| D.E. Publicado em 04/10/2017 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0007041-20.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | NAURA DA SILVA BOFF |
ADVOGADO | : | Ivan do Amaral Borges |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE SAO FRANCISCO DE PAULA/RS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. RECONHECIMENTO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONSECTÁRIOS. CUSTAS. JUSTIÇA ESTADUAL. ISENÇÃO.
1. Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, a segurada faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço.
2. Cumpridos os requisitos tempo de serviço e de carência, a parte autora tem direito à implementação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral desde a data do requerimento, segundo o cálculo que lhe for mais vantajoso e ao pagamento das parcelas vencidas.
3. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente no Supremo Tribunal Federal decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes.
4. O INSS está isento do pagamento das custas no Foro Federal (inc. I do art. 4º da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (art. 11 da Lei Estadual 8.121/1985, com a redação da Lei Estadual 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864, TJRS, Órgão Especial).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo do INSS, julgar prejudicado o apelo em relação à correção monetária e aos juros, e dar parcial provimento à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 26 de setembro de 2017.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Gisele Lemke, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9130982v6 e, se solicitado, do código CRC CF290948. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Gisele Lemke |
| Data e Hora: | 27/09/2017 14:02 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0007041-20.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | NAURA DA SILVA BOFF |
ADVOGADO | : | Ivan do Amaral Borges |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE SAO FRANCISCO DE PAULA/RS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação de rito ordinário proposta por NAURA DA SILVA BOFF (nascida em 24/11/1962) contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, postulando o reconhecimento de tempo de atividade rural no período de 25/11/1974 a 12/04/1978 c/c a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Na Sentença (fl. 132/144), prolatada em 30/12/2014, o juízo a quo julgou procedente o pedido para reconhecer o tempo rural conforme postulado, determinando sua averbação, e para conceder à autora a aposentadoria por tempo de contribuição integral a partir do requerimento administrativo, devendo ser pagas as parcelas vencidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros moratórios. Quanto aos juros e correção monetária, o julgador determinou o restabelecimento da sistemática anterior à Lei nº 11.960/2009 (incidência de juros de 1% ao mês e de correção monetária pelo INPC). O INSS foi condenado ao pagamento das despesas judiciais e ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação relativa às parcelas vencidas. Quanto às custas processuais, o juízo destacou que o TJRS havia declarado a inconstitucionalidade do art. 11 da Lei Estadual 8.121/85, com redação dada pela Lei 13.471/2010, na parte que isentava as pessoas jurídicas. Sentença sujeita ao reexame necessário.
No apelo (fl. 146/149), o INSS asseverou que, pela análise dos documentos carreados aos autos, não havia sido comprovado o tempo mínimo de contribuição exigido para a aposentadoria. Defendeu que também não foi comprovado o labor agrícola no período alegado. Apontou que os juros da Lei 11.960/2009 não haviam sido declarados inconstitucionais pelo STF e que a correção monetária do mesmo dispositivo legal permanecia vigente, vez que o STF ainda não havia modulado os efeitos da decisão. Requereu a reforma da sentença.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Sentença submetida ao reexame necessário.
Do Tempo de Serviço Rural - Considerações Gerais
O tempo de trabalho rural deve ser demonstrado com, pelo menos, um início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea. Não é admitida a prova exclusivamente testemunhal, a teor do § 3º do art. 55 da Lei 8.213/1991, preceito jurisprudencialmente ratificado pelo STJ na Súmula 149 e no julgamento do REsp nº 1.321.493/PR (STJ, 1ª Seção, rel. Herman Benjamin, j. 10/10/2012, em regime de "recursos repetitivos" do art. 543-C do CPC1973). Embora o art. 106 da Lei 8.213/1991 relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo (STJ, Quinta Turma, REsp 612.222/PB, rel. Laurita Vaz, j. 28/04/2004, DJ 07/06/2004, p. 277).
Não se exige, por outro lado, prova documental contínua da atividade rural, ou em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, quaisquer registros em cadastros diversos) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar:
[...] considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ [...]
(STJ, Primeira Seção, REsp 1321493/PR, rel. Herman Benjamin, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012)
Quanto à questão da contemporaneidade da prova documental com o período relevante para apuração de carência, já decidiu esta Corte: A contemporaneidade entre a prova documental e o período de labor rural equivalente à carência não é exigência legal, de forma que podem ser aceitos documentos que não correspondam precisamente ao intervalo necessário a comprovar. Precedentes do STJ (TRF4, Sexta Turma, REOAC 0017943-66.2014.404.9999, rel. João Batista Pinto Silveira, D.E. 14/08/2015).
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do trabalho rural, já que o § 1º do art. 11 da Lei 8.213/1991 define como sendo regime de economia familiar o exercido pelos membros da família "em condições de mútua dependência e colaboração". Via de regra, os atos negociais são formalizados em nome do pater familias, que representa o grupo familiar perante terceiros, função esta em geral exercida pelo genitor ou cônjuge masculino entre os trabalhadores rurais. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental", e já consolidado na jurisprudência do STJ: "A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da admissibilidade de documentos em nome de terceiros como início de prova material para comprovação da atividade rural" (STJ, Quinta Turma, REsp 501.009/SC, rel. Arnaldo Esteves Lima, j. 20/11/2006, DJ 11/12/2006, p. 407).
Importante, ainda, ressaltar que o fato de um dos membros da família exercer atividade outra que não a rural não descaracteriza automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício. A hipótese fática do inc. VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, que utiliza o conceito de economia familiar, somente será descaracterizada se comprovado que a remuneração proveniente do trabalho urbano do membro da família dedicado a outra atividade que não a rural seja tal que dispense a renda do trabalho rural dos demais para a subsistência do grupo familiar:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. O exercício de atividade urbana por um dos componentes do grupo familiar não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial dos demais membros, se estes permanecem desenvolvendo atividade rural, em regime de economia familiar. Para a descaracterização daquele regime, é necessário que o trabalho urbano importe em remuneração de tal monta que dispense o labor rural dos demais para o sustento do grupo. Precedentes do STJ.
(TRF4, Terceira Seção, EINF 5009250-46.2012.404.7002, rel. Rogerio Favreto, juntado aos autos em 12/02/2015)
O INSS alega com frequência que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade rural no período de carência. As conclusões adotadas pelo INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pela prova produzida em Juízo. Em conflito entre as provas colhidas na via administrativa e aquelas tomadas em juízo, deve-se ficar com estas últimas, pois produzidas com as cautelas legais, garantindo-se o contraditório: "A prova judicial, produzida com maior rigorismo, perante a autoridade judicial e os advogados das partes, de forma imparcial, prevalece sobre a justificação administrativa" (TRF4, Quinta Turma, APELREEX 0024057-21.2014.404.9999, rel. Taís Schilling Ferraz, D.E. 25/06/2015). Dispondo de elementos que impeçam a pretensão da parte autora, cabe ao INSS produzir em Juízo a prova adequada, cumprindo o ônus processual descrito no inc. II do art. 333 do CPC/1973, e no inc. II do art. 373 do CPC/2015.
Do Caso Concreto - Atividade Rural
A título de prova documental do exercício da atividade rural, a autora, nascida em 24/11/1962 (fl. 13), natural de São Francisco de Paula/RS, junta aos autos:
- requerimento de aposentadoria por tempo de contribuição da autora junto ao INSS, com DER em 13/04/2012 (fl. 11);
- cópia da carteira de identidade da autora onde constam os nomes dos genitores: Armindo da Silva e Olivia dos Santos Silva (fl. 13);
- certidão de casamento da autora, Naura dos Santos Silva, do lar, com Elton Luis Boff, empregado rural. O casamento foi celebrado em 18/02/1982 (fl. 14);
- documento do CNIS, com períodos de contribuição da autora, com início das referidas contribuições a partir de 12/04/1978 (fl. 20);
- certidão da Prefeitura Municipal de Canela/RS, datada de 06/03/2012, na qual foi informado que a autora é servidora dessa municipalidade, ocupante do cargo de Professora de Ensino Regular, nível 01, classe "B", do quadro de Cargos do Magistério Público Municipal, admitida em 18/05/2000, sob regime jurídico estatutário. Foi certificado também que a Prefeitura Municipal de Canela não possui regime próprio de previdência, sendo que as contribuições da servidora verteram ao Regime Geral de Previdência Social;
- documento do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São Francisco de Paula, datado de 03/12/1969, na qual consta que o pai da autora, Armindo da Silva, agricultor, era filiado. Nesse documento constou a baixa em 15/09/1986, motivado pelo falecimento (fl. 27);
- certidão do INCRA - Divisão de Ordenamento da Estrutura Fundiária, datada de 27/03/2012, na qual foi certificado que estava cadastrado o imóvel rural:
* Ano de entrega da Declaração para cadastro de Imóvel Rural - DP ou período não cadastrado.
- requerimento de justificação administrativa, datado de 17/04/2012, da autora para provar o trabalho no período de 1974 a 1978 nas terras do pai na localidade de Carapia, em regime de economia familiar, na atividade de agricultora (fl. 34);
- entrevista rural da autora. Transcrevo as respostas (fl. 43/44):
- alega que trabalhou na atividade rural desde criança (antes dos 10 anos) até o início de 1978 (antes de começar a trabalhar de empregada), com os pais, lidando com plantação de lavouras e criando animais para o gasto;
- alega que até o início de 1978 não teve nenhum outro tipo de atividade que não fosse na atividade rural, e também que não se afastou da atividade rural por nenhum outro motivo, em nenhum outro momento (a não ser a partir de abril de 1978, quando começou a trabalhar de empregada);
- alega que trabalhavam apenas em terras próprias. O pai tinha 2 áreas de terra (de 2 hectares cada, total de 4 hectares), localizadas na Carapina, e trabalhavam ali ela, os pais e irmãos em regime de economia familiar;
- alega que sempre trabalhou apenas ela, os pais e os 03 irmãos. Não tinham outras pessoas que trabalhassem junto, nem empregados ou diaristas;
- alega que plantavam feijão, milho, batata, aipim, verduras e frutas eles também tinham. Criavam uma vaca de leite, porco e galinhas;
- alega que produziam mais para o gasto, mesmo. Raramente vendiam;
- alega que não tinham outras fontes de renda na época, a não ser o que a família tirava da atividade rural. Nunca tiveram rendas como de aluguel de imóveis ou arrendamento de terras, nem de exploração de atividade turística ou artística ou qualquer outra. Viviam apenas do que produziam;
- a requerente demonstrou calma e coerência nas respostas. Alegou que saiu em 1978 quando foi trabalhar de empregada e não voltou mais a atividade rural.
CONCLUSÃO DA ENTREVISTA
Concluo, com base nas alegações da requerente, que a mesma exerceu atividade rural desde criança (antes dos 10 anos) até antes de ir trabalhar, em 1978, como empregada, se caracterizando como segurada especial desde a idade mínima (24/11/1978) até 31/03/1978 (trabalhadora rural em regime de economia familiar).
- decisão do APS de Taquara (fl. 57): "Tendo em vista certidão do INCRA confirmada somente para o ano de 1972, deixamos de autorizar a respectiva JA, com base no art. 600 da IN 45."
- indeferimento do requerimento de aposentadoria por tempo de contribuição da autora por falta de tempo. Fora consignado que na DER (13/04/2012), a autora havia totalizado 26 anos, 09 meses e 10 dias (fl. 59/61);
- recurso da autora à Junta de Recursos da Previdência Social, na qual sua motivação (fl. 68): "Venho por meio desta solicitar nova análise do meu pedido de aposentadoria. Sendo que na data de entrada do requerimento, não foi considerado o período rural por não ter apresentado provas suficientes para autorização da JA. Só que agora basta apresentar só a certidão do INCRA, os documentos estão junto ao processo em anexo a certidão de casamento dos pais."
- certidão de casamento dos genitores, Armindo da Silva, agricultor, com Olivia Rabelo dos Santos, doméstica, (fl. 69);
- às fl. 74/77 constam as oitivas das testemunhas na justificação administrativa. Transcrevo os principais trechos:
Armindo Vidal Soares: declarou que conhece a justificante desde que ela nasceu; que era vizinho da família, a menos de mil metros de distância, na localidade de Carabina, município de São Francisco de Paula/RS; que conheceu os pais da justificante, Sr. Armindo e Sra. Olívia, que eram agricultores de profissão; que a justificante trabalhou com seus pais desde infância, e assim fez até 1978; que os pais possuíam terra própria, com extensão de três ou quatro hectares, que nela moravam e trabalhavam; que a família era formada pelo casal e quatro filhos; que na época, todos os membros da família dedicavam-se ao trabalho rural; que, pelo que pôde observar, o trabalho era realizado em regime de economia familiar, sem usar mão de obra remunerada; que plantavam milho, feijão, batata, criavam vacas de leite, porcos e galinhas; que vendiam um pouco de milho e feijão, os demais produtos eram destinados ao consumo próprio e/ou alimentação dos animais; que observou pessoalmente e com frequência a justificante trabalhar na agricultura, durante a época em análise.
Valdir Vidor: declarou que conhece a justificante desde 1970 quando a família dela foi mora em Carabina, município de São Francisco de Paula; que eram vizinhos a menos de um quilômetro de distância; que conheceu os pais da justificante, que eram agricultores de profissão; que a justificante trabalhou com os pais desde pequena, e assim continuou até perto dos 18 anos de idade, quando deixou a localidade para trabalhar fora; que os pais da justificante eram donos de uma área de terra com cerca de três hectares de extensão, onde plantavam e também tinham sua casa de moradia; que o casal tinha dois filhos e duas filhas; que todos os membros da família se dedicavam à atividade rural; que, pelo que pôde observar, o trabalho era realizado em regime de economia familiar, sem usar mão de obra remunerada; que plantavam feijão, milho, hortaliças, aipim, batata, criavam galinhas, porcos e algumas cabeças de gado; que sabia informar que produtos a família vendia; que plantavam, primeiramente, para o próprio sustento; que, durante a época em análise, observou pessoalmente e com frequência a justificante trabalhar na agricultura; que o pai do depoente recolhia o leite dos produtores rurais da região, inclusive na propriedade dos pais da justificante.
Vilson dos Santos Heps: declarou que conhece a justificante desde que ela nasceu; que era vizinho da família, a uns 1500 metros de distância, na localidade de Carapina, município de São Francisco de Paula; que conheceu os pais da justificante e que ambos eram agricultores de profissão; que a justificante participou da atividade rural dos pais entre os anos de 1974 e 1978. Perguntado sobre a existência de alguma razão para que se lembrasse exatamente dos anos de 74 e 78, disse a testemunha que nessa época a justificante estava por lá; que os pais da justificante tinham terra própria, cuja extensão estimava ser de 04 a 05 hectares, onde moravam e trabalhavam; que a família da justificante era formada pelo casal, duas filhas e dois filhos; que, no período em análise, todos os membros da família dedicavam-se às atividades rurais; que, pelo que sabe; o trabalho era feito sempre em regime de economia familiar, sem uso de mão de obra remunerada; que plantavam milho, feijão, hortaliças, trigo, criavam uma vaca de leite e galinhas; que acredita que a produção fosse, praticamente, toda para o gasto, não sabendo informar se vendiam algum produto; que, durante a época e análise, observou pessoalmente e com frequência a justificante trabalhar na agricultura.
Transcrevo a decisão de homologação:
"Deixo de homologar quanto ao mérito a presente justificação, eis que a mesma não foi homologada quanto a forma, pois as testemunhas não acompanharam frequentemente a vida rural da justificante no período pretendido e não podem confirmar os fatos."
Designada audiência de instrução, reproduzo a degravação (fl. 118/122):
Valdir Vidor
J: Parte autora pode perguntar.
P: O senhor conhece a dona Naura desde que época?
T: Eu saí da colônia ali onde nós morava em 77/78. Conhecei 20 anos antes, por aí. Eu também nasci lá.
P: Ela trabalhava no campo lá?
T: Sim.
P: Como é o nome da localidade?
T: Carapina.
P: E lá na área deles tinha empregado?
T: Não, não tinha.
P: Quem é que trabalhava lá?
T: Era a família. Os pais, irmãos.
P: O senhor sabe o tamanho da propriedade deles?
T: De 3 a 4 hectares.
P: No período que o senhor conheceu ela lá nunca se afastou do campo? O senhor não lembra mais ou menos quando ela saiu de lá?
T: Depois de 78 ali.
P: Nada mais.
J: Nada Mais.
Armindo Vidal Soares
J: Parte autora.
P: O senhor conhece a dona Naura desde que época?
T: Desde pequeno. Nós morava não muito longe na colônia. Era morava ali.
P: O senhor conheceu ela lá na colônia?
T: Conheci ela na colônia.
P: E que época foi, o senhor lembra?
T: Ah eu era bem pequeno, nem sei.
P: Como era o nome do local lá?
T: Carapina.
P: E ela trabalhava no campo nessa época que o senhor conheceu?
T: Trabalhava no campo.
P: Tinham empregado na época?
T: Não.
P: Trabalhava ela e quem mais lá?
T: Ela e a família.
P: O que eles faziam lá? Plantavam?
T: Plantavam. Não era muita coisa. Plantavam milho, feijão, pro gasto.
P: Era pequena a área deles?
T: Era pequena, 4 hectares.
P: Nada mais.
J: Só isso.
Vilson dos Santos Heps
J: Parte autora.
P: O senhor sempre residiu lá na Carapina?
T: Sempre residi. Dei umas pequenas saídas mas depois voltei.
P: O senhor chegou a conhecer a dona Naura trabalhando lá na área rural desse local?
T: Sim.
P: E lembra o período?
T: 74/78.
P: E ela trabalhava com a família ou tinha empregados lá?
T: Com a família.
P: E era pequena a área da propriedade deles?
T: 4 hectares.
P: O que eles faziam lá?
T: Plantavam hortaliças, (...), essas coisas.
P: O senhor lembra quando ela saiu de lá pra se empregar na área urbana?
T: (...).
P: Nada mais Doutor.
J: É isso.
No caso dos autos, as provas testemunhais produzidas, por sua vez, são uníssonas no sentido de confirmar o exercício da atividade rural da autora no período postulado.
A autora, em 25/11/1974, tinha 12 anos de idade.
Observo que o juízo singular reconheceu o tempo de atividade rural da autora de 25/11/1974 a 12/04/1978, todavia, pela CTPS (fl. 23), a autora teve seu contrato de trabalho com início em 12/04/1978, sendo tal informação corroborada pelo documento CNIS (fl. 97). Deste modo, deve ser dado parcial provimento à remessa oficial para reconhecer o período de atividade rural da autora de 25/11/1974 a 11/04/1978.
Com fundamento nas provas produzidas nos autos, bem como nas oitivas das testemunhas, julgo comprovado o exercício da atividade rural da autora no período de 25/11/1974 a 11/04/1978.
Direito à Aposentadoria no Caso Concreto
No caso em exame, tem-se a seguinte composição do tempo de serviço da autora, na DER (13/04/2012), (fl. 61):
a) tempo reconhecido administrativamente: 26 anos, 09 meses e 10 dias;
b) tempo de tempo de contribuição reconhecido nesta ação: de 25/11/1974 a 11/04/1978: 03 anos, 04 meses e 17 dias;
Total de tempo de contribuição na DER: 30 anos, 01 mês e 27 dias.
Repiso o teor da certidão da Prefeitura Municipal de Canela/RS, datada de 06/03/2012, na qual foi informado que a autora é servidora dessa municipalidade, ocupante do cargo de Professora de Ensino Regular, nível 01, classe "B", do quadro de Cargos do Magistério Público Municipal, admitida em 18/05/2000, sob regime jurídico estatutário. Foi certificado também que a Prefeitura Municipal de Canela não possui regime próprio de previdência, sendo que as contribuições da servidora verteram ao Regime Geral de Previdência Social.
Destaco que à fl. 97, no documento do CNIS, também consta que a partir 18/05/2000 o empregador da autora é o Município de Canela.
A carência necessária à obtenção do benefício de aposentadoria no ano de 2012 era de 180 meses (art. 142 da Lei n.º 8.213/91) restou cumprida, tendo em vista que a parte autora possuía 323 contribuições na DER (fl. 61).
Assim, cumprindo com os requisitos tempo de serviço e carência, a parte autora tem direito:
- à implementação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral desde a data do requerimento, segundo o cálculo que lhe for mais vantajoso;
- ao pagamento das parcelas vencidas.
Correção Monetária e Juros
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do CPC de 2015, ao prever como regra geral que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter a interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão o inc. I traz exceção à regra da cabeça, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
O enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária a ser aplicado sobre os débitos da Fazenda Pública a partir da vigência da Lei 11.960/2009, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no Supremo Tribunal Federal a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em que assentado:
[...] diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução.
4. Embargos de declaração rejeitados.
(STJ, Terceira Seção, EDcl no MS 14.741/DF, rel. Jorge Mussi, j. 08/10/2014, DJe 15/10/2014)
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (Segunda Seção), à unanimidade, como por exemplo nos processos 5005406-14.2014.404.7101, Terceira Turma, j. 1º/06/2016, e 5052050-61.2013.404.7000, Quarta Turma, j. 25/05/2016).
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do Código de Processo Civil de 2015, mostra-se adequado e racional diferir para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo Tribunal Superior, o que conduzirá à observância pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo Supremo Tribunal Federal sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do Juízo de origem sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas caso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter a incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes, conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se, inicialmente, o índice da Lei 11.960/2009. Dessa forma, deve ser considerado prejudicado o apelo do INSS em relação a esse ponto.
Das Custas Processuais
Pelo teor da sentença, entendo que houve condenação do INSS ao pagamento das custas processuais.
Impende referir que o INSS está isento do pagamento das custas no Foro Federal (inc. I do art. 4º da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (art. 11 da Lei Estadual 8.121/1985, com a redação da Lei Estadual 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864, TJRS, Órgão Especial).
Dos Honorários Advocatícios
A sentença foi proferida na vigência do Código de Processo Civil de 1973. Sucumbente minimamente a parte autora, deve ser mantida a condenação ao pagamento de honorários advocatícios fixada na sentença.
Da Implantação do Benefício
O juízo singular concluiu que a parte autora tinha o direito à implementação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, todavia, não se vislumbra documentação da implementação do benefício.
Em consulta ao CNIS da autora na data de 16/08/2017, verifiquei que essa já percebe aposentadoria por tempo de contribuição. Assim, deixo de determinar a implantação imediata do benefício.
Conclusão
Deve ser julgado prejudicado o apelo no que diz respeito à correção monetária e juros, diferindo-se para a fase de cumprimento da sentença a forma de cálculo dos consectários legais.
Deve ser negado provimento ao apelo do INSS, porquanto comprovado o exercício da atividade rural da autora.
Deve ser dado parcial provimento à remessa oficial para que a data fim do reconhecimento do trabalho rural da autora seja o dia 11/04/1978, pois no dia posterior já existe contrato de trabalho na CTPS, e para afastar a condenação ao pagamento de custas processuais.
Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento ao apelo do INSS, julgar prejudicado o apelo em relação à correção monetária e aos juros, e dar parcial provimento à remessa oficial, nos termos da fundamentação.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 26/09/2017
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0007041-20.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00008365620138210066
RELATOR | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dra. Solange Mendes de Souza |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | NAURA DA SILVA BOFF |
ADVOGADO | : | Ivan do Amaral Borges |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE SAO FRANCISCO DE PAULA/RS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 26/09/2017, na seqüência 90, disponibilizada no DE de 11/09/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS, JULGAR PREJUDICADO O APELO EM RELAÇÃO À CORREÇÃO MONETÁRIA E AOS JUROS, E DAR PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI | |
: | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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