APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5005414-04.2014.4.04.7129/RS
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | PAULO LUIZ GAZONI |
ADVOGADO | : | IMILIA DE SOUZA |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. APOSENTADORIA ESPECIAL. AUSÊNCIA DE DANOS MORAIS.
1. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida.
2. Tem direito à aposentadoria especial o segurado que possui 25 anos de tempo de serviço especial e implementa os demais requisitos para a concessão do benefício.
3. As normas que versam sobre correção monetária e juros possuem natureza eminentemente processual, e, portanto, as alterações legislativas referentes à forma de atualização monetária e de aplicação de juros, devem ser observadas de forma imediata a todas as ações em curso, incluindo aquelas que se encontram na fase de execução.
4. Visando não impedir o regular trâmite dos processos de conhecimento, firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público, a forma como será apurada a atualização do débito deve ser diferida (postergada) para a fase de execução, observada a norma legal em vigor.
5. Incabível indenização por dano moral em razão do indeferimento administrativo do benefício previdenciário, pois não possui o ato, de regra, o condão de provocar danos morais ao segurado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa necessária, julgar prejudicada a apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação da parte autora e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de setembro de 2016.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8535514v3 e, se solicitado, do código CRC C71B1B77. | |
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| Signatário (a): | Rogerio Favreto |
| Data e Hora: | 14/09/2016 12:25 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5005414-04.2014.4.04.7129/RS
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | PAULO LUIZ GAZONI |
ADVOGADO | : | IMILIA DE SOUZA |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação de rito ordinário proposta por PAULO LUIZ GAZONI contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, postulando a concessão de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento da natureza especial, prejudicial à saúde ou à integridade física, de atividades laborais que alega ter desenvolvido nos períodos de 18/11/1980 a 28/02/1984, 02/04/1984 a 05/02/1988, 08/02/1988 a 04/01/1989, 10/02/1989 a 29/12/1992 e 11/01/1993 a 10/10/2013. Requer a conversão do trabalho comum em especial pelo fator 0,71, caso algum período anterior a 28/04/1995 não seja reconhecido como especial. Subsidiariamente, requer a concessão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição. Pede, também, a condenação do INSS ao pagamento de indenização por danos morais.
Sentenciando, o juízo "a quo" julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo a especialidade do tempo de serviço nos períodos de 18/11/1980 a 28/02/1984, 11/01/1993 a 02/12/1998 e 19/11/2003 a 10/10/2013, concedendo à parte autora aposentadoria por tempo de contribuição, na sistemática de cálculo mais benéfica, com incidência do fator previdenciário. Condenou o INSS ao pagamento das parcelas vencidas, fixando correção monetária e juros moratórios. Considerando a sucumbência recíproca, que reputou equivalente, condenou as partes a arcarem com honorários advocatícios num total de 10% (dez por cento) sobre o montante devido até a data da sentença, sendo 5% para cada parte, cuja compensação determinou. Deixou de condenar os litigantes em custas. Submeteu a sentença ao reexame necessário.
Irresignado, o autor apresentou recurso sustentando que a sentença incorreu em erro material ao reconhecer a especialidade de 19/11/2003 a 10/10/2013 e depois fazer constar 19/11/2003 a 10/10/2003. Em relação aos períodos de 02/04/1984 a 05/02/1988, 08/02/1988 a 04/01/1989 e 10/02/1989 a 29/12/1992, sustenta que restou comprovada a exposição a hidrocarbonetos. Quanto ao período de 19/11/2003 a 10/10/2013, alega que deve ser também reconhecida a especialidade pela exposição a hidrocarbonetos, uma vez que não pode haver presunção de que os equipamentos de proteção individual foram fornecidos e utilizados. Sustenta que o período de 06/03/1997 a 18/11/2003 deve ser reconhecido como laborado em condições especiais, em vista do potencial nocivo que a exposição ao ruído superior a 85 decibéis causa à saúde e à integridade física. Pede o reconhecimento do direito à conversão dos períodos de labor não reconhecidos como especiais, anteriores a 28/04/1995, em tempo especial, pela aplicação do fator de conversão 0,71. Requer a concessão da aposentadoria especial, desde a DER ou desde a data em que implementadas as condições à aposentação, e, subsidiariamente, a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, sem a incidência do fator previdenciário ou apenas com a aplicação proporcional do fator no cálculo da RMI da aposentadoria; a condenação do INSS ao pagamento de indenização por danos morais; além da condenação da Autarquia Ré ao pagamento de honorários advocatícios.
Inconformado, o INSS interpôs apelação, requerendo a reforma da sentença, para que seja adotada a sistemática prevista na Lei nº 9.494/1997.
Contra-arrazoados os recursos, subiram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Novo CPC (Lei 13.105/2015):
Direito intertemporal e disposições transitórias
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesses termos, para fins de remessa necessária e demais atos recursais, bem como quanto aos ônus sucumbenciais, aplica-se a lei vigente na data em que proferida a decisão recorrida.
MÉRITO
Destaco que a controvérsia no plano recursal restringe-se:
- ao reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 18/11/1980 a 28/02/1984, 02/04/1984 a 05/02/1988, 08/02/1988 a 04/01/1989, 10/02/1989 a 29/12/1992 e 11/01/1993 a 10/10/2013;
- à possibilidade de conversão do trabalho comum em especial pelo fator 0,71, caso algum período anterior a 28/04/1995 não seja reconhecido como especial;
- à consequente concessão de aposentadoria especial ou da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição;
- ao direito à indenização por danos morais.
TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL
O tempo de serviço especial é disciplinado pela lei vigente à época em que exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço, o segurado adquire o direito à sua contagem pela legislação então vigente, não podendo ser prejudicado pela lei nova. Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (AGRESP 493.458/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª Turma, DJU 23/06/2003, e REsp 491.338/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJU 23/06/2003), a qual passou a ter previsão legislativa expressa com a edição do Decreto n.º 4.827/03, que inseriu o § 1º no art. 70 do Decreto n.º 3.048/99.
Isso assentado, e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade profissional enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para ruído, em que necessária sempre a aferição do nível de decibéis (dB) por meio de parecer técnico trazido aos autos, ou simplesmente referido no formulário padrão emitido pela empresa;
b) a partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95, no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico;
c) após 06/03/1997, quando vigente o Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei n.º 9.528/97, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Essa interpretação das sucessivas normas que regulam o tempo de serviço especial está conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 415.298/SC, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 06/04/2009; AgRg no Ag 1053682/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 08/09/2009; REsp 956.110/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/10/2007; AgRg no REsp 746.102/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 07/12/2009).
Agente Nocivo Ruído
Especificamente quanto ao agente nocivo ruído, a comprovação da especialidade da atividade laboral pressupõe a existência de parecer técnico atestando a exposição do segurado a níveis de pressão sonora acima dos limites de tolerância.
Referidos limites foram estabelecidos, sucessivamente, no Quadro Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, o Anexo IV do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, e o Anexo IV do Decreto nº 3.048, de 06/05/1999, alterado pelo Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, os quais consideram insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 80, 85 e 90 decibéis, de acordo com os Códigos 1.1.6, 1.1.5, 2.0.1 e 2.0.1.
Quanto ao período anterior a 05/03/97, já foi pacificado, em sede da Seção Previdenciária desta Corte (EIAC 2000.04.01.134834-3/RS, Rel. Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJU, Seção 2, de 19/02/2003, p. 485) e também do INSS na esfera administrativa (Instrução Normativa nº 57/2001 e posteriores), que são aplicáveis concomitantemente, para fins de enquadramento, os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79 até 05/03/97, data imediatamente anterior à publicação do Decreto nº 2.172/97. Desse modo, até então, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto nº 53.831/64.
Com a edição do Decreto nº 2.172/1997, em 06/03/1997, o nível de tolerância ao ruído, considerado salubre, passou para até 90 decibéis. Posteriormente, o Decreto nº 4.882/2003, de 19/11/2003 estabeleceu o referido limite em 85 decibéis.
No dia 14/05/2014, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, julgou o Recurso Especial nº 1.398.260-PR, estabelecendo o seguinte:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO RETROATIVA DO DECRETO 4.882/2003 PARA RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6/3/1997 a 18/11/2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB. De início, a legislação que rege o tempo de serviço para fins previdenciários é aquela vigente à época da prestação, matéria essa já abordada de forma genérica em dois recursos representativos de controvérsias, submetidos ao rito do art. 543-C do CPC (REsp 1.310.034-PR, Primeira Seção, DJe 19/12/2012 e REsp 1.151.363-MG, Terceira Seção, DJe 5/4/2011). Ademais, o STJ, no âmbito de incidente de uniformização de jurisprudência, também firmou compreensão pela impossibilidade de retroagirem os efeitos do Decreto 4.882/2003. (Pet 9.059-RS, Primeira Seção, DJe 9/9/2013). Precedentes citados: AgRg no REsp 1.309.696-RS, Primeira Turma, DJe 28/6/2013; e AgRg no REsp 1.352.046-RS, Segunda Turma, DJe 8/2/2013. REsp 1.398.260-PR, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 14/5/2014.
Nesse contexto, deve-se adotar os seguintes níveis de ruído para fins de reconhecimento do tempo de serviço especial: superior a 80 decibéis, até a edição do Decreto n. 2.172/1997; superior a 90 decibéis, entre a vigência do Decreto n. 2.172/1997 e a edição do Decreto n. 4.882/2003; após a entrada em vigor do Decreto n. 4.882/2003, 85 decibéis.
Equipamento de Proteção Individual - EPI
A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 02 de junho de 1998, conforme reconhecido pelo próprio INSS por meio da Ordem de Serviço INSS/DSS nº 564/97, em vigor até a mencionada data.
Em período posterior a junho de 1998, a desconfiguração da natureza especial da atividade em decorrência de EPI"s é admissível desde que haja laudo técnico afirmando inequivocamente que a sua utilização pelo trabalhador reduziu efetivamente os efeitos nocivos do agente agressivo a níveis toleráveis, ou os neutralizou (STJ, REsp 720.082/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJ 10/04/2006, p. 279; TRF4, EINF 2001.72.06.002406-8, Terceira Seção, Relator Fernando Quadros da Silva, D.E. 08/01/2010). Para tanto, não basta o mero preenchimento dos campos específicos no PPP, onde simplesmente são respondidas as perguntas "EPI eficaz?" e "EPC eficaz?", sem qualquer detalhamento acerca da total elisão ou neutralização do agente nocivo.
Tratando-se de ruído, nem mesmo a comprovação de redução aos limites legais de tolerância pelo uso de EPI é capaz de eliminar a nocividade à saúde, persistindo a condição especial do labor já que a proteção não neutraliza as vibrações transmitidas para o esqueleto craniano e, através dele, para o ouvido interno. (Irineu Antônio Pedrotti, Doenças Profissionais ou do Trabalho, LEUD, 2ª ed., São Paulo, 1998, p. 538).
Nesta mesma linha, julgado do Colendo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral (ARE 664335, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-029 DIVULG 11-02-2015 PUBLIC 12-02-2015), firmou a seguinte tese: "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria."
Entendeu a Suprema Corte que "tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em limites acima do limite legal, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas. (...) Ainda que se pudesse aceitar que o problema causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores."
EXAME DO TEMPO ESPECIAL NO CASO CONCRETO
Passo, então, ao exame, em separado, de cada um dos períodos controvertidos nesta ação, com base nos elementos contidos nos autos e na legislação de regência, para concluir pelo cabimento ou não do reconhecimento da natureza especial da atividade desenvolvida.
1) Período: 18/11/1980 a 28/02/1984
Empresa: V. Viero & Filhos Ltda
Atividade/função: servente, setor canteiro de obras onde eram executadas obras de arte - pontes rodoviárias
Agente nocivo: enquadramento da atividade profissional
Prova: CTPS (evento7, PROCADM1, fl. 19), Formulário DSS-8030 (evento7, PROCADM1, fl. 32)
Análise da prova: o formulário indica que a parte autora trabalhou na construção de pontes rodoviárias.
Equipamento de Proteção Individual (EPI): tratando-se de período anterior a junho de 1998, a discussão sobre os efeitos do EPI perde relevância, conforme acima já explicitado.
Enquadramento legal: Trabalhadores em edifícios, barragens e pontes - item 2.3.3 do Anexo ao Decreto 53.831/64.
Conclusão: a atividade profissional é enquadrada como especial e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor, devendo ser confirmada a sentença no ponto.
2) Período: 02/04/1984 a 05/02/1988, 08/02/1988 a 04/01/1989 e 10/02/1989 a 29/12/1992
Empresa: Indústria de Calçados Flama Ltda.
Atividade/função: serviços gerais, contramestre, contra-mestre injetados
Agente nocivo: agentes químicos (hidrocarbonetos aromáticos e tóxicos orgânicos)
Prova: Formulário assinado pelo sindico da Massa Falida com base nas informações da CTPS do autor (evento7, PROCADM1, fl. 33), CTPS (evento7, PROCADM1, fls. 19/30), prova testemunhal (evento 30), laudo trabalhista e parecer técnico (evento1, PROCADM11, fls. 03/07 e PROCADM12)
Análise da prova: para o período de 02/04/1984 a 05/02/1988 foi realizada a oitiva das testemunhas Maria de Fátima Fredizzi e Teresinha de Fátima Kussler.
A testemunha Maria de Fátima Fredizzi esclareceu que foi colega do autor, na empresa Calçados Flama, a partir de outubro/1985; que trabalhavam com cola, nas solas e nas máquinas, e com thinner para limpar as máquinas e os calçados; que eram serviços gerais, que faziam de tudo, que trabalhavam em uma filial da empresa; que o autor era contramestre; que ele fazia de tudo; que ajudava a limpar os calçados; que ajudava nas esteiras; que auxiliava os funcionários; que abastecia as esteiras; que abastecia os funcionários com cola e thinner. Disse que o autor ensinava os novatos, que ele tinha contato com cola e solvente, que ele enchia as máquinas, que ele fazia isso diariamente. Referiu que tinha uma máquina de cola com cilindro, que a testemunha operava, que o contramestre enchia a máquina de cola, que passavam a sola com cola, que no final da tarde tiravam a cola e enchiam de thinner e o contra-mestre as limpava; que na empresa tinha balancim, canhão, uma esteira grande muito quente e várias outras máquinas.
A testemunha Teresinha de Fátima Kussler, por sua vez, afirmou que trabalhou com o autor de 1983 a 1986, na Flama, na filial, que o autor já trabalhava lá quando a autora entrou; que ele era contramestre; que a testemunha era serviços gerais; que o autor buscava os produtos; que ensinava o trabalho; que ensinava como usar as máquinas; que ensinava a limpar com solvente; que era o chefe; que buscava os materiais para os empregados; que o autor permanecia nas salas com os funcionários; que tirava cola com solvente e realizava todas as demais funções.
De acordo com a CTPS, o Autor ocupou o cargo de serviços gerais, contramestre e contramestre injetados junto à indústria calçadista, onde, costumeiramente, há exposição a agentes químicos. As testemunhas confirmam a exposição a colas e solventes.
O laudo trabalhista trazido pelo autor, da trabalhadora Alaides Maria da Encarnação, que desempenhava a atividade de serviços gerais, no período de 1983 a 1987, aponta a exposição ao agente ruído de 81 dB(A) e a agentes químicos nas tarefas de aplicar cola com pincel (hidrocarbonetos e tóxicos orgânicos). Assim, entendo comprovada a exposição a hidrocarbonetos.
Deixo de adotar o "parecer técnico" do evento 1, PROCADM12, formulado por engenheiro do trabalho que atuou em perícias na empresa Flama porque não se trata propriamente de perícia realizada na ocasião, mas de um "relato" das condições encontradas em outras inspeções realizadas. Ademais, o parecer não refere os setores em que o Autor trabalhou, concluindo que o trabalho nos setores corte, chanfração, costura, pré-fabricado, montagem, manutenção e almoxarifado eram insalubres e/ou periculosos.
Intermitência na exposição aos agentes nocivos
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho, e em muitas delas a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, vejam-se os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, de minha relatoria, D.E. 24/10/2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 07/11/2011.
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).
Equipamento de Proteção Individual (EPI): tratando-se de período anterior a junho de 1998, a discussão sobre os efeitos do EPI perde relevância, conforme acima já explicitado.
Enquadramento legal: Hidrocarbonetos - códigos 1.2.11 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64; 1.2.10 do Anexo I ao Decreto n.º 83.080/79.
Conclusão: o agente nocivo ao qual estava exposta a parte autora está elencado como especial e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor, devendo ser reformada a sentença no ponto.
3) Período: 11/01/1993 a 10/10/2013
Empresa: Killing S/A
Atividade/função: auxiliar de produção, operador de produção, operador polivalente, líder operacional, operador polivalente, líder operacional, setor adesivos
Agente nocivo:
Conforme PPP (evento7, PROCADM1, fls. 46/49):
11/01/1993 a 01/12/1996 ruído e hidrocarbonetos aromáticos;
02/12/1996 a 15/10/1998 ruído e hidrocarbonetos aromáticos;
16/10/1998 a 31/05/2002 ruído de 88 dB(A) e hidrocarbonetos aromáticos;
01/06/2002 a 30/04/2004 ruído de 86,7 dB(A) e hidrocarbonetos aromáticos;
01/05/2004 a 31/05/2005 ruído de 80,2 dB(A) e hidrocarbonetos aromáticos;
01/06/2005 a 11/07/2006 ruído de 82,5 dB(A) e hidrocarbonetos aromáticos;
12/07/2006 a 01/08/2007 ruído de 82,9 dB(A) e n-hexano;
02/08/2007 a 16/11/2008 ruído de 81,7 dB(A) e etilbenzeno;
17/11/2008 a 09/12/2009 ruído de 81,5 dB(A), n-hexano e etilbenzeno;
10/12/2009 a 13/10/2010 ruído de 80,2 dB(A), n-hexano e etilbenzeno;
14/10/2010 a 19/10/2011 ruído de 83,3 dB(A), n-hexano e etilbenzeno;
20/10/2011 a 17/10/2012 ruído de 85,3 dB(A), n-hexano e etilbenzeno;
18/10/2012 a 10/10/2013 ruído de 85,7 dB(A), n-hexano e etilbenzeno.
De acordo com o PPRA (evento20, PROCADM2):
Operador de produção / operador polivalente - ruído de 81,5 dB(A), 80,2 dB(A), 83,3 dB(A), 85,3 dB(A) e 85,7 dB(A); acetato de etila, acetona, etilbenzeno, metiletilcetona, n-hexano, tolueno, xileno.
Conforme LTCAT (evento20, PROCADM3):
Ruído de 80,27 dB(A), 80,2 dB(A), 82,9 dB(A) e 81,7 dB(A); tolueno, acetona, hexano, nafta, acetato de etila, xileno, C0 aromático, acetato de n-butila, metiletilcetona, acetato de butila, ácido tricloroisocianurico, ácidos minerais, cetonas, ésteres, fenóis, hidrocarbonetos aromáticos, n-hexano, etilbenzeno, acetona, dimetilformamida, acetato de etila, acetona.
Prova: CTPS (evento7, PROCADM1, fl. 27), PPP (evento7, PROCADM1, fls. 46/49) e laudos (evento20, PROCADM2 e PROCADM3)
Análise da prova: o PPP, PPRA e LTCAT apontam níveis variados de ruído para o mesmo setor, de tal sorte que adoto os valores do PPP na última medição, de 18/10/2012 a 10/10/2013, de 85,7 dB(A), isso porque, considerando que o autor sempre trabalhou no setor adesivos, se constatado o nível de ruído de 85,7 dB(A) em 2012/2013, razão não há para se deduzir que as agressões ao trabalhador eram menores ou inexistiam nas demais épocas da prestação do serviço, até porque a evolução tecnológica e da segurança do trabalho tende a causar a redução, e não o aumento, dessa nocividade com o passar dos anos.
No período de 06/03/1997 a 18/11/2003, o nível de ruído a que estava exposta a parte autora não ultrapassa o limite de tolerância previsto pela legislação previdenciária, não merecendo provimento o recurso do autor no ponto.
Assiste razão ao autor quando afirma que a sentença reconheceu a especialidade de 19/11/2003 a 10/10/2013 e depois, ao concluir o quadro do exame da especialidade na empresa Killing S/A, fez constar 19/11/2003 a 10/10/2003. Embora o tempo tenha sido computado corretamente quando do cálculo do tempo de serviço, constou "Portanto, comprovada a especialidade dos períodos de 11/01/1993 a 02/12/1998 e 19/11/2003 a 10/10/2003", quando o correto seria "Portanto, comprovada a especialidade dos períodos de 11/01/1993 a 02/12/1998 e 19/11/2003 a 10/10/2013", assim, deve ser provido o recurso da parte autora e corrigido o erro material.
Equipamento de Proteção Individual (EPI): tratando-se de período anterior a junho de 1998, a discussão sobre os efeitos do EPI perde relevância, conforme acima já explicitado. Tratando-se de agente nocivo ruído, a discussão sobre o uso e a eficácia do EPI perde relevância, tendo em vista os termos da decisão do STF em sede de repercussão geral (ARE 664335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014), conforme acima explicitado. Para o período posterior a junho 1998, o PPP limita-se a responder sim a todas as indagações constantes do item 15, sem qualquer especificação de em que intensidade ocorria a elisão dos agentes nocivos.
Enquadramento legal: de 11/01/1993 a 05/03/1997 e de 19/11/2003 a 10/10/2013 - ruído superior a 80 decibéis até 05/03/1997: item 1.1.6 do Anexo do Decreto n.º 53.831/64 e item 1.1.5 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79; ruído superior a 85 decibéis a partir de 19/11/2003: item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, com a alteração introduzida pelo Decreto n.º 4.882/2003; de 11/01/1993 a 10/10/2013 - Hidrocarbonetos - códigos 1.2.11 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64; 1.2.10 do Anexo I ao Decreto n.º 83.080/79; 1.0.19 do Anexo IV ao Decreto n.º 2.172/97; 1.0.19 do Anexo IV ao Decreto n.º 3.048/99.
Conclusão: os agentes nocivos aos quais estava exposta a parte autora estão elencados como especiais e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor, devendo ser parcialmente reformada a sentença no ponto a fim de acrescer o intervalo de 03/12/1998 a 18/11/2003 aos períodos já computados pelo juízo de origem.
Portanto, não merece provimento a remessa necessária quanto ao ponto. Provido parcialmente o recurso do autor.
Concluindo o tópico, resta reconhecido como especial, exercido sob condições nocivas à saúde ou à integridade física do segurado, o tempo de serviço relativo aos períodos de 18/11/1980 a 28/02/1984, 02/04/1984 a 05/02/1988, 08/02/1988 a 04/01/1989 e 10/02/1989 a 29/12/1992, 11/01/1993 a 10/10/2013, reformando-se em parte a sentença no ponto.
Prejudicado o apelo do autor quanto à análise da possibilidade de conversão do trabalho comum em especial pelo fator 0,71, uma vez que todos os períodos laborados anteriores a 28/04/1995 restaram reconhecidos como de atividade especial.
APOSENTADORIA ESPECIAL - REQUISITOS
A aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, é devida ao segurado que, além da carência, tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física durante 15, 20 ou 25 anos.
Em se tratando de aposentadoria especial, portanto, não há conversão de tempo de serviço especial em comum, visto que o que enseja a outorga do benefício é o labor, durante todo o período mínimo exigido na norma em comento (15, 20, ou 25 anos), sob condições nocivas.
DIREITO À APOSENTADORIA ESPECIAL NO CASO CONCRETO
No caso em exame, considerada a presente decisão judicial, tem-se a seguinte composição do tempo de serviço da parte autora, na DER (16/05/2014):
a) não há tempo especial reconhecido administrativamente;
b) tempo especial reconhecido nesta ação: 32 anos, 8 meses, 2 dias;
Total de tempo de serviço especial na DER: 32 anos, 8 meses, 2 dias.
A carência necessária à obtenção do benefício de aposentadoria no ano de 2014 (art. 142 da Lei n.º 8.213/91) restou cumprida, tendo em vista que a parte autora possuía mais de 180 contribuições na DER (Resumo de Cálculo de Tempo de Contribuição - evento7, PROCADM2, fl. 62).
Assim, cumprindo com os requisitos tempo de serviço e carência, a parte autora tem direito:
- à implementação do benefício de aposentadoria especial desde a data do requerimento;
- ao pagamento das parcelas vencidas.
Dano moral:
Em relação à configuração do dano moral, cabem algumas considerações.
É cediço que a indenização por dano moral, prevista no art. 5º, V, da Constituição Federal de 1988, objetiva reparar, mediante pagamento de um valor estimado em pecúnia, a lesão ou estrago causado à imagem, à honra ou estética de quem sofreu o dano.
Contudo, este Tribunal já firmou entendimento no sentido de que a suspensão do pagamento do benefício ou o seu indeferimento não constitui ato ilegal por parte da Autarquia hábil à concessão de dano moral. Ao contrário, se há suspeita de que o segurado não preenche os requisitos para a concessão do benefício, é seu dever apurar se estes estão ou não configurados. Este ato, que constitui verdadeiro dever do ente autárquico, não é capaz de gerar constrangimento ou abalo tais que caracterizem a ocorrência de dano moral.
Para que isto ocorra, é necessário que o INSS extrapole os limites deste seu poder-dever. Ocorreria, por exemplo, se utilizado procedimento vexatório pelo INSS, o que não foi demonstrado na hipótese.
Sobre o tema, assim já se pronunciou o Colendo STJ, in verbis:
CIVIL. DANO MORAL. NÃO OCORRÊNCIA.
O mero dissabor não pode ser alçado ao patamar Do dano moral, mas somente aquela agressão que exacerba a naturalidade dos fatos da vida, causando fundadas aflições ou angústias no espírito de quem ela se dirige.
(STJ, REsp nº. 215.666 - RJ, 1999/0044982-7, Relator Ministro César Asfor Rocha, 4ª Turma, DJ 1 de 29/10/2001, p. 208).
O dano moral pressupõe dor física ou moral, e se configura sempre que alguém aflige outrem injustamente, sem com isso causar prejuízo patrimonial.
A corroborar tal entendimento, os seguintes precedentes jurisprudenciais:
PREVIDENCIÁRIO - AUXÍLIO-DOENÇA - CANCELAMENTO - PERDAS E DANOS - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - Constatado, através de prova pericial, que a segurada não está apta a realizar atividade laborativa, deve ser restabelecido o benefício de auxílio-doença;
II - No tocante às perdas e danos e dano moral, verifica-se que o dano ao patrimônio subjetivo da Autora não restou comprovado, conforme o disposto no art. 333, I, do CPC;
III - A compensação dos honorários foi determinada corretamente, em razão da sucumbência recíproca;
IV - Recursos improvidos.
(TRF2, 4ª T., unânime, AC nº 2002.02.01.037559-8, relator Des. Federal Arnaldo Lima, DJU de 23.06.2003, pág. 219)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. FRAUDE E MÁ-FÉ. INEXISTÊNCIA. NOVA VALORAÇÃO DA PROVA. RECONHECIMENTO TEMPO ESPECIAL. AGENTE FÍSICO. CALOR. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. INTERMITÊNCIA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL.
1. Se o conjunto probatório não demonstra a causa motivadora do cancelamento do benefício (ausência de comprovação do labor rural) é indevida a suspensão de aposentadoria por tempo de serviço operada pela Autarquia.
2. O cancelamento de benefício previdenciário fundado tão-somente em nova valoração da prova e/ou mudança de critério interpretativo da norma, salvo comprovada fraude e má-fé, atenta contra o princípio da segurança das relações jurídicas e contra a coisa julgada administrativa.
(...)
5. Se o segurado não comprova a perda moral ou a ofensa decorrente do indeferimento administrativo, não lhe é devida a indenização a esse título. Precedentes desta corte.
(TRF4, 5ª T., AC nº 2003.04.01.016376-2, relator Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJU de 25.06.2003, pág. 786)
No caso dos autos, ausente a comprovação de ofensa ao patrimônio subjetivo do autor, inexiste direito à indenização por dano moral. O desconforto gerado pelo indeferimento do benefício resolve-se na esfera patrimonial, através do pagamento de todos os atrasados, com juros e correção monetária.
Ademais, a Administração Pública possui o poder-dever de autotutela, ou seja, o controle da legalidade de seus próprios atos podendo anulá-los, quando eivados de vícios que os tornem ilegais.
No caso concreto, houve dúvida quanto ao trabalho especial da parte autora, não havendo conduta ilegal, irresponsável ou inconsequente da Autarquia que apenas exerceu o seu regular direito de rever os seus próprios atos.
Concluindo o tópico, tenho que não merece provimento o recurso do autor quanto ao ponto.
CONSECTÁRIOS E PROVIMENTOS FINAIS
Consectários
Juros Moratórios e Correção Monetária.
De início, esclareço que a correção monetária e os juros de mora, sendo consectários da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício. Assim, sua alteração não implica falar em reformatio in pejus.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei nº 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que sejam definidos na fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014 - grifei).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01/06/2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a decisão acerca dos critérios de correção, não prevalecendo os índices eventualmente fixados na fase de conhecimento, ocasião em que provavelmente já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de execução a forma de cálculo dos juros e correção monetária, restando prejudicadaa a apelação da Autarquia e a remessa necessária no ponto.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios são devidos à taxa 10% sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência (sentença ou acórdão), nos termos das Súmulas n.º 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Custas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei n.º 9.289/96).
Tutela específica - implantação do benefício
Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, a Terceira Seção deste Tribunal, buscando dar efetividade ao disposto no art. 461, que dispunha acerca da tutela específica, firmou o entendimento de que, confirmada a sentença de procedência ou reformada para julgar procedente, o acórdão que concedesse benefício previdenciário e sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, portanto sem efeito suspensivo, ensejava o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, independentemente do trânsito em julgado ou de requerimento específico da parte (TRF4, Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7, 3ª SEÇÃO, Des. Federal Celso Kipper, por maioria, D.E. 01/10/2007, publicação em 02/10/2007). Nesses termos, entendeu o Órgão Julgador que a parte correspondente ao cumprimento de obrigação de fazer ensejava o cumprimento desde logo, enquanto a obrigação de pagar ficaria postergada para a fase executória.
O art. 497 do novo CPC, buscando dar efetividade ao processo dispôs de forma similar à prevista no Código/1973, razão pela qual o entendimento firmado pela Terceira Seção deste Tribunal, no julgamento da Questão de Ordem acima referida, mantém-se íntegro e atual.
Nesses termos, com fulcro no art. 497 do CPC, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora (NB 168.380.067-0), a ser efetivada em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais, bem como por se tratar de prazo razoável para que a autarquia previdenciária adote as providências necessárias tendentes a efetivar a medida. Saliento, contudo, que o referido prazo inicia-se a contar da intimação desta decisão, independentemente de interposição de embargos de declaração, face à ausência de efeito suspensivo (art. 1.026 CPC).
CONCLUSÃO
Provido em parte o recurso da parte autora para a fim de corrigir erro material da sentença e acrescer os intervalos de 02/04/1984 a 05/02/1988, 08/02/1988 a 04/01/1989, 10/02/1989 a 29/12/1992 e de 03/12/1998 a 18/11/2003 aos períodos já computados pelo juízo de origem como de atividade especial.
Diferida, para a fase de execução, a forma de cálculo dos juros e da correção monetária incidentes sobre o montante da condenação.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à remessa necessária, julgar prejudicada a apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação da parte autora e determinar a implantação do benefício, nos termos da fundamentação.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 13/09/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5005414-04.2014.4.04.7129/RS
ORIGEM: RS 50054140420144047129
RELATOR | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr. Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | PAULO LUIZ GAZONI |
ADVOGADO | : | IMILIA DE SOUZA |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído no Aditamento da Pauta do dia 13/09/2016, na seqüência 504, disponibilizada no DE de 24/08/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À REMESSA NECESSÁRIA, JULGAR PREJUDICADA A APELAÇÃO DO INSS, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
: | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS | |
: | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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