como aluno-aprendiz há necessidade de comprovação de que, em rigor, o estudante prestava serviço à entidade ou, por intermédio dela, a terceiros, e que recebia por conta desta prestação alguma retribuição, ainda que indireta, não bastando a simples menção a percepção de qualquer auxílio, já que pode resultar da concessão de bolsas de estudo ou de subsídios diversos concedidos aos alunos. Enfim, deve ser apresentada documentação que evidencie, de alguma forma, um exercício profissional, não sendo admissível, ademais, o aproveitamento dos períodos de férias.
No caso concreto, a parte autora comprovou que estudou em escola agrícola, Colégio Politécnico da UFSM, de 1976 a 1982, somando 1.641 dias, conforme a Certidão de página 83 do ev. 11.
Como destacado na sentença são duas condições para o reconhecimento do período de aluno-aprendiz: (a) prestação de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz e (b) retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas por terceiros.
Tais condições não restaram comprovadas nos autos pelos documentos juntados. Dessa forma, deve ser confirmada a sentença que não reconheceu os períodos como aluno aprendiz, bem como o direito à concessão da aposentadoria pela falta de tempo de contribuição.
Honorários advocatícios e custas processuais
Os honorários advocatícios seguem a sistemática prevista no artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015. Considerando o trabalho adicional em grau de recurso, aplica-se o comando do § 11º do referido artigo.
Assim, estabeleço a majoração da honorária para 15% sobre o valor atualizado da causa, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC/2015. A exigibilidade de tais verbas permanecerá sobrestada até modificação favorável da situação econômica da parte autora (artigo 98, § 3º, do CPC/2015).
Caso o valor atualizado da causa venha a superar o valor de 200 salários mínimos previsto no § 3º, inciso I, do artigo 85 do CPC/2015, o excedente deverá observar o percentual médio da faixa subsequente, e assim sucessivamente, na forma do §§ 4º, inciso III, e 5º do referido dispositivo legal.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora.
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Apelação Cível Nº 5001410-97.2017.4.04.7102/RS
RELATOR: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
APELANTE: CARLOS EUGENIO VENTURINI MARTINS (AUTOR)
ADVOGADO: IRENA SACHET MASSONI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. tempo de serviço. ALUNO-APRENDIZ. NÃO COMPROVAÇÃO.
1. Para fins de reconhecimento do tempo de serviço prestado na condição de aluno-aprendiz, é necessária a comprovação dos seguintes requisitos: (1) prestação de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz e (2) retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de (a) alimentação, (b) fardamento, (c) material escolar e (d) parcela de renda auferida com a execução de encomendas por terceiros. 2. Hipótese na qual não restou comprovada a qualidade de aluno-aprendiz do autor, durante o período alegado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 23 de outubro de 2018.
Documento eletrônico assinado por FÁBIO VITÓRIO MATTIELLO, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000659667v2 e do código CRC 14564f76.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 23/10/2018
Apelação Cível Nº 5001410-97.2017.4.04.7102/RS
RELATOR: Juiz Federal FÁBIO VITÓRIO MATTIELLO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: CARLOS EUGENIO VENTURINI MARTINS (AUTOR)
ADVOGADO: IRENA SACHET MASSONI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 23/10/2018, na sequência 125, disponibilizada no DE de 08/10/2018.
Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª Turma , por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal FÁBIO VITÓRIO MATTIELLO
Votante: Juiz Federal FÁBIO VITÓRIO MATTIELLO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 20:39:04.