APELAÇÃO CÍVEL Nº 5020154-53.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ANA CARINE BUSATO DAROS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOAO BARROS |
ADVOGADO | : | LUIS AUGUSTO PRAZERES DE CASTRO |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS LEGAIS. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. ANOTAÇÕES EM CTPS. COMPROVAÇÃO.
1. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal.
2. Somado o tempo de atividade rural reconhecido na via judicial com o tempo computado na esfera administrativa, a parte autora possuía direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição na DER, garantindo o direito à concessão do benefício e recebimento das diferenças devidas.
3. O tempo de serviço urbano pode ser comprovado por documentação idônea, gozando as anotações em CTPS de presunção juris tantum de veracidade, sendo, ademais, ônus do empregador os recolhimentos das contribuições devidas que, se não efetuadas, não pode implicar em ônus ao empregado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa necessária e ao recurso do INSS, determinando-se a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de junho de 2017.
Ana Carine Busato Daros
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Ana Carine Busato Daros, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8982424v4 e, se solicitado, do código CRC 234084F0. | |
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| Signatário (a): | Ana Carine Busato Daros |
| Data e Hora: | 17/07/2017 16:52 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5020154-53.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ANA CARINE BUSATO DAROS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOAO BARROS |
ADVOGADO | : | LUIS AUGUSTO PRAZERES DE CASTRO |
RELATÓRIO
A parte autora pretende obter a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 157.044.549-1, DER em 24-06-2011), mediante o reconhecimento do tempo de serviço rural exercido sem registro em CTPS, de 14-09-1975 a 07-10-1980 ou "outro que mesmo assim culmine com a concessão da aposentadoria". Sustenta que, somado tal intervalo aos períodos anotados em CTPS, faz jus à obtenção do benefício.
Após regular instrução, é prolatada sentença, julgando procedente o pedido para reconhecer o trabalho rural exercido pelo autor, no período de 14-09-1975 a 24-06-2011 e condenar o INSS a conceder ao requerente o benefício de aposentadoria por tempo de contriubição, desde a DER.
Irresignado, o INSS apela, sustentando que a sentença é 'ultra petita', pois não há pedido de reconhecimento de tempo de serviço posterior a 1980; que há indícios de fraude na anotação do vínculo empregatício em CTPS e que o autor não trouxe início de prova material hábil à comprovação do trabalho rural no período reclamado.
Apresentadas contrarrazões, e em virtude da remessa necessária, os autos são encaminhados a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Remessa necessária
Conheço da remessa necessária, visto que sua dispensa apenas tem lugar quando a sentença líquida veicular condenação não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos (STJ, Súmula nº 490, EREsp nº 600.596, Corte Especial, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJ 23/11/2009).
Saliente-se, por oportuno, que não incide o limite de 1.000 (mil) salários mínimos previsto no art. 496, §3º, inciso I, do NCPC, porquanto a r. sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Prescrição qüinqüenal
Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, não prescreve o fundo do direito, apenas as parcelas anteriores a cinco anos da data do ajuizamento da ação (Decreto 20.910/32).
Sendo assim, observar-se-á aqui o contido na Súmula n. 85 do STJ: "Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação."
Desse modo, estão fulminadas pela prescrição as parcelas anteriores ao quinquênio que antecede a propositura da ação.
Da alegação de nulidade da sentença
Preliminarmente, não prospera a tese do INSS de que a sentença seria extra petita por ter reconhecido o trabalho exercido pelo autor após 1980, quando a parte autora, na inicial, requereu o cômputo do período de 1975 a 1980.
Ocorre que, na verdade, o pedido do autor é mais amplo. Da leitura da inicial, verifica-se que o bem da vida buscado pelo requerente é a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento do trabalho rural exercido de 1975 a 1980 e "outro que mesmo assim culmine com a concessão da aposentadoria".
Com efeito, a concessão de benefício distinto daquele postulado na petição inicial não implica violação do princípio da adstrição da sentença, consoante firme orientação do STJ:
"(...) tendo em vista o caráter eminentemente protetivo e de alto alcance social da lei previdenciária. Não pode o magistrado, se reconhecer devido o benefício, deixar de concedê-lo ao fundamento de não ser explícito o pedido." (AREsp 75.980/SP, Rel. Min. JORGE MUSSI, Quinta Turma, DJe 05-03-2012)
De fato, essa premissa de que o juiz deve aplicar o direito incidente sobre a situação fática constatada (STJ, AgRg no AREsp 155.067/SP, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, j. 22-05-2012, DJe 26-06-2012) nos leva muito além da mera fungibilidade das ações previdenciárias, para servir de mais genérica diretriz, porquanto o que realmente importa em uma lide previdenciária é outorgar ao indivíduo a proteção previdenciária a que efetivamente faz jus.
Também neste sentido mais amplo de desvinculação da sentença ao pedido:
É firme o posicionamento do STJ, de que em matéria previdenciária deve-se flexibilizar a análise do pedido contido na petição inicial, não se entendendo como julgamento extra ou ultra petita a concessão de benefício diverso do requerido na inicial. (REsp 1499784/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, j. em 03-02-2015, DJe de 11-02-2015)
Nessa mesma linha de orientação, encontra-se o entendimento do TRF4:
Esta Corte tem entendido, em face da natureza pro misero do Direito Previdenciário, e calcada nos princípios da proteção social e da fungibilidade dos pedidos (em equivalência ao da fungibilidade dos recursos), não consistir julgamento ultra ou extra petita a concessão de uma aposentadoria diversa da pedida, uma vez preenchidos pela segurada os requisitos legais relativos à aposentadoria deferida. (AC 0002457-46.2011.404.9999, Rel. p/ Acórdão Juiz Federal GUILHERME PINHO MACHADO, Quinta Turma, D.E. 23-08-2012).
"Não é extra petita a sentença que concede aposentadoria por idade híbrida quando pleiteada aposentadoria por idade rural". (AC 0006519-95.2012.404.9999, Relator Des. Federal CELSO KIPPER, Sexta Turma, D.E. 10-02-2015).
Vencida a prefacial, passo à análise do mérito.
Tempo de serviço rural
Quanto ao reconhecimento de trabalho rural aplicam-se as seguintes regras gerais:
1 - Exige-se início de prova material do exercício da atividade rural, nos termos do § 3º do art. 55 da Lei 8.213/91, que pode ser entendido como a presença de quaisquer dos documentos relacionados no parágrafo único do art. 106 da Lei n. 8.213/91, cujo rol não é exaustivo, não se admitindo a prova exclusivamente testemunhal para fins de comprovação do exercício da atividade rurícola, conforme entendimento sedimentado na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário").
2 - Admite-se a utilização de documentos em nome de terceiros membros do grupo familiar, conforme entendimento já consolidado através da Súmula n.° 73 do TRF da 4ª Região ("Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental").
3 - Admite-se, também, a descontinuidade da prova documental, bem como a ampliação da abrangência do início de prova material a períodos anteriores ou posteriores à sua datação, desde que complementado por robusta prova testemunhal. Com efeito, para caracterizar o início de prova material não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, seja porque a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental. O início de prova material deve viabilizar, em conjunto com a prova oral, um juízo de valor seguro acerca da situação fática. Nesse sentido o STJ, recentemente, editou a Súmula 577, cujo teor é o seguinte: "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentando, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório" (Recursos Especiais 1.321.493 e 1.348.633).
4 - O exercício de atividade urbana pelo rurícola não afasta, por si só, sua condição de segurado especial. No entanto, não se considera segurado especial quando ficar demonstrado que o trabalho urbano constitui a principal atividade laborativa do requerente e/ou sua principal fonte de renda. (REsp 1483172/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/10/2014, DJe 27/11/2014);
5 - O tamanho da propriedade rural não é, sozinho, elemento que possa descaracterizar o regime de economia familiar desde que preenchidos os demais requisitos (REsp 1403506/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/12/2013, DJe 16/12/2013);
6 - A utilização de maquinário e eventual de diaristas não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial porquanto ausente qualquer exigência legal no sentido de que o trabalhador rural exerça a atividade agrícola manualmente. (TRF4, EINF 5023877-32.2010.404.7000, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Rogerio Favreto, juntado aos autos em 18/08/2015);
7 - Segundo a Lei nº 12.873/2013, que alterou, entre outros, o art. 11 da LB, "o grupo familiar poderá utilizar-se de empregados contratados por prazo determinado ou de trabalhador de que trata a alínea g do inciso V do caput, à razão de no máximo 120 (cento e vinte) pessoas por dia no ano civil, em períodos corridos ou intercalados ou, ainda, por tempo equivalente em horas de trabalho, não sendo computado nesse prazo o período de afastamento em decorrência da percepção de auxílio-doença".
8 - No que tange ao trabalho do boia-fria, o STJ, por meio, entre outros, do REsp 1.321.493, Rel. Min. Herman Benjamin, abrandou as exigências quanto ao início de prova material da atividade rural, desde que complementada através de idônea prova testemunhal.
Estabelecidas essas premissas legais, passo à análise do caso concreto.
A título de início de prova material do exercício de atividade rural, a parte autora apresenta, dentre outros, os seguintes documentos:
- certidão de casamento dos pais, em que o genitor aparece com a qualificação profissional de lavrador, em 1980;
- cópia da CTPS, constando vínculo com Tsutomu Hara, a partir de 08-10-1980;
- certidão de casamento e de nascimento de filho, em que o autor consta como lavrador, em 1984 e 1985;
- documentos escolares dos filhos, dando conta da freqüência à escola rural, em Água da Garça, nos anos de 1993, 1994, 1996 e 1997.
As testemunhas ouvidas confirmam o exercício de atividades agrícolas pelo autor. Trouxeram aos autos as seguintes informações:
O autor prestou depoimento pessoal, afirmando que trabalhou como rurícola para José Massato Hara, desde 1975. Nunca trabalhou em outro lugar. Mora no sítio dele. Foi registrado em nome do pai de José Massato Hara. Não sabe quando o registro passou para o nome dele. Acredita que o patrão recolha as contribuições desde 1980. Quando o autor chegou na propriedade não lembra de oturas crianças que lá trabalhassem. Nunca trabalhou em outro lugar. Recebe adicional de férias. Começou com serviços braçais, depois passou a dirigir trator. O patrão tem uns oito empregados.
Antonio Bonini disse que conhece o autor desde 1974, quando ele já trabalhava na roça com a família, na fazenda de José Hara, toda a vida, até hoje. Não sabe se tem registro em CTPS. O autor não teve outros empregadores. Ele mora na fazenda. O depoente tem terreno rural na Água da Garça, próxima às terras de José Hara. Quando conheceu o autor, ele devia ter uns 10 anos de idade e já trabalhava na lavoura com o pai e os irmãos na lavoura de café. O autor também dirige trator. José Massato Hara só tem o autor de empregado atualmente. Antes, teve outros. O depoente conhece Nelson Akira Omura, que já trabalhou para José Massato Hara e para o depoente também.
José Massato Hara informou que conhece o autor desde 1975. Atualmente o autor é empregado registrado do depoente. Antes era registrado pelo pai do depoente, Sr. Tsutomu Hara. Até 1992 o autor trabalhou para o pai do depoente. Em 2005 o registro passou para o nome do depoente. Nesse intervalo, ea o depoente quem recolhia as contribuições, mas o registro ficou em nome do genitor, pois o escritório de contabilidade anterior não providenciou a troca. No início o autor não era tratorista. O autor nunca prestou serviço a outros proprietários rurais. No período de 1975 a 1980 o autor não dirigia trator, apenas carpia soja e quebrava milho. Nessa época era o pai do autor quem recebia o salário. O autor é o único empregado registrado atualmente. Os demais são diaristas.
Roberto Faiçal disse ser contador, já tendo prestado serviço a José Massato Hara. Posteriormente seu filho passou a ser o responsável pelo escritório de contabilidade. De acordo com o livro de registro de empregados, o autor era empregado do pai de José Massato Hara, que se declarou como empregador a partir de 2005. Confirma ter feito a anotação do vínculo na CTPS do autor, em setembro de 2005, baseado nos registros de livros antigos, dando conta que o autor trabalhava desde 1980. Não presenciou o trabalho do autor.
Roberto Squizato Faiçal afirmou que cuida do escritório de contabilidade que presta serviços para José Massato Hara desde 2005. Os livros de registro de empregados que recebeu do escritório anterior davam conta que o autor era empregado de Tsutomu Hara desde 1980 e que após o falecimento deste, o vínculo empregatício passou a ser registrado em nome de José Massato Hara.
Francisco Simionato contou que conhece o autor, é agricultor e tem escritório de contabilidade. Nunca prestou serviços para José Massato Hara, não lembrando de ter informado à Receita Federal sobre o número de funcionários que aquele tinha, desconhece quantos são.
Isabel Cristina Barbana Gusmão trouxe aos autos as seguintes informações: disse ser agricultora e já ter trabalhado no escritório de contabilidade de Cláudio Prata, como telefonista, aos 14 anos de idade. José Massato Hara era cliente desse escritório. Não conhece o autor e não sabe dizer porquê seu nome aparece como responsável por prestar informações à Receita Federal sobre os empregados de José Massato Hara.
Há início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea. No caso, restou demonstrado que a família da autora atuava na agricultura, bem como que o trabalho dos membros da família era essencial e exercido em regime de mútua dependência e cooperação e a agricultura consistia na única fonte de sustento do grupo.
Nesse passo, analisando-se a prova oral produzida, verifica-se que as testemunhas foram coerentes e harmônicas entre si nos pontos relevantes para o deslinde da questão, uma vez que confirmaram que a autora trabalhou na agricultura, na condição de trabalhador rural em regime de economia familiar, inicialmente, e após como empregado rural, sendo que o sustento do grupo familiar provinha, de forma exclusiva, da agricultura.
Consigno, outrossim, que eventuais imprecisões, desde que não significativas, em relação às datas dos fatos, podem ser tidas como naturais e inerentes à falibilidade da memória no que concerne ao tempo de acontecimento dos fatos, aliada ao fato de serem pessoas simples, com idade avançada, muitas vezes sem instrução.
No conjunto, as provas coligidas conduzem à credibilidade de que a requerente trabalhou no meio rural, o que parece aceitável diante do contexto dos autos.
Conforme consignado em sentença, cuja fundamentação adoto como razão de decidir:
"Os testemunhos documentados em mídia digital de fl. 114 são convergentes ao confirmar que a parte autora sempre trabalhou na lavoura, desde sua juventude (1975), em regime de economia familiar com seu pai e, a partir de 1980, como empregado com registro em CTPS para Tsutomu Hara e para seu filho após seu falecimento, José Massato Hara, que foi ouvido como testemunha (fl. 109).
As testemunhas arroladas pela autarquia ré demonstraram somente que o escritório que fazia a contabilidade da fazenda dos empregadores do autor supostamente cometeram erros ao prestar informações para os órgãos competentes.
Dessa forma, a prova oral produzida confirma que o autor trabalhou na lavoura, sem registro, inicialmente em regime de economia familiar, e posteriormente como 'empregado rural', desde os 12 anos de idade até pelo menos a DER, corroborando a versão da inicial."
Assim, tenho que o autor logrou comprovar a existência do vínculo empregatício de natureza rural de forma satisfatória, sendo certo que o não cumprimento das obrigações por parte do empregador não pode ser óbice ao reconhecimento de direitos previdenciários para o segurado, que não era pessoalmente obrigada ao recolhimento das contribuições respectivas.
Merece confirmação a sentença.
Conclusão quanto ao tempo de atividade rural
Deve ser confirmada a sentença para reconhecer o trabalho rurícola exercido no período de 14-09-1975 a 07-10-1980, em regime de economia familiar, e posteriormente como empregado rural, até a DER. O período posterior a 07-10-1980, laborado como empregado rural, deve ser considerado também para efeitos de cumprimento de carência.
Requisitos para a concessão do benefício
A verificação do direito do segurado ao recebimento de aposentadoria por tempo de serviço ou de contribuição deve partir das seguintes balizas:
1) A aposentadoria por tempo de serviço (integral ou proporcional) somente é devida se o segurado não necessitar de período de atividade posterior a 16.12.98, sendo aplicável o art. 52 da Lei 8.213/91.
2) Em havendo contagem de tempo posterior a 16.12.98, somente será possível a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
3) Cumprida o requisito específico de 35 anos de contribuição, se homem, e 30 anos, se mulher, o segurado faz jus à aposentadoria por tempo de serviço (se não contar tempo posterior a 16.12.98) ou à aposentadoria por tempo de contribuição (caso necessite de tempo posterior a 16.12.98). Se poderia se aposentar por tempo de serviço em 16.12.98, deve-se conceder a aposentadoria mais vantajosa, nos termos do art. 122 da Lei 8.213/91.
4) Cumprido o tempo de contribuição de 35 anos, se homem, e 30 anos, se mulher, não se exige do segurado a idade mínima ou período adicional de contribuição (EC 20/98, art. 9º, caput, e CF/88, art. 201, §7º, I).
5) O segurado filiado ao RGPS antes da publicação da Emenda 20/98 faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição proporcional. Seus requisitos cumulativos: I) idade mínima de 53 (homem) e 48 (mulher); II) Soma de 30 anos (homem) e 25 (mulher) com o período adicional de contribuição de 40% do tempo que faltava, na data de publicação da Emenda, para alcançar o tempo mínimo acima referido (EC 20/98, art. 9º, §1º, I).
Contagem de tempo de contribuição
Somados o períodos rural e urbano, o autor completa mais de 35anos de tempo de contribuição na DER.
Assim, perfaz o tempo mínimo exigido e a carência necessária à obtenção da aposentadoria (considerando-se o vínculo como empregado rural para este fim).
As diferenças são devidas desde a data do requerimento administrativo, descontados eventuais valores recebidos a título de benefício previdenciário de natureza inacumulável e respeitada a prescrição quinquenal.
Dos consectários
Correção Monetária e Juros
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101, 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária no ponto.
Pré-questionamento
Ficam pré-questionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.
Honorários Advocatícios
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que, no Estado de Santa Catarina (art. 33, par. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do NCPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais).
Conclusão
Deve ser confirmada a sentença para reconhecer o trabalho rurícola exercido no período de 14-09-1975 a 07-10-1980, em regime de economia familiar, e posteriormente como empregado rural, até a DER, cuja soma garante à autora o direito à obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição.
Determina-se a implantação imediata do benefício, sendo diferida para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais.
Ante o exposto, voto por negar provimento à remessa necessária e ao recurso do INSS, determinando-se a imediata implantação do benefício.
Ana Carine Busato Daros
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/06/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5020154-53.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00011456420118160138
RELATOR | : | Juíza Federal ANA CARINE BUSATO DAROS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Marcus Vinícius Aguiar Macedo |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOAO BARROS |
ADVOGADO | : | LUIS AUGUSTO PRAZERES DE CASTRO |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/06/2017, na seqüência 1005, disponibilizada no DE de 02/06/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À REMESSA NECESSÁRIA E AO RECURSO DO INSS, DETERMINANDO-SE A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal ANA CARINE BUSATO DAROS |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal ANA CARINE BUSATO DAROS |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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