APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000721-08.2012.4.04.7109/RS
RELATOR | : | ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
APELANTE | : | MANOEL MOZART BITTENCOURT DE SOUZA |
ADVOGADO | : | JULIANO BOSSONI |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL. MOTORISTA. AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. RECONHECIMENTO. REVISÃO DA RENDA MENSAL INICIAL DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CABIMENTO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.
1. Demonstrado o exercício de tarefa sujeita a enquadramento por categoria profissional até 28/4/1995, o período respectivo deve ser considerado como tempo especial. 2. Até a vigência da Lei 9.032/1995 é possível a caracterização da atividade especial pela categoria de motorista de caminhão, ante a presunção de penosidade e periculosidade existente no desempenho de suas atividades diárias. 3. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida. 4. O reconhecimento da atividade especial em razão da exposição ao agente físico ruído deve se adequar aos estritos parâmetros legais vigentes em cada época (RESP 1333511 - Castro Meira, e RESP 1381498 - Mauro Campbell). 5. A exposição a níveis de ruído acima dos limites de tolerância estabelecidos na legislação pertinente à matéria sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de equipamentos de proteção e de menção, em laudo pericial, à neutralização de seus efeitos nocivos (STF, ARE 664335, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 4/12/2014, publicado em 12/2/2015). 6. Os equipamentos de proteção individual não são suficientes, por si só, para descaracterizar a especialidade da atividade desempenhada pelo segurado, devendo cada caso ser apreciado em suas particularidades. 7. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à revisão da aposentadoria por tempo de contribuição, com o cálculo que for mais favorável, a contar da data de entrada do requerimento administrativo. 8. Nos termos do julgamento do RE nº 870.947/SE (Tema 810), pelo STF, em 20/9/2017, a correção monetária dos débitos da Fazenda Pública se dará através do IPCA-E. Os juros moratórios devem atender a disciplina da Lei nº 11.960/2009.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo e determinar o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 10 de outubro de 2017.
ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Relator
| Documento eletrônico assinado por ALTAIR ANTONIO GREGORIO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9147256v21 e, se solicitado, do código CRC C5863222. | |
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| Signatário (a): | Altair Antonio Gregorio |
| Data e Hora: | 18/10/2017 21:13 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000721-08.2012.4.04.7109/RS
RELATOR | : | ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
APELANTE | : | MANOEL MOZART BITTENCOURT DE SOUZA |
ADVOGADO | : | JULIANO BOSSONI |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Manoel Mozart Bittencourt de Souza propôs ação ordinária contra o Instituto Nacional de Seguro Social - INSS, em 8/3/2012 (evento 1), postulando a revisão do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição atualmente percebido (NB 106.025.352-3), a contar da data de entrada do requerimento administrativo, formulado em 22/7/1997 (evento 1, PROCADM9, fl. 1), mediante o reconhecimento do exercício de atividades em condições especiais nos períodos de 1/5/1974 a 30/11/1974, 1/5/1975 a 26/9/1975, 1/12/1975 a 8/3/1976 e de 29/4/1995 a 22/7/1997.
Em 10/7/2012 (evento 14) sobreveio sentença que extinguiu o processo, com resolução do mérito, em razão da decadência, nos termos do artigo 269, inciso IV, do CPC. Inconformada, apelou a parte autora (evento 18) postulando o afastamento da decretação da decadência do direito de revisão do benefício previdenciário de que é titular.
Em sessão realizada em 13/9/2012 (evento 5) esta 5ª Turma deu provimento à apelação, para afastar a decadência e determinar o retorno dos autos à origem para prosseguimento do feito.
O acórdão proferido ensejou a interposição de embargos de declaração pela autarquia (evento 9), os quais, por unanimidade, foram rejeitados por esta Turma (evento 14), bem como de recurso especial e extraordinário também pelo INSS (eventos 19 e 20).
Em juízo de admissibilidade, a Vice-Presidência não admitiu os recursos (eventos 26 e 27), tendo a autarquia agravado desta decisão (evento 33). Analisando o recurso, o Superior Tribunal de Justiça não conheceu o agravo (evento 39), tendo os autos retornado ao juízo de origem, em 21/10/2014 (evento 24), para reabertura da instrução processual.
Em 10/2/2017 sobreveio nova sentença (evento 53) que julgou improcedente o pedido formulado na inicial, nos seguintes termos:
Ante o exposto, afasto a prejudicial de prescrição bienal, acolho a prescrição quinquenal com relação a valores anteriores a 08/03/2007, e, no mérito propriamente dito, julgo improcedente o pedido, nos termos do art. 487, I, do CPC.
Condeno o autor ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa (art. 85, § 4º, III, do CPC), atualizados segundo o Manual de Cálculos da Justiça Federal; verbas cuja exigibilidade resta suspensa em virtude da gratuidade judiciária concedida.
Interposto o recurso, intime-se a parte contrária para oferecer contrarrazões no prazo legal (§1º do art. 1.010 do CPC/15), e, na sequência, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (§3º do art. 1.010 do CPC/15).
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação (evento 57) pleiteando, em síntese, o reconhecimento da especialidade das atividades exercidas pela parte autora nos períodos requeridos na inicial, com a conseqüente revisão do benefício atualmente percebido, a contar da DER.
Com contrarrazões ao recurso (evento 63), vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Prescrição
A Lei 8.213/91 prevê expressamente a prescrição quinquenal (artigo 103, parágrafo único, com a redação dada pela Lei 9.528/1997) que atinge as parcelas de benefícios previdenciários não reclamados nas épocas próprias.
Deste modo, deve ser reconhecida a prescrição das parcelas relativas a épocas anteriores ao quinquênio do ajuizamento da ação, ocorrido em 8/3/2012 (evento 1).
Passo ao exame do mérito.
Atividade Especial
O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente à época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/9/2008; EREsp 345554/PB, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ 8/3/2004; AGREsp 493.458/RS, Quinta Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJU 23/6/2003; e REsp 491.338/RS, Sexta Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 23/6/2003) e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (EINF 2005.71.00.031824-5/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 18/11/2009; APELREEX 0000867-68.2010.404.9999/RS, Sexta Turma, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, D.E. 30/3/2010; APELREEX 0001126-86.2008.404.7201/SC, Sexta Turma, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 17/3/2010; APELREEX 2007.71.00.033522-7/RS; Quinta Turma, Relator Desembargador Federal Fernando Quadros da Silva, D.E. 25/1/2010).
Feitas estas observações e tendo em vista a sucessão de leis que trataram a matéria diversamente, é necessário inicialmente definir qual deve ser aplicada ao caso concreto, ou seja, qual a que se encontrava em vigor no momento em que a atividade foi prestada pelo segurado.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:
a) até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei 3.807/1960 (LOPS) e suas alterações e, posteriormente, a Lei 8.213/1991 (LBPS), em sua redação original (artigos 57 e 58), era possível o reconhecimento da especialidade do trabalho mediante a comprovação do exercício de atividade prevista como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou, ainda, quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor (STJ, AgRg no REsp 941885/SP, Quinta Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 4/8/2008; e STJ, REsp 639066/RJ, Quinta Turma, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 7/11/2005), quando então se fazia indispensável a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar a nocividade dos agentes envolvidos;
b) a partir de 29 de abril de 1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14/10/1996, que a revogou expressamente - de modo que, para o intervalo compreendido entre 29/4/1995 (ou 14/10/1996) e 5/3/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei 9.032/1995 no artigo 57 da LBPS, torna-se necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;
c) a partir de 6 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da LBPS pela Medida Provisória 1.523/1996 (convertida na Lei 9.528/1997), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
A respeito da possibilidade de conversão do tempo especial em comum, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial Repetitivo 1.151.363, do qual foi Relator o Ministro Jorge Mussi, assim decidiu, admitindo-a mesmo após 28 de maio de 1998:
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL APÓS 1998. MP N. 1.663-14, CONVERTIDA NA LEI N. 9.711/1998 SEM REVOGAÇÃO DA REGRA DE CONVERSÃO.
1. Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/91.
2. Precedentes do STF e do STJ.
Assim, considerando que o artigo 57, §5º, da Lei 8.213/1991 não foi revogado, nem expressa, nem tacitamente, pela Lei 9.711/1998 e que, por disposição constitucional (artigo 15 da Emenda Constitucional 20, de 15/12/1998), permanecem em vigor os artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios até que a lei complementar a que se refere o artigo 201, §1º, da Constituição Federal, seja publicada, é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28 de maio de 1998.
Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/1973 (Quadro II do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo II) até 28/4/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/1973 (Quadro I do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo I) até 5/3/1997, e os Decretos 2.172/1997 (Anexo IV) e 3.048/1999 a partir de 6/3/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4.882/2003.
Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/6/2003).
Anoto que, administrativamente (evento 1, PROCADM9, fls. 2/3), a autarquia previdenciária reconheceu a especialidade das atividades exercidas pela parte autora, no interregno compreendido entre 8/11/1976 e 28/4/1995, pela categoria profissional de motorista.
Importa referir, inicialmente, que de acordo com a Lei 9.032/1995 até 28/4/1995 é possível a caracterização da atividade especial, pela categoria profissional de motorista, ante a presunção de penosidade e periculosidade existente no desempenho das atividades diárias. Outrossim, a partir desta data (29/4/1995) não é mais viável o enquadramento como especial em razão de qualquer categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição a agentes agressivos.
Isto posto, passo à análise dos períodos controvertidos de atividades exercidas em condições especiais, os quais estão assim detalhados:
Período: 1/5/1974 a 30/11/1974
Empresa: Lucy Moura Madruga
Ramo: Prestação de serviços de malote
Função/Atividades: Motorista
Provas: CTPS (evento 36, CTPS2)
A atividade de motorista contemplada pelos decretos regulamentadores à época em que era possível o reconhecimento da especialidade da atividade através do enquadramento por categoria profissional era aquela caracterizada por sua execução na direção de veículos pesados durante toda a jornada de trabalho. Desse modo, não se pode presumir que a jornada de trabalho de todo aquele que exercia atividade sob a denominação genérica de 'motorista' tenha as mesmas características no tocante à habitualidade e permanência de condições especiais, devendo haver prova de tal fato, nos termos da fundamentação supra. Neste lapso temporal o único documento trazido a exame foi a CTPS do autor, na qual consta a função de motorista, em empresa de transporte de malotes, sem especificar o tipo de veículo utilizado pelo autor no desempenho de suas atividades.
Conclusão: Não restou comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado.
Período: 1/5/1975 a 26/9/1975
Empresa: Adilys Guterres Ferreira
Ramo: Transporte de cargas
Função/Atividades: Motorista
Categoria profissional: Motorista
Enquadramento legal: Códigos 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 e 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/79
Provas: CTPS (evento 36, CTPS2)
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de seu enquadramento por categoria profissional.
Período: 1/12/1975 a 8/3/1976
Empresa: Francisco de Assis Nicoloso
Ramo: Transporte
Função/Atividades: Motorista de caminhão (realizava o transporte rodoviário de cargas diversas em todo o território nacional)
Categoria profissional: Motorista
Enquadramento legal: Códigos 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 e 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/79
Provas: CTPS (evento 36, CTPS2) e PPP (evento 30, PPP4)
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de seu enquadramento por categoria profissional.
Período: 29/4/1995 a 22/7/1997
Empresa: Viação Ouro e Prata S/A
Ramo: Transporte coletivo
Função/Atividades: Motorista de ônibus (realizava o transporte de passageiros em diversas linhas através de escala de serviço)
Agentes nocivos:
- Segundo o PPP ruído inferior a 80 decibéis
- Segundo o laudo técnico ruído de 86,7 decibéis
Enquadramento legal: Códigos 1.1.6 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/1964, 1.1.5 do Anexo I do Decreto 83.080/1979, 2.0.1 do Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e 2.0.1 do Anexo IV do Decreto 3.048/1999, com a alteração introduzida pelo Decreto 4.882/2003 (ruído)
Provas: Formulário DSS (evento 1, PROCADM9, fl. 4), CTPS (evento 36, CTPS2), PPP preenchido em 2015 (evento 47, PPP2) e Laudo técnico fornecido pela empresa expedido em 1998 (evento 1, LAUDO8)
Neste interregno foram juntados aos autos o formulário DSS, o PPP e o Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho da própria empresa. Entretanto, observo que há divergência nas informações relativas aos agentes nocivos. Ocorre que o PPP sempre deve ser preenchido com base em laudo pericial. Assim, nos casos como o dos autos, em que houver divergências entre o PPP e o laudo, este deve ser privilegiado, em detrimento daquele, uma vez que o laudo técnico foi produzido por profissional engenheiro de segurança do trabalho, legalmente habilitado para prestar tais informações. Além disso, o laudo foi produzido no ano de 1998 e o PPP foi preenchido em 2015, razão porque entendo que o laudo elaborado por engenheiro representa a realidade vivenciada pelo autor na época em que foi prestado o labor, diferentemente do PPP que foi preenchido sete anos depois pelo Gerente de Recursos Humanos da empresa.
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição ao agente nocivo referido.
Quanto ao agente nocivo ruído adota-se o entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de limitar o reconhecimento da atividade especial aos estritos parâmetros legais vigentes em cada época (RESP 1333511 - Castro Meira, e RESP 1381498 - Mauro Campbell), de modo que é tida por especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto 2.172/1997. Após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibéis. Com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18/11/2003, o limite de tolerância ao agente físico ruído foi reduzido para 85 decibéis (AgRg no REsp 1367806, Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, vu 28/5/2013), desde que aferidos esses níveis de pressão sonora por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.
Para a caracterização da especialidade, não se exige exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de trabalho, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada, salvo exceções (periculosidade, por exemplo). Habitualidade e permanência hábeis para os fins visados pela norma - que é protetiva - devem ser analisadas à luz do serviço desenvolvido pelo trabalhador, cujo desempenho, não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas, químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho. Nesse sentido: EINF 2004.71.00.028482-6/RS, Relator Desembargador Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 8/1/2010 e EIAC 2000.04.01.088061-6/RS, Relator Desembargador Federal Fernando Quadros da Silva, DJU 3/3/2004.
A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei 9.732, de 11 de dezembro de 1998, que alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/1991, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. A própria autarquia já adotou esse entendimento na Instrução Normativa 45/2010.
Após esta data, de acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo - ARE 664335, submetido ao regime de repercussão geral (tema 555), Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 4/12/2014 e publicado em 12/2/2015, o uso de equipamentos de proteção individual somente descaracterizaria a atividade em condições especiais se comprovada, no caso concreto, a real efetividade, suficiente para afastar completamente a relação nociva a que o empregado se submete.
Especificamente quanto ao agente ruído, a Suprema Corte assentou entendimento que na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário, no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
No caso sob análise, ainda que alguns documentos façam referência ao uso de equipamentos de proteção, não restou comprovado o efetivo fornecimento pela empresa e tampouco ficou demonstrado o uso permanente pelo empregado durante toda a jornada de trabalho. Assim, o emprego desses acessórios não é suficiente para descaracterizar a especialidade do tempo de serviço em exame.
Portanto, deve ser parcialmente provido o recurso da parte autora para o fim de reconhecer a especialidade das atividades exercidas nos interregnos compreendidos entre 1/5/1975 e 26/9/1975, 1/12/1975 e 8/3/1976 e entre 29/4/1995 e 22/7/1997.
Passo à análise do pedido de revisão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição atualmente percebida.
Forma de cálculo da renda mensal inicial (RMI)
A renda mensal inicial do benefício será calculada de acordo com as regras da legislação infraconstitucional vigente na data em que o segurado completar todos os requisitos do benefício.
Assim, o segurado que completar os requisitos necessários à aposentadoria antes de 29/11/1999 (início da vigência da Lei 9.876/1999), terá direito a uma RMI calculada com base na média dos 36 últimos salários-de-contribuição apurados em período não superior a 48 meses (redação original do artigo 29 da Lei 8.213/1991), não se cogitando da aplicação do fator previdenciário conforme expressamente garantido pelo artigo 6º da respectiva lei.
Completando o segurado os requisitos da aposentadoria já na vigência da Lei 9.876/1999 (em vigor desde 29/11/1999), o período básico do cálculo (PBC) estender-se-á por todo o período contributivo, extraindo-se a média aritmética dos 80% maiores salários-de-contribuição, a qual será multiplicada pelo "fator previdenciário" (Lei 8.213/1991, artigo 29, inciso I e parágrafo 7º), respeitado o disposto no artigo 3º da Lei 9.876/1999.
O fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é aquele previsto na legislação aplicada na data concessão do benefício, e não o contido na legislação vigente quando o serviço foi prestado. A propósito, a questão já foi pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de Recurso Especial Repetitivo (REsp 1151363/MG, Relator Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em 23/3/2011, DJe 5/4/2011).
Direito à revisão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição atualmente percebida
Considerado o presente provimento judicial (acréscimo decorrente da conversão do tempo especial) e o tempo reconhecido administrativamente (evento 1, PROCADM9, fls. 2/3), tem-se a seguinte composição do tempo de serviço da parte autora:
Reconhecido na fase administrativa | Anos | Meses | Dias | |||
Contagem até a DER: | 22/07/1997 | 30 | 2 | 27 | ||
Reconhecido fase judicial | Data Inicial | Data Final | Multiplicador | Anos | Meses | Dias |
T. Especial | 01/05/1975 | 26/09/1975 | 0,4 | 0 | 1 | 28 |
T. Especial | 01/12/1975 | 08/03/1976 | 0,4 | 0 | 1 | 9 |
T. Especial | 29/04/1995 | 22/07/1997 | 0,4 | 0 | 10 | 22 |
Subtotal | 1 | 1 | 29 | |||
Somatório adm + judicial | Modalidade: | Coeficiente: | Anos | Meses | Dias | |
Contagem até a DER: | 22/07/1997 | Proporcional | - | 31 | 4 | 26 |
Assim, assegura-se à parte autora o direito à revisão da aposentadoria por tempo de contribuição atualmente percebida, devendo ser implantada, se for o caso, a renda mensal inicial - RMI mais favorável, de acordo com o que for apurado oportunamente em liquidação de sentença, esclarecendo-se que não se trata de decisão condicional, visto que o comando é único, qual seja, determinar que o INSS conceda o benefício ao segurado com o cálculo que lhe for mais vantajoso, de acordo com os critérios que estão claramente definidos e efetue o pagamento das parcelas vencidas desde a data do requerimento administrativo, respeitada a prescrição quinquenal.
Consectários. Juros moratórios e correção monetária.
A partir do julgamento definitivo do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE (Tema 810), pelo Supremo Tribunal Federal, em 20/9/2017, restou superada a controvérsia acerca dos índices de juros moratórios e correção monetária a serem adotados no cálculo das parcelas previdenciárias pretéritas devidas pela Autarquia Previdenciária.
Em síntese, decidiu a Corte Suprema que nas demandas previdenciárias (relações jurídicas de natureza não-tributária) o índice de correção monetária para atualização das condenações impostas à Fazenda Pública deve ser o Índice de Preços ao Consumidor Amplo - Especial (IPCA-E), considerado mais adequado para capturar a variação de preços da economia e recompor o valor do débito desde a data fixada na sentença até o efetivo pagamento final, inclusive para os precatórios. Decidiu ainda, quanto aos juros de mora, que se deve utilizar o índice de remuneração da caderneta de poupança, na forma do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009.
Ainda que não haja acórdão publicado do referido julgamento, conforme entendimento do próprio Supremo Tribunal Federal, a existência de precedente firmado pelo Tribunal Pleno desta Corte autoriza o julgamento imediato de causas que versem sobre a mesma matéria, independentemente da publicação ou do trânsito em julgado do paradigma (RE 993.773 AgR-ED/RS, Relator Ministro Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe 29/8/2017).
Portanto, o cálculo das parcelas devidas deve ser definitivamente alinhado aos critérios de juros e correção monetária determinados pelo STF.
Honorários advocatícios e custas processuais
Modificada a solução da lide deverá o INSS ser condenado ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios.
Os honorários advocatícios seguem a sistemática prevista no artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015. Considerando a impossibilidade de se estabelecer o valor mensal do benefício aqui deferido, resta prejudicada a estimativa do valor da condenação.
Assim, fixo os honorários advocatícios em 10% sobre as parcelas vencidas até a data deste julgado (Súmulas nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e nº 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC/2015.
Caso o valor da condenação a ser apurada em liquidação do julgado venha a superar o valor de 200 salários mínimos previsto no § 3º, inciso I, do artigo 85 do CPC/2015, o excedente deverá observar o percentual mínimo da faixa subsequente, e assim sucessivamente, na forma do §§ 4º, inciso III, e 5º do referido dispositivo legal.
Saliento que a autarquia previdenciária é isenta do pagamento das custas no Foro Federal (artigo 4, inciso I, da Lei 9.289/1996)
Honorários periciais
Deve o INSS suportar o pagamento dos valores fixados a título de honorários periciais. Caso tal despesa processual tenha sido antecipada pela administração da Justiça Federal, o pagamento dos honorários periciais será realizado mediante reembolso, de acordo com o artigo 32 da Resolução 305/2014, do Conselho da Justiça Federal.
Revisão imediata do benefício
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no artigo 497, caput, do Código de Processo Civil, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 9/8/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à revisão do benefício da parte autora (CPF 260.102.160-87), a contar da competência da publicação do acórdão, a ser efetivada em quarenta e cinco dias.
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973, e 37 da CF/1988, impende esclarecer que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
Conclusão
Dar parcial provimento ao apelo da parte autora para reconhecer a especialidade das atividades exercidas nos interregnos de 1/5/1975 a 26/9/1975, 1/12/1975 a 8/3/1976 e de 29/4/1995 a 22/7/1997; para determinar a revisão do benefício atualmente percebido; bem como o pagamento das parcelas vencidas, desde a data do requerimento administrativo, respeitada a prescrição quinquenal.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo e determinar o cumprimento imediato do acórdão.
ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 10/10/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000721-08.2012.4.04.7109/RS
ORIGEM: RS 50007210820124047109
RELATOR | : | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
PRESIDENTE | : | Altair Antonio Gregorio |
PROCURADOR | : | Dr. Eduardo Kurtz Lorenzoni |
APELANTE | : | MANOEL MOZART BITTENCOURT DE SOUZA |
ADVOGADO | : | JULIANO BOSSONI |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 10/10/2017, na seqüência 429, disponibilizada no DE de 25/09/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
: | Juíza Federal GISELE LEMKE | |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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