APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5012095-71.2018.4.04.9999/RS
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | ENIO EUCLIDES ULLMANN |
ADVOGADO | : | ÁLVARO ARCEMILDO BAMBERG |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. COMPROVAÇÃO. AVERBAÇÃO.
1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea.
2. Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, o segurado faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço, com a respectiva averbação para fins de futura aposentadoria.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial e dar provimento ao apelo da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de agosto de 2018.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9444413v35 e, se solicitado, do código CRC EC9431B0. | |
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5012095-71.2018.4.04.9999/RS
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | ENIO EUCLIDES ULLMANN |
ADVOGADO | : | ÁLVARO ARCEMILDO BAMBERG |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária proposta por ENIO EUCLIDES ULLMANN contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, aduzindo ter trabalhado no meio rural, em regime de economia familiar de 17/07/1970 a 30/11/1976, requerendo a averbação do período independentemente de recolhimentos.
Foi proferida sentença em 25/09/2012, julgando improcedente o pedido, em virtude de que o pleito gera despesa ao erário sem a devida contrapartida financeira, de modo que seria inconstitucional (ev.3-SENT19).
A parte autora apelou, sustentando que não havia qualquer inconstitucionalidade nos dispositivos que garantem os direitos do segurado especial sem recolhimento de contribuições até a vigência da Lei nº 8.213/91 (ev.3-APELÇÃO20).
Em decisão proferida por esta turma em 30/11/2016, foi anulada a sentença e determinado o retorno dos autos à origem para reabertura da instrução processual (ev.3-ACOR23, fls. 4-13).
O juízo a quo proferiu sentença, em 21/11/2017, julgando parcialmente procedente o pedido, para condenar o réu a reconhecer e averbar o período de 17/07/1970 a 26/08/1974. Condenou cada uma das partes a 50% das custas processuais e de honorários advocatícios ao procurador da parte adversa fixados em R$ 700,00, tendo suspendido a exigibilidade de tais verbas da parte autora, em virtude de AJG (ev.3-SENT29).
A parte autora apela, sustentando que restou comprovado o labor rural em regime de economia familiar até a data de 30/11/1976, tendo inclusive sido esta a conclusão da autarquia previdenciária (ev.3-APELAÇÃO30).
Sem as contrarrazões e por força da remessa necessária, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A apelação preenche os requisitos de admissibilidade.
REMESSA NECESSÁRIA
Nos termos do artigo 14 do novo CPC, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".
O intuito do legislador foi salvaguardar os atos já praticados, perfeitos e acabados, aplicando-se a nova lei processual com efeitos prospectivos.
Nesse sentido as sentenças sob a égide do CPC de 1973, sujeitavam-se a reexame obrigatório se condenassem a Fazenda Pública ou assegurassem ao autor direito equivalente ao valor de até sessenta salários mínimos.
A superveniência dos novos parâmetros (NCPC, art. 496, § 3º), aumentando o limite para reexame obrigatório da sentença, traz a indagação quanto à lei aplicável às sentenças publicadas anteriormente e ainda não reexaminadas. Uma das interpretações possíveis seria a de que, em tendo havido fato superveniente à remessa - novo CPC, a suprimir o interesse da Fazenda Pública em ver reexaminadas sentenças que a houvessem condenado ou garantido proveito econômico à outra parte em valores correspondentes a até mil salários mínimos, não seria caso de se julgar a remessa. Inexistindo o interesse, por força da sobrevinda dos novos parâmetros, não haveria condição (interesse) para o seu conhecimento.
No entanto, em precedente repetido em julgamentos sucessivos, o STJ assentou que a lei vigente à época da prolação da decisão recorrida é a que rege o cabimento da remessa oficial (REsp 642.838/SP, rel. Min. Teori Zavascki).
Nesses termos, em atenção ao precedente citado, impõe-se que a possibilidade de conhecimento da remessa necessária das sentenças anteriores à mudança processual observe os parâmetros do CPC de 1973, aplicando-se o novo CPC às sentenças posteriores.
Se a sentença sujeita a reexame necessário é a que condena a Fazenda Pública em valor não excedente a sessenta salários mínimos, impõe-se aferir o proveito econômico assegurado ou o montante da condenação na data em que proferida a decisão, pois é neste momento que é feita a avaliação quanto à obrigatoriedade da remessa. Valores sujeitos a vencimento futuro não podem ser considerados para este efeito.
No caso dos autos, como a sentença fixou tão somente a averbação de período rural, não se pode cogitar de condenação em parcelas vencidas até então, nem em resultado econômico da demanda. Não se trata de sentença ilíquida, mas de decisão cujos efeitos não se produzem diretamente por força do processo, dependentes que estão, para terem reflexos econômicos, de situações futuras e incertas.
Em tais condições, resta afastada, por imposição lógica, a necessidade da remessa para reexame.
MÉRITO
A controvérsia restringe-se:
- ao reconhecimento da atividade rural desempenhada sob o regime de economia familiar nos períodos de 27/08/1974 a 30/11/1976.
TEMPO DE SERVIÇO RURAL
O aproveitamento do tempo de atividade rural desenvolvida até 31 de outubro de 1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.
Outrossim, o cômputo do tempo de serviço rural exercido no período anterior à Lei n.º 8.213/91, em regime de economia familiar e sem o recolhimento das contribuições, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
Como regra geral, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91; Recurso Especial Repetitivo n.º 1.133.863/RN, Rel. Des. convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
A relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural no período controvertido, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar, em conformidade com o teor da Súmula n.º 73 deste Tribunal Regional Federal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental." (DJU, Seção 2, de 02/02/2006, p. 524).
O início de prova material, de outro lado, não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental (STJ, AgRg no REsp 1.217.944/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, julgado em 25/10/2011, DJe 11/11/2011).
Ademais, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016), que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".
Quanto à idade mínima para exercício de atividade laborativa, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais consolidou o entendimento no sentido de que "A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários." (Súmula n.º 05, DJ 25/09/2003, p. 493). Assim, e considerando também os precedentes da Corte Superior, prevalece o entendimento de que "as normas que proíbem o trabalho do menor foram criadas para protegê-lo e não para prejudicá-lo." Logo, admissível o cômputo de labor rural já a partir dos 12 anos de idade.
EXAME DO TEMPO RURAL NO CASO CONCRETO
A título de prova documental do exercício da atividade rural, a parte autora, nascida em 17/07/1958, em Crissiumal-RS, trouxe aos autos:
- certidão de casamento do autor, qualificando-o como bancário, datada de 1979 (ev.3-ANEXOSPET4, fl.2);
- certidão de nascimento do demandante, qualificando seu pai como agricultor, datada de 1958 (ev.3-ANEXOSPET4, fl. 6);
- certidão de fração de lote rural, com área de 120.000 m², em nome do genitor do requerente, referente aos anos de 1958, 1972 e 1975 (ev.3-ANEXOSPET4, fls. 7-14);
- documento fornecido pelo INCRA, certificando a posse de imóvel rural, em nome do pai do autor, no período de 1966 a 1978 (ev.3-ANEXOSPET4, fl. 15);
-ficha de imposto de indústria e profissões agrícolas, referente aos anos de 1966 a 1971 (ev.3-ANEXOSPET4, fls.16-21);
- documento fornecido pela prefeitura municipal de Crissiumal/RS, certificando a propriedade de terras rurais, em nome do pai do autor, entre os anos de 1959 e 1972 (ev.3-ANEXOSPET4, fl.22-23);
- CTPS em nome do requerente, com primeiro registro de vínculo urbano no ano de 1977 (ev. 3-ANEXOSPET4, fls. 34-37).
Tais documentos constituem início de prova material do alegado labor rural.
Conforme já mencionado acima, a relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa e é possível a parte utilizar-se de documentos em nome de membros do núcleo familiar, como na espécie.
A prova testemunhal produzida em justificação administrativa realizada em 16/02/2011 (ev.3-CONTES/IMPUG12, fls. 39-44), por sua vez, é robusta e uníssona no sentido de confirmar o exercício da atividade rural do autor, juntamente com sues familiares, no período de 27/08/1974 a 30/11/1976.
Quanto ao fato de o pai do autor ter possuído um bar nas terras da família, com registro a partir de 27/08/1974 (ev. 3-ANEXOSPET4, fl. 5), observo que não foi afastada a condição de segurado especial do demandante. Como visto, comprovado o desempenho de atividade rural, o fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo possuir renda própria não afeta a situação dos demais. Ademais, não há qualquer comprovação nos autos de que o labor rural do autor era dispensável para a subsistência do grupo familiar, e nem especificação de que o trabalho urbano do pai seria a fonte de renda preponderante. Pelo contrário, as testemunhas afirmaram que o pai do autor possuía problemas de saúde e por esta razão passou a trabalhar no bar, tendo permanecido o autor e sua mãe laborando no meio rural, até o ano de 1976, quando conseguiu trabalho na cidade.
Conforme já mencionado acima, é possível a parte utilizar-se de documentos em nome de membros do núcleo familiar, como na espécie. De fato, o conjunto probatório é harmônico e consistente no sentido de que a autor laborou no meio rural com sua família, em regime de economia familiar, nos períodos alegados.
Portanto, resta comprovado o exercício da atividade rural no período 27/08/1974 a 30/11/1976 merecendo reforma a sentença no ponto.
Honorários advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.
O juízo de origem, considerando que as partes sucumbiram em parcelas equivalentes, fixou os honorários advocatícios em R$ 700,00, distribuídos na proporção de 50% para cada. À míngua de recurso das partes quanto a este ponto, e tendo o pedido inicial da parte autora sido atendido, com o integral reconhecimento do período rural postulado, deve ser afastada a sucumbência recíproca e, em consequência, condenado o INSS a pagar o valor fixado a título de honorários em sua integralidade. Resta, ainda, afastada a condenação da parte autora ao pagamento de 50% das custas processuais.
Custas processuais
O TJRS, nos autos do incidente de inconstitucionalidade 7004334053, concluiu pela inconstitucionalidade da Lei Estadual 13.471/2010, a qual dispensava as pessoas jurídicas de direito público do pagamento de custas e despesas processuais. Na ADIN estadual 70038755864, entretanto, a inconstitucionalidade reconhecida restringiu-se à dispensa, pela mesma lei, do pagamento de despesas processuais, não alcançando as custas. Em tais condições, e não havendo vinculação da Corte ao entendimento adotado pelo TJRS em incidente de inconstitucionalidade, mantenho o entendimento anteriormente adotado, já consagrado pelas Turmas de Direito Previdenciário, para reconhecer o direito da autarquia à isenção das custas, nos termos da Lei 13.471/2010.
CONCLUSÃO
À vista do provimento do recurso da parte autora, alterada a sentença no sentido de determinar que o INSS averbe também o período de labor rural do autor 27/08/1974 a 30/11/1976, exercido em regime de economia familiar. Afastada a sucumbência recíproca, deve o INSS arcar com a totalidade dos honorários advocatícios.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial e dar provimento ao apelo da parte autora.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/08/2018
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5012095-71.2018.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00000197320118210094
RELATOR | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. João Heliofar de Jesus Villar |
APELANTE | : | ENIO EUCLIDES ULLMANN |
ADVOGADO | : | ÁLVARO ARCEMILDO BAMBERG |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/08/2018, na seqüência 288, disponibilizada no DE de 13/08/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL E DAR PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Paulo Roberto do Amaral Nunes
Secretário em substituição
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