| D.E. Publicado em 18/04/2018 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000669-21.2016.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ARMANDO RAMÉ |
ADVOGADO | : | Maria Clara Moreira Reichel |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. COMBUSTÍVEIS. PERICULOSIDADE. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. APOSENTADORIA ESPECIAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. CUSTAS PROCESSUAIS.
1. A atividade desenvolvida em local onde há o armazenamento de combustíveis deve ser considerada especial em razão da periculosidade inerente à exposição a substâncias inflamáveis, situação em que há risco potencial de explosão e incêndio.
2. A Lei de Benefícios da Previdência Social, ao instituir, nos artigos 57 e 58, a aposentadoria especial e a conversão de tempo especial em comum, não excepcionou o contribuinte individual, apenas exigiu que o segurado, sem qualquer limitação quanto à sua categoria (empregado, trabalhador avulso ou contribuinte individual), trabalhasse sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.
3. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à concessão da aposentadoria especial, sem a incidência do fator previdenciário, a contar da data do requerimento administrativo.
4. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, determinando a adoção do IPCA-E para o cálculo da correção monetária nas dívidas não-tributárias da Fazenda Pública.
5. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança.
6. Precedente do Supremo Tribunal Federal com efeito vinculante, que deve ser observado, inclusive, pelos órgãos do Poder Judiciário.
7. O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial tida por interposta, mantida a antecipação de tutela, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 09 de abril de 2018.
Juiz Federal Artur César de Souza
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Artur César de Souza, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9348513v6 e, se solicitado, do código CRC 13D37DC7. | |
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| Signatário (a): | Artur César de Souza |
| Data e Hora: | 12/04/2018 11:09 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000669-21.2016.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ARMANDO RAMÉ |
ADVOGADO | : | Maria Clara Moreira Reichel |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença (publicada antes da vigência do CPC/2015) cujo dispositivo tem o seguinte teor:
Ante o exposto, extingo o processo com julgamento de mérito (art. 269, I, do CPC) e JULGO PROCEDENTE o pedido deduzido por ARMANDO RAMÉ contra o INSS - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, para, conceder os efeitos da antecipação da tutela, determinando o imediato pagamento do benefício de aposentadoria especial, determinando à autarquia o pagamento do benefício ao autor, no prazo de 05 dias, sob pena de multa no valor de R$100,00 por dia de descumprimento1, a contar da intimação desta decisão, limitada a R$10.000,00.
Intime-se, por meio de carga dos autos à Procuradoria Seccional Federal, a autarquia.
Outrossim, as parcelas serão devidas desde a data do requerimento na via administrativa, até a efetiva implantação do benefício.
Os valores em atraso deverão ser corrigidos monetariamente pelo INPC, nos termos do art. 41-A, da Lei 8.213/1991, desde quando deveriam ter sido pagas, e acrescidas de juros de mora de 1% ao mês, desde a citação3.
Custas pelo INSS, por metade (Súmula n° 2 do extinto TARS).
O réu pagará os honorários periciais e os advocatícios à procuradora do autor que são arbitrados em 10% sobre o valor da condenação, nela compreendidas as parcelas vencidas até a data da sentença (Súmula 111, do STJ).
Sentença não-sujeita a reexame necessário.
Publique-se, registre-se e intimem-se.
Em suas razões de apelo, a autarquia previdenciária argumenta: ser indevido, após 28/04/1995, o reconhecimento de tempo especial para contribuintes individuais; impossibilidade de enquadramento por periculosidade após a Lei 9.032/95. Sucessivamente, pede juros moratórios e correção monetária nos termos do art. 1º-F da Lei 9.494/97 com redação pela Lei 11.960/2009, bem como seja respeitada a isenção de custas a que tem direito.
Com contrarrazões, e devidamente processados, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão-somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Remessa Oficial
Em relação à remessa oficial, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934642/PR, Rel. Min. Ari Pargendler, julgado em 30-06-2009), prestigiou a corrente jurisprudencial que sustenta ser inaplicável a exceção contida no § 2.º, primeira parte, do art. 475 do CPC aos recursos dirigidos contra sentenças (a) ilíquidas, (b) relativas a relações litigiosas sem natureza econômica, (c) declaratórias e (d) constitutivas/desconstitutivas insuscetíveis de produzir condenação certa ou de definir objeto litigioso de valor certo (v.g., REsp. 651.929/RS).
Assim, em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, dou por interposta a remessa oficial.
Tempo Especial
Por estar em consonância com o entendimento desta Relatoria quanto às questões deduzidas, a sentença recorrida merece ser mantida pelos seus próprios fundamentos, os quais transcrevo, adotando como razões de decidir, in verbis:
Dito isso, no caso concreto, é forçoso reconhecer o autor preenche os requisitos necessários à aposentadoria especial.
A propósito das funções exercidas pelo autor tem-se que esse laborou junto ao posto de combustíveis de sua propriedade, inclusive abastecendo veículos, além de todo trabalho administrativo ser realizado no posto, próximo as bombas de gasolina, submetido a contato com material inflamável, o que qualifica a atividade periculosa, conforme conclui o laudo técnico das condições ambientais do trabalho, às fls. 34/35.
Embora o laudo perfil profissiográfico previdenciário - PPP, de fls. 29-32 tenha sido emitido pelo próprio autor, o período restou reconhecido pela própria autarquia à fl. 44, concluindo apenas que o autor não laborava exposto a agentes nocivos a sua saúde, em que pese o trabalho em postos de combustíveis serem reconhecidos como atividade perigosa por ser inerente o contato com material inflamável, de modo permanente. Nesse sentido a jurisprudência do e. TRF da 4ª Região:
"PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. FRENTISTA. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. VIÁVEL ATÉ 28-04-1995. CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM. INVIÁVEL APÓS 28-05-1998. LEI N.º 9.711/98. FATOR DE CONVERSÃO. REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. MAJORAÇÃO DA RMI DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. EFEITOS FINANCEIROS.
"1. Uma vez exercida atividade enquadrável como especial, sob a égide da legislação que a ampara, o segurado adquire o direito ao reconhecimento como tal e ao acréscimo decorrente da sua conversão em comum.
"2. Os fatores de conversão são proporcionalmente fixados conforme o tempo de serviço exigido para a aposentadoria, tanto especial como comum, não sendo possível a utilização de um multiplicador que se refere à aposentadoria comum aos trinta anos, qual seja, 1,2, para fins de concessão de aposentadoria comum aos trinta e cinco anos, para a qual deve ser aplicado o conversor 1,4.
"3. Trabalho de serviço em posto de abastecimento de combustíveis é de se computar como especial, seja como Frentista , seja como Lavador de Carros; precedentes da 6ª Turma, em face da sujeição aos riscos naturais da estocagem de combustível no local, como de trabalho especial, insalubre e/ou periculoso, com direito à conversão do tempo de atividade especial em tempo de atividade comum para fins de aposentadoria.
"(...)
(APELREEX n.º 2008.71.14.001086-8, 6ª Turma do TRF da 4ª Região, Rel. Des. João Batista Pinto Silveira, D.E. 04/03/2010) - grifei.
Da mesma forma o relato das testemunhas que foram unânimes em ratificar as atividades desempenhadas pelo requerente, trabalhando junto às bombas de combustível e no escritório, que fica nas dependências do posto, próximo as bombas. Inclusive as testemunhas Ramiro e Pedro Flores informaram que o autor também fazia troca de óleo (fl. 165).
A perícia técnica realizada às fls. 136/142, conclui que "no período de 09/8/82 a DER, o autor laborou na área de risco acentuado por inflamáveis com perigo a sua integridade física, em exposição habitual e permanente, previsto na NR 16 anexo 2 da Portaria nº3214/78".
Nesse quadro, demonstrado que a parte autora exerceu atividade especial pelo período de 09/08/1982 a 15/05/2013, mister que se reconheça o direito à percepção de benefício de aposentadoria especial. (grifos nossos)
Acerca do reconhecimento da especialidade da atividade exercida por contribuinte individual, a fim de evitar tautologia, transcreve-se trecho do voto do Des. Federal Celso Kipper, no processo de nº 0001774-09.2011.404.9999/RS:
Acerca do reconhecimento da especialidade da atividade exercida por contribuinte individual, a fim de evitar tautologia, transcreve-se trecho do voto do Des. Federal Celso Kipper, no processo de nº 0001774-09.2011.404.9999/RS:
"Alega o INSS que o tempo de serviço laborado na condição de contribuinte individual não pode ser reconhecido como especial, tendo em vista que este não contribui para o financiamento do benefício de aposentadoria especial.
Em primeiro lugar, a Lei de Benefícios da Previdência Social, ao instituir, nos artigos 57 e 58, a aposentadoria especial e a conversão de tempo especial em comum, não excepcionou o contribuinte individual, apenas exigiu que o segurado, sem qualquer limitação quanto à sua categoria (empregado, trabalhador avulso ou contribuinte individual), trabalhasse sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.
Veja-se, a propósito, a redação do caput e §§ 3º e 4º do referido artigo:
Art. 57 - A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhando sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15, 20 ou 25 anos, conforme dispuser a lei.
(...)
§ 3º - A concessão de aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado.
§ 4º - O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão de qualquer benefício.
(...)
Por outro lado, o art. 64 do Decreto n. 3.048/99, com a redação dada pelo Decreto 4.729, de 09-06-2003, assim estabelece:
Art. 64 - A aposentadoria especial, uma vez cumprida a carência exigida, será devida ao segurado empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual, este somente quando cooperado filiado a cooperativa de trabalho ou de produção, que tenha trabalhado durante quinze, vinte ou vinte e cinco anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.
O Regulamento da Previdência Social, entretanto, ao não possibilitar o reconhecimento, como especial, do tempo de serviço prestado pelo segurado contribuinte individual que não seja cooperado, filiado a cooperativa de trabalho ou de produção, estabeleceu diferença não consignada em lei para o exercício de direito de segurados que se encontram em situações idênticas, razão pela qual extrapola os limites da lei e deve ser considerado nulo nesse tocante. A respeito da nulidade das disposições do decreto regulamentador que extrapolarem os limites da lei a que se referem, vejam-se os seguintes precedentes do e. Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. IPVA. ISENÇÃO. ATIGO 1º, DO DECRETO ESTADUAL 9.918/2000. RESTRIÇÃO AOS VEÍCULOS ADQUIRIDOS DE REVENDEDORES LOCALIZADOS NO MATO GROSSO DO SUL. EXORBITÂNCIA DOS LIMITES IMPOSTOS PELA LEI ESTADUAL 1.810/97. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA LEGALIDADE ESTRITA. INOBSERVÂNCIA. AFASTAMENTO DE ATO NORMATIVO SECUNDÁRIO POR ÓRGÃO FRACIONÁRIO DO TRIBUNAL. POSSIBILIDADE. SÚMULA VINCULANTE 10/STF. OBSERVÂNCIA.
1. A isenção do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), concedida pelo Decreto Estadual 9.918/2000, revela-se ilegal i inconstitucional, porquanto introduzida, no ordenamento jurídico, por ato normativo secundário, que extrapolou os limites do texto legal regulamentado (qual seja, a Lei Estadual 1.810/97), bem como ante a inobservância do princípio constitucional da legalidade estrita, encartado no artigo 150, § 6º, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
(...)
4. Como de sabença, a validade dos atos normativos secundários (entre os quais figura o decreto regulamentador) pressupõe a estrita observância dos limites impostos pelos atos normativos primários a que se subordinam (leis, tratados, convenções internacionais, etc.), sendo certo que, se vierem a positivar em seu texto uma exegese que possa irromper a hierarquia normativa subjacente, viciar-se-ão de ilegalidade e não de inconstitucionalidade (precedentes do Supremo tribunal Federal: ADI 531 AgR, Rel. Ministro Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgado em 11.12.1991, DJ 03.04.1992; e ADI 365 AgR, Rel. Ministro Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgado em 07.11.1990, DJ 15.03.1991).
(...)
(RO em MS n. 21.942, Primeira Turma, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 15-02-2011) Grifei
TRIBUTÁRIO. AITP. LEI 8.630/93 E DECRETO 1.035/93. SUJEITO PASSIVO DA OBRIGAÇÃO. NULIDADE DO ACÓRDÃO. PRELIMINAR REJEITADA. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA. PRECEDENTES.
- Preliminar de nulidade rejeitada, por não caracterizada violação ao art. 535 do CPC.
- O decreto regulamentar não pode ir além do disposto na lei a que se refere.
(...)
(REsp n. 433.829, Segunda Turma, Rel. Ministro Francisco Peçanha Martins, julgado em 20-09-2005) Grifei
FINANCEIRO. MUTUÁRIOS DO S.F.H. CONVERSÃO DO DÉBITO, EM FACE DA IMPLANTAÇÃO DO PLANO CRUZADO. DECRETO-LEI Nº 2.284/86 (ARTIGO 10 - ANEXO III). ALTERAÇÃO DE CRITÉRIO (DECRETO Nº 92.591/86). ILEGITIMIDADE. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
I - O regulamento não pode extrapolar das disposições contidas na lei, sob pena de resultar eivado de nulidade.
(...)
(REsp n. 14.741-0, Primeira Turma, Rel. Ministro Demócrito Reinaldo, julgado em 02-06-1993) Grifei
De outra banda, é verdade que, a teor do art. 195, § 5º, da Constituição Federal, nenhum benefício da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.
No entanto, para a concessão de aposentadoria especial ou conversão de tempo exercido sob condições especiais em tempo de trabalho comum, previstas nos artigos 57 e 58 da Lei de benefícios, existe específica indicação legislativa de fonte de custeio: o parágrafo 6º do mesmo art. 57 supracitado, combinado com o art. 22, inc. II, da Lei n. 8.212/91, os quais possuem o seguinte teor:
Art. 57 - (...)
§ 6º - O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inc. II do art. 22 da Lei 8.212, de 24/07/91, cujas alíquotas serão acrescidas de 12, 9 ou 6 pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após 15, 20 ou 25 anos de contribuição, respectivamente.
Art. 22 - (...)
II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei 8.213/91, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos:
a) 1% para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;
b) 2% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;
c) 3% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave.
Ademais, não vejo óbice ao fato de a lei indicar como fonte do financiamento da aposentadoria especial e da conversão de tempo especial em comum as contribuições a cargo da empresa, pois o art. 195, caput e incisos, da Constituição Federal, dispõem que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e, dentre outras ali elencadas, das contribuições sociais do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei.
Por fim, ressalto que, a rigor, sequer haveria, no caso, necessidade de específica indicação legislativa da fonte de custeio, uma vez que se trata de benefício previdenciário previsto pela própria Constituição Federal (art. 201, § 1º c/c art. 15 da EC n. 20/98), hipótese em que sua concessão independe de identificação da fonte de custeio (STF, RE n. 220.742-6, Segunda Turma, Rel. Ministro Néri da Silveira, julgado em 03-03-1998; RE n. 170.574, Primeira Turma, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgado em 31-05-1994; AI n. 614.268 AgR, Primeira Turma, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 20-11-2007; ADI n. 352-6, Plenário, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgada em 30-10-1997; RE n. 215.401-6, Segunda Turma, Rel. Ministro Néri da Silveira, julgado em 26-08-1997; AI n. 553.993, Rel. Ministro Joaquim Barbosa, decisão monocrática, DJ de 28-09-2005), regra esta dirigida à legislação ordinária posterior que venha a criar novo benefício ou a majorar e estender benefício já existente.
Diante dessas considerações, o tempo de serviço sujeito a condições nocivas à saúde, prestado pela parte autora na condição de contribuinte individual, deve ser reconhecido como especial."
No que tange ao enquadramento da atividade como especial em razão da periculosidade decorrente da exposição a substâncias inflamáveis, há que ser levada em conta a sujeição do segurado à ocorrência de acidentes passíveis de causar danos à saúde ou à integridade física. Em se tratando de locais onde há armazenamento de inflamáveis e presença de bomba abastecedora, é considerável o risco de explosão e incêndio, o que evidencia a periculosidade da atividade laboral. Assim julga esta Turma:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO/SERVIÇO. REQUISITOS. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS E LÍQUIDOS INFLAMÁVEIS. FRENTISTA. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. 1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 2. Considerando que o § 5.º do art. 57 da Lei n. 8.213/91 não foi revogado pela Lei n. 9.711/98, e que, por disposição constitucional (art. 15 da Emenda Constitucional n. 20, de 15-12-1998), permanecem em vigor os arts. 57 e 58 da Lei de Benefícios até que a lei complementar a que se refere o art. 201, § 1.º, da Constituição Federal, seja publicada, é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28-05-1998. Precedentes do STJ. 3. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, aceitando-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, devendo existir comprovação da sujeição a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 4. a exposição a hidrocarbonetos aromáticos enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial. 5. A atividade de frentista em posto de combustíveis deve ser considerada especial devido à periculosidade decorrente da exposição a substâncias inflamáveis, hipótese em que é ínsito o risco potencial de acidente. 6. Para a caracterização da especialidade, não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada, salvo exceções (periculosidade, por exemplo). 7. A habitualidade e permanência hábeis aos fins visados pela norma - que é protetiva - devem ser analisadas à luz do serviço cometido ao trabalhador, cujo desempenho, não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas, químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho. 8. Não comprovado o tempo de serviço/contribuição suficiente até a Emenda Constitucional n. 20, de 1998, bem como até 1999, ausente o requisito etário na data do requerimento administrativo e no ajuizamento da ação, é indevida a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, subsistindo, todavia, o direito à averbação da especialidade das atividades prestadas de 13-04-2006 a 21-11-2007, 13-04-2006 a 21-11-2007, 02-05-2008 a 27-10-2009 e de 28-10-2009 a 29-12-2011. (TRF4, Apelação/Reexame Necessário Nº 5000804-28.2010.404.7001, 6ª TURMA, Des. Federal CELSO KIPPER, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 26/06/2014)
Aposentadoria Especial
A aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, é devida ao segurado que, além da carência, tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física durante 15, 20 ou 25 anos.
Em se tratando de aposentadoria especial, portanto, não há conversão de tempo de serviço especial em comum, visto que o que enseja a outorga do benefício é o labor, durante todo o período mínimo exigido na norma em comento (15, 20, ou 25 anos), sob condições nocivas.
No caso, somando-se os períodos reconhecidos na presente decisão, perfaz a parte autora:
RECONHECIDO NA FASE JUDICIAL | ||||||
Obs. | Data Inicial | Data Final | Mult. | Anos | Meses | Dias |
Especial | 09/08/1982 | 15/05/2013 | 1,0 | 0 | 369 | 7 |
Subtotal | 30 | 9 | 7 | |||
SOMATÓRIO (FASE ADM. + FASE JUDICIAL) | Anos | Meses | Dias | |||
Contagem até a Data de Entrada do Requerimento: | 15/05/2013 | 30 | 9 | 7 |
Assim, preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à concessão da aposentadoria especial, sem a incidência do fator previdenciário, a contar da data do requerimento administrativo.
No tocante à necessidade de afastamento do segurado, após a concessão do benefício, de qualquer atividade sujeita a contagem especial, cabe mencionar que a Corte Especial deste Tribunal, em julgamento realizado em 24/05/2012, afirmou a inconstitucionalidade do § 8º do artigo 57 da Lei 8.213/91, nos autos da Arguição De Inconstitucionalidade 5001401-77.2012.404.0000, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira Do Valle Pereira.
Cumpre referir que não se desconhece que a questão acerca da possibilidade de percepção do benefício da aposentadoria especial na hipótese em que o segurado permanece no exercício de atividades laborais nocivas à saúde teve a repercussão geral reconhecida pelo STF no julgamento do RE 788092 (Tema 709). Não se desconhece, também, das razões invocados pelo Relator, Ministro Dias Toffoli, no sentido da constitucionalidade da referida regra, insculpida no § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991.
Entretanto, pelos fundamentos acima declinados, mantenho a decisão da Corte Especial deste Tribunal até que haja o pronunciamento definitivo pela Suprema Corte. Dessa forma, verificado que restam cumpridas as exigências do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, deve o INSS conceder o benefício ora pretendido à parte autora, independente do afastamento do trabalho.
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado da 3ª Seção deste Tribunal, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, de acordo com o art. 10 da Lei n. 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n. 8.880/94;
- INPC de 04/2006 a 29/06/2009, conformeo art. 31 da Lei n. 10.741/03, combinado com a Lei n. 11.430/06, precedida da MP n. 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n. 8.213/91;
- IPCA-E a partir de 30/06/2009.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo STF, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Assim, explicito que a correção monetária deverá observar os critérios acima estabelecidos.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgnoAgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Assim, deve ser dado provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial quanto ao tópico.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios, em 10% sobre as parcelas vencidas até a data da sentença, foram fixados de acordo com o entendimento desta Corte.
Custas e despesas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS). Assim, deve ser dado provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial quanto ao ponto.
Antecipação de tutela
Confirmado o direito ao benefício de aposentadoria, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela, concedida pelo juízo de origem.
Prequestionamento
Para fins de possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores dou por prequestionadas as matérias constitucionais e legais alegadas em recurso pela(s) parte(s), nos termos das razões de decidir já externadas no voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou tidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do declinado.
Conclusão
Apelo do INSS e remessa oficial parcialmente providos - quanto ao juros moratórios e custas processuais.
Adequada a decisão quanto aos consectários legais.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial tida por interposta, mantida a antecipação de tutela.
Juiz Federal Artur César de Souza
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 09/04/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000669-21.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00003425820148210099
RELATOR | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Maurício Pessutto |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ARMANDO RAMÉ |
ADVOGADO | : | Maria Clara Moreira Reichel |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 09/04/2018, na seqüência 9, disponibilizada no DE de 22/03/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO INSS E À REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA, MANTIDA A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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