Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. PORTUÁRIO. RUÍDO. TRF4. 5003820-63.2019.4.04.7101...

Data da publicação: 06/07/2024, 07:01:18

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. PORTUÁRIO. RUÍDO. 1. No tocante à realização de perícia em empresas ativas, em razão da discordância do segurado quanto ao conteúdo do PPP, torna-se necessária a demonstração da falta de correspondência entre as informações contidas no formulário e a realidade do trabalho prestado, não bastando a mera discordância genérica quanto aos dados fornecidos pelo empregador. 2. A admissão de provas em substituição ao PPP passa, necessariamente, pela demonstração, ainda que de forma indiciária, da existência de omissão na análise da exposição a algum agente agressivo ou, ainda, divergência a respeito da quantificação de agente informado no laudo. 3. Hipótese em que a parte apresentou sete diferentes laudos que referem ruído superior àquele registrado no PPP, sendo prova bastante a infirmar os dados dele constantes, pois os laudos examinaram mesmo local e atividades. (TRF4, AC 5003820-63.2019.4.04.7101, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relatora ELIANA PAGGIARIN MARINHO, juntado aos autos em 28/06/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003820-63.2019.4.04.7101/RS

RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

APELANTE: GILSON TAYLOR DA ROSA GARCIA (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta em face de sentença que julgou procedente em parte o pedido, nos seguintes termos (evento 28, SENT1):

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido, com fulcro no artigo 487, I e III, "a", do Código de Processo Civil para:

a) reconhecer o caráter especial do período de 01/12/1990 a 20/08/1991 (Arrumador - Sindicato dos Arrumadores Trabalhadores Portuários Avulsos em Capatazia do Rio Grande e São José do Norte), determinar a sua averbação pelo INSS após a conversão em tempo comum pelo fator 1.4; e rejeitar o pedido quanto aos interregnos de 01/01/1998 a 31/05/1999 (Arrumador - OGMO); 01/07/1999 a 31/01/2000 (Arrumador - OGMO); 01/02/2000 a 01/12/2003 (Operador de Transporte - TECON), bem como de 01/02/2006 a 28/02/2019 (Arrumador - OGMO);

b) rejeitar o pedido de aposentadoria especial ou por tempo de serviço, na modalidade integral, com DIB em 07/12/2018.

Tendo em vista sucumbência recíproca, porém mínima do INSS, arbitro os honorários em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, a ser pago pelo autor ao INSS. Fica suspensa a exigibilidade da condenação do autor, por ser ele beneficiário da assistência judiciária gratuita.

As partes são isentas de custas, na forma do artigo 4º, incisos I e II, da Lei nº 9.289/1996.

A parte autora recorre buscando a reforma da sentença quanto aos períodos de tempo especial de 01/01/1998 a 31/05/1999, 01/02/2000 a 01/12/2003 e de 01/02/2006 a 28/02/2019 (evento 32, APELAÇÃO1).

Oportunizada a apresentação de contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de Admissibilidade

O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.

Tempo de Serviço Especial

O reconhecimento da especialidade da atividade é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.

Dito isso, tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.

Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:

a) no período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei 3.807/1960 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei 8.213/1991, em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto quanto à exposição a ruído e calor, além do frio, em que necessária a mensuração de seus níveis, por meio de parecer técnico trazido aos autos ou simplesmente referido no formulário padrão emitido pela empresa;

b) a partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção daquelas a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14/10/1996, que revogou expressamente a Lei em questão - de modo que, no interregno compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei 9.032/1995 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva da exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído, calor e frio, em relação aos quais é imprescindível a perícia técnica, conforme visto acima;

c) após 06/03/1997, quando vigente o Decreto 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei 9.528/1997, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

d) a partir de 01/01/2004, passou a ser necessária a apresentação do Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, que substituiu os formulários SB-40, DSS 8030 e DIRBEN 8030, sendo este suficiente para a comprovação do tempo especial desde que devidamente preenchido com base em laudo técnico e contendo a indicação dos responsáveis técnicos legalmente habilitados, por período, pelos registros ambientais e resultados de monitoração biológica, eximindo a parte da apresentação do laudo técnico em juízo. Nesse sentido, cumpre destacar que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que, em regra, trazido aos autos o PPP, dispensável a juntada do respectivo laudo técnico ambiental, inclusive em se tratando de ruído, na medida em que o documento já é elaborado com base nos dados existentes no LTCAT. Ressalva-se, todavia, a necessidade da apresentação desse laudo quando idoneamente impugnado o conteúdo do PPP (STJ, Petição 10.262/RS, Primeira Seção, Relator Ministro Sérgio Kukina, DJe de 16/02/2017).

Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/1973 (Quadro II do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo II) até 28/04/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/1973 (Quadro I do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo I) até 05/03/1997, e, a partir de 06/03/1997, os Decretos 2.172/1997 (Anexo IV) e 3.048/1999, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4.882/2003. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível, também, a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP n. 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/06/2003).

Ainda, o STJ firmou a seguinte tese no Tema 534: As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991).

Acerca da conversão do tempo especial em comum, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial Repetitivo 1.151.363, do qual foi Relator o Ministro Jorge Mussi, pacificou o entendimento de que é possível a conversão mesmo após 28/05/1998.

Assim, considerando que o § 5.º do art. 57 da Lei 8.213/1991 não foi revogado nem expressa, nem tacitamente pela Lei 9.711/1998 e que, por disposição constitucional (art. 15 da Emenda Constitucional 20, de 15/12/1998), permanecem em vigor os artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios até que a lei complementar a que se refere o art. 201, § 1º, da Constituição Federal, seja publicada, é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28/05/1998.

Agente Nocivo Ruído

Em se tratando de agente nocivo ruído, indispensável a existência de laudo técnico pericial para comprovar a exposição permanente e habitual ao agente agressivo, acima do limite permitido, a fim de caracterizar a atividade como especial.

O código 1.1.6 do Decreto 53.831/1964 previa que a especialidade deveria ser considerada para exposição a níveis de ruído superiores a 80 dB(A). Com a edição do Decreto 2.172, de 06 de março de 1997, esse índice foi alterado para 90 dB(A) - código 2.0.1. Ainda, após 18/11/2003, o limite foi fixado em 85 dB(A), conforme dispõe o Decreto 4.882/2003.

De outro lado, ainda que a partir da Lei 9.732/1998 seja obrigatória a informação pelo empregador acerca da utilização de tecnologia de proteção individual ou coletiva para diminuição/eliminação dos agentes nocivos presentes no ambiente de trabalho, com base em laudo técnico (art. 58, §2º, da LBPS), quanto ao agente agressivo ruído o uso de EPI, ainda que elimine a insalubridade, não descaracteriza o tempo de serviço especial.

Registro que o Supremo Tribunal Federal, em decisão proferida nos autos do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 664.335, em que foi relator o Min. Luiz Fux, cuja ata de julgamento foi publicada no DJE de 17/12/2014, definiu que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial.

O Tribunal assentou, ainda, a tese de que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.

Com relação à variação do nível de ruído a que foi submetido o segurado, houve julgamento do acórdão paradigma do Tema 1.083 do STJ em 18/11/2021, com publicação em 25/11/2021, em que restou fixada a seguinte tese:

O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço.

Portanto, não é mais aplicável a média ponderada ou aritmética. Necessária apresentação de laudo técnico com indicação do nível equivalente de ruído e, em caso de ausência, há possibilidade de utilização do pico.

Quanto ao método de aferição do agente nocivo ruído, esta Corte Regional tem posicionamento segundo o qual a utilização de metodologia diversa da prevista na NHO-01 da FUNDACENTRO não inviabiliza o reconhecimento da especialidade, bastando que a exposição esteja embasada em estudo técnico realizado por profissional habilitado para tanto (AC 5015224-47.2015.4.04.7200, Turma Regional Suplementar de SC, Relator Paulo Afonso Brum Vaz, em 19/09/2019; AC 5001695-25.2019.4.04.7101, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, em 06/08/2020; AC 5003527-77.2017.4.04.7129, Quinta Turma, Relatora Gisele Lemke, em 08/07/2020).

Do Caso Concreto

Os pontos controvertidos nos presentes autos dizem respeito ao reconhecimento da especialidade nos intervalos de 01/01/1998 a 31/05/1999 (Arrumador - OGMO), 01/07/1999 a 31/01/2000 (Arrumador - OGMO); 01/02/2000 a 01/12/2003 (Operador de Transporte - TECON) e de 01/02/2006 a 28/02/2019 (Arrumador - OGMO), os quais assim foram examinados pela sentença:

No que tange aos períodos de 01/01/1998 a 31/05/1999; 01/07/1999 a 31/01/2000, bem como de 01/02/2006 a 28/02/2019 (Arrumador - OGMO), cumpre salientar que apesar de o autor ter juntado PPP emtido pelo Sindicato dos Arrumadores e Trabalhadores Portuários Avulsos em Capatazia do Rio Grande e São José do Norte, há PPP emitido pelo próprio OGMO dos trabalhadores do Porto de Rio Grande com base em Laudos Técnicos diversos e informações conflitantes com as do Laudo realizado pelo Sindicato.

Ora, se o intermediador de mão-de-obra foi o OGMO e não o Sindicato, impõe-se a consideração do PPP por ele emitido, sendo ineficaz o do Sindicato.

Destarte, o PPP emitido pelo OGMO (evento 10 - RESPOSTA1 - p. 36 e ss.) traz exposição a ruído dentro dos limites de tolerância (entre 80,50 e 83,36 decibéis), sendo que de 19/11/2003 em diante o nível de tolerância ao ruído era de 85 decibéis e de 05/03/1997 a 18/11/2003 era de 90 decibéis.

Quanto à poeiras mencionadas nos documentos, como descritas, não se constituem agentes nocivos hábeis a ensejar a pretendida conversão. Veja-se que da descrição da atividade a exposição a poeiras minerais é sequer habitual, e após o advento da Lei 9.032/95 é necessária a comprovação da permanência, além da habitualidade da exposição.

Em relação ao período de 01/02/2000 a 01/12/2003 (Operador de Transporte - TECON Rio Grande S/A) consta do PPP correspondente (Evento 10 - RESPOSTA1 - p. 70/71) que no exercício das suas atribuições o postulante encontrava-se exposto a ruído da ordem 80,19 decibéis, portanto dentro do limite de tolerância, repise-se.

No apelo os argumentos trazidos para a reforma da sentença são:

a) o formulário PPP emitido pelo Sindicato dos Arrumadores é omisso, não mencionando nenhum fator de risco e o PPP do OGMO somente analisou o ruído e menciona poeira, deixando de analisar os outros agentes nocivos presentes na atividade do trabalhador portuário;

b) para mesmo período e cargo o Sindicato dos Arrumadores emitiu PPP no qual consta exposição a ruído de 87,66 a 89,92 dB, bem como a poeira mineral (processo 50003598320194047101);

c) o Sindicato limitou o período informado no PPP a 12/1999, de modo que o postulante teve que buscar o formulário PPP para os períodos restantes junto ao OGMO;

d) tendo em vista que laudos técnicos constataram que a atividade do trabalhador portuário avulso arrumador é insalubre, não se mostra justo nem razoável considerar as informações do PPP do Sindicato e do OGMO como corretas;

e) laudos técnicos apresentados comprovam categoricamente que os trabalhadores portuários arrumadores laboram com exposição a uma série de agentes prejudiciais à saúde, tais como ruído excessivo, poeira, produtos químicos, agentes biológicos, além de ser uma atividade penosa;

f) imprescindível a realização de perícia técnica judicial para avaliação e comprovação da especialidade, pois os documentos apresentados revelam que as informações do Sindicato e do OGMO não condizem com a realidade vivenciada no desempenho da jornada laboral pelos arrumadores;

g) quanto à atividade de Operador de Transporte - TECON, o segurado logrou reconhecimento da periculosidade em reclamatória trabalhista;

h) também há outros laudos que demonstram o ruído superior àquele anotado no PPP.

Examino.

Arrumador - Porto de Rio Grande

A sentença analisou o direito do autor a partir do PPP do evento 10, RESPOSTA1, p. 44, o qual registra, para a atividade de arrumador, exposição à poeira e ruído, este superior a 80 e inferior a 85 dB(A). Tal documento está regularmente expedido, com anotação de responsabilidade técnica e abrange o lapso de 01/03/1998 a 21/11/2018 (data da expedição).

O apelante, no bojo da fundamentação, não ataca o argumento utilizado pela Juíza para eleição da prova: se o intermediador de mão-de-obra foi o OGMO e não o Sindicato, impõe-se a consideração do PPP por ele emitido, sendo ineficaz o do Sindicato. Nesse sentido, até mesmo por compartilhar do entendimento, reputo que a prova a ser aquilatada frente às demais é esta, pois apenas de modo extraordinário deve ser substituída a análise de condições ambientais emitida de forma regular pelo contratante.

Nesse ponto, o recorrente impugna a medição do ruído e a omissão de outros agentes nocivos além da poeira, tais como agentes químicos e biológicos. Dos muitos laudos apresentados pelo segurado, vê-se que, à exceção do ruído, o registro da exposição a fatores biológicos e químicos não é unânime. Pelo contrário (p.e. evento 32, LAUDO5). Tais riscos são mencionados apenas por parte dos peritos, muitas vezes de forma isolada (ora um, ora outro). Embora não se negue que os trabalhadores de porto possam estar em contato com tais agentes, é preciso reconhecer que essa exposição não é, certamente, habitual, pois as cargas a serem embarcadas e desembarcados são rotativas. Outros riscos são igualmente mencionados nos laudos: umidade (em porões), frio (em cargas restriadas), químicos (carregamento de adubos, carvão, calcário, combustível), poeira vegetal (carregamento de grãos e farelos). Não verificada, entretanto, a frequência de exposição exigida pela norma previdenciária (habitual e permanente), o enquadramento é indevido.

Em relação ao ruído, a técnica registrada no PPP é o do decibelímetro e registra 80,50 e 83,36 dB (evento 1, PPP10). A admissão de provas em substituição ao PPP passa, necessariamente, pela demonstração, ainda que de forma indiciária, da existência de omissão na análise da exposição a algum agente agressivo ou, ainda, divergência a respeito da quantificação de agente informado no laudo.

Passo a examinar os laudos relativos ao Porto de Rio Grande para trabalhador avulso, função de arrumador.

i) laudo do evento 1, LAUDO17 mede ruído apenas em comboio de vagões carregados com soja em operação de descarga, portanto não é similar;

ii) laudo do evento 1, LAUDO18 e ​evento 32, LAUDO7​ registro o ruído superior a 90 db(A);

iii) laudo do evento 14, LAUDO5 não informa setor TPA/capatazia;

iv) laudo do evento 14, LAUDO6 informa ruído de 89,4 a 93,6 dB(A) para trabalhar paradigma;

v) laudo do evento 14, LAUDO11 informa níveis de 91 dB(A), nas empilhadeiras e 93 dB(A), no trator empurrador. Refere laudo do SESI de 1996 o qual registra: 94 e 98 dBA, nos tratores empurradores; 93, 97 e 100 dBA, nos tratores portuários; 93, 94, 95, 98 e 102 dBA, nas empilhadeiras; 95 dBA, no caminhão de container; 97 dBA, no guindaste; 98 dBA, na pá carregadeira; 91 dBA, no caminhão; e de 90 dBA, no armazém da garagem, no decorrer da movimentação dos maquinários;

vi) laudo do evento 32, LAUDO2 indica ruído entre 86 e 98 dB(A);

vii) laudo do evento 32, LAUDO3 informa ruído de 90 e 92 dB(A) na operação de máquinas;

viii) laudo do evento 32, LAUDO4 mede ruído de 91,8 dB(A).

Portanto, a parte apresenta sete laudos que referem ruído superior àquele registrado no PPP, sendo prova bastante a infirmar os dados dele constantes, pois os laudos examinaram mesmo local e atividades. Não ignorando os desafios que envolvem a medição de ruído normalizado em uma atividade com tanta diversidade de atribuições, cargas e sitios, tenho que a parte desincumbiu-se do ônus probatório no caso concreto, sendo a defesa do INSS incapaz de rebater a tese arguida. Considero, assim, demonstrado ruído superior a 90 dB(A) no período de 01/01/1998 a 31/05/1999, 01/07/1999 a 31/01/2000 e de 01/02/2006 a 28/02/2019.

Operador de Transporte - TECON Rio Grande S/A

Quanto ao período de 01/02/2000 a 01/12/2003, a parte alega que a periculosidade foi reconhecida em reclamatória trabalhista. De fato, a justiça trabalhista reconheceu a periculosidade devido ao fato do perito ter mencionado que havia incidência de menos de 2% de movimentação de contêineres com carga inflamável.

Houve, por certo tempo, controvérsia sobre o reconhecimento da especialidade das atividades tidas como perigosas exercidas após 06/03/1997, data de início da vigência do Decreto 2.172/1997. No entanto, o STJ assim decidiu, no Tema 1.031 acerca da possibilidade de enquadramento da atividade de vigilante como perigosa:

5. Com o advento do Decreto 2.172/1997, a aposentadoria especial sofre nova alteração, pois o novo texto não mais enumera ocupações, passando a listar apenas os agentes considerados nocivos ao Trabalhador, e os agentes assim considerados seriam, tão-somente, aqueles classificados como químicos, físicos ou biológicos. Não traz o texto qualquer referência a atividades perigosas, o que à primeira vista, poderia ao entendimento de que está excluída da legislação a aposentadoria especial pela via da periculosidade. Essa conclusão, porém, seria a negação da realidade e dos perigos da vida, por se fundar na crença – nunca confirmada – de que as regras escritas podem mudar o mundo e as vicissitudes do trabalho, os infortúnios e os acidentes, podem ser controlados pelos enunciados normativos.

6. Contudo, o art. 57 da Lei 8.213/1991 assegura, de modo expresso, o direito à aposentadoria especial ao Segurado que exerça sua atividade em condições que coloquem em risco a sua saúde ou a sua integridade física, dando impulso aos termos dos arts. 201, § 1o. e 202, II da Constituição Federal. A interpretação da Lei Previdenciária não pode fugir dessas diretrizes constitucionais, sob pena de eliminar do Direito Previdenciário o que ele tem de específico, próprio e típico, que é a primazia dos Direitos Humanos e a garantia jurídica dos bens da vida digna, como inalienáveis Direitos Fundamentais.

7. Assim, o fato de os decretos não mais contemplarem os agentes perigosos não significa que eles – os agentes perigosos – tenham sido banidos das relações de trabalho, da vida laboral ou que a sua eficácia agressiva da saúde do Trabalhador tenha sido eliminada. Também não se pode intuir que não seja mais possível o reconhecimento judicial da especialidade da atividade, já que todo o ordenamento jurídico-constitucional, hierarquicamente superior, traz a garantia de proteção à integridade física e à saúde do Trabalhador. (grifos do original)

Considero, portanto, superada a questão referente à possibilidade de reconhecimento da periculosidade como fator de enquadramento da atividade como tempo especial. No caso específico da exposição a inflamáveis, a periculosidade encontra-se prevista no art. 193 da CLT, com redação dada pela Lei 12.740/2012.

Embora, para a caracterização da especialidade por exposição a periculosidade não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada.

No caso em tela, entretanto, a prova da frequência aponta o sentido contrário, de que a exposição era apenas ocasional, de modo que indefiro o pedido.

Por fim, quanto aos níveis de ruído, o laudo do evento 14, LAUDO11 informa apenas os quantitativos de barulho encontrados pontualmente junto às empilhadeiras e trator, não se tratando, portanto, de média. Já o laudo do evento 14, LAUDO12 apresenta mesma medição de ruído para seis diferentes vínculos. Embora as empresas estivessem situadas na área portuária, a perícia, realizada nestas condições, de modo global, não tem força para infirmar os dados específicos do PPP emitido pela empresa.

Com estas razões nego provimento ao apelo no ponto.

Requisitos para Aposentadoria

O INSS apurou, na DER, 31 anos, 1 meses e 17 dias de tempo de contribuição.

Na sentença recorrida, foi reconhecido tempo especial, totalizando 31 anos, 5 meses e 1 dia.

Considerando o tempo especial ora reconhecido, tem-se que o autor implementa 37 anos, 4 meses e 10 dias de contribuição, fazendo jus à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada (93.91 pontos) é inferior a 95 pontos (Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. I, incluído pela Lei 13.183/2015).

Da Tutela Específica

Tendo em vista o disposto no art. 497 do CPC e a circunstância de que os recursos excepcionais, em regra, não possuem efeito suspensivo, fica determinado ao INSS o imediato cumprimento deste julgado, mediante implantação do benefício previdenciário.

Requisite a Secretaria desta Turma, à Central Especializada de Análise de Benefícios - Demandas Judiciais (CEAB-DJ-INSS-SR3), o cumprimento desta decisão e a comprovação nos presentes autos, de acordo com os prazos estabelecidos na Resolução 357/2023 deste Tribunal:

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTOImplantar Benefício
NB1910617145
ESPÉCIEAposentadoria por Tempo de Contribuição
DIB07/12/2018
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB
RMIA apurar
OBSERVAÇÕESnull

Correção Monetária e Juros

A atualização monetária das parcelas vencidas deve observar o INPC no que se refere ao período compreendido entre 11/08/2006 e 08/12/2021, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02/03/2018), inalterado após a conclusão do julgamento, pelo Plenário do STF, de todos os EDs opostos ao RE 870.947 (Tema 810 da repercussão geral), pois rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.

Quanto aos juros de mora, entre 29/06/2009 e 08/12/2021, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança, por força da Lei 11.960/2009, que alterou o art. 1º-F da Lei 9.494/97, conforme decidido pelo Pretório Excelso no RE 870.947 (Tema STF 810).

A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, impõe-se a observância do art. 3º da Emenda Constitucional 113/2021, segundo o qual, "nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente".

Honorários

Modificada a solução da lide, pagará o INSS honorários advocatícios fixados em 10% do valor das parcelas vencidas até a data do acórdão, a teor das Súmulas 111 do STJ e 76 desta Corte, conforme tese firmada pelo STJ no julgamento do Tema 1.105.

Prequestionamento

No que concerne ao prequestionamento, tendo sido a matéria analisada, não há qualquer óbice, ao menos por esse ângulo, à interposição de recursos aos tribunais superiores.

Conclusão

Dar parcial provimento ao apelo da parte autora para reconhecer o caráter especial dos períodos de 01/01/1998 a 31/05/1999, 01/07/1999 a 31/01/2000 e de 01/02/2006 a 28/02/2019, bem como o direito à aposentadoria na DER.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do autor, bem com determinar a implantação do benefício, via CEAB/DJ.



    Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004473534v19 e do código CRC c4ae28d3.Informações adicionais da assinatura:
    Signatário (a): ELIANA PAGGIARIN MARINHO
    Data e Hora: 20/6/2024, às 9:49:9


    5003820-63.2019.4.04.7101
    40004473534.V19


    Conferência de autenticidade emitida em 06/07/2024 04:01:17.

    Poder Judiciário
    TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

    Apelação Cível Nº 5003820-63.2019.4.04.7101/RS

    RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

    APELANTE: GILSON TAYLOR DA ROSA GARCIA (AUTOR)

    APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

    EMENTA

    PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. PORTUÁRIO. RUÍDO.

    1. No tocante à realização de perícia em empresas ativas, em razão da discordância do segurado quanto ao conteúdo do PPP, torna-se necessária a demonstração da falta de correspondência entre as informações contidas no formulário e a realidade do trabalho prestado, não bastando a mera discordância genérica quanto aos dados fornecidos pelo empregador.

    2. A admissão de provas em substituição ao PPP passa, necessariamente, pela demonstração, ainda que de forma indiciária, da existência de omissão na análise da exposição a algum agente agressivo ou, ainda, divergência a respeito da quantificação de agente informado no laudo.

    3. Hipótese em que a parte apresentou sete diferentes laudos que referem ruído superior àquele registrado no PPP, sendo prova bastante a infirmar os dados dele constantes, pois os laudos examinaram mesmo local e atividades.

    ACÓRDÃO

    Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do autor, bem com determinar a implantação do benefício, via CEAB/DJ, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

    Florianópolis, 28 de junho de 2024.



    Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004473535v4 e do código CRC be8c0fbb.Informações adicionais da assinatura:
    Signatário (a): ELIANA PAGGIARIN MARINHO
    Data e Hora: 28/6/2024, às 16:29:18


    5003820-63.2019.4.04.7101
    40004473535 .V4


    Conferência de autenticidade emitida em 06/07/2024 04:01:17.

    Poder Judiciário
    Tribunal Regional Federal da 4ª Região

    EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 21/06/2024 A 28/06/2024

    Apelação Cível Nº 5003820-63.2019.4.04.7101/RS

    RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

    PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

    PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART

    APELANTE: GILSON TAYLOR DA ROSA GARCIA (AUTOR)

    ADVOGADO(A): ANA CRISTINA BORGES DA CUNHA (OAB RS072646)

    APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

    Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 21/06/2024, às 00:00, a 28/06/2024, às 16:00, na sequência 724, disponibilizada no DE de 12/06/2024.

    Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

    A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR, BEM COM DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB/DJ.

    RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

    Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

    Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

    Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

    LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

    Secretária



    Conferência de autenticidade emitida em 06/07/2024 04:01:17.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora