Apelação/Remessa Necessária Nº 5014118-43.2012.4.04.7107/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: ALVIDORINO CARDOSO FERNANDES
ADVOGADO: EDUARDO SIMIONATO (OAB RS036170)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de apelações e remessa necessária de sentença (proferida na vigência do novo CPC) cujo dispositivo tem o seguinte teor:
Isso posto, julgo parcialmente procedentes os pedidos deduzidos na inicial para condenar o INSS a:
a) reconhecer a especialidade das atividades exercidas pelo autor nos períodos de 02/10/1979 a 01/03/1983, de 15/03/1983 a 17/11/1986, de 24/11/1986 a 06/02/1992, de 03/08/1992 a 31/10/1995, de 01/11/1995 a 02/06/1998, de 05/03/2001 a 07/03/2006 e de 01/08/2006 a 29/09/2011; e
b) conceder ao demandante o benefício de aposentadoria especial previsto no art. 57, da LBPS, nos termos da fundamentação.
Deverá o INSS pagar ao autor as parcelas atrasadas, de acordo com a renda mensal apurada, a contar do ajuizamento desta demanda (05/10/2012) até a data da efetiva implantação do benefício. Sobre o montante devido deverá incidir correção monetária calculada de acordo com os índices oficiais acima arrolados e juros moratórios de 12% ao ano a contar da citação (Súmula n.º 75 do TRF da 4ª Região).
Ante a sucumbência mínima da parte autora, condeno o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre as parcelas vencidas até a data de publicação desta sentença, corrigidas e com juros moratórios, de acordo com o determinado pela Súmula n.º 76, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Sem condenação em custas, uma vez que a parte autora não as adiantou, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Arcará o INSS com os valores devidos a título de honorários, adiantados ao perito nomeado nestes autos.
Espécie sujeita a reexame necessário.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Na hipótese de interposição de recurso de apelação, o qual será recebido no duplo efeito, intime-se a parte contrária para contrarrazoar, querendo, no prazo legal.
Verificadas as condições de admissibilidade e cumpridos os procedimentos de estilo, remetam-se os autos ao egrégio TRF da 4ª Região.
A parte autora, em sua apelação, requer, preliminarmente, seja determinado o retorno dos autos à origem para realização de perícia técnica, a fim de que seja avaliada a eficácia dos EPIs fornecidos pelas empresas empregadoras, somente na hipótese de ser acolhido o recurso repetitivo sobre o tem, em tramitação no STF, sob pena de evidente cerceamento de defesa. No mérito, requer seja determinar a averbação, para todos os fins previdenciários, do tempo especial reconhecido na sentença, bem como seja condenado o INSS a conceder à parte autora a aposentadoria especial, a contar da data do requerimento administrativo (15/12/2011).
Em suas razões de apelação, a Autarquia Previdenciária discorre sobre os requisitos para o reconhecimento do tempo especial. Requer seja julgado improcedente o pedido. Subsidiariamente, requer a aplicação do disposto no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, com a redação dada pela Lei n. 11.960/09, no que tange à correção monetária e aos juros de mora.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão-somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Admissibilidade da Apelação da Parte Autora
Não conheço do apelo da parte autora, por ausência de interesse recursal, quanto ao pedido de averbação, para fins previdenciários, do tempo especial reconhecido na sentença.
A averbação, para fins previdenciários, do tempo exercido em condições especiais é decorrência lógica da sentença. Não há, portanto, necessidade de que fique consignado na sentença que deve ser averbado o tempo de contribuição nela reconhecido.
Admissibilidade da Apelação do INSS
O recurso do INSS é extremamente genérico, pois simplesmente se procedeu à cópia e à colagem de diversos argumentos gerais de natureza jurídica e cujo sentido e alcance não são controvertidos ou comentários acerca de fatos que não necessariamente se referem ao caso dos autos. Sem dúvida, a petição poderia ser juntada a qualquer processo relativo a esta questão. Ele teria que indicar em qual prova dos autos estão baseadas as suas alegações de fato. Conforme precedente da Turma, "[não] se conhece de apelação genérica e abstrata, que não enfrenta os fundamentos da sentença" (2005.04.01.025175-1 - SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ).
Assim, não conheço do recurso quanto ao reconhecimento do tempo especial.
Preliminar de conversão em diligência para a realização de perícia
Não merece acolhida a preliminar de conversão em diligência para a realização de perícia técnica para avaliação da eficácia dos EPIs, visto que os documentos juntados aos autos são suficientes para a análise da especialidade dos períodos controvertidos.
Tempo Especial
Na hipótese vertente, os períodos controversos de atividade laboral exercidos em condições especiais estão assim detalhados:
Período: 02/10/1979 a 01/03/1983
Empresa: Randon S.A.
Função/Atividades: Auxiliar Geral.
Agentes nocivos: Ruído superior a 80 dB.
Enquadramento legal: Códigos 1.1.6 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64.
Provas: CTPS (Evento 1, PROCADM7, Página 8), PPP (Evento 1, PROCADM11, Página 16).
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição, de forma habitual e permanente, ao agente nocivo referido.
Período: 15/03/1983 a 17/11/1986
Empresa: Mecânica de Implementos Rodoviários Ltda.
Função/Atividades: Mecânico Eletricista.
Agentes nocivos: Ruído superior a 90 dB, óleos e graxas.
Enquadramento legal: Códigos 1.1.6 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64; códigos 1.2.11 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 e 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79.
Provas: CTPS (Evento 1, PROCADM7, Página 8) e perícia judicial por similaridade (Evento 45, LAUDOPERIC1).
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição, de forma habitual e permanente, aos agentes nocivos referidos.
Período: 24/11/1986 a 06/02/1992 e 01/11/1995 a 02/06/1998
Empresa: Belluno Implementos Rodoviários Ltda.
Função/Atividades: Mecânico Eletricista.
Agentes nocivos: Ruído superior a 90 dB, óleos e graxas.
Enquadramento legal: Códigos 1.1.6 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64; códigos 1.2.11 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 e 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79.
Provas: CTPS (Evento 1, PROCADM7, Página 8), formulário DSS-8030 (Evento 1, PROCADM8, Página 2) e perícia judicial por similaridade (Evento 45, LAUDOPERIC1).
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição, de forma habitual e permanente, aos agentes nocivos referidos.
Período: 03/08/1992 a 31/10/1995
Empresa: Tor - Comércio de Peças e Acessórios para Veículos
Função/Atividades: Mecânico Eletricista.
Agentes nocivos: Ruído superior a 90 dB, óleos e graxas.
Enquadramento legal: Códigos 1.1.6 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64; códigos 1.2.11 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 e 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79.
Provas: CTPS (Evento 1, PROCADM7, Página 10), formulário DSS-8030 (Evento 1, PROCADM14, Página 15) e perícia judicial por similaridade (Evento 45, LAUDOPERIC1).
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição, de forma habitual e permanente, aos agentes nocivos referidos.
Período: 05/03/2001 a 07/03/2006 e 01/08/2006 a 29/09/2011
Empresa: Madal S.A.
Função/Atividades: Montador de Estrutura,
Agentes nocivos: Ruído superior a 85 dB e óleos.
Enquadramento legal: Códigos 1.1.6 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64, 2.0.1 do Anexo IV do Decreto 2.172/97, 2.0.1 do Anexo IV do Decreto 3.048/99 com alteração pelo Decreto 4.882/2003; códigos 1.2.11 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79, 1.0.7 do Anexo IV do Decreto n. 2.172/97, 1.0.7 do Anexo IV do Decreto n. 3.048/99.
Provas: CTPS (Evento 1, PROCADM10, Página 2), Declaração da empresa (Evento 27, LAUDO2, Página 1) e laudo técnico (Evento 27, LAUDO2, Página 2).
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição ao agente nocivo ruído no período de 18/11/2003 a 07/03/2006 e 01/08/2006 a 29/9/2011 e ao agente químico óleo em todo o período.
Revisando a jurisprudência desta Corte, providência do colegiado para a segurança jurídica da final decisão esperada, passa-se a adotar o entendimento pacífico do egrégio Superior Tribunal de Justiça, no sentido que devem limitar o reconhecimento da atividade especial os estritos parâmetros legais vigentes em cada época (RESP 1333511 - CASTRO MEIRA, e RESP 1381498 - MAURO CAMPBELL), de modo que é tida por especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto 2.172/1997. Após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibéis. Com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância ao agente físico ruído foi reduzido para 85 decibéis (AgRg no REsp 1367806, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, vu 28/05/2013), desde que aferidos esses níveis de pressão sonora por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.
A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, que alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/91, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo.
A própria Autarquia já adotou esse entendimento na Instrução Normativa 45/2010:
Art. 238...
§ 6º Somente será considerada a adoção de Equipamento de Proteção Individual - EPI em demonstrações ambientais emitidas a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, e desde que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade e seja respeitado o disposto na NR-06 do MTE, havendo ainda necessidade de que seja assegurada e devidamente registrada pela empresa, no PPP, a observância:
Tratando-se de ruído, nem mesmo a comprovação de redução aos limites legais de tolerância pelo uso de EPI é capaz de eliminar a nocividade à saúde, persistindo a condição especial do labor já que a proteção não neutraliza as vibrações transmitidas para o esqueleto craniano e, através dele, para o ouvido interno. (Irineu Antônio Pedrotti, Doenças Profissionais ou do Trabalho, LEUD, 2ª ed., São Paulo, 1998, p. 538).
Ademais, o STF, no julgamento do ARE 664335, submetido ao regime de repercussão geral do art. 543-B do CPC, decidiu que "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria" (ARE 664335, Relatora: Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, publicado em 12/02/2015)."
Sobre a eficácia dos EPIs para os agentes químicos, a fim de evitar tautologia, transcrevo trecho do voto da Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ, no julgamento da APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5012407-66.2013.404.7107, 6ª Turma, por unanimidade, julgado em 27/06/2018:
"(...)
Quanto aos agentes químicos, a utilização de luvas e cremes de proteção não possui o condão de neutralizar a ação dos agentes nocivos a que estava exposto o autor.
Com efeito, tais cremes são conhecidos como "luvas invisíveis" e são utilizados por não ocasionarem perda de tato ou movimentação dos trabalhadores. Exatamente em decorrência de tais características, torna-se impossível ao trabalhador a avaliação do nível de proteção a que está sujeito, considerando-se o desgaste natural da camada protetora proporcionada por tais cremes em virtude do manuseio de equipamentos, ferramentas, da fricção das mãos com objetos e roupas e mesmo do suor, aspectos ínsitos à prestação laboral em análise. Torna-se, destarte, praticamente impossível a manutenção de uma camada protetiva contínua e homogênea.
Assim, não convincente a afirmação de que a utilização apenas de cremes de proteção, ainda que de forma adequada, possui o condão de neutralizar a ação de agentes nocivos químicos, ainda mais considerando que a exposição do autor a tais elementos ocorria de forma "contínua e permanente".
Frise-se que tal entendimento vem sendo reiteradamente adotado no âmbito trabalhista, restando caracterizada a insalubridade em grau máximo do labor desempenhado por trabalhadores da área de mecânica de manutenção, ainda que demonstrada através de prova técnica a adequada utilização de cremes protetores. Em tal sentido:
ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. MECÂNICO DE MANUTENÇÃO. ÓLEOS E GRAXAS. EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. CREME DE PROTEÇÃO. O creme protetor para as mãos não é capaz de elidir a ação dos agentes insalubres (graxas e óleos minerais) presentes na atividade de mecânico de manutenção, sendo devido ao trabalhador o respectivo adicional em grau máximo, porque notório o fato de o exercente de tal função manusear habitualmente óleos e graxas minerais, produto químico para o qual as luvas 'invisíveis' não se mostram eficazes para o efeito de inibir o contato com o agente insalutífero, pois são retiradas facilmente pelo atrito. (TRT4, RO 0000362-53.2011.5.04.0301; 10ª Turma, Relatora Desa. Denise Pacheco. 20-02-2014).
ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. MECÂNICO. CONTATO COM ÓLEOS E GRAXAS. GRAU MÁXIMO. Tendo trabalhado em contato com agentes nocivos, enquadrados no Anexo 13 da NR-15 da Portaria 3.214/78 do MTE, não elididos pelo uso de equipamentos de proteção adequados e eficazes para afastar o contato com óleos minerais, faz jus o empregado ao pagamento do adicional de insalubridade em grau máximo. Recurso não provido. (TRT4, RO 0000362-53.2011.5.04.0301; 5ª Turma; Relatora Desa. Brígida Joaquina Charão Barcelos Toschi. 21-08-2014).
RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. CREME DE PROTEÇÃO. Em que pese a conclusão do perito engenheiro, no sentido de não serem insalubres as atividades laborais da reclamante, pelo uso adequado do creme de proteção para as mãos, esta Turma Julgadora, na sua atual composição, adota o entendimento de que os cremes de proteção, mesmo com Certificado de Aprovação, e utilização regular pelo trabalhador, não são eficazes para neutralizar de forma eficiente a ação dos agentes insalubres, porquanto não formam uma barreira de proteção uniforme sobre as mãos e antebraços, a qual não permanece íntegra após o atrito das mãos com as peças manuseadas. Adicional de insalubridade devido. (TRT4, RO 0002111-72.2012.5.04.0333; 9ª Turma; Relatora Desa. Maria da Graça Ribeiro Centeno. 22-05-2014).
ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. CONTATO COM PRODUTOS QUÍMICOS DE ORIGEM MINERAL. "LUVA INVISÍVEL". GRAU MÁXIMO. O fornecimento e o uso do creme protetor, ainda que o obreiro o reaplique de forma periódica, consiste em uma "luva invisível" que vai sendo retirada com o manuseio, expondo o empregado ao contato direto com o agente insalubre. A proteção insuficiente é fator de aumento do risco, pois o trabalhador, acreditando estar imune, age com menor cautela do que quando não está usando nenhum equipamento de proteção individual. (TRT4, RO 0000145-35.2013.5.04.0561; 6ª Turma; Relator Des. Raul Zoratto Sanvicente. 26-02-2014).
(...)"
Assim, adotando o entendimento supra, tenho que o eventual uso de luvas ou creme de proteção não é suficientes para a efetiva proteção contra os efeitos nocivos dos hidrocarbonetos.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, é devida ao segurado que, além da carência, tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física durante 15, 20 ou 25 anos.
Em se tratando de aposentadoria especial, portanto, não há conversão de tempo de serviço especial em comum, visto que o que enseja a outorga do benefício é o labor, durante todo o período mínimo exigido na norma em comento (15, 20, ou 25 anos), sob condições nocivas.
No caso, considerados os períodos de atividade especial reconhecidos, perfaz a parte autora mais de 25 anos de tempo especial.
RECONHECIDO NA FASE ADMINISTRATIVA | Anos | Meses | Dias | |||
Contagem até a Data de Entrada do Requerimento: | 15/12/2011 | 2 | 0 | 1 | ||
RECONHECIDO NA FASE JUDICIAL | ||||||
Obs. | Data Inicial | Data Final | Mult. | Anos | Meses | Dias |
Especial | 02/10/1979 | 01/03/1983 | 1,0 | 3 | 5 | 0 |
Especial | 15/03/1983 | 17/11/1986 | 1,0 | 3 | 8 | 3 |
Especial | 24/11/1986 | 06/02/1992 | 1,0 | 5 | 2 | 13 |
Especial | 01/11/1995 | 02/06/1998 | 1,0 | 2 | 7 | 2 |
Especial | 03/08/1992 | 31/10/1995 | 1,0 | 3 | 2 | 29 |
Especial | 05/03/2001 | 07/03/2006 | 1,0 | 5 | 0 | 3 |
Especial | 01/08/2006 | 29/09/2011 | 1,0 | 5 | 1 | 29 |
Subtotal | 28 | 3 | 19 | |||
SOMATÓRIO (FASE ADM. + FASE JUDICIAL) | Anos | Meses | Dias | |||
Contagem até a Data de Entrada do Requerimento: | 15/12/2011 | 30 | 3 | 20 |
Desse modo, a parte autora tem direito à concessão da aposentadoria especial, sem a incidência do fator previdenciário, a contar da data do requerimento administrativo.
Data de início dos efeitos financeiros
Os efeitos financeiros do benefício são devidos desde a data do requerimento administrativo, porquanto o direito ao benefício (ou a determinado valor de renda mensal) é independente da prova desse direito, consoante orientação consolidada na Terceira Seção desta Corte:
EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADES AGRÍCOLAS E ESPECIAIS. EFEITOS FINANCEIROS DA REVISÃO DO BENEFÍCIO. Em ação em que se reconhece tempo de serviço rural e/ou especial para efeito de revisão da renda mensal inicial do benefício, os efeitos financeiros do acréscimo do tempo de serviço devem, em regra, retroagir à data de entrada do requerimento do benefício (ressalvada eventual prescrição quinquenal), independentemente de, à época, ter havido requerimento específico nesse sentido ou de ter sido aportada documentação comprobatória suficiente ao reconhecimento da atividade rural e/ou especial, tendo em vista o caráter de direito social da previdência social, o dever constitucional, por parte da autarquia previdenciária, de tornar efetivas as prestações previdenciárias aos beneficiários, o disposto no art. 54, combinado com o art. 49, ambos da Lei 8.213/91, e a obrigação do INSS de conceder aos segurados o melhor benefício a que têm direito, ainda que, para tanto, tenha que orientar, sugerir ou solicitar os documentos necessários. Precedentes do STJ e desta Corte. (TRF4, EINF 0000369-17.2007.404.7108, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 08/03/2012).
Desse modo, merece reforma a sentença no ponto.
Afastamento da Atividade Especial
No tocante à necessidade de afastamento do segurado, após a concessão do benefício, de qualquer atividade sujeita a contagem especial, cabe mencionar que a Corte Especial deste Tribunal, em julgamento realizado em 24/05/2012, afirmou a inconstitucionalidade do § 8º do artigo 57 da Lei 8.213/91, nos autos da Arguição De Inconstitucionalidade 5001401-77.2012.404.0000, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira Do Valle Pereira.
Cumpre referir que não se desconhece que a questão acerca da possibilidade de percepção do benefício da aposentadoria especial na hipótese em que o segurado permanece no exercício de atividades laborais nocivas à saúde teve a repercussão geral reconhecida pelo STF no julgamento do RE 788092 (Tema 709). Não se desconhece, também, das razões invocados pelo Relator, Ministro Dias Toffoli, no sentido da constitucionalidade da referida regra, insculpida no § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991. Entretanto, pelos fundamentos acima declinados, mantenho a decisão da Corte Especial deste Tribunal até que haja o pronunciamento definitivo pela Suprema Corte.
Dessa forma, verificado que restaram cumpridas as exigências do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, deve o INSS conceder o benefício ora pretendido à parte autora, independente do afastamento do trabalho.
Correção monetária
A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei n.º 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).
A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, que fora prevista na Lei 11.960/2009, que introduziu o art. 1º-F na Lei 9.494/97, foi afastada pelo STF no julgamento do tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, o que restou confirmado, no julgamento de embargos de declaração por aquela Corte, sem qualquer modulação de efeitos. O precedente do STF é aplicável desde logo, uma vez que, nos termos da decisão do Relator, a pendência do julgamento dos embargos de declaração é que motivava a suspensão nacional dos processos.
No julgamento do tema 905, através do REsp 1.495146, e interpretando o julgamento do STF, o STJ definiu quais os índices que se aplicariam em substituição à TR, concluindo que aos benefícios assistenciais deveria ser utilizado IPCA-E, conforme decidiu a Suprema Corte, no recurso representativo da controvérsia e que, aos previdenciários, voltaria a ser aplicável o INPC, uma vez que a inconstitucionalidade reconhecida restabeleceu a validade e os efeitos da legislação anterior, que determinava a adoção deste último índice, nos termos acima indicados.
Ainda que o STJ não tenha levantado a suspensão dos efeitos da tese que firmou no julgamento do Tema 905, nada obsta à utilização dos respectivos argumentos, por esta Turma, como razões de decidir, uma vez que bem explicitam os critérios atualizatórios, a partir da natureza dos benefícios – assistencial ou previdenciária.
A conjugação dos precedentes dos tribunais superiores resulta, assim, na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.
Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).
Honorários advocatícios
Ficam mantidos os honorários advocatícios fixados em 10% sobre as parcelas vencidas até a data da sentença.
Custas e despesas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei n.º 9.289/96), devendo, no entanto, reembolsar o valor adiantado a título de honorários periciais.
Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497 do novo CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão, a ser efetivado em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Conclusão
Conhecer em parte da apelação da parte autora e, nesse limite, dar-lhe parcial provimento para que os efeitos financeiros do benefício tenham início na data do requerimento administrativo.
Conhecer em parte da apelação do INSS e, nesse limite, dar-lhe parcial provimento para adequar os juros de mora.
Dar parcial provimento à remessa oficial para adequar os juros de mora.
Determinar o cumprimento imediato do acórdão.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por conhecer em parte das apelações e, nesse limite, dar-lhes parcial provimento, dar parcial provimento à remessa oficial e determinar o cumprimento imediato do acórdão.
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5014118-43.2012.4.04.7107/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: ALVIDORINO CARDOSO FERNANDES
ADVOGADO: EDUARDO SIMIONATO (OAB RS036170)
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. AGENTE NOCIVO RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS. AFASTAMENTO DO TRABALHO. ART. 57, §8º, DA LEI DE BENEFÍCIOS. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA.
1. É admitida como especial a atividade em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80 decibéis até 05/03/1997, em que aplicáveis concomitantemente, para fins de enquadramento, os Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79; superiores a 90 decibéis no período de 06/03/1997 a 18/11/2003, de acordo com o Decreto nº 2.172/97, e, a partir de 19/11/2003 superiores a 85 decibéis, nos termos do Decreto 4.882/2003.
2. A exposição a agentes químicos é prejudicial à saúde, ensejando o reconhecimento do tempo de serviço como especial.
3. Reconhecida a inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da LBPS pela Corte Especial deste Tribunal (Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade n. 5001401-77.2012.404.0000, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, julgado em 24-05-2012), que determina o afastamento do trabalho após a concessão de aposentadoria especial, resta assegurada à parte autora a possibilidade de continuar exercendo atividades laborais sujeitas a condições nocivas após a conversão do benefício, sendo este devido a contar da data do requerimento administrativo, nos termos do § 2º do art. 57 c/c art. 49, II, da Lei n. 8.213/91.
4. A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, prevista na Lei 11.960/2009, foi afastada pelo STF no julgamento do Tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, o que restou confirmado, no julgamento de embargos de declaração por aquela Corte, sem qualquer modulação de efeitos.
5. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.
6. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, conhecer em parte das apelações e, nesse limite, dar-lhes parcial provimento, dar parcial provimento à remessa oficial e determinar o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 03 de junho de 2020.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 26/05/2020 A 03/06/2020
Apelação/Remessa Necessária Nº 5014118-43.2012.4.04.7107/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR(A): CÍCERO AUGUSTO PUJOL CORRÊA
APELANTE: ALVIDORINO CARDOSO FERNANDES
ADVOGADO: EDUARDO SIMIONATO (OAB RS036170)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 26/05/2020, às 00:00, a 03/06/2020, às 14:00, na sequência 404, disponibilizada no DE de 15/05/2020.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER EM PARTE DAS APELAÇÕES E, NESSE LIMITE, DAR-LHES PARCIAL PROVIMENTO, DAR PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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