APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5066099-92.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VILMAR ROMEU GORCZEVSKI |
ADVOGADO | : | SOMER IDEA |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. COMPROVAÇÃO. AVERBAÇÃO. VEDAÇÃO À UTILIZAÇÃO PARA EFEITOS DE CARÊNCIA E EM REGIME DE PREVIDÊNCIA DIVERSO.
1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea.
2. Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, o segurado faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço, com a respectiva averbação para fins de futura aposentadoria.
3. É direito do segurado a emissão da Certidão de Tempo de Serviço, uma vez que o aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991 independe do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência e utilização em regime previdenciário diverso, nos termos do art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e art. 127, V, do Decreto n.º 3.048/99, restrições que devem constar da certidão a ser emitida para fins de contagem recíproca.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária e negar provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de junho de 2018.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9418290v6 e, se solicitado, do código CRC EB785238. | |
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5066099-92.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VILMAR ROMEU GORCZEVSKI |
ADVOGADO | : | SOMER IDEA |
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária proposta por VILMAR ROMEU GORCZEVSKI contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, postulando a averbação de tempo rural, mediante o reconhecimento do labor rural que sustenta ter exercido no período de 02/05/1974 a 31/03/1980.
Sentenciando, o juízo a quo julgou procedente o pedido, para o fim de averbar o período de 02/05/1974 a 31/03/1980. Condenou o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados em R$ 1.500,00; bem como das despesas processuais, como as de correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (ev.3-SENT12).
O INSS apela, sustentando que restou descaracterizado o regime de economia familiar da autora, em virtude de seu pai ter trabalhado e receber aposentadoria como empresário. Aduz ainda que a documentação apresentada foi insuficiente para comprovação de seu labor rural (ev.3-APELAÇÃO13).
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A apelação preenche os requisitos de admissibilidade.
REMESSA NECESSÁRIA
Nos termos do artigo 14 do novo CPC, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".
O intuito do legislador foi salvaguardar os atos já praticados, perfeitos e acabados, aplicando-se a nova lei processual com efeitos prospectivos.
Nesse sentido as sentenças sob a égide do CPC de 1973, sujeitavam-se a reexame obrigatório se condenassem a Fazenda Pública ou assegurassem ao autor direito equivalente ao valor de até sessenta salários mínimos.
A superveniência dos novos parâmetros (NCPC, art. 496, § 3º), aumentando o limite para reexame obrigatório da sentença, traz a indagação quanto à lei aplicável às sentenças publicadas anteriormente e ainda não reexaminadas. Uma das interpretações possíveis seria a de que, em tendo havido fato superveniente à remessa - novo CPC, a suprimir o interesse da Fazenda Pública em ver reexaminadas sentenças que a houvessem condenado ou garantido proveito econômico à outra parte em valores correspondentes a até mil salários mínimos, não seria caso de se julgar a remessa. Inexistindo o interesse, por força da sobrevinda dos novos parâmetros, não haveria condição (interesse) para o seu conhecimento.
No entanto, em precedente repetido em julgamentos sucessivos, o STJ assentou que a lei vigente à época da prolação da decisão recorrida é a que rege o cabimento da remessa oficial (REsp 642.838/SP, rel. Min. Teori Zavascki).
Nesses termos, em atenção ao precedente citado, impõe-se que a possibilidade de conhecimento da remessa necessária das sentenças anteriores à mudança processual observe os parâmetros do CPC de 1973, aplicando-se o novo CPC às sentenças posteriores.
Se a sentença sujeita a reexame necessário é a que condena a Fazenda Pública em valor não excedente a sessenta salários mínimos, impõe-se aferir o proveito econômico assegurado ou o montante da condenação na data em que proferida a decisão, pois é neste momento que é feita a avaliação quanto à obrigatoriedade da remessa. Valores sujeitos a vencimento futuro não podem ser considerados para este efeito.
No caso dos autos, como a sentença fixou tão somente a averbação de período rural, não se pode cogitar de condenação em parcelas vencidas até então, nem em resultado econômico da demanda. Não se trata de sentença ilíquida, mas de decisão cujos efeitos não se produzem diretamente por força do processo, dependentes que estão, para terem reflexos econômicos, de situações futuras e incertas.
Em tais condições, resta afastada, por imposição lógica, a necessidade da remessa para reexame.
MÉRITO
A controvérsia restringe-se:
- ao reconhecimento da atividade rural desempenhada sob o regime de economia familiar nos períodos de 02/05/1974 a 31/03/1980.
TEMPO DE SERVIÇO RURAL
O aproveitamento do tempo de atividade rural desenvolvida até 31 de outubro de 1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.
Outrossim, o cômputo do tempo de serviço rural exercido no período anterior à Lei n.º 8.213/91, em regime de economia familiar e sem o recolhimento das contribuições, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
Como regra geral, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91; Recurso Especial Repetitivo n.º 1.133.863/RN, Rel. Des. convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
A relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural no período controvertido, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar, em conformidade com o teor da Súmula n.º 73 deste Tribunal Regional Federal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental." (DJU, Seção 2, de 02/02/2006, p. 524).
O início de prova material, de outro lado, não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental (STJ, AgRg no REsp 1.217.944/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, julgado em 25/10/2011, DJe 11/11/2011).
Ademais, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016), que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".
Quanto à idade mínima para exercício de atividade laborativa, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais consolidou o entendimento no sentido de que "A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários." (Súmula n.º 05, DJ 25/09/2003, p. 493). Assim, e considerando também os precedentes da Corte Superior, prevalece o entendimento de que "as normas que proíbem o trabalho do menor foram criadas para protegê-lo e não para prejudicá-lo." Logo, admissível o cômputo de labor rural já a partir dos 12 anos de idade.
EXAME DO TEMPO RURAL NO CASO CONCRETO
A título de prova documental do exercício da atividade rural, a parte autora, nascida em 02/05/1962, em São João da Urtiga/RS, trouxe aos autos:
- registro de imóvel rural com área de 3.430 m², em nome dos pais do autor, datado de 1976; com registro de venda no ano de 1980 (ev.3-ANEXOSPET4, fls. 12-13);
- notas fiscais de produtor rural, em nome do pai do autor, datadas de 1974 a 1981 (ev.3-ANEXOSPET4, fls. 14-32);
- histórico escolar do autor, em instituição localizada no município de São João da Urtiga/RS, cursando da 5ª a 7ª series, datado de 2015 (ev.3-ANEXOSPET4, fl. 60).
Tais documentos constituem início de prova material do alegado labor rural.
Conforme já mencionado acima, a relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa e é possível a parte utilizar-se de documentos em nome de membros do núcleo familiar, como na espécie.
A prova testemunhal produzida em audiência de instrução realizada em 02/02/2017 (ev.3-AUDIÊNCI9 e ev.7-VIDEO1-3), por sua vez, é robusta e uníssona no sentido de confirmar o exercício da atividade rural do autor, juntamente com sues familiares, no período de 02/05/1974 a 31/03/1980.
Nesse sentido bem assentou o juízo a quo ao prolatar a sentença, na parte que a seguir reproduzo:
"(...)A testemunha NELSON LEVANDOSKI declarou em juízo que conhece a família do autor há muito tempo. Informou que o autor e sua família trabalhavam na agricultura, sendo que o requerente começou a ajudar a sua família quando tinha por volta de oito anos de idade, permanecendo na agricultura ate os vinte anos de idade. Plantavam milho, soja, mandioca, em terras próprias, com tamanho aproximado de uma colônia. O labor era manual, sem auxílio de empregados, sendo que a única fonte de renda da família provém da agricultura.
A testemunha VALMIR JUCOSKI declarou em juízo que conhece a família do requerente há muito tempo. Disse que a família e o autor sempre trabalharam na agricultura, sendo que o autor começou ajudar sua família em torno de dez anos de idade, permanecendo até os vinte anos de idade. Possuíam terras próprias e laboravam sem auxílio de empregados. Plantavam milho, soja, feijão, sendo a agricultura a única fonte de renda da família. O labor era manual, sem auxílio de maquinários.
A testemunha EVALDO JUCOSKI declarou em juízo que conhece o requerente e sua família. Relatou que o autor e sua família sempre trabalharam com agricultura, sendo que o mesmo começou ajudar seus pais quando tinha por volta de dez anos de idade, permanecendo até os vinte anos de idade. Possuíam terras próprias, de cerca de 25 hectares. Plantavam milho, soja, batata, sem auxílio de empregados. O labor era manual, sem auxílio de empregados (...)".
Conforme consulta ao Sistema PLENUS verifica-se que o pai do autor é beneficiário de aposentadoria por tempo de contribuição na condição de empresário. Observo que não foi afastada a condição de segurado especial do autor e de sua mãe. Pela análise das notas fiscais juntadas aos autos, verifica-se que os períodos de produção e as quantidades de grãos comercializados são compatíveis com o tamanho da terra utilizada e com o número de pessoas que nela trabalha na lida campesina, sendo reconhecida, assim, a realização do cultivo em regime de economia familiar.
Também não há nos autos, qualquer referência de uso de empregados ou maquinário para cultivo das atividades rurais desempenhadas pelo autor e pela família.
Portanto, resta comprovado o exercício da atividade rural no período 02/05/1974 a 31/03/1980.
Emissão de Certidão de Tempo de Serviço/Contribuição
É direito do segurado a emissão da Certidão e não cabe ao INSS a negativa de emissão sob o pretexto de necessidade de prévia indenização, uma vez que o aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991 independe do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência e utilização em regime previdenciário diverso, nos termos do art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e art. 127, V, do Decreto n.º 3.048/99, acima já referido.
Honorários advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.
O juízo de origem, tendo por aplicáveis as disposições do art. 85, §§ 3º e 4º do novo CPC, fixou os honorários de sucumbência em 10% sobre o valor das parcelas vencidas.
Mantida a decisão em grau recursal, impõe-se a majoração dos honorários, por incidência do disposto no §11 do mesmo dispositivo legal.
Assim, os honorários vão fixados em 15% sobre o valor das parcelas vencidas, observado o trabalho adicional realizado em grau recursal.
CONCLUSÃO
A sentença resta mantida integralmente.
Majorados os honorários advocatícios conforme fundamentação supra.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa necessária e negar provimento ao apelo do INSS.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/06/2018
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5066099-92.2017.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00018928820158210120
RELATOR | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Waldir Alves |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VILMAR ROMEU GORCZEVSKI |
ADVOGADO | : | SOMER IDEA |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/06/2018, na seqüência 390, disponibilizada no DE de 12/06/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA E NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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