Apelação Cível Nº 5008020-86.2018.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO RODRIGUES DOS SANTOS
RELATÓRIO
Trata-se de ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, na qual a parte autora relata que 'requereu a concessão do benefício de Benefício de Aposentadoria por Tempo de Contribuição com averbação do tempo de serviço, no dia 17/09/2015, com NB n° 42/171.952.810- 9. No entanto, foi indeferido pela via rural administrativa, sob o argumento de falta de tempo de contribuição. Requereu averbação do período rural de 05/06/1975 a 30/04/1981, assim como do período anotado em CTPS 01/08/1986 a 05/01/1987. Da mesma forma, solicitou a conversão do período 05/06/1975 a 30/04/1981, 01/05/1981 a 31/12/1981, 01/01/1982 a 13/04/1985, 01/06/1985 a 23/04/1986, 01/08/1986 a 05/01/1987, 01/09/1987 a 31/12/1995, 01/09/1996 a 20/08/1999, 12/04/2007 a 22/06/2007, com a realização de perícia judicial na Fazenda Panema – Leópolis – Paraná e a conversão do período 01/04/2010 a 26/03/2015. Por conseguinte, requereu a procedência da demanda para concessão da aposentadoria por tempo integral e o pagamento pagamento das parcelas vencidas desde a DER e vincendas, monetariamente corrigidas pelo IGP-DI desde o respectivo vencimento) e acrescidas de juros legais e moratórios de 1% a.m. a partir da citação incidentes até a data do efetivo pagamento.'
Sentenciando em 19/07/2016, o juízo a quo julgou o pedido nos seguintes termos:
Diante do exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial para condenar o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS a:
a) a averbar o período de 05/06/1975 a 30/04/1985 laborado no meio rural sem anotação em CTPS;
b) a averbar o período de 01/08/1986 A 05/01/1987 laborado no meio rural com anotação em CTPS
c) averbar a conversão judicial dos períodos de 05/06/1975 a 30/04/1981, 01/05/1981 a 31/12/1981; 01/01/1982 a 13/04/1985, 01/06/1985 a 23/04/1986, 01/08/1986 a 05/01/1987, 01/09/1987 a 31/12/1995; 01/09/1996 a 20/08/1999 e de 01/04/2010 a 26/03/2015 que juntos importam em acréscimo de 11 anos, para todos os fins previdenciários, em favor do autor.
d) conceder o benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição ao autor JOÃO RODRIGUES DOS SANTOS, da forma mais favorável ao autor, com início na data do requerimento administrativo do pedido, quando já teria direito ao benefício. A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação, e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam - IPCA-E (a partir de 30/06/2009, conforme RE 870.947, julgado em 20/09/2017) com incidência a partir da reafirmação da DER.
A partir de 30/06/2009, os juros incidem de uma só vez, de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei n.º 9.494/1997, com incidência a partir da reafirmação da DER.
Condeno ainda, o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS ao pagamento dos honorários advocatícios em favor do (s) procurador(es) do autor, arbitrados em 10% sobre o valor da condenação incidente sobre as prestações vencidas, os honorários advocatícios, com incidência a partir da data em que reafirmada a DER. Assim procedo à vista do que preceitua a Súmula 111 do STJ: “Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre prestações vencidas após a Sentença”.
Irresignado, apela o INSS. Argui que não restou comprovada a exposição habitual e permanente em níveis que justifiquem a contagem de tempo especial no período de 05/06/1975 A 30/04/1981. Ao final, defende a reforma da sentença em relação aos consectários legais para que seja observado o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, na redação dada pela Lei nº 11.960/09, para fins de correção monetária e de juros sobre as parcelas eventualmente devidas pela Autarquia.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
MÉRITO
A controvérsia no plano recursal restringe-se:
- ao reconhecimento do exercício de atividade especial no(s) período(s) de 05/06/1975 A 30/04/1981;
- aos critérios definidos para correção monetária e juros das eventuais diferenças devidas.
TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL
Inicialmente, ressalte-se que deve ser observada, para fins de reconhecimento da especialidade, a lei em vigor à época em que exercida a atividade, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.
Assim, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o considere como especial, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova mais restritiva. Esse, inclusive, é o entendimento da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AGREsp n. 493.458/RS, 5ª Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJU de 23/06/2003; e REsp n. 491.338/RS, 6ª Turma, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 23/06/2003), a qual passou a ter previsão legislativa expressa com a edição do Decreto n.º 4.827/03, que inseriu o § 1º no art. 70 do Decreto n.º 3.048/99.
Feita essa consideração e tendo em vista a sucessão de leis que disciplinam a matéria, necessário, preliminarmente, verificar qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, que se encontrava vigente nada data em que exercida a atividade que se pretende ver reconhecida a especialidade.
Verifica-se, assim, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:
a) até 28/04/1995, quando vigente a Lei nº 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e, posteriormente, a Lei n° 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial; ou, ainda, quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor, que exigem a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a existência ou não de nocividade (STJ, AgRg no REsp n. 941885/SP, 5ª Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe de 04/08/2008; e STJ, REsp n. 639066/RJ, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ de 07/11/2005);
b) a partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção daquelas a que se refere a Lei n° 5.527/68, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória nº 1.523, de 14/10/1996, que revogou expressamente a Lei em questão - de modo que, no interregno compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n° 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, como já salientado;
c) a partir de 06/03/1997, data da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória nº 1.523/96 (convertida na Lei nº 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos, por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Saliente-se, ainda, que é admitida a conversão de tempo especial em comum após maio de 1998, consoante entendimento firmado pelo STJ, em decisão no âmbito de recurso repetitivo, (REsp n.º 1.151.363/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011).
Por fim, observo que, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), nº 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo II) até 28/04/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas.
Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e n. 83.080/79 (Anexo I) até 05/03/1997, e os Decretos n. 2.172/97 (Anexo IV) e n. 3.048/99 a partir de 06/03/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto nº 4.882/03.
Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível, também, a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula nº. 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP n° 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJU de 30/06/2003).
FATOR DE CONVERSÃO
Registre-se que o fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é aquele previsto na legislação aplicada na data concessão do benefício e no cálculo de sua renda mensal inicial, e não o contido na legislação vigente quando o serviço foi prestado. A propósito, a questão já foi pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de Recurso Especial Repetitivo (REsp 1151363/MG, Relator Ministro Jorge Mussi, 3ª Seção, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011).
AGENTE NOCIVO RUÍDO
Especificamente quanto ao agente nocivo ruído, a comprovação da especialidade da atividade laboral pressupõe a existência de parecer técnico atestando a exposição do segurado a níveis de pressão sonora acima dos limites de tolerância.
Referidos limites foram estabelecidos, sucessivamente, no Quadro Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, o Anexo IV do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, e o Anexo IV do Decreto nº 3.048, de 06/05/1999, alterado pelo Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, os quais consideram insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 80, 85 e 90 decibéis, de acordo com os Códigos 1.1.6, 1.1.5, 2.0.1 e 2.0.1.
Quanto ao período anterior a 05/03/1997, já foi pacificado pela Seção Previdenciária desta Corte (EIAC 2000.04.01.134834-3/RS, Rel. Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJU, Seção 2, de 19/02/2003, p. 485) e também no âmbito do INSS na esfera administrativa (IN nº 57/2001 e posteriores), que são aplicáveis concomitantemente, para fins de enquadramento, os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79 até 05/03/1997, data imediatamente anterior à publicação do Decreto nº 2.172/97. Desse modo, até então, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto nº 53.831/64.
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, em 06/03/1997, o nível de tolerância ao ruído, considerado salubre, passou para até 90 decibéis. Posteriormente, o Decreto nº 4.882/03, de 19/11/2003 estabeleceu o referido limite em 85 decibéis.
Em face da controvérsia existente acerca da possibilidade de aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, já que mais benéfico ao segurado, em 14/05/2014, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp nº 1.398.260-PR, em sede de Recurso Especial Repetitivo, firmou entendimento sobre a matéria, nos seguintes termos:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO RETROATIVA DO DECRETO 4.882/2003 PARA RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6/3/1997 a 18/11/2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB. De início, a legislação que rege o tempo de serviço para fins previdenciários é aquela vigente à época da prestação, matéria essa já abordada de forma genérica em dois recursos representativos de controvérsias, submetidos ao rito do art. 543-C do CPC (REsp 1.310.034-PR, Primeira Seção, DJe 19/12/2012 e REsp 1.151.363-MG, Terceira Seção, DJe 5/4/2011). Ademais, o STJ, no âmbito de incidente de uniformização de jurisprudência, também firmou compreensão pela impossibilidade de retroagirem os efeitos do Decreto 4.882/2003. (Pet 9.059-RS, Primeira Seção, DJe 9/9/2013). Precedentes citados: AgRg no REsp 1.309.696-RS, Primeira Turma, DJe 28/6/2013; e AgRg no REsp 1.352.046-RS, Segunda Turma, DJe 8/2/2013. REsp 1.398.260-PR, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 14/5/2014.
Portanto, deve-se adotar os seguintes níveis de ruído para fins de reconhecimento do tempo de serviço especial: superior a 80 dB(A) até 05/03/1997, superior a 90 dB(A) entre 06/03/1997 a 18/11/2003 e superior a 85 dB(A) a partir de 19/11/2003.
AGENTES QUÍMICOS
Sinale-se que a exigência relativa à necessidade de explicitação da composição e concentração dos agentes químicos a que o segurado estava exposto, não encontra respaldo na legislação previdenciária, a qual reconhece a especialidade do labor quando existe contato com agentes químicos nocivos à saúde, elencados na legislação de regência. Nesse sentido: Embargos Infringentes nº 5004090-13.2012.404.7108, 3ª Seção, Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, por unanimidade, juntado aos autos em 06/12/2013.
EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL - EPI
A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP 1.729/12/1998, convertida na Lei 9.732, de 11/12/1998, que alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/1991, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Esse entendimento, inclusive, foi adotado pelo INSS na Instrução Normativa 45/2010.
A partir de dezembro de 1998, quanto à possibilidade de desconfiguração da natureza especial da atividade em decorrência de EPIs, o STF ao julgar o ARE 664.335, submetido ao regime de repercussão geral (tema 555), Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014 e publicado em 12/02/2015, fixou duas teses:
1) "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial"; e
2) "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Ressalte-se, por fim, que para afastar o caráter especial das atividades desenvolvidas pelo segurado é necessária uma efetiva demonstração da elisão das consequências nocivas, além de prova da fiscalização do empregador sobre o uso permanente dos dispositivos protetores da saúde do obreiro durante toda a jornada de trabalho.
INTERMITÊNCIA NA EXPOSIÇÃO AOS AGENTES NOCIVOS
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física, referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, mas sim que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades do trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de caráter eventual. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho. Nesse sentido vem decidindo esta Corte (EINF n.º 2007.71.00.046688-7, 3ª Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 07/11/2011; EINF nº 0004963-29.2010.4.04.9999, 3ª Seção, Relatora Vivian Josete Pantaleão Caminha, D.E. 12/03/2013; EINF n° 0031711-50.2005.4.04.7000, 3ª Seção, Relator Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 08/08/2013).
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, 3ª Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF 2008.71.99.002246-0, 3ª Seção, Relator Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).
Adotando-se tal entendimento, é possível concluir-se que, em se tratando de agentes biológicos, é desnecessário que o contato se dê de forma permanente, já que o risco de contágio independe do tempo de exposição (vide TRF4, 3ª Seção, EIAC nº 2000.04.01.034170-5/SC, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU 20/10/2004).
EXAME DO TEMPO ESPECIAL NO CASO CONCRETO
Passo, então, ao exame do (s) período(s) controvertido(s) nesta ação, com base nos elementos contidos nos autos e na legislação de regência, para concluir pelo cabimento ou não do reconhecimento da natureza especial da atividade desenvolvida. Para tanto trago fração do comando sentencial que assim analisou a questão:
Dos agentes biológicos:
Alega o autor que esteve exposto a agentes biológicos insalubres quando trabalhava com sua família no meio rural.
Importante citar os trechos do Laudo Técnico Pericial de evento nº 56.1, o qual destacou que:
“O Autor fazia manejo de rebanhos, andava no curral, tendo contato com couro, pêlos e dejeções de animais, os quais são vetores para algumas doenças citadas. De acordo com a NR 15, Anexo 14 – Agentes biológicos, Insalubridade em grau médio: estábulos e cavalariças, o Autor se enquadra perfeitamente nesta situação, visto estar em contato direto com animais no curral e no campo, podendo contaminar-se com uma das doenças listadas acima.”
Assim, ficou demostrado que a parte autora encontrava-se exposta de maneira habitual e permanente aos agentes biológicos no período de 05/06/1975 a 30/04/1981, o qual passa a ter um acréscimo de 2 anos, 04 meses e 10 dias, ante a aplicação do fator de aplicação 1.4.
Entendo que o reconhecimento da especialidade no referido entretempo merece correção, pois não se fez qualquer prova que o segurado esteve em contato com riscos biológicos, tais como parasitoses, infecções agudas e crônicas em animais, reações alérgicas ou intoxicações provocadas por plantas ou animais. Necessário se faz, portanto, para o reconhecimento da especialidade, o contato com animais infectados.
O simples manejo de animais sadios e os cuidados necessários com o rebanho e criações em geral não tem o condão de presumir o risco biológico a ensejar o reconhecimento da especialidade laborativa. A pensar assim, qualquer trabalhador do campo, sem prova de risco de agente biológico, tem direito a contagem do sobretempo.
Rogando venia, trago fração do recurso de apelação, cujas razões de irresignação procedem:
O cargo ocupado pelo recorrido, por si só, não caracteriza o exercício de atividade insalubre, não se enquadrando em nenhum dos itens do Anexo do Dec. 83080/79 nem do Anexo do Decreto n.º 53.831/1964, que classifica as atividades profissionais em que o mero exercício já garante a insalubridade.
Se analisarmos os Anexos aos Regulamento Aprovado Pelo Decreto Nº 83.080/79 e Decreto n.º 53.831/1964 (Classificação de Atividades Segundo os Agentes Nocivos) veremos que os agentes indicados não se enquadram em nenhuma das hipóteses previstas pela legislação aplicável.
O ANEXO do Decreto n.º 53.831/1964 diz que:
(quadros sem formatação)
1.3.1 Carbúnculo, brucela, mormo e tétano. Operações industriais com animais ou produtos oriundos de animais infectados Trabalhos permanentes expostos ao contato direto com germes infecciosos - Assistência Veterinária, serviços em matadouro, cavalariças e outros Insalubre 25 anos Jornada normal Art. 187 CLT Portaria Ministerial 262, de 06.08.1962.
Já o Anexo ao Regulamento aprovado pelo Decreto n.º 83.080, de 24.01.1979 elenca:
1.3.1 Carbúnculo Brucela, mormo, tuberculose e tétano Trabalhos permanentes em que ha ja contacto com produtos de animais infectados. Trabalhos permanentes em que haja contacto com carnes, visceras, glândulas, sangue, ossos, pelos, dejeções de animais infectados (atividades discriminadas entre as do código 2.1.3 do Quadro II: médicos, veterinários, enfermeiros e técnicos de laboratório).
1.3.2 Animais doentes e materiais infecto - contagiantes Trabalhos permanentes expostos ao contato com animais doentes ou materiais infecto - contagiantes (atividades discrimiadas entre as do código 2.1.3 do Quadro II: médicos, veterinários, enfermeiros e técnicos de laboratório).
Assim, para fazer jus ao reconhecimento especial deveria o recorrido comprovar que trabalhava em contato direto com animais doentes e infectados, o que não é o caso, já que, como segurado especial, lidava, eventualmente, com animais próprios para o consumo.
Considerando a não comprovação à exposição habitual e permanente aos agentes invocados pela decisão, requer a reforma da sentença.
Conclusão: os agentes nocivos não são elencados como especiais para o reconhecimento da natureza especial do labor, devendo ser reformada a sentença no ponto.
CONSECTÁRIOS LEGAIS
Os consectários legais devem ser fixados nos termos que constam do Manual de Cálculos da Justiça Federal e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 que alterou a redação do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/1997, nos termos das teses firmadas pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 810 (RE 870.947) e pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 905 (REsp 1.492.221/PR).
Nesse curso, dou parcial provimento ao recurso do INSS no tocante.
REQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
CONCLUSÃO
Provida a apelação do INSS para afastar o reconhecimento da natureza especial do labor no período de 05/06/1975 A 30/04/1981.
Adequados os consectários legais, na forma dos julgamentos dos Temas 810/STF e 905/STJ.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação do INSS.
Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001445211v6 e do código CRC d54e28c0.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 28/11/2019, às 15:33:34
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 05:35:53.
Apelação Cível Nº 5008020-86.2018.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO RODRIGUES DOS SANTOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. TRATO COM ANIMAIS SADIOS. AFASTADO RECONHECIMENTO DA ESPECIALIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.
1. O simples manejo de animais sadios e os cuidados necessários com o rebanho e criações em geral não tem o condão, por si só, de presumir o risco biológico a ensejar o reconhecimento da especialidade laborativa.
2. Para fazer jus ao reconhecimento especial deve o segurado comprovar que trabalhava em contato direto com animais doentes e infectados.
3. Consectários legais fixados nos termos do decidido pelo STF (Tema 810) e pelo STJ (Tema 905).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 26 de novembro de 2019.
Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001445212v4 e do código CRC d636bd70.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 28/11/2019, às 15:33:34
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 05:35:53.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 26/11/2019
Apelação Cível Nº 5008020-86.2018.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO RODRIGUES DOS SANTOS
ADVOGADO: THAIS TAKAHASHI (OAB PR034202)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 26/11/2019, às 10:00, na sequência 98, disponibilizada no DE de 11/11/2019.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Juiz Federal MARCOS JOSEGREI DA SILVA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 05:35:53.