Apelação Cível Nº 5053042-32.2021.4.04.7100/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: ENIVALDO DE SOUZA CARDOZO (AUTOR)
ADVOGADO(A): TIAGO BECK KIDRICKI (OAB RS058280)
ADVOGADO(A): LUCIANA ALVARES DE CASTRO E SOUSA (OAB RS058479)
ADVOGADO(A): JOSE RODRIGO CAMPOS DE AZEVEDO (OAB RS087755)
ADVOGADO(A): TIAGO BECK KIDRICKI
ADVOGADO(A): LUCIANA ALVARES DE CASTRO E SOUSA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de apelações contra sentença publicada na vigência do Código de Processo Civil de 2015, com dispositivo de seguinte teor:
Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido, para determinar ao INSS que:
Reconheça os períodos trabalhados, conforme a respectiva qualificação, nos termos da fundamentação e da tabela anexa;
Converta o tempo de serviço especial em comum, mediante a multiplicação pelo fator de conversão 1,4;
Averbe o acréscimo de 06 anos, 04 meses e 01 dia ao total já reconhecido administrativamente;
Conceda à parte autora o benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, a contar do requerimento administrativo (em 25/03/2019), mediante a sistemática de cálculo mais benéfica.
Diante do direito reconhecido em sentença e do caráter alimentar da pretensão, DEFIRO a antecipação dos efeitos da tutela, determinando que o INSS comprove, no prazo recomendado pela Corregedoria Regional da Justiça Federal da 4ª Região, a implantação do benefício.
Condeno o INSS ao pagamento das parcelas vencidas, acrescidas de juros e correção monetária calculados nos termos da fundamentação.
Nos termos do art. 86 do NCPC, diante da sucumbência recíproca, condeno ambas as partes ao pagamento de honorários.
Fixo a verba, equitativamente, nos termos do art. 85, em R$ 500,00 em favor do réu, com exigibilidade suspensa, diante da gratuidade judiciária concedida, e, em favor da autora, em 10% sobre o valor total da condenação (inc. I do § 3º do art. 85 do CPC) .
Apelou a parte autora sustentando o cerceamento de defesa, em face da omissão na análise do pedido do
. No mérito, alegou ter sido comprovada a atividade insalutífera nos intervalos de 14/10/2011 a 26/04/2012 e 07/05/2012 a 25/03/2019.Apelou o INSS sustentando que, diante da sucumbência recíproca e Súmula n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça, não deve prevalecer a sua condenação sucumbencial em 10% sobre o valor total da condenação.
Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Do cerceamento de defesa
Não procedem as alegações da parte autora com relação ao cerceamento de defesa. Nos termos do art. 370 do Novo CPC, como já previa o CPC/1973 no art. 130, cabe ao julgador, inclusive de ofício, determinar a produção das provas necessárias ao julgamento de mérito. Portanto, se entender encontrar-se munido de suficientes elementos de convicção, é dispensável a produção de outras.
MÉRITO
Não estando o feito submetido ao reexame necessário, a controvérsia no plano recursal restringe-se:
- ao reconhecimento da especialidade das atividades desenvolvidas nos períodos de 14/10/2011 a 26/04/2012 e 07/05/2012 a 25/03/2019;
- à consequente concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da DER (25/03/2019);
- aos honorários advocatícios.
Tempo de serviço especial
O tempo de serviço especial é disciplinado pela lei vigente à época em que exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço, o segurado adquire o direito à sua contagem pela legislação então vigente, não podendo ser prejudicado pela lei nova, cuja previsão legislativa expressa se deu com a edição do Decreto n.º 4.827/03, que inseriu o § 1º no art. 70 do Decreto n.º 3.048/99. Nesse sentido é a orientação adotada pela Terceira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/9/2008; EREsp 345554/PB, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ 8/3/2004; AGREsp 493.458/RS, Quinta Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJU 23/6/2003; e REsp 491.338/RS, Sexta Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 23/6/2003).
Isso assentado, e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:
a) no período de trabalho até 28-04-1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade profissional enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto quanto à exposição a ruído e calor, em que necessária sempre a aferição de seus níveis (decibéis/ºC IBUTG), por meio de parecer técnico trazido aos autos ou, simplesmente, referido no formulário padrão emitido pela empresa;
b) a partir de 29-04-1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13-10-1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14-10-1996, que a revogou expressamente, de modo que, no interregno compreendido entre essas datas e 05-03-1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;
c) após 06-03-1997, quando vigente o Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei n.º 9.528/97, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Essa interpretação das sucessivas normas que regulam o tempo de serviço especial está conforme à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 415.298/SC, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 06/04/2009; AgRg no Ag 1053682/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 08/09/2009; REsp 956.110/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/10/2007; AgRg no REsp 746.102/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 07/12/2009).
Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/1973 (Quadro II do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo II) até 28/4/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/1973 (Quadro I do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo I) até 5/3/1997, e os Decretos 2.172/1997 (Anexo IV) e 3.048/1999 a partir de 6/3/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4.882/2003. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/6/2003).
Exame do tempo especial no caso concreto
Passo, então, ao exame do(s) período(s) controvertido(s) nesta ação, com base nos elementos contidos nos autos e na legislação de regência, para concluir pelo cabimento ou não do reconhecimento da natureza especial da atividade desenvolvida.
Período: a) 14/10/2011 a 26/04/2012, b) 07/05/2012 a 25/03/2019
Empresa: a) Orbital Serviços Auxiliares de Transporte Aéreo, b) Azul Linhas Aéreas Brasileiras S/A
Atividade/função: a) agente de atendimento ao passageiro I, b) agente de aeroporto
Agente nocivo: não há
Prova: CTPS (
- p. 11 e 12); laudo pericial judicial, por similaridade ( )Enquadramento legal: não há
Conclusão: conforme laudo, juntado pelo próprio segurado, um trabalhador em escritório, no aeroporto (caso do autor), fica exposto a um nível de ruído de 66,5 dB, inferior, portanto, ao limite de tolerância vigentes à época da prestação do labor. A submissão a 92,9 dB, é restrita a funcionários que atuam no pátio de manobras de aeronaves.
A descrição das atividades do autor nas duas empresas deixa claro que suas atividades ocorriam no terminal de passageiros dos aeroportos, não nas pistas ou pátios de manobras das aeronaves.
No tocante à periculosidade decorrente da exposição a produtos inflamáveis, segundo o referido documento, é própria de quem "realizava, de forma habitual, acompanhamento ao abastecimento de aeronaves", atividade não prevista nos PPPs da parte segurada (
- p. 39 e 51).Portanto, o segurado não esteve exposto a agente nocivo, logo, não é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor, devendo ser confirmada a sentença no ponto.
Do direito à aposentadoria
Mantido o tempo de serviço, fica inalterada a sentença quanto ao preenchimento dos requisitos à aposentadoria.
Transcorridos menos de cinco anos entre a DER (25/03/2019) e o ajuizamento da demanda (22/07/2021), não incide, no caso, a prescrição quinquenal.
Honorários advocatícios
Apesar do tempo insalutífero pleiteado pelo autor ter sido reconhecido apenas parcialmente, houve direito à concessão do benefício, então, entende-se que, como a parte autora decaiu em parte mínima do pedido, é devida a manutenção da condenação da Autarquia em 10% sobre as parcelas vencidas, nos termos do artigo 85, §3º, inciso I, do CPC.
Por outro lado, conforme a Súmula n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça, a verba honorária deve incidir sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência (sentença).
Dá-se parcial provimento à apelação do INSS, no ponto.
Ainda com relação aos honorários da Autarquia, em 26/08/2020, foi afetado pelo STJ o Tema 1059, com a seguinte questão submetida a julgamento: "(Im)possibilidade da majoração, em grau recursal, da verba honorária estabelecida na instância recorrida, quando o recurso for provido total ou parcialmente, ainda que em relação apenas aos consectários da condenação".
Ainda que não determinada a suspensão dos feitos neste grau de jurisdição, mas considerando a necessidade de evitar prejuízo à razoável duração do processo, a melhor alternativa, no caso, é diferir, para momento posterior ao julgamento do tema, a decisão sobre a questão infraconstitucional afetada, sem prejuízo do prosseguimento do feito quanto aos demais temas, evitando-se que a controvérsia sobre consectários possa produzir impactos à prestação jurisdicional principal.
Assim, deverá ser observado pelo juízo de origem, oportunamente, o que vier a ser decidido pelo tribunal superior quanto ao ponto.
Negado provimento ao recurso do autor, deve ser observada, em cumprimento de sentença, a majoração de 50% da verba honorária fixada na origem, pela incidência do §11 do artigo 85 do CPC. Observada, ainda, a suspensão de exigibilidade decorrente do benefício de gratuidade de justiça.
Tutela específica - implantação do benefício
Considerando o disposto no
, deixo de determinar a implantação do benefício.Conclusão
Parcialmente provida a apelação do INSS para que a verba honorária incida sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência (sentença). Honorários advocatícios nos termos da fundamentação. Nos demais pontos, mantida a sentença.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do INSS e negar provimento à apelação da parte autora.
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Apelação Cível Nº 5053042-32.2021.4.04.7100/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: ENIVALDO DE SOUZA CARDOZO (AUTOR)
ADVOGADO(A): TIAGO BECK KIDRICKI (OAB RS058280)
ADVOGADO(A): LUCIANA ALVARES DE CASTRO E SOUSA (OAB RS058479)
ADVOGADO(A): JOSE RODRIGO CAMPOS DE AZEVEDO (OAB RS087755)
ADVOGADO(A): TIAGO BECK KIDRICKI
ADVOGADO(A): LUCIANA ALVARES DE CASTRO E SOUSA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. tempo especial. agentes nocivo ruído abaixo do limite legal de tolerância. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. honorários advocatícios.
1. Não comprovada a exposição da parte autora a agentes nocivos nos períodos objeto de seu apelo, inviável o reconhecimento de sua especialidade.
2. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição.
3. Os honorários advocatícios devem incidir apenas sobre as parcelas vencidas até a data da decisão de procedência, no caso, a sentença.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de abril de 2023.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003785230v6 e do código CRC 2e807854.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/04/2023 A 13/04/2023
Apelação Cível Nº 5053042-32.2021.4.04.7100/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS
APELANTE: ENIVALDO DE SOUZA CARDOZO (AUTOR)
ADVOGADO(A): TIAGO BECK KIDRICKI (OAB RS058280)
ADVOGADO(A): LUCIANA ALVARES DE CASTRO E SOUSA (OAB RS058479)
ADVOGADO(A): JOSE RODRIGO CAMPOS DE AZEVEDO (OAB RS087755)
ADVOGADO(A): TIAGO BECK KIDRICKI
ADVOGADO(A): LUCIANA ALVARES DE CASTRO E SOUSA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/04/2023, às 00:00, a 13/04/2023, às 16:00, na sequência 341, disponibilizada no DE de 23/03/2023.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 22/04/2023 04:01:20.