Apelação/Remessa Necessária Nº 5001702-61.2017.4.04.7109/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: REOVALDO RODRIGUES (AUTOR)
RELATÓRIO
Trata-se de ação proposta contra o INSS, na qual REOVALDO RODRIGUES (70 anos) postula a concessão de aposentadoria por idade, desde a DER (05/01/2016), mediante o cômputo de períodos em mandatos eletivos e tempo de serviço militar obrigatório.
A sentença (prolatada em 25/03/2019, evento 60) assim decidiu:
III. DISPOSITIVO
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, consoante art. 487, I, do CPC, para determinar ao INSS o cômputo do período de serviço militar do autor, para todos os efeitos, nos termos da fundamentação.
Ante a sucumbência recíproca, condeno autor e réu a arcarem com metade das custas e com os honorários advocatícios da parte adversa, arbitrados em R$ 1.000,00 (um mil reais) para cada um, nos termos do art. 85, § 8º, do CPC, atualizados segundo o Manual de Cálculos da Justiça Federal. Entretanto, no que se refere ao autor, ficam as verbas com a exigibilidade suspensa, diante da concessão da gratuidade da justiça.
Quanto à condenação do réu às custas judiciais, reconheço a inexigibilidade destas, ante a isenção prevista no art. 4º, I, da Lei 9.289/1996.
Sentença sujeita a remessa necessária.
Apela o INSS, evento 67, pela exclusão do aproveitamento do tempo de serviço militar para fins de carência.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
Da remessa necessária em sentenças meramente declaratórias
A remessa necessária (ou remessa oficial, ou reexame necessário) é um instituto que surgiu no direito processual civil brasileiro sob a égide do Código Buzaid, em 1973 (art. 475), prosseguindo na filosofia implantada pela apelação de ofício do art. 822 do CPC39 (e mais remotamente o recurso de ofício da Lei nº 4 de 1831, art. 90), com o objetivo de proteger o patrimônio público contra revezes eventualmente ocorridos em decisões de primeiro grau de jurisdição.
No momento da criação do instituto, a realidade da advocacia pública no Brasil requeria alguma tutela, por sua falta de estrutura especializada, mesmo no âmbito da União. Tal realidade modificou-se muito ao longo dos anos, tanto que, com a reforma do Código Buzaid pela Lei nº 10.352/2001, diminui a importância conferida à remessa oficial, a qual passou a sujeitar, no âmbito do art. 475, §2º, apenas aquelas sentenças ilíquidas que representassem montante maior que 60 salários mínimos.
O novo CPC por muito pouco não dispensou o instituto de seu texto, mantendo-o apenas como forma de atender a municípios sem estrutura de defesa jurídica, embora, por questão de isonomia federativa, tenha mantido a remessa necessária também com relação à União e aos Estados, como se verifica na Exposição de Motivos ao novo CPC produzida no Senado:
"A remessa necessária não é um grande problema de ser reexcluída, já que é uma das proposições da comissão, quando se trata de demandas onde envolva a União, ou de demandas que envolvam inclusive os estados, todos os estados têm uma democracia pública extremamente estruturada, o que me preocupa é com o município. Como ficam os municípios? 5.600 municípios, onde boa parte sequer tem uma Advocacia Pública estruturada, boa parte dos advogados de municípios acaba sendo advogados privados, que têm dificuldade inclusive com o Direito Público, não dominam a questão. E o que isso vai acontecer? Como haverá essa defesa dos municípios? A remessa necessária serve, sim, para a proteção do patrimônio público, volto a dizer, para estado, para município... Para estado e para a União isso seguramente não seria imprescindível, podemos conviver sem a remessa necessária. Mas um ponto de reflexão, a reflexão diz respeito aos municípios que têm poucos recursos e nem sempre uma Advocacia estruturada, e seguramente serão os maiores prejudicados. Então o primeiro ponto de reflexão" (Código de Processo Civil: anteprojeto/Comissão de Juristas Responsável pela Elaboração de Anteprojeto de Código de Processo Civil - Brasília: Senado Federal, Presidência, 2010, p. 341. Extraído em 22/11/2017, de: https://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf)
o O texto final do art. 496 acabou por manter a remessa necessária nos casos em que os valores envolvidos representarem mais de mil salários mínimos e desde que não haja súmula de tribunal superior ou acórdão de recurso repetitivo no mesmo sentido da sentença em questão; trata-se, claramente, de um instituto em vias de extinção.
No entanto, a remessa necessária existe e deve ser aplicada, apenas deve ser observada como exceção, não como regra, em atendimento à mens legis, e, bem por isso, a interpretação do âmbito de sua aplicação deve ser restritiva.
Quanto ao momento de incidência da norma, deve-se ter em consideração o princípio tempus regit actum, que tem relação direta com o princípio constitucional da irretroatividade das leis, o qual possui previsão nos arts. 5º, XXXVI, da CF, e 6º da LINDB (Texto do Ministro Luiz Fux em: https://www.conjur.com.br/2016-mar-22/ministro-luiz-fux-cpc-seguranca-juridica-normativa, cons. em 22/11/2017). Desta forma, as sentenças proferidas a partir de 18/03/2016 devem obedecer o previsto no CPC2015 (artigos 1.045 do CPC2015 e 1.211 do CPC1973).
Esta Turma já consolidou entendimento de que a sentença não pode ser propriamente considerada ilíquida quando contém ou refere todos os elementos necessários para se apurar, mediante cálculo aritmético de baixa complexidade, o valor final da condenação. É posição desta Turma, quanto aos feitos previdenciários, que os valores a serem considerados no cômputo são aqueles apuráveis na data da sentença, não se havendo de ponderar por quanto tempo se estenderá eventual benefício, o qual, no caso das sentenças meramente declaratórias, sequer possui representatividade econômica no momento da decisão, como ocorre no caso destes autos.
Assim, não merece conhecimento a remessa necessária.
DA AVERBAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO MILITAR
Quanto à pretensão do demandante de averbar o tempo de serviço militar obrigatório, tal possibilidade consta do art. 55, I, da Lei nº 8.213/91.
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
I - o tempo de serviço militar, inclusive o voluntário, e o previsto no § 1º do art. 143 da Constituição Federal, ainda que anterior à filiação ao Regime Geral de Previdência Social, desde que não tenha sido contado para inatividade remunerada nas Forças Armadas ou aposentadoria no serviço público;
Outrossim, o Decreto nº 3.048/99, em seu art. 60, IV, reconhece o tempo de serviço militar como tempo de contribuição:
Art. 60. Até que lei específica discipline a matéria, são contados como tempo de contribuição, entre outros:
I - (...);
IV - o tempo de serviço militar, salvo se já contado para inatividade remunerada nas Forças Armadas ou auxiliares, ou para aposentadoria no serviço público federal, estadual, do Distrito Federal ou municipal, ainda que anterior à filiação ao Regime Geral de Previdência Social, nas seguintes condições:
a) obrigatório ou voluntário; e
b) alternativo, assim considerado o atribuído pelas Forças Armadas àqueles que, após alistamento, alegarem imperativo de consciência, entendendo-se como tal o decorrente de crença religiosa e de convicção filosófica ou política, para se eximirem de atividades de caráter militar;
(Grifos nossos)
Comprovando o tempo de serviço militar de forma adequada, deve o período em questão ser averbado pelo INSS, inclusive para efeito de carência, conforme entendimento consolidado nesta Corte (TRF4, Sexta Turma, APELREEX 0017043-49.2015.4.04.9999, Rel. VÂNIA HACK DE ALMEIDA, D.E. de 16/06/2017; TRF4, Quinta Turma, APELREEX 0004153-78.2015.4.04.9999, Rel. PAULO AFONSO BRUM VAZ, D.E. de 19/05/2016).
Mantenho, portanto, a sentença no ponto.
Majoração dos honorários de sucumbência
Considerando o disposto no art. 85, § 11, NCPC, e que está sendo negado provimento ao recurso do INSS, majoro os honorários fixados a favor do autor em 50%.
CONCLUSÃO
Não conhecida a remessa oficial e negado provimento à apelação.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial e negar provimento à apelação.
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5001702-61.2017.4.04.7109/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: REOVALDO RODRIGUES (AUTOR)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO - CARÊNCIA.
. É possível averbar o tempo de serviço militar obrigatório, inclusive para efeito de carência, conforme entendimento consolidado nesta Corte, em interpretação ao art. 55, I, da Lei nº 8.213/91, c/c o art. 60, IV, do Decreto nº 3.048/99.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial e negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de agosto de 2019.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001215247v4 e do código CRC e1dc5dab.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 27/08/2019
Apelação/Remessa Necessária Nº 5001702-61.2017.4.04.7109/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: REOVALDO RODRIGUES (AUTOR)
ADVOGADO: Rodrigo Nunes Bolbotka (OAB RS057078)
ADVOGADO: JOSÉ HENRIQUE RODRIGUES (OAB RS066401)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 27/08/2019, na sequência 501, disponibilizada no DE de 09/08/2019.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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