
Apelação Cível Nº 5011132-63.2018.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: OLAVO CENCI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença, publicada em 20-10-2017, na qual o magistrado a quo julgou improcedente o pedido de reconhecimento de tempo urbano pleiteado, determinando, contudo, a implantação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição reconhecido administrativamente como devido.
Condenou o autor ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em R$ 1.000,00.
Apela o demandante requerendo o reconhecimento do tempo de serviço urbano, na condição de empresário, referente às competências de novembro e dezembro de 2005, janeiro a dezembro de 2006, janeiro a setembro de 2007, agosto de 2008, e fevereiro e julho de 2012, com a consequente outorga da aposentadoria por tempo de contribuição desde a data do primeiro requerimento administrativo, em 05-12-2012.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A controvérsia restringe-se ao reconhecimento do tempo de serviço urbano como empresário, com a consequente concessão de aposentadoria por tempo de contribuição desde o primeiro requerimento administrativo, em 05-12-2012.
Narra o autor que, na condição de empresário, efetuou recolhimentos nas competências de novembro e dezembro de 2005, janeiro a dezembro de 2006, janeiro a setembro de 2007, agosto de 2008, e fevereiro e julho de 2012, mas estas não foram consideradas pelo INSS na via administrativa.
Refere que postulou o benefício, administrativamente, em mais duas oportunidades (11-07-2013 e 05-12-2013), e, muito embora concedida a aposentadoria em 05-12-2013, renunciou à inativação por não concordar com a ausência de cômputo das contribuições que entende devidas, acima referidas, além de não concordar com o valor do benefício (evento 3, ANEXOSPET4, p. 195; e evento 3, PET7, p. 06-08).
Afirma que as contribuições estão devidamente registradas no CNIS, razão pela qual devem ser consideradas válidas.
Passo à análise da pretensão.
Nos intervalos discutidos, o requerente era inicialmente sócio da empresa "Irmãos Cenci Ltda. EPP", juntamente com um outro familiar, retirando-se da sociedade em novembro de 2007, ocasião em que formou nova sociedade, denominada "Regina Transportes Ltda.", com outro membro familiar, onde também detinha a condição de sócio, como comprovam os contratos sociais do evento 3, ANEXOSPET4, p. 125-135, havendo comprovação de retirada de pró-labore nos meses de dezembro de 2005, janeiro a março de 2006, julho a novembro de 2006, e janeiro de 2007, a teor dos contracheques do evento 3, ANEXOSPET4, p. 142-147.
Em ambos os contratos sociais consta que o autor exercia, juntamente com o(a) outro(a) sócio(a), a administração de ambas as empresas.
Consoante o disposto na alínea "f" do inciso V do artigo 11 da Lei n. 8213/91, é considerado contribuinte individul o titular de firma individual urbana ou rural, o diretor não empregado e o membro de conselho de administração de sociedade anônima, o sócio solidário, o sócio de indústria, o sócio gerente e o sócio cotista que recebam remuneração decorrente de seu trabalho em empresa urbana ou rural, e o associado eleito para cargo de direção em cooperativa, associação ou entidade de qualquer natureza ou finalidade, bem como o síndico ou administrador eleito para exercer atividade de direção condominial, desde que recebam remuneração.
No caso concreto, como se verifica, o demandante enquadra-se como contribuinte individual, sendo, portanto, responsável pelo recolhimento das suas contribuições previdenciárias.
Com efeito, o exercício de atividade profissional na condição de contribuinte individual, da qual decorre vinculação obrigatória ao RGPS, como na hipótese, impõe a necessidade de recolhimento, por iniciativa própria, das contribuições previdenciárias correspondentes, consoante o disposto no artigo 30, inc. II, da Lei n. 8.212/91.
Afirma o autor que as contribuições estão devidamente registradas no CNIS. Contudo, ao contrário do alegado, no CNIS não constam as datas de pagamento das contribuições relativas às competências de novembro e dezembro de 2005, janeiro a dezembro de 2006, janeiro a setembro de 2007, agosto de 2008, e fevereiro e julho de 2012, como se verifica do evento 3, ANEXOSPET4, p. 176-177, e foram desconsideradas pela Autarquia nos documentos do evento 3, ANEXOSPET4, p. 171-173, por estarem irregulares.
Consoante dispõe o § 5º do art. 29-A da Lei n. 8.213/91, havendo dúvida sobre a regularidade do vínculo incluído no CNIS e inexistência de informações sobre remunerações e contribuições, o INSS exigirá a apresentação dos documentos que serviram de base à anotação, sob pena de exclusão do período.
Entendo, pois, que os registros existentes no CNIS não são suficientes para a comprovação pretendida, sendo imprescindível, para o reconhecimento do tempo de serviço urbano como empresário, a apresentação dos recolhimentos previdenciários correspondentes aos períodos desconsiderados.
Para a comprovação do recolhimento das contribuições previdenciárias referentes às competências de novembro e dezembro de 2005, janeiro a dezembro de 2006, janeiro a setembro de 2007, agosto de 2008, e fevereiro e julho de 2012, as quais não foram consideradas pelo INSS na via administrativa, o autor juntou aos autos, no evento 3, PET10, p. 04-15, as Guias da Previdência Social - GPS referentes às competências de dezembro de 2005, janeiro a dezembro de 2006, e janeiro a setembro de 2007, todas em nome da empresa "Irmãos Cenci Ltda. EPP", cujo identificador é o CNPJ da empresa, e não o NIT do autor. Nas competências referentes aos meses de dezembro de 2005, janeiro a dezembro de 2006, e janeiro a junho de 2007, consta o código de pagamento 2003, e nas competências de julho a setembro de 2007 consta o código de pagamento 2100.
Tais códigos de pagamento referem-se às contribuições devidas pela empresa, não se destinando a comprovar o pagamento de contribuição previdenciária devida pelo contribuinte individual. A diferença entre os códigos (2100 ou 2003) corresponde à empresa optante pelo regime tributário SIMPLES ou não, como se verifica por meio de consulta ao sítio da Receita Federal.
Nesse sentido os seguintes julgados desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE URBANA. RECOLHIMENTOS PARA O SIMPLES NACIONAL. ATIVIDADE ESPECIAL. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL.CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Os recolhimentos efetuados sob o código 2003 não se referem aos recolhimentos previdenciários como contribuinte individual e sim para o SIMPLES nacional. De acordo com o artigo 13, § 1º, X, da Lei Complementar nº 123/2006, as contribuições devidas pelo empresário à Previdência Social, na condição de contribuinte individual, não estão incluídas no SIMPLES.
2. É possível o reconhecimento do caráter especial das atividades desempenhadas pelo segurado contribuinte individual, desde que o trabalhador consiga demonstrar o efetivo exercício de atividades nocivas, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, ou então em decorrência do exercício de atividade considerada especial por enquadramento por categoria profissional.
3. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, o respectivo tempo de serviço especial deve ser reconhecido.
4. Havendo laudo de perícia judicial nos autos dando conta do não fornecimento de Equipamentos de Proteção Individual, ou de que, embora tivessem sido fornecidos, não foram eficazes em virtude da ausência de comprovação de sua efetiva e correta utilização, não há que se falar em afastamento da nocividade dos agentes agressivos presentes nas atividades prestadas pela parte autora.
5. Se o segurado implementar os requisitos para a obtenção de aposentadoria pelas regras anteriores à Emenda Constitucional 20/98, pelas Regras de Transição e/ou pelas Regras Permanentes, poderá inativar-se pela opção que lhe for mais vantajosa.
6. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
(AC n. 5002893-47.2017.4.04.7108, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, julgado em 24-06-2020)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. TEMPO RURAL. ATIVIDADE URBANA. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. RECOLHIMENTO PARA O SIMPLES NACIONAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA.
1. O exercício de atividade rural deve ser comprovado mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ.
2. Os recolhimentos efetuados sob o código 2003 não se referem aos recolhimentos previdenciários como contribuinte individual e sim para o SIMPLES nacional. De acordo com o artigo 13, § 1º, X, da Lei Complementar nº 123/2006, as contribuições devidas pelo empresário à Previdência Social, na condição de contribuinte individual, não estão incluídas no SIMPLES.
3. Preenchidos os requisitos legais, o segurado tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição proporcional, desde a data do requerimento administrativo.
4. A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, prevista na Lei 11.960/2009, foi afastada pelo STF no julgamento do Tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, o que restou confirmado, no julgamento de embargos de declaração por aquela Corte, sem qualquer modulação de efeitos.
5. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.
6. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.
(AC n. 5008719-43.2019.4.04.9999, Sexta Turma, Rel. Juiz Federal Julio Guilherme Berezoski Schattschneider, julgado em 05-05-2021)
PREVIDENCIÁRIO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CÓDIGO 2003. EMPRESA. EMPRESÁRIO. RESPONSABILIDADE PELOS RECOLHIMENTOS. SÓCIO GERENTE. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. CTPS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. REAFIRMAÇÃO DA DER. DATA DE INÍCIO DOS EFEITOS FINANCEIROS: TEMA 995/STJ. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. AFASTAMENTO. MAJORAÇÃO. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Os recolhimentos efetuados sob o código 2003 dizem respeito ao regime Simples de tributação. Trata-se da contribuição devida pela empresa, que não enseja contagem de tempo de serviço para o empresário.
2. Uma vez comprovado o exercício de atividade como sócio gerente, devem ser admitidos os recolhimentos efetuados na condição de contribuinte individual, com a contagem do tempo respectivo.
3. A anotação em Carteira de Trabalho e Previdência Social constitui prova plena, para todos os efeitos, do vínculo empregatício ali registrado, porquanto goza de presunção iuris tantum de veracidade, ilidida apenas quando da existência de suspeitas objetivas e razoavelmente fundadas acerca dos assentos contidos do documento.
4. Início dos efeitos financeiros "para o momento do adimplemento dos requisitos legais (...)", conforme definido no voto condutor de mérito no julgamento do Tema 995/STJ.
5. Tratando-se de concessão de benefício previdenciário, uma vez fixados os honorários advocatícios devidos pelo INSS nos termos das Súmulas 111 do Superior Tribunal de Justiça e 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, descabida a imposição à parte autora de ônus sucumbenciais sobre a parte do pedido inicial não acolhida, pois a adoção dos valores da condenação como base de cálculo já observa a proporcionalidade da sucumbência.
6. Verba honorária majorada em razão do comando inserto no § 11 do art. 85 do CPC/2015.
7. Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do CPC.
(Ac n. 5011299-13.2019.4.04.7003, Turma Regional Suplementar do Paraná, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, julgado em 08-03-2022)
Questão bastante similar foi apreciada pela Sexta Turma desta Corte ao julgar, em 24-06-2020, a Apelação Cível n. 5003016-69.2018.4.04.7121, de que foi Relator o Des. Federal João Batista Pinto Silveira, da qual extraio o seguinte excerto:
DO PERÍODO URBANO
Postula a parte autora o reconhecimento do intervalo de 01-04-14 a 31-12-14, recolhido na condição de contribuinte individual.
O autor apresentou comprovantes de recolhimento (ev.28, guia2), relativo ao período vindicado, tendo sido realizado pagamento no código - 2003 - Empresas Optantes pelo Simples CNPJ/MF.
As guias de pagamento GPS acostadas aos autos não conferem ao autor o direito ao reconhecimento de tempo de serviço correspondente às competências em que foram recolhidas, uma vez que os pagamentos foram efetuados sob o código "2003", o que significa que não são recolhimentos previdenciários do contribuinte individual, mas, em verdade, representam contribuição para o sistema Simples Nacional em nome da empresa titularizada pelo autor.
Cabe destacar que a contribuição previdenciária que está abrangida pelo recolhimento unificado instituído pelo sistema Simples Nacional é contribuição patronal previdenciária, não abarcando o recolhimento devido pelo contribuinte individual que titulariza a empresa, de acordo com o artigo 13, § 1º, X, da Lei Complementar nº. 123/2006:
§ 1º O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas:
(...)
X - Contribuição para a Seguridade Social, relativa à pessoa do empresário, na qualidade de contribuinte individual;
A contribuição única da empresa que escolheu o regime simplificado veio a substituir a forma de arrecadação estabelecida no art. 22, da Lei 8.212/91. Ou seja, houve modificação acerca dos débitos tributários da empresa, mas nada foi alterado com relação à contribuição do empresário, considerado, desde sempre, contribuinte individual, responsável pelo recolhimento de suas contribuições.
Assim, o fato de a empresa ser optante do Simples Nacional, não desobriga o segurado empresário, porque contribuinte individual, de recolher as suas contribuições devidas à Previdência Social. A LC 123/06 estabeleceu forma única de recolhimentos de tributos devidos pela empresa, excluídos os débitos da previdência de seus sócios ou empregados. A qualidade de segurado do empresário nesta situação deve ser verificada com o recolhimento de contribuições vertidas por ele próprio e não pela empresa.
Desse modo, não prospera o apelo do autor quanto às contribuições de 01-04-14 a 31-12-14.
Observo que, mesmo nas Guias da Previdência Social recolhidas sob o código 2100, não estão incluídos os recolhimentos do contribuinte individual empresário, haja vista que tal código também se refere às contribuições da empresa, e não do segurado em nome próprio.
Portanto, as Guias de Pagamento acostadas aos autos, referentes às competências de dezembro de 2005, janeiro a dezembro de 2006, e janeiro a setembro de 2007, não são hábeis a demonstrar o recolhimento de contribuições previdenciárias na condição de contribuinte individual.
Já quanto às competências novembro de 2005, agosto de 2008, e fevereiro e julho de 2012, o autor não trouxe aos autos qualquer comprovação de recolhimento previdenciário visando ao reconhecimento do tempo de serviço pretendido.
Não há, pois, comprovação de recolhimento de contribuições previdenciárias em todo o período vindicado na presente demanda.
Em se tratando de deficiência probatória, é de se observar a jurisprudência da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, na seara do direito previdenciário, frente à sua natureza protetiva, é desarrazoado em hipóteses tais reconhecer a improcedência de pleito, formando a coisa julgada material (Recurso Repetitivo n. 1.352.721/SP, publicado no DJe de 28-04-2016, de que foi Relator o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho):
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa. 6. Recurso Especial do INSS desprovido.
Muito embora a hipótese apreciada pelo STJ seja relativa a tempo de serviço rural, certo é que a fundamentação adotada deve ser aplicada a qualquer situação em que ausente conteúdo probatório eficaz, tal como decidiu a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça ao julgar, em 26-10-2020, o AgInt no AgInt no AREsp n. 1538872/PR, da Relatoria do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO QUE ACOLHE A PRETENSÃO DO SEGURADO PARA RECONHECER A POSSIBILIDADE DE AJUIZAMENTO DE NOVA AÇÃO. AGRAVO INTERNO QUE SE LIMITA A DEFENDER A IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE ESPECIAL. RAZÕES RECURSAIS DISSOCIADAS DA REALIDADE DOS AUTOS. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 283 E 284/STF. AGRAVO INTERNO DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
(...)
4. Ademais, cabe esclarecer que, ao contrário do que afirma o INSS, o entendimento firmado no REsp. 1.352.721/SP, julgado em sede de recurso repetitivo pela Corte Especial do STJ, fixa parâmetro para o julgamento de qualquer ação previdenciária, não se podendo restringir seu alcance à lides de trabalhadores rurais.
5. Agravo Interno do INSS a que se nega provimento.
Nesse mesmo sentido os seguintes precedentes desta Corte: AC n. 5001505-66.2018.4.04.7208, Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, Rel. Des. Federal Celso Kipper, julgado em 17-12-2020; AC n. 0017718-80.2013.4.04.9999, Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, Rel. Juíza Federal (convocada) Gabriela Pietsch Serafin, julgado em 14-12-2017; AC n. 0018761-18.2014.4.04.9999/SC, Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, julgado em 14-09-2017; e AC n. 0011414-31.2014.4.04.9999, Quinta Turma, Relator Des. Federal Roger Raupp Rios, julgado em 07-06-2016.
Assim, deve o feito ser extinto sem resolução do mérito quanto à pretensão de reconhecimento do tempo de serviço urbano como contribuinte individual nas competências de novembro e dezembro de 2005, janeiro a dezembro de 2006, janeiro a setembro de 2007, agosto de 2008, e fevereiro e julho de 2012, nos moldes do artigo art. 485, inc. IV, do CPC de 2015, não se obstando, por conseguinte, o ajuizamento de nova ação para renovação do pleito mediante apresentação de novas provas.
Honorários advocatícios
Considerando que a sentença foi publicada após 18-03-2016, data definida pelo Plenário do STJ para início da vigência do NCPC (Enunciado Administrativo nº 1-STJ), bem como o Enunciado Administrativo n. 7 - STJ (Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC), aplica-se ao caso a sistemática de honorários advocatícios ora vigente.
Desse modo, considerando a manutenção da sentença de primeiro grau e tendo em conta o disposto no § 11 do art. 85 do NCPC, bem como recentes julgados do STF e do STJ acerca da matéria (v.g.ARE971774 AgR, Relator p/ Acórdão: Min. Edson Fachin, Primeira Turma, DJe 19-10-2016; ARE 964330 AgR, Relator p/ Acórdão: Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe 25-10-2016; AgInt no AREsp 829.107/RJ, Relator p/ Acórdão Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe 06-02-2017 e AgInt nos EDcl no REsp 1.357.561/MG, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe 19-04-2017), majoro a verba honorária de R$ R$ 1.000,00 para R$ 1.100,00, restando suspensa a satisfação respectiva, por ser a parte beneficiária da gratuidade de justiça, que ora defiro.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por julgar extinto o feito sem exame do mérito, nos moldes do artigo art. 485, inc. IV, do CPC de 2015.
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Apelação Cível Nº 5011132-63.2018.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: OLAVO CENCI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. tempo de serviço urbano. empresário. contribuinte individual. prova das contribuições previdenciárias. ausência. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM EXAME DO MÉRITO.
1. O demandante, na condição de empresário, enquadra-se como contribuinte individual, sendo, portanto, responsável pelo recolhimento das suas contribuições previdenciárias por iniciativa própria, consoante o disposto no artigo 30, inc. II, da Lei n. 8.212/91.
2. Consoante dispõe o § 5º do art. 29-A da Lei n. 8.213/91, havendo dúvida sobre a regularidade do vínculo incluído no CNIS e inexistência de informações sobre remunerações e contribuições, o INSS exigirá a apresentação dos documentos que serviram de base à anotação, sob pena de exclusão do período.
3. Os códigos de pagamento 2003 e 2100, constantes das Guias da Previdência Social, referem-se às contribuições devidas pela empresa, não se destinando a comprovar o pagamento de contribuição previdenciária devida pelo contribuinte individual.
4. Hipótese em que as Guias da Previdência Social juntadas aos autos não comprovam os recolhimentos previdenciários na condição de contribuinte individual.
5. Pela eficácia normativa do devido processo legal em sua dimensão substancial, as disposições do processo civil comum são flexibilizadas quando tocam uma causa previdenciária, de modo que a decisão denegatória de proteção social, por insuficiência de prova material, não pode impedir futura comprovação da existência desse direito fundamental à subsistência digna.
6. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial quanto ao tempo urbano controverso, conforme determina o art. 320 do CPC de 2015, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção, sem exame do mérito (art. 485, IV, do CPC de 2015) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 486, §1º, do mesmo diploma), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa (Precedente do STJ em sede de recurso representativo de controvérsia: REsp 1.352.721/SP, Corte Especial, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 16-12-2015).
7. O entendimento firmado no REsp. 1.352.721/SP, julgado em sede de recurso repetitivo pela Corte Especial do STJ, fixa parâmetro para o julgamento de qualquer ação previdenciária, não se podendo restringir seu alcance à lides de trabalhadores rurais (STJ, AgInt no AgInt no AREsp n. 1538872/PR, Primeira Seção, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 26-10-2020).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, julgar extinto o feito sem exame do mérito, nos moldes do artigo art. 485, inc. IV, do CPC de 2015, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 08 de abril de 2022.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 01/04/2022 A 08/04/2022
Apelação Cível Nº 5011132-63.2018.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: OLAVO CENCI
ADVOGADO: IVANIA MARI ROMANO (OAB SC033599)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 01/04/2022, às 00:00, a 08/04/2022, às 16:00, na sequência 544, disponibilizada no DE de 23/03/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, JULGAR EXTINTO O FEITO SEM EXAME DO MÉRITO, NOS MOLDES DO ARTIGO ART. 485, INC. IV, DO CPC DE 2015.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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