APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002973-53.2013.4.04.7107/RS
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RELATOR |
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TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | PEDRO PINHEIRO |
ADVOGADO | : | HENRIQUE OLTRAMARI |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. ATIVIDADE ESPECIAL. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. TRABALHADOR DA AGROPECUÁRIA. AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. AMIANTO. AGENTES QUÍMICOS. QUANTIDADE DE EXPOSIÇÃO. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA NA EXPOSIÇÃO AOS AGENTES NOCIVOS. REQUISITOS IMPLEMENTADOS - DIREITO À CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL
1. Na medida em que comprovado o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, o segurado faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço.
2. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.
3. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
4. As atividades de trabalhador da agropecuária exercida até 28-04-1995 devem ser reconhecidas como especiais em decorrência do enquadramento por categoria profissional previsto à época da realização do labor
5. Tendo havido oscilação dos níveis de tolerância da exposição a ruído ocupacional, previstos nos normativos que se sucederam, devem ser considerados os parâmetros previstos pela norma vigente ao tempo da prestação do serviço, ainda que mais recentemente tenha havido redução do nível máximo de exposição segura. Precedentes do STJ (Ag.Rg. no REsp 1381224/PR)
6. Até 05-03-1997 é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto n. 53.831/64, tendo em vista que, até aquela data, são aplicáveis concomitantemente, para fins de enquadramento, os Decretos n. 53.831/64, n. 72.771/73 e n. 83.080/79. Em relação ao período posterior, exige-se a exposição a ruídos superiores a 90 decibéis até 18-11-2003 (Anexo IV dos Decretos n. 2.172/97 e n. 3.048/99, este na redação original) e, a partir de então, a ruídos superiores a 85 decibéis, conforme a alteração trazida pelo Decreto n. 4.882, de 18-11-2003, ao Decreto n. 3.048/99
7. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a submissão contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Não se interpreta como ocasional, eventual ou intermitente a exposição ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Precedentes desta Corte.
8. Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos - tóxicos orgânicos e inorgânicos - , diferentemente do que ocorre com alguns agentes agressivos, como ruído, calor, frio ou eletricidade, não dependem, segundo os normativos aplicáveis, de análise quanto ao grau ou intensidade de exposição no ambiente de trabalho para a configuração da nocividade e reconhecimento da especialidade do labor para fins previdenciários.
9. Nos limites em que comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade do tempo de labor correspondente.
10. Implementados mais de 25 anos de tempo de atividade sob condições nocivas e cumprida a carência mínima, é devida a concessão do benefício de aposentadoria especial, a contar da data do requerimento administrativo, nos termos do § 2º do art. 57 c/c art. 49, II, da Lei n. 8.213/91.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido, negar provimento ao apelo do autor, dar parcial provimento ao apelo do INSS e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de novembro de 2017.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9188574v44 e, se solicitado, do código CRC FADB38A5. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Taís Schilling Ferraz |
| Data e Hora: | 30/11/2017 19:17 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002973-53.2013.4.04.7107/RS
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TAIS SCHILLING FERRAZ |
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APELANTE | : | PEDRO PINHEIRO |
ADVOGADO | : | HENRIQUE OLTRAMARI |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária proposta por PEDRO PINHEIRO contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, postulando a concessão de aposentadoria especial, desde a DER (05-03-2012), mediante o reconhecimento, como tempo de serviço, da atividade que sustenta ter exercido como trabalhador rural nos períodos de 11/05/1973 a 31/03/1981 e 13/06/1981 a 02/06/1986, da conversão dos períodos de tempo comum em tempo especial, bem como da natureza especial, prejudicial à saúde ou à integridade física, de atividades laborais que alega ter desenvolvido nos períodos de 03/06/1985 a 10/04/1987, 07/06/1989 a 15/06/1994, 21/11/1994 a 02/03/1995 e 20/03/1995 a 25/06/2011.
Da decisão que indeferiu a produção de prova pericial (evento 18), a parte autora apresentou agravo retido (evento 23).
Sentenciando, o juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo o exercício de atividade rural nos períodos de 11/05/1973 a 31/03/1981 e 13/06/1981 a 02/06/1986, bem como a especialidade do tempo de serviço nos períodos de 03/06/1985 a 10/04/1987, 21/11/1994 a 02/03/1995, 07/06/1989 a 15/06/1994, 20/03/1995 a 30/09/2002 e 19/11/2003 a 25/06/2011; reconhecendo a exposição ao agente nocivo amianto nos períodos de 07/06/1989 a 15/06/1994 e 20/03/1995 a 30/09/2002, com fator de conversão 1,25, para efeito de concessão de aposentadoria especial; condenando o INSS a conceder à parte autora aposentadoria especial, desde a DER (05-03-2012). Condenou o INSS a pagar à parte autora as diferenças vencidas e vincendas decorrentes da concessão do benefício, a partir da DER, aplicando-se, por força da Lei n. 11.960/2009, os índices oficiais de remuneração e juros aplicados à caderneta de poupança para a atualização monetária e compensação da mora. Em face da sucumbência da ré na maior parte dos pedidos, condenou-a ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §3º, do CPC, observadas as Súmulas 76 do TRF da 4ª Região e 111 do STJ. Custas isentas (evento 135).
A parte autora apela reiterando, preliminarmente, às razões do agravo retido. Sustenta ter ocorrido cerceamento de defesa quanto ao indeferimento da produção de prova pericial, uma vez que as informações registradas no PPP da empresa Fras-le estão equivocadas, sendo divergentes das conclusões de perícias realizadas em outras ações. No mais, postula o reconhecimento da especialidade do labor no período de 01-10-2002 a 18-11-2003, por exposição ao agente nocivo ruído e de 01-10-2002 a 25-06-2011 pela exposição a agentes químicos. Caso necessário, postula a reafirmação da DER (evento 139).
O INSS, por sua vez, recorre postulando, preliminarmente, a submissão do feito ao reexame necessário. No mérito, requer o afastamento do reconhecimento da atividade rural, diante da ausência de início de prova material do labor em regime de economia familiar. Defende a necessidade de apresentação de documentos contemporâneos ao período que se busca o reconhecimento, sendo necessária a comprovação da comercialização da produção rurícola. Afirma que não houve comprovação de que a atividade rural era a única fonte de renda do grupo familiar. Sustenta, ainda, o afastamento do reconhecimento dos períodos de atividade especial, diante da não comprovação da habitualidade e permanência na exposição a agentes nocivos por meio de laudo técnico contemporâneo. Alega que, para os agentes químicos, é necessária a descrição dos agentes, bem como dos níveis de concentração. Subsidiariamente, postula que a incidência de honorários advocatícios seja limitada às parcelas vencidas até a data da sentença (evento 143).
Com contrarrazões, e por força do reexame necessário, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
O autor postulou a antecipação dos efeitos da tutela em petição protocolada em 19-09-2017 (evento 2 desta instância).
É o relatório.
VOTO
JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE
Os apelos preenchem os requisitos de admissibilidade.
REEXAME NECESSÁRIO
Nos termos do artigo 14 do novo CPC, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".
A nova lei processual prevê que serão salvaguardados os atos já praticados, perfeitos e acabados na vigência do diploma anterior, e que suas disposições aplicam-se aos processos em andamento, com efeitos prospectivos.
As sentenças sob a égide do CPC de 1973, sujeitavam-se a reexame obrigatório se condenassem a Fazenda Pública ou em face dela assegurassem direito controvertido de valor excedente a 60 salários mínimos.
O CPC de 2015 definiu novos parâmetros de valor, no art. 496, § 3º, para reexame obrigatório das sentenças. O texto afastou o interesse da Fazenda Pública em ver reexaminadas decisões que a condenem ou garantam o proveito econômico à outra parte em valores correspondentes a até mil salários mínimos.
No caso concreto, o valor do proveito econômico, ainda que não registrado na sentença, é mensurável por cálculos meramente aritméticos, o que caracteriza como líquida a decisão, para efeitos de aferição da necessidade de reexame obrigatório.
O INSS foi condenado ao pagamento de benefício previdenciário de prestação continuada, fixando-se a data de início dos efeitos financeiros, bem como todos os consectários legais aplicáveis.
Embora ainda não tenha sido calculado o valor da renda mensal inicial - RMI do benefício, é possível estimar, a partir da remuneração que vinha sendo auferida pela parte, registrada nos autos, que o valor do benefício resultante, multiplicado pelo número de meses correspondentes à condenação, entre a DER e a sentença, resultará em valor manifestamente inferior ao limite legal para o reexame obrigatório.
Impõe-se, para tal efeito, aferir o montante da condenação na data em que proferida a sentença. Valores sujeitos a vencimento futuro não podem ser considerados, pois não é possível estimar por quanto tempo o benefício será mantido. Não se confundem valor da condenação e valor da causa. Se é a sentença que está ou não sujeita a reexame, é no momento de sua prolação que o valor da condenação, para tal finalidade, deve ser estimado.
Assim, sendo a condenação do INSS fixada em valor manifestamente inferior a mil salários mínimos, a sentença não está sujeita ao reexame obrigatório, de forma que a remessa não deve ser conhecida nesta Corte.
Assim, nego provimento ao apelo no ponto.
Do agravo retido
Preliminarmente, não procedem as alegações da parte autora em agravo retido. Nos termos do art. 370 do Novo CPC, como já previa o CPC/1973 no art. 130, cabe ao julgador, inclusive de ofício, determinar a produção das provas necessárias ao julgamento de mérito. Portanto, se entender encontrar-se munido de suficientes elementos de convicção, é dispensável a produção de outras.Nego provimento, portanto, ao agravo retido da parte autora.
MÉRITO
A controvérsia restringe-se:
- ao reconhecimento da atividade rural desempenhada sob o regime de economia familiar nos períodos de 11/05/1973 a 31/03/1981 e 13/06/1981 a 02/06/1986;
- ao reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 03/06/1985 a 10/04/1987, 07/06/1989 a 15/06/1994, 21/11/1994 a 02/03/1995, 20/03/1995 a 30/09/2002, 01/10/2002 a 18/11/2003 e 19/11/2003 a 25/06/2011;
- à habitualidade e permanência na exposição aos agentes nocivos;
- à necessidade de laudo técnico contemporâneo;
- à necessidade de análise quantitativa para os agentes químicos;
- à consequente concessão de aposentadoria especial, desde a DER (05-03-2012);
- aos honorários advocatícios.
TEMPO DE SERVIÇO RURAL
O aproveitamento do tempo de atividade rural desenvolvida até 31 de outubro de 1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.
Outrossim, o cômputo do tempo de serviço rural exercido no período anterior à Lei n.º 8.213/91, em regime de economia familiar e sem o recolhimento das contribuições, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
Como regra geral, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91; Recurso Especial Repetitivo n.º 1.133.863/RN, Rel. Des. convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
A relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural no período controvertido, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar, em conformidade com o teor da Súmula n.º 73 deste Tribunal Regional Federal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental." (DJU, Seção 2, de 02/02/2006, p. 524).
O início de prova material, de outro lado, não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental (STJ, AgRg no REsp 1.217.944/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, julgado em 25/10/2011, DJe 11/11/2011).
Ademais, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016), que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".
Quanto à idade mínima para exercício de atividade laborativa, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais consolidou o entendimento no sentido de que "A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários." (Súmula n.º 05, DJ 25/09/2003, p. 493). Assim, e considerando também os precedentes da Corte Superior, prevalece o entendimento de que "as normas que proíbem o trabalho do menor foram criadas para protegê-lo e não para prejudicá-lo." Logo, admissível o cômputo de labor rural já a partir dos 12 anos de idade.
EXAME DO TEMPO RURAL NO CASO CONCRETO
A título de prova documental do exercício da atividade rural, a parte autora, nascida em 11-05-1961, em Três de Maio-RS, trouxe aos autos:
- cópia de registro geral de imóveis da Comarca de Três de Maio, na qual consta que Nercy Pinheiro, genitor do demandante, qualificado naquela ocasião como agricultor, adquiriu imóvel rural no ano de 1980 (evento 1, procadm3, fl. 11);
- ficha de associado junto ao Sindicato de Trabalhadores Rurais, em nome do pai do autor, datada de 1994 (evento 1, procadm3. fl. 16);
- notas fiscais de produtor rural em nome dos pais do requerente, datadas de 1998 e 1999 (evento1, procadm5, fls. 01-04);
- notas fiscais de produtor rural em nome da pai do autor, emitidas em 2000 (evento1, procadm5, fl. 05);
- ficha de criador em nome de pai do demandante, com registros entre 2002 e 2008 (evento 1, procadm5, fl. 06);
- documentos de ITR em nome do genitor do requerente, referentes aos exercícios de 1988 e 2012 (evento 1, procadm5, fls. 07-08);
- certidão de nascimento de irmão do autor, ocorrido em 27-09-1965, na qual seu pai foi qualificado como agricultor (evento 1, procadm5, fl. 10);
- certidão de casamento dos pais do demandante, celebrado em 16-07-1960, na qual o pai foi qualificado como agricultor (evento 1, procadm5, fl. 11).
Tais documentos constituem início de prova material do alegado labor rural.
Conforme já mencionado acima, a relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa e é possível a parte utilizar-se de documentos em nome de membros do núcleo familiar, como na espécie.
Quanto ao argumento de que as provas não são contemporâneas ao período do labor, não merece prosperar. Observa-se que os documentos juntados abrangem grande lapso temporal, demonstrando a vocação campesina da família por longo período. Ademais, em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, o qual seguiu o rito dos recursos repetitivos, firmou-se entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.
A prova testemunhal produzida em Justificação Administrativa realizada em 15/10/2013 (evento 43) , por sua vez, é robusta e uníssona no sentido de confirmar o exercício da atividade rural nos períodos de 11/05/1973 a 31/03/1981 e 13/06/1981 a 02/06/1985. Os depoentes relataram conhecer o autor da localidade de Nossa Senhora de Lourdes, interior do município de Três de Maio-RS. Disseram que no período de sua infância e sua adolescência, ele trabalhou em terras pertencentes aos seus pais, as quais tinham dez hectares, não sendo, porém todos aproveitáveis para agricultura, visto que se tratava de terreno dobrado e de difícil manejo. Afirmaram que o demandante exerceu a atividade rurícola juntamente com seus pais e irmãos, sem contratação de empregados e de forma manual. Citaram os produtos cultivados e esclareceram que parte era destinado ao consumo, sendo o excedente comercializado na região. Por fim, referiram que a atividade foi exercida até o autor deixar definitivamente a localidade para trabalhar em metalúrgica em Caxias do Sul.
Alega o INSS que houve descaracterização do regime de economia familiar pela percepção de fonte de renda não proveniente da atividade campesina. Contudo, assiste razão ao INSS apenas em parte.
Confome cópia da CTPS juntada aos autos (evento 1, procadm3, fl. 20), no período de 03/06/1985 a 10/04/1987, o autor apresentou vínculo de emprego com a empresa Elege SA, no cargo de auxiliar de serviços gerais em granja. Portanto, diante da percepção da renda oriunda de contrato formal de trabalho, não é possível o reconhecimento da atividade rural em regime de economia familiar, devendo ser excluído o período de 03/06/1985 a 02/06/1986, dos reconhecidos pelo magistrado a quo.
Quanto aos demais períodos, não há prova da obtenção de renda estranha à atividade rural em regime de economia familiar, tendo a prova testemunhal demonstrado a necessidade do labor rural à subistência do autor e de seu grupo familiar.
Portanto, resta comprovado o exercício da atividade rural no período de 11/05/1973 a 31/03/1981 e 13/06/1981 a 02/06/1985, merecendo parcial reforma a sentença para excluir o período de 03/06/1985 a 02/06/1986 dos intervalos já computados pelo juízo de origem.
TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL
O tempo de serviço especial é disciplinado pela lei vigente à época em que exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço, o segurado adquire o direito à sua contagem pela legislação então vigente, não podendo ser prejudicado pela lei nova. Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (AGRESP 493.458/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª Turma, DJU 23/06/2003, e REsp 491.338/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJU 23/06/2003), a qual passou a ter previsão legislativa expressa com a edição do Decreto n.º 4.827/03, que inseriu o § 1º no art. 70 do Decreto n.º 3.048/99.
Isso assentado, e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28-04-1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade profissional enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para ruído, em que necessária sempre a aferição do nível de decibéis (dB) por meio de parecer técnico trazido aos autos, ou simplesmente referido no formulário padrão emitido pela empresa;
b) a partir de 29-04-1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre essa data e 05-03-1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95, no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico;
c) após 06-03-1997, quando vigente o Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei n.º 9.528/97, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Essa interpretação das sucessivas normas que regulam o tempo de serviço especial está conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 415.298/SC, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 06/04/2009; AgRg no Ag 1053682/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 08/09/2009; REsp 956.110/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/10/2007; AgRg no REsp 746.102/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 07/12/2009).
Fator de conversão
Registre-se que o fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é aquele previsto na legislação aplicada na data concessão do benefício e no cálculo de sua renda mensal inicial, e não o contido na legislação vigente quando o serviço foi prestado. A propósito, a questão já foi pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de Recurso Especial Repetitivo (REsp 1151363/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, 3ª Seção, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011).
Agente Nocivo Ruído
Especificamente quanto ao agente nocivo ruído, o Quadro Anexo do Decreto n. 53.831, de 25-03-1964, o Quadro I do Decreto n. 72.771, de 06-09-1973, o Anexo I do Decreto n. 83.080, de 24-01-1979, o Anexo IV do Decreto n. 2.172, de 05-03-1997, e o Anexo IV do Decreto n. 3.048, de 06-05-1999, alterado pelo Decreto n. 4.882, de 18-11-2003, consideram insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 80, 85 e 90 decibéis, de acordo com os Códigos 1.1.6, 1.1.5, 2.0.1 e 2.0.1, nos termos abaixo:
Até 05-03-1997:
1. Anexo do Decreto n. 53.831/64 - Superior a 80 dB;
2. Quadro I do Decreto n. 72.771/73 e Anexo I do Decreto n. 83.080/79 - Superior a 90 dB.
De 06-03-1997 a 06-05-1999:
Anexo IV do Decreto n. 2.172/97 - Superior a 90 dB.
De 07-05-1999 a 18-11-2003:
Anexo IV do Decreto n. 3.048/99, na redação original - Superior a 90 dB.
A partir de 19-11-2003:
Anexo IV do Decreto n. 3.048/1999 com a alteração introduzida pelo Decreto n. 4.882/2003 - Superior a 85 dB.
Embora a redução posterior do nível de ruído admissível como prejudicial à salubridade tecnicamente faça presumir ser ainda mais gravosa a situação prévia (a evolução das máquinas e das condições de labor tendem a melhorar as condições de trabalho), pacificou o egrégio Superior Tribunal de Justiça que devem limitar o reconhecimento da atividade especial os estritos parâmetros legais vigentes em cada época (RESP 1333511 - Min. Castro Meira, e RESP 1381498 - Min. Mauro Campbell).
Revisando jurisprudência desta Corte, providência do Colegiado para a segurança jurídica da final decisão esperada, passa-se a adotar o critério da egrégia Corte Superior, de modo que é tida por especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibeis até a edição do Decreto 2.171/97. Após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibeis. Com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância ao agente físico ruído foi reduzido para 85 decibeis (AgRg no REsp 1367806, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, vu 28-05-2013), desde que aferidos esses níveis de pressão sonora por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.
Para fins de enquadramento, em não havendo informação quanto à média ponderada de exposição ao ruído, deve-se adotar o critério dos picos de ruído, afastando-se o cálculo pela média aritmética simples, por não representar com segurança o grau de exposição ao agente nocivo durante a jornada de trabalho.
EXAME DO TEMPO ESPECIAL NO CASO CONCRETO
Passo, então, ao exame dos períodos controvertidos nesta ação, com base nos elementos contidos nos autos e na legislação de regência, para concluir pelo cabimento ou não do reconhecimento da natureza especial da atividade desenvolvida.
Período: 03/06/1985 a 10/04/1987.
Empresa: BRF Brasil Foods.
Atividade/função: auxiliar de serviços gerais no setor de reflorestamento.
Categoria profissional: trabalhadores na agropecuária.
Agentes nocivos: inseticidas fosforados e organofosforados, hidrocarbonetos aromáticos e outros compostos de carbono provenientes de inseticidas.
Prova: PPP-Perfil profissiográfico previdenciário (evento 1, procadm3, fl. 27), laudo pericial por similaridade (evento 129), CTPS (evento 1, procadm3, fl. 20).
Enquadramento legal: trabalhadores na agropecuária: item 2.2.1 do do Anexo ao Decreto n.º 53.831/64; fósforo: item 1.2.6 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/64 e do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79; tóxicos orgânicos: código 1.2.11 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/64; hidrocarbonetos e outros compostos de carbono: código 1.2.10 do Anexo I do Decreton.º 83.080/79.
Conclusão: o PPP descreve que o autor desenvolvia atividades de plantio de eucalipitos, adubação de mudas, trato de animais e limpeza de galpões, estando sujeito a agente nocivo químico pelo uso de formicida em pó. Consta registro de responsável técnico legalmente habilitado para os registros ambientais, sendo, portanto, o PPP prova adequada da especialidade. Ademais, o demandante juntou laudo pericial com análise de atividades similares, na qual consta que há exposição a inseticidas fosforados e organofosforados, fungicidas e inseticidas derivados do ácido carbônico, inseticidas clorados derivados de hidrocarbonetos. Por fim, registro que se impõe o reconhecimento da especialidade pela categoria profissional de trabalhadores na agropecuária, consoante se verifica em CTPS, a qual descreve que a empregadora era estabelecimento agrícola, bem como nas atividades descritas no PPP. Os agentes nocivos aos quais estava exposta a parte autora estão elencados como especiais, a atividade é enquadrada como especial e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor, devendo ser confirmada a sentença no ponto.
Período: 07/06/1989 a 15/06/1994.
Empresa: Fras-le.
Atividade/função: auxiliar de limpeza industrial.
Agente nocivo: níveis de ruído de 87,9 e 90 dB e amianto
Prova: PPP-Perfil profissiográfico previdenciário (evento 1, procadm3, fls. 28-29);
Enquadramento legal: ruído superior a 80 decibéis até 05/03/1997: item 1.1.6 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/64 e item 1.1.5 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79; amianto: código 1.0.2 (asbestos) do Anexo IV do Dec. n. 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99.
Conclusão: o PPP fornecido pela empregadora registra responsável técnico legalmente habilitado para os registros ambientais e as técnicas utilizadas para aferição dos agentes nocivos, sendo, portanto, prova adequada da especialidade do labor. Os níveis de ruído são superiores ao limite legal de tolerância, além de estar registrada a exposição a amianto. Ainda que tenha sido constatada, através de estudos científicos, a prejudicialidade do agente nocivo asbesto e tenha sido editada apenas em 1997, por força do Decreto n. 2.172, norma redefinindo o enquadramento da atividade pela exposição ao referido agente, é certo que, independentemente da época da prestação laboral, a agressão ao organismo era a mesma, de modo que o tempo de serviço do autor deva ser considerado especial com possibilidade de aposentação aos 20 anos de labor. Quanto ao nível de concentração de tais agentes, os riscos ocupacionais gerados pela sua exposição, diferentemente do que ocorre com alguns agentes agressivos, como ruído, calor, frio ou eletricidade, não dependem, segundo os normativos aplicáveis, de análise quanto ao grau ou intensidade de exposição no ambiente de trabalho para a configuração da nocividade e reconhecimento da especialidade do labor para fins previdenciários. Dessa forma, em decorrência da exposição do autor ao agente nocivo asbesto, ao se verificar o tempo de serviço especial total do autor, o período em questão deve ser convertido pelo fator 1,25, tornando-se, assim, equivalente àqueles demais em que o autor esteve exposto a agentes que acarretem a aposentação aos 25 anos de serviço. Os agentes nocivos aos quais estava exposta a parte autora estão elencados como especiais e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor, devendo ser confirmada a sentença no ponto.
Período: 21/11/1994 a 02/03/1995.
Empresa: Chapecó Companhia Industrial de Alimentos.
Atividade/função: auxiliar de produção no setor de desossa.
Agente nocivo: níveis de ruído de 88 dB e umidade.
Prova: PPP-Perfil profissiográfico previdenciário (evento 1, procadm4, fls. 01-02) e laudo técnico de (evento 1, procadm4, fls. 03-04).
Enquadramento legal: ruído superior a 80 decibéis até 05/03/1997: item 1.1.6 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/64 e item 1.1.5 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79; umidade: 1.1.3 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/64.
Conclusão: o PPP e o laudo técnico que o acompanha registram a exposição a níveis de ruído superiores ao limite legal de tolerância, bem como à umidade. Os agentes nocivos aos quais estava exposta a parte autora estão elencados como especiais e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor, devendo ser confirmada a sentença no ponto.
Períodos: 20/03/1995 a 30/09/2002, 01/10/2002 a 18/11/2003 e 19/11/2003 a 25/06/2011.
Empresa: Fras-le.
Atividade/função: prenseiro no setor de prensa-pastilhas (20/03/1995 a 30/06/1997) e operador de produção no setor de beneficiamento de pastilhas (01/07/1997 a 25/06/2011).
Agente nocivo: amianto (20/03/1995 a 30/09/2002); picos de ruído de 89,4 dB ( 20/03/1995 a 30/06/1997), 93,5 dB (01/07/1997 a 31/12/1999), 90,6 dB (01/01/2000 a 31/12/2000), 92,6 dB (01/01/2001 a 31/12/2001), 89,4 dB (19/11/2003 a 31/12/2004), 91,1 dB (01/01/2005 a 31/12/2007), 91 dB (01/01/2008 a 31/12/2008), 94,4 dB (01/01/2009 a 25/06/2011).
Prova: PPP-Perfil profissiográfico previdenciário (evento 1, procadm4, fls. 05-10).
Enquadramento legal: ruído superior a 80 decibéis até 05/03/1997: item 1.1.6 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/64 e item 1.1.5 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79; ruído superior a 90 decibéis a partir de 06-03-97 até 18-11-2003: item 2.0.1 do Anexo IV do Dec. n. 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99 na redação original; ruído superior a 85 decibeis a partir de 19-11-2003: item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n. 3.048/1999 com a alteração introduzida pelo Decreto n. 4.882/2003; abestos: item 1.0.2 do Anexo IV do Decreto n. 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto n. 3.048/99.
Conclusão: quanto ao pedido de reconhecimento da especialidade do labor no período de 01/10/2002 a 25/06/2011 por exposição a agentes químicos, não assiste razão à parte autora, visto que o PPP registra exposição a "poeiras totais", sem descrever que esteja se referindo a agente químico. Trata-se de item não previsto, portanto, na legislação de regência, e tampouco se pode presumir a sua nocividade à integridade física do segurado. Observo que, ainda que o autor tenha dado continuidade a função anteriormente exercida de operador de produção no setor de beneficiamento de pastilhas, não há provas de que permaneceu exposto a amianto a partir de 01/10/2002, visto que, conforme laudos periciais juntados aos autos (evento 139), a empresa utilizou amianto no processo produtivo somente até outubro de 2009.
No mesmo sentido, não é possível o reconhecimento da especialidade de 01/10/2002 a 18/11/2003 por exposição a ruído, uma vez que o PPP registra para o período níveis de ruído de 63,3 a 89,4 dB, os quais são inferiores ao limite legal de tolerância. Registro, ainda, que não há razões para infirmar as conclusões do PPP, uma vez que este apresenta os riscos ambientais contemporâneos ao tempo de labor e indica as técnicas de aferição do ruído e dos agentes químicos. O formulário informa, ainda, os responsáveis técnicos legalmente habilitados para os registros ambientais.
Restou comprovada a exposição ao agente nocivo ruído em níveis superiores ao limite legal de tolerância nos períodos de 20/03/1995 a 31/12/2001 e 19/11/2003 a 25/06/2011, bem como a amianto no período de 20/03/1995 a 30/09/2002, para o qual o reconhecimento da especialidade do labor independe de análise quantitativa da exposição.
Observo que, como anteriormente afirmado, a exposição a amianto (asbesto), independentemente da época da prestação laboral, enseja o reconhecimento da especialidade do labor com possibilidade de aposentação aos 20 anos de labor. Assim, em decorrência da exposição do autor ao agente nocivo asbesto, ao se verificar o tempo de serviço especial total do autor, o período de 20/03/1995 a 30/09/2002, deve ser convertido pelo fator 1,25, tornando-se, assim, equivalente àqueles demais em que o autor esteve exposto a agentes que acarretem a aposentação aos 25 anos de serviço.
Os agentes nocivos aos quais estava exposta a parte autora estão elencados como especiais e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor, devendo ser confirmada a sentença no ponto.
Intermitência na exposição aos agentes nocivos
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição é ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n. 0003929-54.2008.404.7003, Terceira Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24-10-2011; EINF n. 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07-11-2011.
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF n. 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18-05-2011; TRF4, EINF n. 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08-01-2010).
Dessa forma, demonstrada que a exposição aos agentes nocivos era insíta as atividades laborais desenvolvidas, resta comprovada a habitualidade e permanência na exposição.
Laudo extemporâneo
Cumpre referir que a extemporaneidade do laudo técnico em relação ao período cuja especialidade o segurado pretende ver reconhecida não impede o enquadramento da atividade como especial, conforme se depreende do seguinte aresto:
"PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. EC 20/98. ATIVIDADE ESPECIAL. CONVERSÃO. LEI N. 9.711/98. DECRETO N. 3.048/99. LAUDO CONTEMPORÂNEO. DESNECESSIDADE. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. HONORÁRIOS PERICIAIS. OMISSÃO SUPRIDA. MARCO INICIAL DO BENEFÍCIO.
1 a 4. Omissis. 5. O fato de o laudo pericial não ser contemporâneo ao exercício das atividades laborativas não é óbice ao reconhecimento do tempo de serviço especial, visto que, se em data posterior ao labor despendido, foi constatada a presença de agentes nocivos, mesmo com as inovações tecnológicas e de medicina e segurança do trabalho que advieram com o passar do tempo, reputa-se que, à época do labor, a agressão dos agentes era igual, ou até maior, dada a escassez de recursos materiais existentes para atenuar sua nocividade e a evolução dos equipamentos utilizados no desempenho das tarefas. 6 a 12. Omissis. (TRF4, AC n.º 2003.04.01057335-6, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E de 02.05.2007)."
Assim, não há óbice ao reconhecimento da especialidade das atividades nos períodos postulados.
AGENTES QUÍMICOS - QUANTIDADE DE EXPOSIÇÃO
Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos - tóxicos orgânicos e inorgânicos - , diferentemente do que ocorre com alguns agentes agressivos, como ruído, calor, frio ou eletricidade, não dependem, segundo os normativos aplicáveis, de análise quanto ao grau ou intensidade de exposição no ambiente de trabalho para a configuração da nocividade e reconhecimento da especialidade do labor para fins previdenciários.
Aposentadoria especial - requisitos
A aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, é devida ao segurado que, além da carência, tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física durante 15, 20 ou 25 anos.
Em se tratando de aposentadoria especial, portanto, não há conversão de tempo de serviço especial em comum, pois o que enseja a outorga do benefício é o labor, durante todo o período mínimo exigido na norma em comento (15, 20, ou 25 anos), sob condições nocivas.
Direito à aposentadoria especial no caso concreto
No caso em exame, considerada a presente decisão judicial, tem-se a seguinte composição do tempo de serviço da parte autora, na DER (05/03/2012): 25 anos, 5 meses e 6 dias.
A carência necessária à obtenção do benefício de aposentadoria no ano de 2012 (art. 142 da Lei n.º 8.213/91) restou cumprida, tendo em vista que a parte autora possuía mais de 180 contribuições na DER (Resumo de Cálculo de Tempo de Contribuição - Evento 1, procadm5, fl. 13)
A circunstância de permanecer o autor em atividade após a data de entrada do requerimento administrativo de aposentadoria não obsta à implantação do benefício nem a fixação de seus efeitos financeiros desde a DER.
Primeiro, porque a data de início do benefício de aposentadoria especial, segundo o art. 57. § 2º, da Lei nº 8.213/91, deve ser fixada da mesma forma que a da aposentadoria por idade, conforme dispõe o art. 49 do mesmo diploma legal:
Art. 49. A aposentadoria por idade será devida:
I - ao segurado empregado, inclusive o doméstico, a partir:
a) da data do desligamento do emprego, quando requerida até essa data ou até 90 (noventa) dias depois dela; ou
b) da data do requerimento, quando não houver desligamento do emprego ou quando for requerida após o prazo previsto na alínea "a";
II - para os demais segurados, da data da entrada do requerimento.
Segundo, porque acolher o argumento do INSS significaria onerar o segurado com os custos da demora no processamento administrativo e da ação judicial. Não seria razoável exigir que se afastasse das atividades laborais desde o requerimento administrativo a fim de que, sem remuneração salarial, aguardasse em casa a resolução do litígio.
Terceiro, e nem por isso menos importante, porque foi afirmada pela Corte Especial deste Tribunal, em sede de Arguição de Inconstitucionalidade (Incidente nº 5001401-77.2012.404.0000, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira), em sessão realizada em 24-05-2012, a inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, em acórdão assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. ARGUIÇÃO DE INCONSTUCIONALIDADE. § 8º DO ARTIGO 57 DA LEI Nº 8.213/91. APOSENTADORIA ESPECIAL. VEDAÇÃO DE PERCEPÇÃO POR TRABALHADOR QUE CONTINUA NA ATIVA, DESEMPENHANDO ATIVIDADE EM CONDIÇÕES ESPECIAIS.
1. Comprovado o exercício de atividade especial por mais de 25 anos, o segurado faz jus à concessão da aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 e § 1º da Lei 8.213, de 24-07-1991, observado, ainda, o disposto no art. 18, I, "d" c/c 29, II, da LB, a contar da data do requerimento administrativo.
2. O § 8º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 veda a percepção de aposentadoria especial por parte do trabalhador que continuar exercendo atividade especial.
3. A restrição à continuidade do desempenho da atividade por parte do trabalhador que obtém aposentadoria especial cerceia, sem que haja autorização constitucional para tanto (pois a constituição somente permite restrição relacionada à qualificação profissional), o desempenho de atividade profissional, e veda o acesso à previdência social ao segurado que implementou os requisitos estabelecidos na legislação de regência.
3. A regra em questão não possui caráter protetivo, pois não veda o trabalho especial, ou mesmo sua continuidade, impedindo apenas o pagamento da aposentadoria. Nada obsta que o segurado permaneça trabalhando em atividades que impliquem exposição a agentes nocivos sem requerer aposentadoria especial; ou que aguarde para se aposentar por tempo de contribuição, a fim de poder cumular o benefício com a remuneração da atividade, caso mantenha o vínculo; como nada impede que se aposentando sem a consideração do tempo especial, peça, quando do afastamento definitivo do trabalho, a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial. A regra, portanto, não tem por escopo a proteção do trabalhador, ostentando mero caráter fiscal e cerceando de forma indevida o desempenho de atividade profissional.
4. A interpretação conforme a constituição não tem cabimento quando conduz a entendimento que contrarie sentido expresso da lei.
5. Reconhecimento da inconstitucionalidade do § 8º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91.
Assim, cumprindo com os requisitos tempo de serviço e carência, a parte autora tem direito:
- à implementação do benefício de aposentadoria especial, desde a DER (05/03/2012)
- ao pagamento das parcelas vencidas, desde então.
Por fim, transcorridos menos de cinco anos entre a DER (05/03/2012) e o ajuizamento da ação (05/03/2013), não incide a prescrição.
PROVIMENTOS FINAIS
Honorários Advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.
O juízo de origem, tendo por aplicáveis as disposições do art. 85, §§ 3º e 4º do novo CPC, fixou os honorários de sucumbência em 10% sobre o valor da condenação.
Mantida a decisão em grau recursal, impõe-se a majoração dos honorários, por incidência do disposto no §11 do mesmo dispositivo legal.
Assim, os honorários vão fixados em 15% sobre o valor das parcelas vencidas, observado o trabalho adicional realizado em grau recursal.
Contudo, o apelo do INSS deve ser parcialmente provido para limitar a incidência dos honorários advocatícios às parcelas vencidas até a data da sentença.
Tutela específica - implantação do benefício
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, a ser efetivada em 45 dias, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais. Resulta, todavia, facultada à parte autora a possibilidade de renúncia à implantação do benefício ora determinada.
Por fim, na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Dessa forma, resta atendido o pedido de antecipação dos efeitos da tutela veiculado pela parte autora em petição juntada ao evento 2 desta instância.
CONCLUSÃO
Parcialmente provido o apelo do INSS para afastar o reconhecimento da atividade rural em regime de economia familiar no período de 03/06/1985 a 02/06/1986, bem como para limitar a incidência dos honorários advocatícios às parcelas vencidas até data da sentença. Honorários advocatícios fixados nos termos da fundamentação supra. Nos demais pontos, a sentença resta mantida.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo retido, negar provimento ao apelo do autor, dar parcial provimento ao apelo do INSS e determinar a implantação do benefício.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/11/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002973-53.2013.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50029735320134047107
RELATOR | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | PEDRO PINHEIRO |
ADVOGADO | : | HENRIQUE OLTRAMARI |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/11/2017, na seqüência 674, disponibilizada no DE de 08/11/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO, NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO AUTOR, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO INSS E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9261156v1 e, se solicitado, do código CRC 443E8657. | |
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