APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5022349-60.2010.4.04.7000/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JOSE ANTAO DOS SANTOS FILHO |
ADVOGADO | : | ANTONIO MIOZZO |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. BOIA-FRIA ATIVIDADE ESPECIAL. PEDREIRO/SERVENTE. VIGIA/VIGILANTE. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. OPÇÃO PELA EC 20/98 OU NA DER. HONORARIOS ADVOCATÍCIOS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. TUTELA ESPECIFICA.
1.As incoerências ou divergências na prova testemunhal não podem ser motivo determinante para o indeferimento do reconhecimento da atividade ruricola. Ainda mais, que se trata de periodo antigo, onde as testemunhas não se lembram com exatidão os fatos. Importante é a interpretação conjunta da prova testemunhal com a natureza do serviço prestado e, nesse ponto, deve-se considerar que efetivamente a parte autora foi trabalhador rural boia-fria, na informalidade, para vários agricultores, impondo-se o reconhecimento do tempo de serviço rural pleiteado. Tenha-se que a origem campesina restou demonstrado, pelo registro da condição de agricultor/lavrador em documentos públicos.
2. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço.
3. A referência à fabricação de explosivos, associada ao agente químico 'fósforo' (Dec. 53.831/64, item 1.2.6., subitem II; Dec. 83.080/79, item 1.2.6), possibilita o reconhecimento da atividade como especial, em razão da periculosidade do labor exercido.
4.Em relação à atividade de vigilante, a jurisprudência do STJ e da 3ª Seção desta Corte firmou entendimento no sentido de que, até 28/04/1995, é possível o reconhecimento da especialidade da profissão de vigia ou vigilante por analogia à função de guarda, tida por perigosa (código 2.5.7 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64), independentemente de o segurado portar arma de fogo no exercício de sua jornada laboral (REsp º 541377/SC, 5ª Turma, Min. Arnaldo Esteves Lima, DJU 24/04/2006; EIAC n.º 1999.04.01.082520-0, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJU 10-04-2002, Seção 2, pp. 425-427). Após, necessária a comprovação de porte de arma, mediante apresentação de qualquer meio de prova, inclusive prova testemunhal, evidenciando a periculosidade da profissão.
5. A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é considerada irrelevante para o reconhecimento das atividades exercida em condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, no período anterior a 02 de junho de 1998, conforme admitido pelo próprio INSS por meio da Ordem de Serviço INSS/DSS nº 564/97, em vigor até a mencionada data. Em período posterior a junho de 1998, a desconfiguração da natureza especial da atividade em decorrência do uso de EPIs é admissível desde que haja laudo técnico afirmando, de forma inequívoca, que a sua utilização pelo trabalhador reduziu efetivamente os efeitos nocivos do agente agressivo a níveis toleráveis ou os neutralizou (STJ, REsp 720.082/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJ 10/04/2006, p. 279; TRF4, EINF 2001.72.06.002406-8, Terceira Seção, Relator Fernando Quadros da Silva, D.E. 08/01/2010).
6.O segurado tem o direito de obter a revisão do seu benefício com base em parcelas salariais reconhecidas pela Justiça do Trabalho, não sendo necessária a participação do INSS na lide trabalhista, para fins de aproveitá-la como meio de prova na demanda previdenciária.
7. O deferimento de verbas trabalhistas nada mais é do que o reconhecimento tardio de um direito já incorporado ao patrimônio jurídico do segurado, o que justifica a revisão da RMI e o pagamento das diferenças decorrentes desde a data da concessão do benefício.
8. O FGTS não é verba integrante do salário de contribuição, porquanto se trata de parcela incidente sobre a remuneração do empregado, contudo, não lhe é paga como contraprestação mensal direta e imediata, logo, não se enquadra na definição articulada no art. 28, I da Lei nº 8.213-91.
9.Comprovado o tempo de serviço/contribuição suficiente e implementada a carência mínima, é devida a aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, a contar da data de entrada do requerimento administrativo, nos termos dos artigos 54 e 49, inciso II, da Lei 8.213/91, bem como efetuar o pagamento das parcelas vencidas desde então. Deverá ser implantada a Renda Mensal Inicial mais vantajosa a parte autora, seja a encontrada antes da vigência da EC 20/98(atualizada até a DER) ou na data da entrada do requerimento administrativo.
10. Com relação ao termo inicial dos efeitos, a jurisprudência pacífica desta Corte é no sentido de que deve retroagir à data da concessão do benefício, pois o pedido administrativo continha documentos relativos ao tempo de serviço rural e especial, estabelecendo como termo inicial a da data de entrada do requerimento administrativo, nos termos dos artigos 54 e 49, inciso II, da Lei 8.213/91.
11.Os honorários advocatícios serão suportados pelo INSS em favor do patrono da parte autora, que arbitro em 10% sobre o valor da condenação, seguindo a sistemática do CPC/73 vigente na data da publicação da sentença, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula n. 111 do STJ e Sumula n. 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
12. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, de modo a racionalizar o andamento do processo, e diante da pendência, nos tribunais superiores, de decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes.
13. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do artigo 497, caput, do Código de Processo Civil.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao Apelo da parte autora, negar provimento ao Apelo do INSS e a remessa oficial, e determinar o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 09 de novembro de 2016.
Ezio Teixeira
Relator
| Documento eletrônico assinado por Ezio Teixeira, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8658733v8 e, se solicitado, do código CRC F826189. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Ezio Teixeira |
| Data e Hora: | 11/11/2016 16:36 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5022349-60.2010.4.04.7000/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JOSE ANTAO DOS SANTOS FILHO |
ADVOGADO | : | ANTONIO MIOZZO |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Cuida-se de recursos de Apelação e Remessa Oficial, contra a Sentença que decidiu a causa, no sentido de:
"Ante o exposto, declaro extinto o processo sem resolução de mérito, nos termos do artigo 267, VI, do CPC, quanto ao reconhecimento da especialidade do período de 01/04/1994 a 28/04/1995, julgando parcialmente procedentes os demais pedidos, nos termos do artigo 269, I, do CPC, para condenar o INSS a averbar como especiais os períodos de 19/09/1983 a 23/06/1992, de 07/08/1992 a 31/03/1994, de 29/04/1995 a 24/11/1999 e de 17/04/2000 a 29/08/2005.
Considerando a sucumbência recíproca, dou por compensados os honorários, nos termos do artigo 21 do Código de Processo Civil. Sem custas a restituir, em razão da gratuidade de justiça deferida ao autor.
Intimem-se.
Eventual apelação fica recebida no duplo efeito, desde que tempestiva. Verificado este requisito, intime-se a parte adversa para contra-arrazoar em 15 dias. Vencido este prazo, remetam-se ao E.TRF4.
Sentença sujeita ao reexame necessário (Súmula 490, STJ)."
Nas razões do Apelo do INSS, sustentou mesmo utilizando arma de fogo, o reconhecimento da atividade de vigilante como especial pelo enquadramento profissional só é possível até 28.4.1995, dia anterior ao do início da vigência da Lei 9.032/1995, que alterou a redação da Lei nº 8.213/1991, de modo que a periculosidade da atividade não mais é motivo para cálculo diferenciado do tempo de serviçoa parte autora. Que a a prova da periculosidade não pode ser feita com base em meros testemunhos. Pediu a reforma da sentença.
No Apelo da parte autora, requer seja reformada a r. sentença monocrática, para considerar válidos, legais e suficientes o conjunto de provas materiais subsidiadas pela prova testemunhal das efetivas atividades rurais do Apelante. Referiu que se já é praticamente impossível obter documentos para os trabalhadores volantes, mostra-se excessivo exigir-se documentos de inicio de prova material especifico das atividades rurais de bóia-fria. Afinal, são todas atividades rurais, tanto na condição de porcenteiro, empreiteiro, ou diarista volantes. Requereu, seja acolhido o direito do Apelante no cômputo como especial também o período de tempo de laborado na função de vigilância de empresa conforme declarado pelo instrumento técnico de PPP de evento 1, LAU9 dos autos emitido pela empresa empregadora, mesmo que não fazendo uso da arma de fogo no desempenho de suas atividades de vigilância, reformando a r sentença monocrática também neste ponto. Pediu a inclusão das verbas trabalhistas reconhecidas em sede de sentença trabalhista no periodo de 02/10/02 a 29/09/05. Por derradeiro, pleiteou concessão da aposentadoria por tempo de serviço em qualquer circunstância proporcional ou integral desde a data da DER, com o pagamento das parcelas mensais vencidas e a vencer até a data da implantação do benefício em favor do Apelante, corrigidas monetariamente desde o vencimento de cada parcela, acrescidas dos juros de mora de 1% ao mês desde a data da citação, honorários advocatícios no percentual legal a incidir sobre o valor da condenação até a data do julgamento deste recurso de Apelação, e demais cominações legais por ser a única consentânea com os primados do direito e da Justiça.
Com contrarrazões, foram remetidos os autos a essa Corte.
É o relatório.
VOTO
O caso dos autos trata do pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição com o reconhecimento de tempo de serviço rural desde os 12 anos de idade, tempo de serviço especial quando laborou como servente e vigilante, concedendo o beneficio previdenciário desde a data do requerimento administrativo.
REMESSA NECESSÁRIA
O art. 14 do CPC/2015 prevê a irretroatividade da norma processual a situações jurídicas já consolidadas. A partir disso, verifico que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, de modo que não é aplicável o art. 496 do CPC/2015, em relação à remessa necessária, em razão da irretroatividade.
De acordo com a decisão do Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o INSS só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, admito como interposta a remessa necessária.
ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR
Inicialmente, entende-se por "regime de economia familiar" nas palavras da Lei nº 8.213/91, através de seu art. 11, § 1°, "a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados".
No que concerne à prova do tempo de serviço exercido nesse tipo de atividade, deve-se observar a regra art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, que dispõe que "a comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento".
Para a análise do início de prova material, filio-me aos seguintes entendimentos sumulados:
Súmula nº 73 do TRF da 4ª Região: Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Súmula nº 149 do STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário.
Súmula nº 577 do STJ: É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.
Quanto à contagem do tempo de serviço rural em regime de economia familiar prestado por menor de 14 anos, entendo ser devida. Conforme o STJ, a legislação, ao vedar o trabalho infantil do menor de 14 anos, teve por escopo a sua proteção, tendo sido estabelecida a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo, aplicando-se o princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social (AR nº 3.629/RS, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 9/9/2008; EDcl no REsp nº 408.478/RS, Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 5/2/2007; AgRg no REsp nº 539.088/RS, Ministro Felix Fischer, DJ 14/6/2004). No mesmo sentido é a Sumula nº 05 da TNU dos JEF.
Esclareço ser possível a formação de início razoável de prova material sem a apresentação de notas fiscais de produtor rural em nome próprio. Com efeito, a efetiva comprovação da contribuição é flexibilizada pelo fato de o art. 30, inciso III, da Lei nº 8.212/91, atribuir a responsabilidade de recolher à empresa que participa da negociação dos produtos referidos nas notas fiscais de produtor, seja na condição de adquirente, consumidora, consignatária ou se trate de cooperativa. Nesse caso, a contribuição especificada não guarda relação direta com a prestação de serviço rural em família, motivo pelo qual se pode reconhecer o tempo de serviço rural, ainda que ausentes notas fiscais de produtor rural como início de prova material.
A existência de início de prova material, todavia, não é garantia de obtenção do tempo de serviço postulado. A prova testemunhal é de curial importância para que se confirme a atividade e seu respectivo lapso temporal, complementando os demais elementos probatórios.
No que respeita à não exigência de contribuições para a averbação do tempo de serviço do segurado especial, a questão deve ser analisada sob o prisma constitucional, eis que em seu texto foi prevista a unificação da Previdência Social, outorgando a qualidade de segurado do RGPS aos trabalhadores rurais.
Obedecendo a tais mandamentos, o § 2º, do art. 55, da Lei nº 8.213/91 previu a possibilidade de que o tempo de serviço rural dos segurados especiais fosse computado independentemente do recolhimento de contribuições ou indenização:
"O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência conforme dispuser o Regulamento."
Tal entendimento foi esposado pelo Supremo Tribunal Federal na decisão liminar da ADIN 1664-4-DF. Assim, desde que devidamente comprovado, o tempo de serviço que o segurado trabalhou em atividade rural poderá ser utilizado para fins de qualquer aposentadoria por tempo de serviço independentemente de contribuições.
Também devem ser observados os precedentes vinculantes, conforme estipula o art. 927 do CPC/2015. Do STJ, temos as seguintes teses firmadas:
Tema 644 - Concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição a trabalhador urbano mediante o cômputo de atividade rural
"Não ofende o § 2º do art. 55 da Lei 8.213/91 o reconhecimento do tempo de serviço exercido por trabalhador rural registrado em carteira profissional para efeito de carência, tendo em vista que o empregador rural, juntamente com as demais fontes previstas na legislação de regência, eram os responsáveis pelo custeio do fundo de assistência e previdência rural (FUNRURAL). (REsp 1352791/SP)
Tema 554 - Abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural do "boia-fria"
"o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal. (REsp 1321493/PR)
Temas 532, 533 - Repercussão de atividade urbana do cônjuge na pretensão de configuração jurídica de trabalhador rural previsto no art. 143 da Lei 8.213/1991
"3.O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana." (REsp 1304479/SP)
No caso dos autos, pretende a parte autora seja computando o período de trabalho rural de 06/06/1965 a 06/05/1970, em que laborou como boia-fria, diarista rural.
Na hipótese em tela, o autor juntou os seguintes documentos, ainda no procedimento administrativo (evento 34, PROCADM3):
a) certidão de nascimento da irmã do autor, Srª Maria Aparecida dos Santos, ocorrido em 09/08/1963, indicando o pai, Sr. José Antão dos Santos como lavrador (p. 28);
b) certidão de nascimento do autor, ocorrido em 06/05/1953, indicando seu pai como lavrador (p. 30);
c) certidão de nascimento do irmão do autor, Sr. Aparecido Rodrigues dos Santos, ocorrido em 04/09/1962, indicando o pai como lavrador (p. 32);
d) certidão de nascimento do irmão do autor, Sr. João Antônio dos Santos, ocorrido em 08/04/1956 (p. 34);
As certidões indicam expressamente a ocorrência dos nascimentos em domicílio, tendo a segunda e a última explicitado tratar-se de 'domicílio rural'. Vale lembrar que, diversamente do procedimento administrativo previdenciário, o processo judicial não exige número mínimo de documentos, ainda que a exigência de início de prova material persista também aqui. De todo modo, dada a informalidade do meio rural, a comprovação de vínculo com o campo normalmente é realizada por declarações em documentos pessoais, como certidões de casamento e de nascimento. Nesse sentido, por certo não haverá prova material específica para todos os anos no trabalho rural, o que tornaria inexeqüível o exercício do direito à contagem do tempo. Apresentados documentos datados de anos aproximados, presume-se que são válidos para os demais, sob pena de tornar inviável a comprovação material exigida pela lei.
Ademais, a jurisprudência do TRF da 4ª Região já decidiu que o início de prova material requerido pela legislação pode ser suprido por documentos em nome dos pais do segurado, mormente considerando que a maioria desenvolveu suas atividades durante a adolescência e o início da idade adulta, razão suficiente para esclarecer a pequena quantidade de documentos em nome próprio. Nesse sentido, cito:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. TRABALHADOR RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. APRESENTAÇÃO DE TÍTULO ELEITORAL E DE ALISTAMENTO MILITAR. PAI QUE SE APOSENTOU COMO TRABALHADOR RURAL. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material (no caso, mediante documento próprio - título eleitoral e de reservista - e outros em nome dos pais - tendo um deles se aposentado como trabalhador rural), desde que complementado por prova testemunhal idônea. Precedentes. (TRF4, EINF 2005.71.07.005421-8, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 08/03/2012)
No caso, a indicação do pai do autor como lavrador e a notícia de que o nascimento, tanto do autor como de seus irmãos, deu-se em domicílio e que este domicílio era rural, constituem indícios razoáveis de contato com o campo a permitir a complementação por prova oral.
Em Juízo (evento 77, AUDIO MP31), o autor declarou que residia na zona rural de Jardim Alegre, sendo o pai arrendatário de 7 alqueires, divindo a produção com o proprietário, meio a meio. A família trabalhava na lavoura de milho e feijão, retirando para o consumo próprio e vendendo o remanescente. Não soube dizer para quem era vendida a produção. Disse ter estudado depois dos 15 anos ao mudar-se para a cidade de Ivaiporã. Passando a alternar o trabalho na construção civil e no meio rural, como bóia-fria, até aproximadamente aos 18 anos. Lembra-se que o primeiro trabalho urbano, com anotação em CTPS, foi para a 'empreiteira da cidade'.
Ouvido em Justificação Administrativa, o Sr. Lazaro de Souza prestou o seguinte depoimento (evento 34, PROCADM5, p. 1):
"que o depoente nasceu em Londrina/PR e que morou em Jardim Alegre por dois anos, de 1962 a 1964; depois o depoente mudou-se para Rosário, voltou para Ivaiporã, mas declara que esteve em contato com o justificante somente em Jardim Alegre; que em Jardim Alegre o depoente era autônomo e morava na cidade, não trabalhava na lavoura; que o depoente trabalhava com carroça, cortando e puxando lenha, e como a cidade era pequena, acabou conhecendo o justificante e sua família; que o justificante era lavrador e o depoente não tem conhecimento se as terras eram próprias ou arrendadas; que plantavam feijão, milho, arroz; cuidava do pé de café; que o depoente não soube responder quem trabalhava nas terras com o justificante, nem soube responder quantos irmãos o justificante tinha; que não soube responder se o justificante empregava alguém nas terras ou não; que o pai do justificante era José mas o depoente não lembra o nome da mãe; que plantavam e colhiam tudo manual, com força braçal, não tinham maquinário; que preparavam a terra na enxada; que o depoente não tem conhecimento se o justificante possuía outra fonte de renda; que o depoente declara que encontrava o justificante na cidade, quando o justificante ia vender a produção nos armazéns; que às vezes o depoente via o justificante trabalhando na lavoura, quando o depoente passava com a carroça próximo às terras em que o justificante trabalhava;... quando [o depoente] saiu de Jardim Alegre o justificante continuou morando em Jardim Alegre, mas depois disso não teve mais contato com o justificante; que o justificante trabalhava na região conhecida como Barra Preta."
A segunda testemunha ouvida em justificação administrativa foi o Sr. Pedro Carlos da Silva, em cujo depoimento se lê (evento 34, PROCADM5, p. 3):
"que o depoente nasceu em Borrazópolis/PR e foi morar em Jardim Alegre com 3 anos de idade (1967); que o depoente era lavrador e trabalhava em terras próprias; que o depoente permaneceu em Jardim Alegre até 1991, quando mudou-se par Colombo, região metropolitana de Curitiba; que o depoente casou-se em 1984 e continuou morando nas terras do pai até 1991, quando saiu; que o depoente declara que em Jardim Alegre exerceu somente a atividade de lavrador; que justificante era mais conhecido dos pais do depoente; que moravam próximos, mas o depoente não soube dizer a que distância moravam; que o depoente acredita que o justificante trabalhava em terras arrendadas; que o depoente era criança, tinha em torno de 4 anos quando esteve em contato com o justificante e não lembra dos fatos; que o depoente declara que veio reencontrar o justificante aqui em Colombo e que através de conversas veio a descobrir que eram vizinhos; que o depoente sabe dos fatos através dos pais; que os pais do depoente eram bem conhecidos do justificante"
Ouvida pelo Juízo Estadual de Ivaiporã/PR (evento 141, AUDIO MP31), a Srª. Jandira de França Viesba declarou ter trabalhado como bóia-fria, cerca de 3 anos, com o autor. O trabalho se deu há cerca de 40 anos, em lavoura 'branca' (milho, algodão), na fazenda Arapongas e na fazenda do "Zé Galo" em Arapuã. Disse que a arregimentação dos trabalhadores era feita por 'gatos', cujos nome não se lembra. O pagamento era quinzenal. Disse ter começado a trabalhar como bóia-fria por volta dos 13 anos .
O Sr. Joel Ramos, também ouvido pelo Juízo Estadual de Ivaiporã/PR (evento 141, AUDIO MP32), declarou ter trabalhado com o autor, a contar de 1965, por aproximadamente cinco ou seis anos, como bóia-fria. Confirmou o trabalho na fazenda Arapongas e também na fazenda Bem-te-vi, em lavouras de café, milho e algodão. Os trabalhadores eram arregimentados por 'gatos', cujos nomes não se lembra. A arregimentação era perto de uma serraria. O pagamento era quinzenal.
Como visto, o autor apresentou como início de prova material as certidões de nascimento dos irmãos, além da sua própria. São indícios de contato da família com o meio rural a depender de corroboração por prova oral.
As incoerências ou divergências na prova testemunhal não podem ser motivo determinante para o indeferimento do reconhecimento da atividade ruricola. Ainda mais, que se trata de periodo antigo, onde as testemunhas não se lembram com exatidão os fatos. Importante é a interpretação conjunta da prova testemunhal com a natureza do serviço prestado e, nesse ponto, deve-se considerar que efetivamente a parte autora foi trabalhador rural boia-fria, na informalidade, para vários agricultores, impondo-se o reconhecimento do tempo de serviço rural pleiteado. Tenha-se que a origem campesina restou demonstrado, pelo registro da condição de agricultor/lavrador em documentos públicos.
Sendo assim, reformo a sentença, e reconheço como atividade rural na categoria de segurado especial na condição de bóia-fria ruricola, indepedentemente de contribuição, o periodo de 06/06/1965 a 06/05/1970.
ATIVIDADE ESPECIAL
O reconhecimento da atividade especial em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado deve observar a legislação vigente à época do desempenho da atividade, com base na qual passa a compor o patrimônio jurídico previdenciário do segurado, como direito adquirido. Significa que a comprovação das condições adversas de trabalho deve observar os parâmetros vigentes na época de prestação, não sendo aplicável retroativamente legislação nova que estabeleça restrições à análise do tempo de serviço especial.
Esse é o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial repetitivo 1.115.363/MG, precedente de observância obrigatória, de acordo com o art. 927 do CPC/2015. Ademais, essa orientação é regra expressa no art. 70, § 1º, do Decreto 3.048/99, na redação dada pelo Decreto 4.827/2003.
A partir dessas premissas, associadas à sucessão de leis no tratamento da matéria, é necessário definir qual a legislação em vigor no momento em que a atividade foi prestada pelo segurado.
Nesse prisma, a análise do tema deve observar a seguinte evolução legislativa:
1) Até 28/04/1995, com base na Lei nº 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, nos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original, havia presunção legal da atividade especial, de acordo com o enquadramento por ocupações ou grupos profissionais (ex.: médico, engenheiro, motorista, pintores, soldadores, bombeiros e guardas), ou por agentes nocivos químicos, físicos ou biológicos, demonstrado o desempenho da atividade ou da exposição a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído, frio e calor, para os quais é necessária a mensuração dos níveis de exposição por perícia técnica ou formulário emitido pela empresa;
2) A partir de 29/04/1995, não subsiste a presunção legal de enquadramento por categoria profissional, excepcionadas aquelas referidas na Lei 5.527/68, cujo enquadramento por categoria pode ser feito até 13/10/1996, dia anterior à MP 1.523, que revogou expressamente a Lei 5.527/68. No período compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, diante das alterações que a Lei 9.032/95 realizou no art. 57 da Lei 8.213/91, o enquadramento da atividade especial depende da efetiva exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, sendo suficiente a apresentação de formulário padrão do INSS preenchido pela empresa (SB-40, DSS-8030), sem a exigência de embasamento em laudo técnico, exceto quanto aos agentes nocivos ruído, frio e calor, que dependem da mensuração conforme visto acima;
3) A partir de 06/03/1997, o enquadramento da atividade especial passou a depender da demonstração da efetiva exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física, através de formulário padrão (DSS-8030, PPP) baseado em laudo técnico da empresa ou perícia técnica judicial demonstrando as atividades em condições especiais de modo: permanente, não ocasional, nem intermitente, por força da Lei nº 9.528/97, que convalidou a MP nº 1.523/96, modificando o artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91. O Decreto nº 2.172/97 é aplicável de 06/03/1997 a 05/05/1999, sendo substituído pelo Decreto nº 3.048/99, desde 06/05/1999.
4) A partir de 01/01/2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para análise da atividade especial postulada (art. 148 da IN 99 do INSS, publicada no DOU de 10/12/2003). Esse documento substitui os antigos formulário e exime a apresentação de laudo técnico em juízo, desde que adequadamente preenchido, com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica.
O enquadramento das categorias profissionais deve observar os Decretos 53.831/64, 72.771/73 e 83.080/79 somente até 28/04/1995. A partir dessa data, a Lei 9.032/95 extinguiu o reconhecimento da atividade especial por presunção legal, exceto para as profissões previstas na Lei 5.527/68, que permaneceram até 13/10/1996, por força da MP 1.523.
O enquadramento dos agentes nocivos, por sua vez, deve seguir os Decretos 53.831/64, 72.771/73 e 83.080/79, até 05/03/1997, e os Decretos 2.172/97 e 3.048/99, a partir de 06/03/1997, com incidência do Decreto 4.882/2003, quanto ao agente nocivo ruído. Ainda, tais hipóteses de enquadramento não afastam a possibilidade de reconhecimento da atividade especial no caso concreto, por meio de perícia técnica, ainda que não prevista a atividade nos Decretos referidos. Esse entendimento encontra amparo na Súmula 198 do TFR, segundo a qual "atendidos os demais requisitos, é devida aposentadoria especial, se a perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em regulamento".
Para fins de reconhecimento da atividade especial, a caracterização da habitualidade e permanência, nos termos do art. 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não exige que a exposição ocorra durante toda a jornada de trabalho. É suficiente para sua caracterização o contato cujo grau de nocividade ou prejudicialidade à saúde ou integridade física fique evidenciado pelas condições em que desenvolvida a atividade.
É perfeitamente possível o reconhecimento da especialidade da atividade, mesmo que não se saiba a quantidade exata de tempo de exposição ao agente insalubre. Necessário, apenas, restar demonstrado que o segurado estava sujeito, diuturnamente, a condições prejudiciais à sua saúde.
A permanência não pode ter aplicação restrita, como exigência de contato com o agente nocivo durante toda a jornada de trabalho do segurado, notadamente quando se trata de nocividade avaliada de forma qualitativa. A exposição permanente depende de constatação do grau e intensidade no contato com o agente, com avaliação dos riscos causados à saúde do trabalhador, embora não seja por todas as horas da jornada de trabalho.
Quanto ao agente nocivo ruído, a sucessão dos decretos regulamentares indica a seguinte situação:
- Até 05.03.97: Anexo do Decreto n.º 53.831/64 (Superior a 80 dB) e Anexo I do Decreto n.º 83.080/79 (Superior a 90 dB).
- De 06.03.97 a 06.05.99: Anexo IV do Decreto n.º 2.172/97 (Superior a 90 dB).
- De 07.05.99 a 18.11.2003 Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, na redação original (Superior a 90 dB).
- A partir de 19.11.2003: Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99 com a alteração introduzida pelo Decreto n.º 4.882/2003 (Superior a 85 dB).
Desse modo, até 05/03/1997, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto 53.831/64. Já a partir de 06/03/1997, deve ser observado o limite de 90 dB até 18/11/2003. O nível de 85 dB somente é aplicável a partir de 19/11/2003, pois o Superior Tribunal de Justiça, em precedente de observância obrigatória (art. 927 do CPC/2015) definiu o entendimento segundo o qual os estritos parâmetros legais relativos ao nível de ruído, vigentes em cada época, devem limitar o reconhecimento da atividade especial (REsp repetitivo 1.398.260/PR), nos seguintes termos:
"O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ." (REsp 1398260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014)
Por fim, destaco que os níveis de pressão sonora devem ser aferidos por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.
Em relação aos agentes químicos, a caracterização da atividade especial não depende da análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, pois são avaliados de forma qualitativa. Os Decretos que regem a matéria não exigem patamares mínimos, para tóxicos orgânicos e inorgânicos, ao contrário do que ocorre com os agentes físicos ruído, calor, frio ou eletricidade. Nesse sentido a exposição habitual, rotineira a agentes de natureza química são suficientes para caracterizar a atividade prejudicial à saúde ou à integridade física, conforme entendimento desta Corte (TRF4, APELREEX 2002.70.05.008838-4, Quinta Turma, Relator Hermes Siedler da Conceição Júnior, D.E. 10/05/2010).
Quanto aos agentes biológicos a exposição deve ser avaliada de forma qualitativa, não sendo condicionada ao tempo diário de exposição do segurado. O objetivo do reconhecimento da atividade especial é proporcionar ao trabalhador exposto a agentes agressivos a tutela protetiva, em razão dos maiores riscos que o exercício do labor lhe ocasiona, sendo inerente a atividade profissional a sujeição a esses agentes insalubres.
Com relação às perícias por similaridade ou por aferição indireta das condições de trabalho, destaco que esse procedimento tem sido admitido, nos casos em que a coleta de dados in loco se mostrar impossível para a análise da atividade especial. Nesse sentido cito os seguintes precedentes desta Corte:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. [...] A jurisprudência pátria reconhece a validade da perícia técnica por similaridade para fins de comprovação do tempo de serviço especial nos casos de impossibilidade de aferição direta das circunstâncias de trabalho. (TRF4, APELREEX 0009499-10.2015.404.9999, QUINTA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, D.E. 25/08/2016)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. [...] LAUDO EXTEMPORÂNEO. SIMILARIDADE. [...] 5. A perícia técnica deve ser realizada de forma indireta, em empresa similar àquela em que laborou o segurado, quando não há meio de reconstituir as condições físicas do local de trabalho em face do encerramento das suas atividades. (TRF4 5030892-81.2012.404.7000, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 06/07/2016)
No que tange ao uso de equipamentos de proteção individual (EPI), somente a partir de 03/12/1998 é relevante a sua consideração na análise da atividade especial. Nessa data entrou em vigor a MP 1.729/98, convertida na Lei 9.732/98, que alterou o art. 58, § 2º, da Lei 8.213/91, estipulando a exigência de o laudo técnico conter informações sobre a existência de tecnologia de proteção individual eficaz para diminuir a intensidade do agente nocivo a limites de tolerância e recomendação do empregador para o uso. Logo, antes dessa data é irrelevante o uso de EPI, sendo adotado esse entendimento pelo próprio INSS (IN 77/2015, art. 268, inciso III).
Ainda, é pacífico o entendimento deste Tribunal e também do Colendo Superior Tribunal de Justiça (REsp nº 462.858/RS, Relator Ministro Paulo Medina, Sexta Turma, DJU de 08-05-2003) no sentido de que esses dispositivos não são suficientes para descaracterizar a especialidade da atividade, a não ser que comprovados, por meio de perícia técnica especializada, o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho e a sua real efetividade.
Quando se trata de ruído, há precedente de aplicação obrigatória, nos termos do art. 927, do CPC/2015, o qual firmou a tese de que a utilização de EPI não impede a caracterização da atividade especial por exposição ao agente ruído. Trata-se do ARE 664.355 (Tema 555 reconhecido com repercussão geral), no qual o STF firmou a tese de que a utilização de Equipamento de Proteção Individual - EPI não ilide de modo eficaz os efeitos nocivos do agente físico ruído, porquanto não se restringem aos problemas relacionados às funções auditivas, restando assentado que mesmo na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no PPP, no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
No caso de exposição a hidrocarbonetos, "o contato com esses agentes (graxas, óleos minerais, hidrocarbonetos aromáticos, combustíveis, solventes, inseticidas, etc.) é responsável por frequentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo. Isto para não mencionar problemas hepáticos, pulmonares e renais" (TRF4, APELREEX 0002033-15.2009.404.7108, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 12/07/2011).
FONTE DE CUSTEIO
Não deve ser acolhida a tese comumente apresentada pelo INSS, a respeito da ausência de fonte de custeio para o reconhecimento da atividade especial, em razão do fornecimento de equipamentos de proteção individual pelo empregador e ausência de indicação do código de recolhimento no campo GFIP do PPP.
De acordo com o art. 195 da Constituição Federal de 1988, a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, com base numa pluralidade de fontes de custeio. Nesse sentido a previsão de fonte de financiamento nas contribuições a cargo da empresa (art. 57, § 6º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 22, II, da Lei 8.212/91) não configura óbice à análise da aposentadoria especial e da conversão de tempo especial em comum, na medida em que o RGPS é regime de repartição e não de capitalização, no qual a cada contribuinte corresponde um fundo específico de financiamento do seguro social.
Ademais, o benefício de aposentadoria especial foi estipulado pela própria Constituição Federal (art. 201, § 1º, c/c art. 15 da EC 20/98), o que implica a possibilidade de sua concessão independente da identificação da fonte de custeio (STF, AI 553.993). Logo, a regra à específica indicação legislativa da fonte de custeio é dirigida à legislação ordinária posterior que venha a criar novo benefício ou a majorar e estender benefício já existente.
Da mesma forma, se estiver comprovado o trabalho em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física, a ausência do código ou indicação equivocada no campo GFIP do PPP não impede o reconhecimento da atividade especial. Isso porque o INSS possui os meios necessários para fiscalizar irregularidades na empresa, não podendo ser o segurado responsabilizado por falha do empregador.
Por fim, o recolhimento das contribuições previstas nos arts. 57, §§ 6º e 7º, da Lei 8.213/91 e art. 22, II, da Lei 8.212/91, compete ao empregador, de acordo com o art. 30, I, da Lei 8.212/91, motivo pelo qual a ausência do recolhimento não pode prejudicar o segurado.
Assim, a tese do INSS não deve ser acolhida.
TEMPO DE ATIVIDADE ESPECIAL NO CASO CONCRETO
Os períodos de atividade especial, controvertidos pelo INSS, correspondem aos intervalos em que exerceu as atividades de servente e vigilante.
Diante das premissas supra, passo à análise dos vínculos controvertidos.
Empregador: BRITANITE/IBQ - Indústrias Químicas Ltda.
Função: Servente
Período: de 19/09/1983 a 23/06/1992
Agentes nocivos alegados: ruído e explosivos
Documentos: CTPS (evento 1, CTPS12, p. 8); DSS-8030 (evento 34, PROCADM2, p. 8) e laudo técnico (evento 34, PROCADM2, p. 9).
O formulário DSS-8030 apresentado administrativamente confirma o desempenho da função de servente no setor da oficina de manutenção civil. Ali consta a seguinte descrição do local e da atividade:
"O local de trabalho é toda a área de fabricação de explosivos nas dependências da oficina de manutenção civil, em prédios de alvenaria entrincheirados, com ventilação e iluminação natural e artificial, em ambiente periculoso.
A atividade realizada é a manutenção corretiva e preventiva e de emergência, com tarefas de construção e reparos diversos.
Agentes agressivos: risco de explosão, ruído e ergonômico.
Há exposição em caráter habitual e permanente."
O formulário declara o fornecimento de EPI's, consistindo em protetores auriculares, capacete, óculos e botina de segurança. O laudo juntado é vago, limitando-se a afirmar que "o nível de ruído se situa na faixa de 85 a 90 dB", sem indicar nível de ruído equivalente ou a dose diária. Confirma o risco de explosão ou permanência em área de risco com explosivo, "conforme definido pela NR-16, anexo 1, item 3".
A decisão administrativa (evento 34, PROCADM3, p. 4) declara não haver elementos que permitam o enquadramento da atividade, destacando a extemporaneidade do laudo.
À época, vigorava a possibilidade de reconhecimento da especialidade do trabalho mediante enquadramento nos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. Nestes, encontra-se uma única referência à fabricação de explosivos, associada ao agente químico 'fósforo' (Dec. 53.831/64, item 1.2.6., subitem II; Dec. 83.080/79, item 1.2.6). Ocorre que tanto o formulário DSS-8030, como o laudo que o subsidia não referem a exposição ao agente químico 'fósforo'.
Disso não deflui a impossibilidade de reconhecimento da especialidade, mas fundada na periculosidade, como já reconheceu o STJ:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE ELETRICIDADE. SUPRESSÃO PELO DECRETO 2.172/1997 (ANEXO IV). ARTS. 57 E 58 DA LEI 8.213/1991. ROL DE ATIVIDADES E AGENTES NOCIVOS. CARÁTER EXEMPLIFICATIVO. AGENTES PREJUDICIAIS NÃO PREVISTOS. REQUISITOS PARA CARACTERIZAÇÃO. SUPORTE TÉCNICO MÉDICO E JURÍDICO. EXPOSIÇÃO PERMANENTE, NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE (ART. 57, § 3º, DA LEI 8.213/1991).
1. Trata-se de Recurso Especial interposto pela autarquia previdenciária com o escopo de prevalecer a tese de que a supressão do agente eletricidade do rol de agentes nocivos pelo Decreto 2.172/1997 (Anexo IV) culmina na impossibilidade de configuração como tempo especial (arts. 57 e 58 da Lei 8.213/1991) de tal hipótese a partir da vigência do citado ato normativo.
2. À luz da interpretação sistemática, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991). Precedentes do STJ.
3. No caso concreto, o Tribunal de origem embasou-se em elementos técnicos (laudo pericial) e na legislação trabalhista para reputar como especial o trabalho exercido pelo recorrido, por consequência da exposição habitual à eletricidade, o que está de acordo com o entendimento fixado pelo STJ.
4. Recurso Especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art.
543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
(REsp 1306113/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/11/2012, DJe 07/03/2013)
À vista da legislação pertinente, o trabalho desempenhado pelo autor era, portanto, perigoso, gerando a contagem especial para fins de aposentadoria.
No que toca à alegada extemporaneidade do laudo, prevalece a presunção de melhoria das condições de trabalho com o passar do tempo, em função seja da fiscalização por sindicatos e órgãos públicos, seja do aprimoramento das técnicas de trabalho. Alterações de layout podem efetivamente implicar supressão ou minoração da insalubridade ou periculosidade, mas tais circunstâncias consistem fatos impeditivos ou modificativos do direito do segurado e, portanto, ônus probatório do INSS. Também aqui cita-se julgado do E.TRF4:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. LAUDO EXTEMPORÂNEO. MAJORAÇÃO DE RMI DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. 1. a 3. omissis 4. Se em data posterior ao labor despendido foi constatada a presença de agentes nocivos, mesmo com as inovações tecnológicas e de medicina e segurança do trabalho que advieram com o passar do tempo, depreende-se que, na época do labor, a agressão dos agentes era ao menos igual, senão maior, em razão da escassez de recursos materiais existentes até então para atenuar sua nocividade e a evolução dos equipamentos utilizados no desempenho de suas tarefas. (TRF4, APELREEX 5066304-98.2011.404.7100, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão João Batista Pinto Silveira, juntado aos autos em 22/03/2012)
Assim, procedente o pedido, no ponto, mantenho a Sentença.
Empregadores: Imperial Segurança/SERVIS/CIPLA/HB (grupo econômico)
Funções: Vigilante, vigia e guarda patrimonial
Períodos: 07/08/1992 a 24/11/1999 e 17/04/2000 a 29/08/2005
Agente nocivo alegado: periculosidade
Documentos: CTPS (evento 1, CTPS13), PPP's (evento 1, LAU8)
Na parte da CTPS reservada às anotações gerais, consta a seguinte informação (evento 1, CTPS13, p. 17):
"Em 01/11/1992, o portador foi transferido da IMP. SEG. SC/LTDA. para SERVIS S/A CTBA, Rua Desembargador Frederico Westphalen, 1361, sendo esta empresa do mesmo grupo econômico daquela e assume todos os direitos e obrigações decorrentes do vínculo empregatício conforme contrat da folha 013 dsta Carteira de Trabalho e Previdência Social, alterando seu número de registro para 82/01033. SERVIS S/A"
E ainda nas anotações gerais (evento 1, CTPS13, p. 18):
"Em 01/04/94, o portador foi transferido da Servis para Cipla Ind. Mat. Constr. S/A, sendo esta empresa do mesmo grupo econômico daquela e assume todos os direitos e obrigações decorrentes do vínculo empregatício conforme contrato de fl. 14 desta Carteira de Trabalho e Previdência Social. CIPLA IND. DE MAT. DE CONSTR. S/A"
E por último, na página 50 da CTPS (evento 1, CTPS13, p. 20 do arquivo digitalizado):
"As empresas: NOVA S/A - IMPERIAL SEGURANÇA S/C LTDA.-SERVIS S/A- CIPLA INDÚSTRIA DE MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO S/A - HB ACTIVO HOLDING S/A - pertencem ao mesmo grupo econômico (em 19/06/1992). - ELISETH HANSEN"
Os contratos de trabalho constantes da CTPS permitem definir dois períodos em que o autor prestou serviços ao grupo econômico, desempenhando as funções de vigia, vigilante e guarda patrimonial: de 07/08/1992 a 24/11/1999 e 17/04/2000 a 29/08/2005. Cabe registrar que parte do primeiro vínculo havido com o grupo econômico foi averbado como especial pelo INSS, a saber, de 01/04/1994 a 28/04/1995, não havendo interesse de agir nesse particular.
Dos formulários apresentados pelo autor , apenas o PPP emitido para o período iniciado em 17/04/2000 confirma o uso de arma de fogo (evento 1, LAU8, p. 2).
Depondo em juízo, o autor disse que o trabalho de vigia era prestado na residência de 'Dona Eliseth', proprietária da empresa CIPLA. Prestava o trabalho com arma de fogo, calibre 38, de propriedade do Sr. Luis e limitado o uso ao interior da propriedade. Não tinha porte de arma, nem autorização para portá-la fora da residência da Srª Eliseth e do Sr. Luis. Trabalhavam dois vigias por turno, mudando os horários a cada noventa dias. Declarou que o serviço foi prestado durante todo o período na residência da Srª Eliseth, apesar das alterações na CTPS.
O Sr. Cláudio Konik declarou ter trabalhado na CIPLA e na HB, como vigilante, de 1991 a 2005. O trabalho era prestado no Cotolengo e no Barigui. Por último teria trabalhado na residência dos proprietários das empresas. Confirmou que o autor trabalhava com arma de fogo, apesar de não ter 'porte'. Ao que sabe, o autor teria trabalhado somente na residência dos proprietários, Sr. Luis e Srª Eliseth.
O Sr. Carlos Alberto dos Santos declarou ter trabalhado na CIPLA e na HB, de 1993 a 2002. Fazia vigilância na residência da Srª Eliseth, tendo porte de arma e usando arma própria. Confirmou ter trabalhado com o autor, este também com arma de fogo, apesar de não ter o porte. O trabalho foi prestado no mesmo lugar, mesmo havendo mudança de empregador nas anotações em CTPS.
O Sr. Luiz Roberto Moreira declarou ter trabalhado na CIPLA e na HB, de 1992 a 2002, como vigilante. Também fazia vigilância na residência da Srª Elisete, tendo porte de arma. Trabalhou esporadicamente com o autor.
Por fim, prestou esclarecimentos ao Juízo a Srª Eliseth Hansen. Confirmou que o autor trabalhou em sua residência como vigilante. Não soube dizer o período ou a duração da prestação de trabalho. O contrato teria sido firmado pelo ex-marido da depoente, razão pela qual não teria maiores informações.
A despeito das poucas informações trazidas pela Srª Eliseth, os depoimentos das demais testemunhas confirmam o desempenho da função de vigilante, com arma de fogo, por todo o período, caracterizando assim o risco à integridade física do autor e, portanto, a especialidade do trabalho.
Note-se que, em relação ao período de 02/10/2002 a 29/09/2005, além das anotações em CTPS, houve confirmação da prestação do trabalho pela testemunha Cláudio Konik, devendo o período ser averbado.
No tocante aos lapsos de trabalho como vigia, não obstante a inexistência de previsão expressa da especialidade da função de vigilante nas normas de regência, o Decreto n. 53.831/64 prevê o enquadramento como especial da função de guarda, no item 2.5.7 do respectivo Anexo.
Por se tratar de rol meramente exemplificativo, é possível o enquadramento da atividade de vigilante, por analogia, considerando-se a própria similaridade das funções exercidas.
Nesse sentido, extrai-se precedente do Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. VIGILANTE BANCÁRIO. LEI VIGENTE AO TEMPO DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. ENQUADRAMENTO. ATIVIDADE ESPECIAL. ROL EXEMPLIFICATIVO. POSSIBILIDADE.
1. A Egrégia 3ª Seção desta Corte Superior de Justiça pacificou já entendimento no sentido de que o tempo de serviço é regido pela lei vigente ao tempo da sua prestação.
2. Desse modo, em respeito ao direito adquirido, se o trabalhador laborou em condições adversas e a lei da época permitia a sua contagem de forma mais vantajosa, o tempo de serviço assim deve ser contado.
3. Recurso não conhecido.
(REsp 441.469/RS, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, unânime, julg. em 11.2.2003, publ. em 10.3.2003).
No que pertine à atividade de vigia/vigilante, pode ser considerada como especial por equiparação à categoria profissional de "guarda" até 28/04/1995, e, posteriormente, mediante comprovação da exposição a agentes nocivos à saúde ou a integridade física que advém do porte de arma de fogo. Nesse sentido:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL. VIGIA/VIGILANTE. PORTE DE ARMA DE FOGO. PERICULOSIDADE. RECONHECIMENTO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. JUROS DE MORA. ADEQUAÇÃO. CABIMENTO. 1. Demonstrado o exercício de tarefa sujeita a enquadramento por categoria profissional até 28/04/1995 (vigia/vigilante por analogia a profissão de guarda), o período respectivo deve ser considerado como tempo especial. 2. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida. 3. Até 28/04/1995, é possível o reconhecimento da especialidade da profissão de vigia ou vigilante por analogia à função de guarda, independentemente de o segurado portar arma de fogo no exercício de sua jornada laboral. Após essa data, o reconhecimento da especialidade depende da comprovação da efetiva exposição a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, como o uso de arma de fogo, por exemplo. 4. Comprovado o tempo de serviço/contribuição suficiente e implementada a carência mínima, é devida a aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, a contar da data do requerimento administrativo, nos termos dos artigos 54 e 49, inciso II, da Lei 8.213/91. 5. Não incide a Lei nº 11.960/2009 apenas em relação à correção monetária equivalente à poupança, porque declarada inconstitucional (ADIs 4.357 e 4.425/STF), com efeitos erga omnes e ex tunc. 6. Os juros de mora, contados da citação, são fixados à taxa de 1% ao mês até junho/2009, e, após essa data, pelo índice de juros das cadernetas de poupança, com incidência uma única vez, nos termos da Lei 11.960/2009. 7. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do artigo 461 do CPC. (TRF4, APELREEX 5009163-30.2011.404.7001, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão (auxílio Kipper) Paulo Paim da Silva, juntado aos autos em 13/04/2015) (Grifei)
Em relação à atividade de vigilante, a jurisprudência do STJ e da 3ª Seção desta Corte firmou entendimento no sentido de que, até 28/04/1995, é possível o reconhecimento da especialidade da profissão de vigia ou vigilante por analogia à função de guarda, tida por perigosa (código 2.5.7 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64), independentemente de o segurado portar arma de fogo no exercício de sua jornada laboral (REsp º 541377/SC, 5ª Turma, Min. Arnaldo Esteves Lima, DJU 24/04/2006; EIAC n.º 1999.04.01.082520-0, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJU 10-04-2002, Seção 2, pp. 425-427). Após, necessária a comprovação de porte de arma, mediante apresentação de qualquer meio de prova que demonstre o uso rotineiro, diário, habitual e permanente na sua jornada de trabalho, o que restou evidenciado pela prova documental complementada pelo depoimento das testemunhas, que devem ser consideradas para fins de demonstração do pleiteado.
A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é considerada irrelevante para o reconhecimento das atividades exercida em condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, no período anterior a 02 de junho de 1998, conforme admitido pelo próprio INSS por meio da Ordem de Serviço INSS/DSS nº 564/97, em vigor até a mencionada data.
Em período posterior a junho de 1998, a desconfiguração da natureza especial da atividade em decorrência do uso de EPIs é admissível desde que haja laudo técnico afirmando, de forma inequívoca, que a sua utilização pelo trabalhador reduziu efetivamente os efeitos nocivos do agente agressivo a níveis toleráveis ou os neutralizou (STJ, REsp 720.082/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJ 10/04/2006, p. 279; TRF4, EINF 2001.72.06.002406-8, Terceira Seção, Relator Fernando Quadros da Silva, D.E. 08/01/2010). Para tanto, não basta o mero preenchimento dos campos específicos no PPP, onde simplesmente são respondidas as perguntas "EPI eficaz?" e "EPC eficaz?", sem qualquer detalhamento acerca da total elisão ou neutralização do agente nocivo.
No caso dos autos, relativamente ao período a partir de junho de 1998, não há nos autos qualquer documento técnico que ateste a eficácia dos EPIs eventualmente fornecidos ao autor, sendo que no caso da atividade de vigia, dificilmente haveria equipamento protetivo que elidisse o risco de morte inerente à atividade exercida.
Procedente o pedido, no ponto, mantenho a Sentença.
Empregador: DIGITAL PRESS
Função: vigia/vigilante
Período: de 02/07/2007 a 17/12/2007
Agente nocivo alegado: periculosidade
Documentos: CTPS (evento 1, CTPS13); PPP (evento 1, LAU9)
O vínculo em questão consta da CTPS do autor, confirmando a data de entrada, mas sem indicação da data de saída (evento 1, CTPS13, p. 6). Confirma também a contratação no cargo de vigia. O extrato do CNIS confirma a data de entrada e aponta a competência de janeiro/2008 como último recolhimento (evento 34, PROCADM2, p. 17). Indica também o código da classificação brasileira de ocupações (CBO) '5174', correspondente à família 'Porteiros, vigias e afins'.
A descrição sumária das atividades é a seguinte (http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/pesquisas/BuscaPorCodigo.jsf acesso em 22/01/2014):
Fiscalizam a guarda do patrimônio e exercem a observação de fábricas, armazéns, residências, estacionamentos, edifícios públicos, privados e outros estabelecimentos, inclusive comerciais, percorrendo-os sistematicamente e inspecionando suas dependências,previnir perdas,evitar incêndios e acidentes, entrada de pessoas estranhas e outras anormalidades; controlam fluxo de pessoas, identificando, orientando e encaminhando-as para os lugares desejados; recebem hóspedes em hotéis; acompanham pessoas e mercadorias; fazem manutenções simples nos locais de trabalho.
O PPP juntado (evento 1, LAU9) designa o cargo de 'guardião', descrevendo a atividade laconicamente: "Realiza vigilância da empresa". Como se vê, não há nenhuma menção ao uso de arma de fogo, circunstância considerada imprescindível à comprovação do risco para a integridade física a caracterizar a especialidade do trabalho.
Mantenho a Sentença pela improcedência do pedido, pois não restou demonstrado o porte de arma de fogo, bem como o conjunto das atividades desempenhadas no cargo denotam que o trabalho era mais de controle de fluxo de pessoas ou cuidados/manutenção gerais com os prédios públicos e privados, do que atividades propriamente de vigilância, sem atuação na proteção patrimonial ou atividades tipicas de policiamento.
Improcedente o pedido, no ponto, mantendo a Sentença.
CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM PARA FINS DE APOSENTADORIA
O demandante busca a conversão de tempo de serviço exercido sob condições especiais em tempo de serviço comum, para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
O art. 57, § 5º, da Lei 8.213/91 estabelecia a possibilidade de converter o tempo de serviço especial em comum. Por força do art. 28 da MP 1.663-10, de 28/05/1998, o referido parágrafo havia sido revogado, com a finalidade de vedar a possibilidade de conversão de tempo especial em comum, após 28/05/1998. Quando convertida na Lei 9.711/98, contudo, a revogação do art. 57, § 5º, da Lei 8.213/91 não foi mantida. Nesse sentido é o entendimento do STJ, firmado nos temas 422 e 423 dos recursos repetitivos:
"EMENTA [...] PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL APÓS 1998. MP N. 1.663-14, CONVERTIDA NA LEI N. 9.711/1998 SEM REVOGAÇÃO DA REGRA DE CONVERSÃO. 1. Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/1991. [...] 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido." (REsp 1151363 MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011)
Esse entendimento é de observância obrigatória, nos termos do art. 927, do CPC.
Ainda, o Decreto nº 4.827, de 03 de setembro de 2003 alterou o art. 70 do Decreto nº 3.048/99, permitindo a conversão do tempo de serviço especial em comum a qualquer tempo. Da mesma forma o INSS assegura o direito de conversão do tempo de serviço especial em comum para qualquer tempo, nos termos do art. 256 da IN 77/2015:
"Art. 256. O tempo de trabalho exercido sob condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, conforme a legislação vigente à época da prestação do serviço será somado após a respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, qualquer que seja o período trabalhado, aplicando- se para efeito de concessão de qualquer benefício, a tabela de conversão constante no Anexo XXVIII."
Esse dispositivo demonstra que o próprio INSS vem reconhecendo a atividade especial, quando comprovada, em períodos anteriores a 1980. Nesse ponto deve ser rejeitada a tese de ser vedada a possibilidade de conversão, em período anterior a 10/12/1980. Tal vedação resultaria em prejuízo do trabalhador, indo de encontro ao objetivo da Lei 6.887/80, a qual buscou justamente possibilitar ao trabalhador aposentar-se antes da data em que se aposentaria, se simplesmente somasse os tempos de serviço, sem antes convertê-los, reparando, desse modo, os danos causados pelas condições adversas de trabalho. Nessa linha, entendo como perfeitamente possível a conversão de atividade especial em comum antes da Lei nº 6.887/80.
Quanto ao fator de conversão, deve ser utilizado o parâmetro vigente no momento da aposentação, aplicando-se o multiplicador 1,40, para homem, e 1,20, para mulher. Esse critério segue o entendimento firmado pelo STJ nos temas 422 e 423 dos recursos repetitivos:
"Temas 422/423 - Fator de conversão
EMENTA [...] CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM. OBSERVÂNCIA DA LEI EM VIGOR POR OCASIÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE. DECRETO N. 3.048/1999, ARTIGO 70, §§ 1º E 2º. FATOR DE CONVERSÃO. EXTENSÃO DA REGRA AO TRABALHO DESEMPENHADO EM QUALQUER ÉPOCA. 1. A teor do § 1º do art. 70 do Decreto n. 3.048/99, a legislação em vigor na ocasião da prestação do serviço regula a caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais. Ou seja, observa-se o regramento da época do trabalho para a prova da exposição aos agentes agressivos à saúde: se pelo mero enquadramento da atividade nos anexos dos Regulamentos da Previdência, se mediante as anotações de formulários do INSS ou, ainda, pela existência de laudo assinado por médico do trabalho. 2. O Decreto n. 4.827/2003, ao incluir o § 2º no art. 70 do Decreto n. 3.048/99, estendeu ao trabalho desempenhado em qualquer período a mesma regra de conversão. Assim, no tocante aos efeitos da prestação laboral vinculada ao Sistema Previdenciário, a obtenção de benefício fica submetida às regras da legislação em vigor na data do requerimento. 3. A adoção deste ou daquele fator de conversão depende, tão somente, do tempo de contribuição total exigido em lei para a aposentadoria integral, ou seja, deve corresponder ao valor tomado como parâmetro, numa relação de proporcionalidade, o que corresponde a um mero cálculo matemático e não de regra previdenciária. 4. Com a alteração dada pelo Decreto n. 4.827/2003 ao Decreto n. 3.048/1999, a Previdência Social, na via administrativa, passou a converter os períodos de tempo especial desenvolvidos em qualquer época pela regra da tabela definida no artigo 70 (art. 173 da Instrução Normativa n. 20/2007). 5. Descabe à autarquia utilizar da via judicial para impugnar orientação determinada em seu próprio regulamento, ao qual está vinculada. Nesse compasso, a Terceira Seção desta Corte já decidiu no sentido de dar tratamento isonômico às situações análogas, como na espécie (EREsp n. 412.351/RS). 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (REsp 1151363 MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011)"
Com base nesses fundamentos, os segurados do Regime Geral da Previdência Social que trabalhem sob condições especiais podem converter o tempo de serviço especial em tempo de serviço comum, mesmo antes de 10/12/1980 e após 28/05/1998, com a aplicação dos fatores de conversão estabelecidos na legislação vigente no momento da aposentadoria.
Inclusão de valores reconhecidos em sentença trabalhista - HB ACTIVO HOLDING S/A - 02/10/2002 a 29/09/2005
O autor pleiteia a inclusão, no cálculo do salário-de-benefício, de valores recebidos por força de acordo homologado na Justiça do Trabalho. Argumenta que o valor integral do acordo serviu de base à incidência das contribuições. O INSS se opôs ao pedido, argumentando que a sentença homologatória constitui início de prova material, insuficiente ao reconhecimento do tempo trabalho ou dos valores recebidos.
No que toca à averbação do tempo do trabalho, como visto, além das anotações em CTPS, houve confirmação testemunhal da efetiva prestação do trabalho perante este Juízo.
Já quanto à inclusão de valores do cálculo do salário-de-benefício, cabe notar que a incidência das contribuições previdenciárias no caso tem fato gerador distinto: a celebração do acordo em sede de ação trabalhista. Com efeito, no cálculo do salário-de-benefício são computadas as contribuições vertidas pelo empregado, cujo fato gerador são os pagamentos feitos a título de verbas salariais, arroladas no artigo 28, caput e §8º, da Lei nº 8.212/91. Assim, para que os valores pagos por força de acordo homologado na Justiça do Trabalho, faz-se necessária a discriminação da natureza das verbas pagas.
No caso em tela, tais verbas foram discriminadas nos seguintes termos (evento 1, ANEXOS PET17, p. 21):
"As partes estipulam que R$ 9.655,00 (nove mil seiscentos e cinquenta e cinco reais) se referem à diferença de FGTS + 40%, item 2 do pedido, e R$ 5.319,00 (cinco mil trezentos e dezenove reais) se referem aos domingos e feriados trabalhados, item 7 do pedido."
Esta Corte tem entendido que o êxito do segurado em anterior reclamatória trabalhista, no que pertine ao reconhecimento de parcelas salariais, atribui-lhe o direito de postular a revisão dos salários-de-contribuição componentes do período de cálculo do benefício, aproveitando-se as provas colhidas naquela demanda, não sendo necessária a participação do INSS na ação para que possa valer como meio de prova na lide previdenciária.
Sobre o assunto, refiro a seguinte jurisprudência:
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. DIFERENÇAS RECONHECIDAS EM RECLAMATÓRIA TRABALHISTA.
Ainda que não tenha o INSS participado da relação processual na Justiça Trabalhista, reconhecido o direito do empregado a aumento salarial nas competências integrantes do PBC, tais valores devem ser considerados no cálculo do benefício previdenciário. (AC 97.04.05591-9; Rel. Juíza Virgínia Scheibe; 5ª Turma; decisão 09/10/2000; unânime; DJU 25/10/2000)
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO.
(...)
2. O reconhecimento do direito à percepção de horas extras, através de sentença oriunda da Justiça do Trabalho transitada em julgado, justifica a revisão do benefício de aposentadoria, incluindo-se tais valores nos salários-de-contribuição, mesmo que o empregador não tenha recolhido as contribuições devidas.
(...) (AC 95.04.56698-7; Rel. Juíza Luíza Dias Cassales; 5ª Turma; julgamento em 07/11/96; unânime; DJU 12/03/97)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. REVISÃO. SENTENÇA PROLATADA EM RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. EFICÁCIA PROBATÓRIA. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. INTEGRAÇÃO NOS SALÁRIOS-DE-CONTRIBUIÇÃO. REAJUSTE DO BENEFÍCIO EM MAIO DE 1996. INPC. INADMISSIBILIDADE.
1. A decisão proferida em processo trabalhista plenamente contencioso produz efeitos externos. Tais efeitos só não se produzem naquelas hipóteses em que a reclamatória caracteriza mero artifício para forjar tempo de serviço fictício, em processo simulado.
(...) (AC 2000.71.00.009892-2; Rel. Juiz Antônio Albino Ramos de Oliveira; 5ª Turma; julgamento dia 20/02/2003; unânime; DJU 30/04/2003)
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE CÁLCULO DE BENEFÍCIO. INCLUSÃO DE PARCELAS RECONHECIDAS EM SEDE DE RECLAMAÇÃO TRABALHISTAS DENTRO DO PBC.
É cediço que, com relação aos salários-de-contribuição, o êxito em reclamatória trabalhista, na qual pleiteiam-se verbas não pagas, no Período Básico de Cálculo do salário-de-benefício, determinará a necessidade de recálculo da renda mensal inicial do benefício. Havendo um aumento dos salários, pelo pagamento ainda que tardio de verbas de natureza salarial, haverá, conseqüentemente, a necessidade de uma revisão do benefício concedido. Somente não caberá a revisão do cálculo da renda mensal inicial do benefício se o segurado, no Período Básico de Cálculo, já contribuía pelo teto de contribuição, uma vez que o excedente é desconsiderado para fins de recolhimento das contribuições. (AC 1999.71.00.021407-3; Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz; 5ª Turma; julgamento em 15/08/2002; unânime; DJU 04/09/2002)
Destarte, sigo na mesma linha dos julgados acima, considerando que à parte autora assiste o direito de obter a revisão do seu benefício, tendo por base os rendimentos que foram deferidos no processo trabalhista.
Acerca das parcelas componentes das contribuições previdenciárias para cálculo dos benefícios da Previdência Social, confira-se o que dispõe a Constituição Federal, em seu artigo 201, § 11º:Art. 201. (...)§ 11º. Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei.
A Lei nº 8.212/91, art. 28, I, dispõe:
Art. 28. Entende-se por salário-de-contribuição:
I - para o empregado e trabalhador avulso: a remuneração auferida em uma ou mais empresas, assim entendida a totalidade dos rendimentos pagos, devidos ou creditados a qualquer título, durante o mês, destinados a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa.
Refiro, ainda, o § 3º do art. 29 da Lei nº 8.213/91: Art. 29. O salário-de-benefício consiste: § 3º Serão considerados para cálculo do salário-de-benefício os ganhos habituais do segurado empregado, a qualquer título, sob forma de moeda corrente ou de utilidades, sobre os quais tenha incidido contribuições previdenciárias, exceto o décimo-terceiro salário (gratificação natalina).
Resta claro, portanto, que há previsão na Lei Maior e na legislação para que sejam considerados nos salários-de-contribuição todos os rendimentos auferidos a qualquer título pelo segurado.
O FGTS, contudo, não é verba integrante do salário de contribuição, porquanto se trata de parcela incidente sobre a remuneração do empregado, contudo, não lhe é paga como contraprestação mensal direta e imediata, logo, não se enquadra na definição articulada no art. 28, I, c/c § 9º, "e", nº 1, da Lei nº 8.213-91. Neste ponto, portanto, merece ser confirmada a Sentença.
Por fim, as verbas que contribuirão para o cálculo do salário-de-benefício estão elencadas no art. 28 da Lei 8.213-91.
DIREITO À APOSENTADORIA E FORMA DE CÁLCULO DO BENEFÍCIO
O direito à aposentadoria antes da Emenda Constitucional nº 20/98 surgia para o segurado homem com 30 anos de serviço e para a mulher com 25 anos, eis que prevista a possibilidade de concessão do benefício de forma proporcional. Com o advento da referida emenda, ocorreram grandes mudanças nas regras de concessão da aposentação. Porém, o art. 3º da inovação constitucional assegurou a concessão de aposentadoria e pensão, a qualquer tempo, aos segurados do RGPS, bem como aos seus dependentes, que, até a data da publicação da Emenda, tenham cumprido os requisitos para a obtenção destes benefícios, com base nos critérios da legislação então vigente.
Da mesma forma, a Lei 9.876/99 que mudou o cálculo do valor do salário-de-benefício, instituindo o fator previdenciário, determinou em seu art. 6° que o segurado que até o dia anterior à data de publicação da Lei tenha cumprido os requisitos para a concessão de benefício teria o cálculo da sua renda mensal inicial segundo as regras até então vigentes. Dessa forma, a aquisição do direito à concessão da aposentadoria possui três marcos aquisitivos, nos quais se verifica a situação do segurado nesses momentos, calculando-se o coeficiente da renda mensal inicial, de acordo com o tempo de serviço do segurado em cada um desses momentos. Significa que o segurado, para ter aplicado à sua aposentadoria a forma de cálculo do salário-de-benefício de acordo com a EC nº 20/98 ou Lei nº 9.876/99, não poderá contar tempo posterior às respectivas datas dessas normas, para o aumento de coeficiente de cálculo.
Nesse diapasão, com base no respeito ao direito adquirido, pode-se resumir a situação dos segurados, conforme o implemento dos requisitos para aposentadoria e o método de cálculo de seus benefícios da seguinte forma:
Situação 1 - Direito adquirido até a EC 20/98
1.1 Aposentadoria Integral: 30 anos de serviço (mulheres) / 35 anos de serviço (homens) / 100% da média dos 36 últimos salários-de-contribuição, encontrados nos 48 meses antes de 15/12/1998, de acordo com o art. 202, II da CF/88, antes EC 20/98 c/c redação original do art. 29 e 53 da lei 8.213/91
1.2 Aposentadoria proporcional: 25 anos de serviço (mulheres) / 30 anos de serviço (homens) / 70 % da média dos 36 últimos salários-de-contribuição, encontrados nos 48 meses antes de 15/12/1998 + 6% a cada ano adicional até essa data, como determina o art. 202, §1º da CF/88, antes da EC 20/98 c/c redação original do art. 29 e 53 da Lei 8.213/91
Situação 2 - Direito adquirido até a Lei 9.876/99
2.1 Aposentadoria Integral: 30 anos de serviço (mulheres) / 35 anos de serviço (homens) / 100% da média dos 36 últimos salários-de-contribuição, encontrados nos 48 meses antes de 28/11/1999, conforme o art. 201, § 7º da CF/88, com redação dada pela EC 20/98 c/c redação original do art. 29 e 53 da lei 8.213/91
2.2 Aposentadoria proporcional: para os segurados já vinculados ao RGPS antes de 15/12/1998 (EC 20/98) / 25 anos de serviço e idade de 48 anos (mulheres) / 30 anos de serviço e idade de 53 anos (homens) + 40% do tempo faltante até 15/12/98 (pedágio) / 70% da média dos 36 últimos salários-de-contribuição, encontrados nos 48 meses antes de 28/11/1999, + 5% a cada ano adicional até essa data, com fundamento no art. 9º, § 1º, inc. I e II da EC 20/98 c/c redação original do art. 29 da lei 8.213/91
Situação 3 - Direito adquirido após a Lei 9.876/99
3.1 Aposentadoria Integral: 30 anos de serviço (mulheres) / 35 anos de serviço (homens) / 100% da média dos 80% maiores salários-de-contribuição desde julho de 94 com fator previdenciário, de acordo com o art. 201, § 7º da CF/88, com redação dada pela EC 20/98 c/c art. 29 da lei 8.213/91, redação dada pela lei 9.876/99, e art. 53 da Lei 8.213/91 e art. 39, IV do Decreto 3.048/99
3.2 Aposentadoria Proporcional: para os segurados já vinculados ao RGPS antes de 15/12/1998 (EC 20/98) / 25 anos e idade de 48 anos (mulheres) / 30 anos e idade de 53 anos (homens) + 40% do tempo faltante até 15/12/98 (pedágio) / 70% da média dos 80% maiores salários-de-contribuição desde julho de 94 com fator previdenciário + 5% a cada ano adicional, conforme o art. 9º, § 1º, inc. I e II da EC 20/98 c/c art. 3º da lei 9.876/99
No caso concreto, a soma do tempo de serviço já reconhecido pelo INSS (Evento 34 PROCADM3) com o cômputo do tempo de serviço rural (04 anos, 11 meses e 01 dia) o acréscimo do tempo de serviço especial, possibilita a concessão da Aposentadoria por Tempo de Contribuição antes da EC 20/98 e na DER (17/12/2007), sendo que antes da vinda da Lei n. 9.876/99 não preenche o requisito etário.
Por fim, em 17/12/2007(DER) tinha direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (regra permanente do art. 201, §7º, da CF/88), possuindo a faixa etária mínima exigida, cumprido o pedágio e o tempo de serviço necessário. O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, porque a DER é anterior a 18/06/2015, data do início da vigência da MP 676/2015, convertida na Lei 13.183/2015.
Logo, a parte autora tem o direito à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição para corresponder a 100% da média dos 80% maiores salários-de-contribuição existentes após julho de 1994, devidamente atualizados até 1712/2007 (DIB), com fator previdenciário, nos termos art. 201, § 7º da CF/88, com redação dada pela EC 20/98 c/c art. 29 da lei 8.213/91, redação dada pela lei 9.876/99, e art. 53 da Lei 8.213/91 e art. 39, IV do Decreto 3.048/99. O coeficiente de cálculo é estabelecido, descontando-se o tempo de serviço utilizado para o preenchimento do pedágio.
O termo inicial do benefício deve ser fixado em 17/12/2007(DER), na forma do art. 54 c/c o art. 49, ambos da Lei 8.213/91.
Optando a parte autora pelo cálculo da RMI até a EC 20/98, deverão ser utilizados os salários de contribuição até 16/12/1998 para apuração da RMI, conforme a legislação previdenciária regente, e atualizada a RMI de 16/12/1998 até a DER pelo indices de manutenção dos beneficios previdenciários.
Ressalto que somente o primeiro reajuste após a data de início do benefício será proporcional, devendo ser aplicado o reajuste integral aos demais.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública passa por situação de grande incerteza quanto aos critérios que devem ser utilizados. Pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810), a partir da vigência da Lei 11.960/09.
O recente art. 491 do CPC/2015, segundo o qual os consectários devem ser definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às peculiaridades do caso concreto. Nesse sentido o seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido.
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a sua definição.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentada a possibilidade de diferir para a fase de execução a análise das teses referentes a juros de mora e à correção monetária (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que sejam definidos na fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Diante disso, difere-se para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, restando prejudicada a remessa necessária, no ponto. Apelação das partes que venham a discutir esses indexadores, também se submetem a fase de cumprimento da sentença, onde poderão ser valer da via conciliatória.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Reformo a Sentença, para condenar o INSS ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da parte autora, dada a procedência do pedido de Aposentadoria por Tempo de Contribuição em favor da parte autora, sendo vencedor no pleito principal. Devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação os honorários advocatícios, seguindo a sistemática do CPC/73 vigente na data da publicação da sentença, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula n. 111 do STJ e Sumula n. 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
CUSTAS PROCESSUAIS
O INSS é isento do pagamento no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (art. 11 da Lei nº 8.121/85, com a redação dada pela Lei nº 13.471/2010), isenção esta que não se aplica quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
DO PREQUESTIONAMENTO
Os fundamentos para o julgamento do feito trazem nas suas razões de decidir a apreciação dos dispositivos citados, utilizando precedentes jurisprudenciais, elementos jurídicos e de fato que justificam o pronunciamento jurisdicional final. Ademais, nos termos do § 2º do art. 489 do CPC/2015, "A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé". Assim, para possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos recursos oferecidos pelas partes, nos termos em que fundamentado o voto.
TUTELA ESPECÍFICA
O CPC/2015 aprimorou a eficácia mandamental das decisões que tratam de obrigações de fazer e não fazer e reafirmou o papel da tutela específica. Enquanto o art. 497 do CPC/2015 trata da tutela específica, ainda na fase cognitiva, o art. 536 do CPC/2015 reafirma a prevalência da tutela específica na fase de cumprimento da sentença. Ainda, os recursos especial e extraordinário, aos quais está submetida a decisão em segunda instância, não possuem efeito suspensivo, de modo que a efetivação do direito reconhecido pelo tribunal é a prática mais adequada ao previsto nas regras processuais civis. Assim, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora (NB 146.001.567-0/42 ), a ser efetivada em 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
CONCLUSÃO
Reformada a Sentença, com o reconhecimento do tempo de serviço rural e acrescido ao reconhecimento do tempo de serviço especial, concedendo o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral e o pagamento das parcelas vencidas desde a DER (17/12/2007), prejudicado o exame do critério de aplicação dos juros e correção monetária.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao Apelo da parte autora, negar provimento ao Apelo do INSS e a remessa oficial, e determinar o cumprimento imediato do acórdão.
Ezio Teixeira
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 09/11/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5022349-60.2010.4.04.7000/PR
ORIGEM: PR 50223496020104047000
RELATOR | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JOSE ANTAO DOS SANTOS FILHO |
ADVOGADO | : | ANTONIO MIOZZO |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 09/11/2016, na seqüência 701, disponibilizada no DE de 24/10/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA, NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS E A REMESSA OFICIAL, E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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